A luz da aurora transpassava as cortinas finas do quarto do casal Uchiha. Sasuke já estava acordado há algum tempo, porque aquele era um dia especialmente peculiar para si e por isso sequer havia conseguido dormir à noite.
Era aniversário da morte dele.
O moreno olhou de relance para a esposa, vendo seu corpo nu de costas para si com o lençol fino parcialmente lhe cobrindo. Ele observou as marcas na sua pele exposta e se permitiu dar um ínfimo sorriso, lembrando-se da noite anterior em que mataram as saudades que sentiam um do outro, após seu retorno para a Vila.
Se levantou da cama com suavidade a fim de não despertá-la, já que, além da noite calorosa, Sakura havia enfrentado um longo turno de trinta e seis horas no hospital de Konoha e por isso havia ficado exausta. Ela finalmente estava repousando, e Sasuke estava decidido a não atrapalhá-la, ainda que precisasse sair do apartamento.
Retirou lentamente o lençol de cima de si e sentou-se na cama, sentindo o corpo tenso e o coração hesitante. A mulher se movimentou na cama, virou-se para o seu lado e lhe roubou o travesseiro que antes estivera deitado, o prendendo num abraço forte e aconchegante. Sasuke a observou por alguns segundos, refletindo sobre a luta interna entre permanecer deitado com ela ou ir àquele local.
Durante a reconstrução de Konoha, após a grande quarta guerra ninja, Kakashi, Naruto e Sakura decidiram preservar o distrito Uchiha. Não as casas, já corrompidas pelo passado pútrido, mas sim a área arborizada, onde fora construído um memorial simples para sua família. Sasuke sabia que durante sua ausência, Sakura ia até o local acender incensos e deixar flores em respeito aos seus familiares, e agora era a sua vez de acender um incenso para Itachi.
Decidiu-se por seguir seu plano e saiu da cama balançando a cabeça, caminhou para a poltrona onde sua roupa estava jogada e vestiu-se devagar, paciente. No início, quando havia perdido um braço, tarefas rotineiras como aquela eram irritantes, porém agora já estava habituado ao seu quadro e até mesmo preferia assim.
A perda de seu braço simbolizava o abandono de um Sasuke corrompido pela maldição do ódio Uchiha. Desde aquele dia no Vale do Fim, ele havia começado uma nova fase em sua vida, se tornando um novo homem, digno do time 7 e do amor do irmão. Itachi havia lhe dito na última vez em que se viram que sempre o amaria, mesmo depois tudo que havia feito, ainda assim, Itachi o perdoou, e foi aquilo que o permitiu começar a seguir em frente.
Colocou a capa negra ao passo que decidiu deixar sua katana em casa, já que ela não lhe seria útil no memorial Uchiha. Ninguém ousava ir àquele local. Nem mesmo Sasuke, sendo aquela a primeira vez depois da morte do irmão que se permitia ir ao memorial.
A casa estava silenciosa e Sasuke saiu do quarto sem fazer qualquer ruído, andou com calma até o quarto da filha, abriu a porta e a observou dormir tranquilamente. Ela era seu orgulho e sua esperança de que o legado de sua família jamais fosse esquecido. Sasuke esperava que a menina não passasse pelos mesmo sofrimentos que ele tinha vivido, que ela nunca precisasse encontrar os mesmos demônios que cruzaram seu caminho e foram sua ruína.
Fechou os olhos e encostou a cabeça no umbral quando as memórias invadiram sua mente.
Antes de Itachi sair para sua série de treinamentos diários, ele havia prometido ao irmão mais novo que voltaria cedo e que brincaria com ele. Sasuke havia separado seus brinquedos e esperou pelo o irmão pacientemente, sentado na varanda da casa durante toda a tarde. Quando a noite chegou, sua mãe, Mikoto, o obrigou a entrar e ele compreendeu decepcionado que o irmão não voltaria tão cedo.
Após o treino, Itachi voltou para casa exausto devido ao uso intensivo de chakra nos exercícios. Na entrada, viu um brinquedo do mais novo jogado ao chão e fechou os olhos frustrado ao se lembrar de mais uma promessa quebrada à Sasuke.
Caminhou até o quarto do irmão e se apoiou no batente da porta para fitá-lo, o pequeno Uchiha estava jogado sobre a cama com o lençol enrolado em si, ressoando baixinho, indicando um sono tranquilo. Antes de se deitar, Itachi permaneceu alguns instantes ali, observando o menor dormir, sentindo-se tolo por não proporcionar ao irmão todo o carinho e atenção que ele tanto queria, merecia e precisava.
Sasuke balançou a cabeça se afastando do quarto da filha. Naquela noite, embora Itachi nunca tivesse descoberto, ele fingiu dormir. Sasuke esperou o irmão até depois do seu horário, mas estava com tanta raiva por ele ter quebrado mais uma de suas promessas que não o cumprimentou naquela noite, muito menos o contou tal fato depois.
O Uchiha caminhou para fora do apartamento, fechou a porta e deu um sorriso singelo ao se lembrar do porquê estavam dormindo ali em primeiro lugar. Segundo sua filha, Sakura havia destruído a antiga casa com apenas um soco num ataque de fúria.
Sasuke sorriu com a certeza de que, pelo menos, algumas coisas nunca mudavam, mas assim que começou a caminhar pela Vila, o sorriso se esvaiu, dando lugar à costumeira máscara de indiferença.
