belamaciel izabela maciel

Nosso narrador conta apenas com a companhia de um passarinho para lidar com seus sentimentos


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Um pássaro chamado Solitude

Desde que me mudei para esse apartamento, há 2 anos, esse singelo canarinho pousa todo dia na beira da janela de minha sala. Não faz nada mais. Não canta, não pia. Nas primeiras semanas tentei colocar sementes para que se alimentasse, mas ele sempre tratou o gesto com indiferença. O pássaro parecia ignorar minha presença. Mesmo assim, pousava todo dia em minha janela. Não devia fazer parte de um bando, já que sempre aparecia sozinho. Decidi chamá-lo de Solitude.

Solitude era um canarinho amarelo, mas algumas das penas de suas asas eram de um tom amarronzado. Ele pousava tímido na beirada da janela e ia, aos poucos, adentrando em minha humilde sala, percorrendo cada vez um pouco mais do cômodo. Da última vez chegou até o meio da sala, onde há uma mesinha que uso para servir café. Olhou desconfiado para a garrafa térmica, que já estava pela metade. Nessa mesma mesa havia uma foto da minha irmã. Era uma foto antiga, já estava desbotada e amassada nos cantos. Mas eu gostava tanto dela que a mantinha como um belo enfeite, num porta-retratos barato e simples, comprado numa feira. Mas ela ficava lá: em destaque na sala. Minha irmã se suicidou há 8 anos. Odiava tirar fotos. As poucas fotos que ainda tenho dela são em momentos espontâneos; sorrindo em meio a uma conversa, abraçando seu gato de estimação, conversando com nossa mãe. Essa foto que eu deixo na sala foi tirada durante uma viagem. Estávamos na Praça Tiradentes em Ouro Preto, num fim de tarde. Havíamos acabado de sair de um sebo; eu com um livro, ela com cinco. Na hora que tirei aquela foto, ela estava admirando o pôr-do-sol, e nem percebeu que tornou-se momentaneamente minha modelo. Acho que nunca soube da existência daquela foto. Nunca soube que, felizmente, está eternizada na mesa de café da minha sala. Nunca soube que chamou a atenção de Solitude.

Daquele dia em diante, Solitude ia imediatamente até a mesa e permanecia ao lado do porta-retrato. Seus olhinhos inquietos rodeavam a sala, mas o canarinho não saía do lugar, até finalmente se cansar e levantar voo. Há algumas semanas, num domingo, eu estava tomando café da manhã quando ele chegou. Diante de mim, um jornal. Eu tinha esse costume, talvez antiquado, de comprar o jornal aos domingos e passar uma parte consideravel da manha lendo-o enquanto apreciava uma xicara de café. Ou duas. Ou algumas. A manchete que mais chamava a atencao naquele dia era sobre uma enchente que ocorreu numa cidadezinha mineira. Pequena, de poucos recursos e precisando de ajuda. Algumas paginas a frente havia uma coluna muito bem escrita sobre o falecido autor Ferreira Gullar. Fora isso, nada mais me prendeu as paginas de papel, e decidi deixar o jornal dobrado sobre a mesa. Passei a observar Solitude.
“Sabe, essa menina aí da foto é minha irmã. Voce ia gostar dela”
O passarinho, em resposta, apenas me encarou.
“Nos já tivemos um gato, mas um passarinho, nunca”, continuei “Eu nunca gostei muito de gatos, e esse especificamente era um tanto levado. Mas era tão carinhoso com ela que acabei tomando gosto por ele.”

Os dias seguiram dessa forma, com Solitude pousando sempre no mesmo lugar e ouvindo algumas historias sobre minha irma. Contei da vez que ela teve que ser levada ao hospital para levar pontos na testa. Contei do cachorro de pelucia que ela ganhou de mim na infancia e o guardou desde então. Contei do amigo viciado em drogas que ela teve na adolescência; chegava drogado para vê-la, sempre com roupas relaxadas, e parecia sair ainda mais doido. Deixou nossa mãe preocupada na época, mas eu sabia que ela era certinha demais pra fazer algo assim. Contei do encanto dela quando viajamos para Buenos Aires; as bochechas rosadas, queimadas pelos ventos de inverno na capital argentina, seus olhos brilhando enquanto caminhávamos pelas ruas.

Passaram-se algumas semanas até eu ter coragem de tocar no assunto. Hesitante, decidi contar a Solitude como aconteceu. Foi numa quinta-feira. No dia anterior, ah!, ela estava tão alegre. Passou a manhã no quarto lendo ao som de Bitches Brew do Miles Davis, e à tarde levei-a para tomar um café. Conversamos durante um bom tempo, enquanto apreciávamos cada um seu expresso. Ela parecia bem. Como não pude prever isso? Talvez se tivesse prestado mais atenção em seu olhar… Fato é que no dia seguinte, saí cedo para trabalhar. Havia esquecido meu celular em casa, então estava totalmente alheio a qualquer mensagem que pudesse ter recebido. Chego em casa, cansado, e antes de entrar na garagem percebo uma ambulancia, uma viatura da policia e mais uma multidao bem ao lado da entrada do predio. Sem entender, subo diretamente para o apartamento. A porta estava destrancada. Entro e não encontro ninguém. O que pode ter acontecido? Ando de cômodo em cômodo e encontro a janela do quarto da minha irmã aberta. Entro, olho pela janela e me deparo com aquela mesma multidão, exatamente ali embaixo. Naquele momento, gelei. Desci o mais rápido que pude, e o que encontrei lá ficará eternamente gravado em minha memória.

Solitude foi o primeiro a quem relatei todos os acontecimentos daquele dia. Quando terminei, fiquei alguns minutos olhando para o chão, como se estivesse temendo o olhar daquele pássaro. Tomo coragem e decido encará-lo.

Pela primeira vez, ouvi seu canto. Era uma melodia triste, baixa, sem energia. Na hora, não consegui me mover. Solitude permaneceu em cima da mesa, cantando, piando, seus olhos fixos aonde eu estava. Ele abriu as asas, levantou voo e saiu pela janela.

16 Mayıs 2020 20:24 0 Rapor Yerleştirmek Hikayeyi takip edin
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