Insubordinação, traição…
Os sentimentos que ecoavam dentro de mim como o gongo que toca pela manhã no Shirai Ryu, minha racionalidade me coloca à prova a cada missão conjunta ou reunião. O fogo fazia parte de mim, da minha essência que queima em meu peito a cada kunai lançada e inimigo abatido, pela vontade de fazer o certo e proteger meu reino, minha família e amigos. Apesar de amar o calor da sensação de adrenalina que lutar me causa, em meu coração, as chamas ganham calmaria, o inferno que carrego dentro de mim fica em paz e tudo que eu quero é sentir frio.
O frio que ele emana, da quietude que seus olhos quase brancos trazem, do hálito gelado contra meu rosto quando fala tão perto que meu estômago parece criar borboletas. Kuai Liang era meu oposto, quase um nêmese...mas era tudo que eu queria.
Meu irmão estaria decepcionado se pudesse ler meus pensamentos, principalmente os mais impuros sobre ele, seu corpo e alma. Por minha vontade de descobrir o que tem por trás da sua postura, do jeito de andar que me desconcerta, ainda que jamais admita para qualquer pessoa, por que Sub Zero me intimida; me faz querer trair meu próprio clã e minhas convicções para chamá-lo de meu, nem que fosse por apenas uma noite. E eu quase o odeio, por tudo que representa, pelo passado problemático que teria que ser o meu futuro...e não é.
Eu sinto seu olhar pesado sobre mim, me estremeço por dentro e desejo acabar com a distância entre nós, me aproximando do frio que atrai o meu calor, que ironicamente aquece meu peito como as chamas que carrego em minha essência.
- Você não costuma estar tão quieta. - O frio familiar, a voz baixa, calma e sussurrada tão próxima a meu rosto….
- Às vezes eu também gosto de estar em silêncio. - Respondi, ainda olhando para o horizonte, vendo o sol se pôr entre as montanhas.
- E o que tem no seu silêncio? - Parou de vez ao meu lado, senti o peso dos seus olhos sobre mim e suspirei.
- Egoísmo.
- Egoísmo? - Kuai Liang perguntou, e finalmente eu o encarei.
Observei a cicatriz que cortava seu rosto, a barba que lhe caia tão bem. Tive vontade de delinear o medalhão que ele carrega com os dedos, tocar em seus braços que já adquiriram uma coloração azulada por causa do seu gelo, porém, me contive.
- Já teve vontade de ter o mundo apenas para si mesmo, Sub Zero? - Questionei, vendo seu rosto se virar para as montanhas em nossa frente.
- Sim. - Sua resposta veio mais rápida do que eu imaginei. - Mas o mundo é algo muito amplo. Qual é o mundo que você quer ter, Akemi?
Eu cogitei responder “você”, pagar para ver os sinais que fingia ignorar, os olhares e a maneira como Kuai Liang me trata. Talvez, ele fosse aquilo que me faltava, uma parte do mundo que eu adoraria ter em minha vida. Porém, as coisas são muito mais problemáticas e me envolver com ele seria meu paraíso e perdição, ainda que estivesse entre a razão e a emoção, a relação com meu irmão era mais importante que qualquer coisa.
- A sinceridade custa algumas coisas que não sei se quero pagar, Sub Zero. - Respondi, o vendo sorrir de canto.
- O preço pode não ser tão ruim assim, Akemi. - Se virou de costas, caminhando na direção contrária. - Nos vemos em breve.
Não tive coragem de olhar para trás e vê-lo ir, deixei que a brisa quente encontrasse meu rosto e respirei fundo, tentando acalmar a vontade de gritar o nome dele e dizer tudo que queria a muito tempo.
~
O relógio na cabeceira da minha cama marcava meia noite, o calor era tão intenso que arrisco dizer que essa é a noite mais quente do Japão. Não que isso me incomode, pelo contrário, estava acostumada com o fogo e a sensação de quase estar dentro de uma “sauna”. O céu estava limpo, estrelado e a lua brilhava intensamente, clareando quase todo o templo do Shirai Ryu.
Eu não conseguia dormir, rolava de um lado para o outro no colchão com meus pensamentos inquietos, pensando na última conversa que tive com Sub Zero. Desejei ter sido mais corajosa, contado tudo que queria e o beijado em seguida.
Era estranha a maneira como Kuai Liang mexia comigo sem ao menos ter me tocado - intimamente - ou tentado uma aproximação com segundas intenções.
Por outro lado, eu tinha até a quarta intenção com ele.
Definitivamente já estava conformada que não dormiria tão cedo, queria que algo acontecesse e mudasse completamente os rumos daquela noite; e como uma prece atendida pelos Deuses Ancestrais...ouvi um barulho do lado de fora da minha varanda.