Havia poucas pessoas circulando pelas ruas, mas ele sentia os olhares analíticos sobre si, muitos deles temerosos, outros desconfiados. Fechou os olhos, ignorando a todos e seguiu seu caminho. Ele já estava acostumado a ser alvo de olhares assim, fossem de civis ou de ninjas, e no fundo, ele não se importava mais com aquilo, afinal, já estava familiarizada com aquele tratamento desde que se tornara “o menino sobrevivente do massacre”, quando ainda era jovem.
Havia apenas uma pessoa em todo o mundo shinobi que ele não suportaria ser olhado daquela forma, com aquela mesma desconfiança e medo. E esta pessoa era Sarada, porque para o Uchiha, a menina era sua própria personificação de esperança e redenção.
Um som de risada infantil chamou sua atenção, o fazendo olhar na direção de um garoto que carregava o irmão mais novo nas costas, o menor chorava e resmungava enquanto o maior sorria tentando lhe acalmar. A cena fez sua garganta se fechar, e seus passos se tornarem mais rápidos.
Sasuke precisava sair dali.
Respirando fundo e lutando contra suas emoções conflitantes, chegou ao memorial. Observou a grande pedra à distância, sentindo o coração acelerado, a respiração irregular e a mão suando frio. Caminhou lentamente até o monumento Uchiha, e cada passo dado uma lembrança vinha à tona, principalmente às boas que durante sua fase do ódio, desejara com muito empenho esquecer.
Itachi fazendo carinho em sua cabeça.
Itachi fugindo das aulas para passar algum tempo consigo.
Itachi cuidando dele quando se machucava.
O abraço amoroso e caloroso de Mikoto.
O Uchiha sentou-se de frente para a pedra em silêncio. Se soubesse da verdade antes de se deixar levar pelo discurso de Orochimaru e do ódio cego promovido pelo irmão, tudo ainda teria terminado da mesma forma? Havia, de fato, algum modo de salvar seu irmão na época?
A morte é mais difícil para aqueles que ficam, os quais têm de lidar com a saudade sufocante e as lembranças dolorosas todos os dias.
Em um momento, seus pais e seu irmão estavam consigo, eram uma família como qualquer outra naquele distrito, tendo seus altos e baixos, mas ainda unidos. No momento seguinte, quando menos esperou, a morte chegou como uma ladra, sorrateira e rápida, restando apenas Sasuke, sozinho e choroso, vendo os corpos frios dos pais no chão e seu único herói demonizado à frente.
Ninguém escapa da morte, seja rico ou pobre, inteligente ou burro, homem ou mulher. A morte sempre chega, e leva consigo aqueles que você sempre desejou manter ao seu lado.
Sasuke tombou a cabeça levemente para frente, em um grito mudo de dor, deixando as lágrimas presas finalmente rolarem por seus olhos.
Lembrou-se do prazer que sentiu quando finalmente enfrentou Itachi e pensou tê-lo assassinado apenas naquela primeira luta. E agora sentia apenas dor pelo ocorrido. O peso da culpa caiu sobre seus ombros e as lágrimas se intensificaram, mesmo que permanecesse quieto.
Ele esteve tão errado, por anos seguiu um objetivo que o destruiu aos poucos e ainda o destruía.
Há aqueles que escolhem partir, guiados por suas dores e seus demônios internos, e diversas vezes são apenas cascas vazias. Apenas sobrevivendo ao dia a dia, até chegarem aos seus limites de sofrimento e finalmente se suicidarem. Todos se questionam o motivo, o porquê da tal decisão, como se alguém tivesse a resposta ou entendesse e pudesse mensurar a dor do outro. Como se a morte tivesse apenas uma causa.
Uma fina chuva começou a cair sobre ele, mas Sasuke não se importou. Fechou os olhos e se deixou molhar, lavando a sua alma.
Há aqueles que partem sem que queiramos. Apenas vão. Têm suas vidas interrompidas por acontecimentos inesperados. Esses, que geralmente envolvem outras pessoas. A dor nesses casos é pior. A morte não é a resposta para essas pessoas. E sim, a criadora da dúvida de outrens. Das que ficaram. E isso destrói.
A morte é uma interrupção abrupta, um mal sem alívio, que Sasuke nunca seria capaz de entender.
Sentiu quando a chuva parou de cair sobre seu rosto, abriu os olhos confuso. Sarada estava em pé ao seu lado, segurando um guarda-chuva, seu rosto mantinha uma expressão neutra. Ela tinha tanto de si, que isso às vezes o impressionava. Ela sentou-se em silêncio em seu lado, Sasuke pegou o guarda-chuva de sua mão e o segurou.
Em nenhum momento eles falaram.
Sarada fechou os olhos e começou a rezar para Kami, o que surpreendeu o Uchiha. Ele a observou com certa adoração, e quando ela finalizou a oração, encostou a cabeça no ombro do pai quieta.
Eles não precisavam de palavras, não naquele momento. Ambos se entendiam daquela forma e para Sasuke estava perfeito assim.
O moreno não soube quanto tempo havia se passado, mas a chuva já tinha parado e ele continuaram ali. Sasuke, mergulhado em memórias e pensamentos e, Sarada, respeitando seu momento de dor.
— Sarada — a morena se ajeitou e olhou atenta para o pai — Você quer ouvir sobre o último adeus que eu dei ao seu tio?
A Uchiha mais nova confirmou com a cabeça animada e Sasuke lhe contou sobre o último contato que tivera com o irmão que tanto amava. Ele podia não compreender o fato de Itachi perdoá-lo quando ele próprio não o fazia, mas ele compreendia perfeitamente aquele amor incondicional que somente os Uchihas possuíam, o mesmo amor e devoção que ele sentia por Sarada.
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