lembro-me do dia em que Kyungsoo partiu — ele estava estranho, e eu pressenti alguma coisa diferente no ar. ele cheirava a velas e cedros, como um presságio de morte que dele emanava. quando me ofereci para o acompanhar a casa, ele fitou-me demoradamente com os olhos grandes e desconfiados. parecia querer dizer-me alguma coisa, mas no fim acenou com a cabeça, como quem permitia que me aproximasse. com a mochila às costas, segurava as duas alças entre os dedos esguios e fitou-me muito atento, sempre com um olhar e expressão indecifrável de quem esconde muitos segredos. quando o alcancei ele começou a caminhar sobre a rua de paralelos irregulares, arrastando a sola das sapatilhas empoeiradas de forma barulhenta, como se quisesse abafar o barulho dos seus pensamentos. ao espreitar pelo canto do olho constatei o quanto se encontrava terrivelmente triste, mais do que o costume, e eu senti um arrepio, como se alguma coisa mole e sem forma pairasse sobre ele. ao passarmos pelo mercadinho fiz-lhe sinal para que esperasse enquanto comprava um saco de gomas e pastilhas-elásticas. um bando de pássaros barulhentos sobrevoou a praça, atraindo as atenções, e Kyungsoo levantou o rosto, fitando o céu azul sobre a cabeça. a luz do sol feriu-lhe os olhos e ele protegeu-os com a mão, seguindo com a cabeça o movimento das aves negras. entreguei-lhe algumas gomas que ele aceitou, enchendo os dedos das mãos de açúcar. passou a língua, lambendo os pequenos grãos, e mesmo adocicado ainda parecia pairar sobre ele uma sombra oculta. Kyungsoo era de poucas palavras, baixinho, de feições bonitas às quais ninguém parecia notar. ele vestia calças de bombazine e casacos velhos; usava o cabelo negro escorrido e curto, com a franja cortada rente à testa. era recorrente apanhar dos mais velhos — levava chapadas e pontapés; outras vezes enfiavam-no dentro do caixote do lixo ou metiam-lhe a cabeça na sanita. por isso vivia calado e discreto. sem querer dar nas vistas e desconfiado, protegia-se atrás de um pilar ou na sala dos arrumos, e assim foi deixando de existir, tornando-se aos poucos uma sombra de si próprio. eu achava-o fantástico, e hoje arrependo-me de não o ter segurado de forma a averiguar aquela estranha sensação que me inquietava e que dele se desprendia. podia ter segurado a sua mão quando o vi abrir a cancela do jardim de casa. o chiar das dobradiças enferrujadas e o barulho do ferro que embateu tornou a despedida pesada e sombria. a casa parecia abandonada, como um enorme castelo das histórias assombradas, com uma pintura triste sob uma fechada robusta; as persianas abertas, com as cortinas brancas bordadas entre-abertas numa pequena brecha, como se alguém espreitasse por entre elas; o grande pássaro esculpido em pedra que se erguia imponente e solitário no centro do jardim, coberto de musgo e hera. ao percorrer o passadiço de madeira e se aproximar da porta de entrada, senti aquela sensação de desconforto aumentar. instintivamente chamei pelo seu nome assim que os seus pés alcançaram o alpendre de mármore. ele voltou-se para trás, e os seus olhos redondos cruzaram-se com os meus naquilo que parecia uma súplica silenciosa por ajuda. sempre atrás da cancela, deixei-me ficar com o olhar cravado em Kyungsoo, imóvel, sem saber o que fazer. por fim, acenei. “até amanhã, Do Kyungsoo, mas nunca mais o vi.
Okuduğunuz için teşekkürler!
Ziyaretçilerimize Reklamlar göstererek Inkspired’ı ücretsiz tutabiliriz. Lütfen AdBlocker’ı beyaz listeye ekleyerek veya devre dışı bırakarak bizi destekleyin.
Bunu yaptıktan sonra, Inkspired’i normal şekilde kullanmaya devam etmek için lütfen web sitesini yeniden yükleyin..