Levantei rapidamente, pegando minha katana ao lado da cama e indo em direção a porta, abri rapidamente querendo surpreender um possível inimigo e...acabei abaixando a guarda.
Não conseguia acreditar no que estava olhando.
- O que faz aqui? - Segurei o cabo da espada um pouco mais forte.
- Eu posso entrar? - A voz dele foi baixa, quase um sussurro que estremeceu o mais profundo da minha alma.
Dei espaço para Sub Zero adentrar em meu quarto; foi naquele momento que quase perco a fala com seu rosto tão bonito como sempre.
- Você está em território inimigo. - Falei e ele apenas deu uma pequena risadinha.
- Não é como se eu tivesse medo do seu clã. - Revirei os olhos, colocando a katana em cima da cama.
- Deveria ter. - Me aproximei dele, ficando a poucos centímetros de distância. - Somos tão mortais como um veneno de escorpião.
- Não tenho medo de escorpiões. - Respondeu, dando mais um passo em minha direção. - Muito menos do veneno dele. Mas me diga, Akemi...o seu veneno é letal?
- Talvez.- Mantive o contato visual, observando ainda mais de perto os olhos quase brancos. - Por que? Gostaria de provar?
Kuai Liang riu, provável dando mais um dos seus sorrisos de canto que tiravam a minha compostura.
O ambiente pareceu ficar com toques de tensão, minhas mãos queriam tocá-lo e acabar de vez com aquela maldita história.
- Eu sou um assassino, Akemi. - Seus dedos tocaram meus braços em uma leve carícia, me deixando completamente arrepiada quando senti um terço do frio que emanava dele. - Não tenho medo de provar do seu veneno ou qualquer coisa do gênero.
- Te falta sensatez, Grão-Mestre.- Falei mais baixo, quase ousando tocá-lo. - Mas você não me disse o que faz aqui.
E então, ele tirou uma kunai que estava encaixada em uma das fivelas do seu braço. A princípio, olhei para o objeto confusa até finalmente reconhecer o laço amarelo preso a ela.
A lança que eu costumava usar em batalha, minha preferida e arrisco dizer que é meu amuleto da sorte.
– Você veio até aqui apenas para me trazer a kunai? - Segurei o arpão em minhas mãos e em seguida, deixando em cima da cama.
– Você me pareceu muito ligada a ela. - Respondeu rapidamente, dando um passo para trás. - Achei que gostaria que alguém a guardasse.
– Definitivamente sim. - Cruzei meus braços, olhando para ele com dúvida. – Porém, eu poderia pegá-la em uma próxima luta. Por que veio até aqui? Qual é o seu propósito, Sub Zero?
– Egoísmo. - Olhei confusa para ele, sentindo meu corpo se arrepiar pela mansidão de sua voz.
– Egoísmo?
– Sim, egoísmo. - Deu um passo em minha direção, ficando em uma distância perigosa de mim. – Assim como você, também queria o mundo. – Seus dedos agora, passaram por meu rosto demoradamente.
– O que tem nesse mundo que você quer ter, Grão-Mestre?
– Você.
Fiquei em silêncio, observando a claridade da lua iluminar o rosto tão lindo que ele tem, ainda que a máscara cobrisse uma parte. O ambiente pareceu ficar um pouco mais frio que antes; porém, ele foi tão agradável que definitivamente não me importei. Quis dizer muita coisa, principalmente o que guardo a tanto tempo e nunca tive coragem de proferir. Hesitei por poucos segundos antes de me convencer que cansei de evitar minhas vontades.
Nesse momento, ignorei meu irmão, meu clã e todos os problemas em questão. Me aproximei juntamente com ele, retirei a máscara azul que cobria o seu rosto e contemplei a luz da lua as expressões tão bonitas que Kuai Liang tem.
– Então seremos egoístas juntos. - Sussurrei, fechando os olhos e tocando os lábios dele com os meus.
Beijá-lo causou um frenesi dentro do meu corpo, seu toque frio me arrepiou, suas mãos me puxaram ainda mais para perto e eu só pude agradecer aos deuses por aquilo.
Tinha consciência de todos os problemas que viriam a seguir, porém, acredito que dessa vez..
Valia a pena ser egoísta.
Спасибо за чтение!
Мы можем поддерживать Inkspired бесплатно, показывая рекламу нашим посетителям.. Пожалуйста, поддержите нас, добавив в белый список или отключив AdBlocker.
После этого перезагрузите веб-сайт, чтобы продолжить использовать Inkspired в обычном режиме.