— O que é tudo isso?
— Cartas?
— Eu sei o que são cartas, eu quero saber o que isso faz aqui.
Com os braços cruzados ao lado da mesa no laboratório, Jyrki questionou ao ver Anthony colocando as peças separadamente sobre a mesa onde eles deveriam estar observando uma das novas espécies da semana.
O alado olhou para ele e logo em seguida se virou para os papéis. Se apoiando na mesa, encarou os desenhos coloridos no verso pensando em como deveria responder.
— Você sabe que o Jamey sofre com alguns lapsos de memórias – Com calma, falou ainda separando as cartas restantes em sua mão. — E você também reparou que ele se esforça bastante para se lembrar das coisas que a gente comenta, certo?
— Tenho visto – Respondeu levantando o queixo enquanto olhava as plantas nas prateleiras. — Notei que algumas vezes ele tenta repetir o que já foi dito... Ou pergunta sobre algo que trabalhamos no dia anterior para tentar se lembrar.
— É... – sorrindo Anthony concordou. Estava feliz ao se lembrar de como o jovem se esforçava todos os dias e ainda mais feliz por saber que Jyrki se importava com o avanço deles. — Então eu pensei que a gente deveria fazer algo pra estimular isso nele.
— Separando cartas?
— Não, Jyrki! – Jogando os últimos papéis na mesa, ele se virou fitando o olhar sério e julgador do mais velho. — Jogo da memória.
A resposta fez o homem olhar para as cartas por alguns instantes, as contemplando, e logo em seguida para o alado como se esperasse que ele continuasse a falar.
— Você... sabe como funciona, né?
— Não.
A resposta foi rápida e tão séria como as anteriores, porém ouvir isso fez o mais jovem arregalar os olhos e escancarar a boca. A reação só fez o mais velho erguer a sobrancelha questionando sua reação exagerada.
— Você não... Espera! Então tem algo que eu sei e você não sabe?! – Rindo Anthony perguntou, fazendo Jyrki revirar os olhos. — Eu não tô me gabando é só que... Nossa.
— É algo que eu deveria conhecer?
— Não... Não faz diferença saber ou não sobre isso.
— Isso explica.
— Mas! – Retrucou apontando o dedo para cima e fazendo Jyrki o encarar exausto. — Agora vai ser importante. Você fica aqui e não mexe em nada! Eu vou buscar o Jamey.
—
— Eu jogava isso antes, mas não sei se vou conseguir agora... – Sentado em um dos bancos ao redor da mesa, Jamey comentou inseguro.
— Claro que vai! – Anthony afirmou, sentado no banco a frente enquanto ajeitava as cartas desnecessariamente. Depois se virou, vendo Jyrki no banco ao lado olhando para seu rosto. — A gente vai devagar porque o Jyrki não sabe como funciona.
— Verdade?
— Sim – O mais velho respondeu, mostrando um ligeiro interesse nas cartas.
— Eu vou explicar como funciona – Se apoiando na mesa, Anthony começou a falar se aproximando das cartas. — Vamos supor que sou eu quem começa, ok? Então eu vou pegar uma carta — Pegou mostrando para os outros o desenho de um pássaro no verso. — Agora eu tenho que descobrir onde está a outro que faz par com essa.
— Mas... Não dá para saber – Jyrki esclareceu o óbvio, fitando os papéis iguais na mesa.
— É, a gente tem que adivinhar. Se você acertar, você continua, se errar, o próximo continua – Colocando a carta de volta na mesa, finalizou orgulhoso. — Entendeu?
— Possivelmente vou entender melhor vendo acontecer.
— Como sempre...
— Quem começa? – Jamey perguntou sorridente.
— Pode ser você, depois o Jyrki e eu.
— Ok!
Com cuidado o jovem esticou a mão pegando o primeiro papel que estava próximo dele. Com um sorriso mostrou aos outros a imagem de uma garça. Em seguida tentou procurar pelo par, encontrando o desenho de um rato.
A diferença o fez rir antes de abaixar as cartas nos lugares anteriores.
Jyrki seguiu com o jogo tentando as cartas mais distantes, porém recebendo o mesmo resultado diferente. Anthony continuou e assim passaram os próximos minutos virando e desvirando cartas.
Depois de algum tempo o alado e Jamey já tinham conseguido fazer alguns pares enquanto Jyrki tinha a maioria deles ao lado. Não era de se surpreender que a memória dele fosse a melhor do grupo. Porém o que deixava o alado impressionado era que em todas as vezes que o mais velho acertava um par, podia ver em seu rosto um brilho de satisfação incomum. Jyrki possivelmente nem notava isso, mas parecia contente consigo mesmo.
Jamey também chamava a atenção de Anthony. Era lento e muitas vezes tirou a mesma carta por ter se esquecido. Outros momentos, encontrou o par, mas não conseguia se lembrar onde estava o outro. Entretanto nem Anthony e nem Jyrki perderam a paciência. Foi difícil para o alado segurar a língua, mas precisava fazer isso por ele.
O jogo que normalmente leva 30 minutos para terminar, acabou se estendendo por 2 horas, mas ninguém reclamou, ninguém discutiu e ninguém se afastou.
Cada minuto gasto valeu a pena para ver aqueles olhos que dificilmente conseguiam ver quando estavam ocupados lendo papéis ou injetando líquidos em cobaias. Aquelas duas horas valeram mais do que Anthony esperava que fosse.
— Eu perdi, né? – Jamey comentou ao ver seu baralho com três pares.
Anthony olhou o seu vendo ter dois pares a mais e nem perdeu tempo de ver de Jyrki que obviamente tinha vencido.
— Na verdade, – Jyrki retrucou chamando os olhares — eu acho que você venceu hoje.
Os dois olharam em sua direção sem entender, fazendo o mais velho suspirar sem precisar.
— Você encontrou as cartas. Conseguiu jogar quando você disse que não ia conseguir.
— Ah.
— Não tá errado – Anthony adicionou vendo Jamey olhar para as cartas mais contente do que antes e depois se virou para Jyrki que os olhava com a mesma expressão de sempre. Acabou sorrindo. — A gente tem que fazer isso de novo.
— Eu quero!
— Jyrki?
— Não vejo porque não.
— Ótimo! No próximo eu vou trazer um baralho diferente. A gente pode até tentar fazer de outra forma.
— Como?
— Ah... Não sei. A gente vê na hora!
— Por mim tudo bem.
— Por mim também.
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