asunacoxinha Gabrielle Moreira

Para Dipper, não havia mais uma direção. O norte apontado pela bússola indicava um céu nublado demais para que pudesse seguir o mapa das estrelas. Deveria gritar? Chorar? Mas...como poderia? Era apenas uma marionete e marionetes eram inúteis se não houvesse alguém para puxar suas cordas. Alguém para ditar suas ações. Dipper estava quebrado, tão danificado que nem o mais talentoso de todos os oleiros seria capaz de consertá-lo. Contudo, as cordas estavam ali, prontas para serem puxadas; os fios nunca estiveram presos como agora, tão apertados que o enforcava, o nó embutido em seus braços frágeis não o abandonariam nem por um único instante, mesmo que estes estivessem prestes a desabar. As linhas ainda estavam ali, então por que ninguém as puxava? Sua resposta eram tão complexa quanto suas perguntas poderiam ser, mas estas também eram tão simples que ele mesmo as poderia responder: Por que alguém as puxaria? Cordas tão desgastadas e fracas quanto ao próprio brinquedo; marionetes quebradas eram iguais à brinquedos defeituosos, não serviam para nada. Avisos: *Esta é a antiga Brinquedo Sexual postada no Spirit Fanfics! *Também postada no Wattpad. *Também postada no Nyah


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#GravityFalls #yaoi #billdip #Bildipper #traumas #gay #lgbt #Bill-Cipher #Dipper-Pines
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Coragem


– Fujam daqui! Nós cuidaremos dele – a tola voz infantil levemente apreensiva, que tendia para o comando, falou.


– Não! É uma missão suicida! – tentaram alertar, em vão.


– Confiem em nós, vencemos ele uma vez antes... – a fala infantil, numa falha tentativa de soar masculina, tornou a dizer.


– E vamos vencê-lo novamente – uma voz feminina conhecida, mas ainda assim nostálgica completou a frase.


Esse sonho novamente…


– Quando eu puser minhas mãos em vocês, vou desmontar suas moléculas!


Vamos, acorde, é apenas um sonho. Apenas mais um sonho indesejável.


Mas sua linguagem metálica e inumana não me permitia acordar.


– Me enganaram pela última vez!


Não, não, não! Está chegando.


– Pronto! Estou com as crianças, acho que vou acabar com um deles apenas por diversão.


Mais uma vez, não...


Quase como se eu pudesse voltar a sentir suas mãos apertando meu corpo, ao mesmo tempo em que sentia meus ossos estalarem contra a minha irmã; ele pressionava-nos com tamanha força apenas para ter a certeza de que não escaparíamos, ele queria ter o total controle sobre nós e de que não seríamos capazes de usarmos alguns de nossos truques outra vez.


Mas, o pior de tudo era ser forçado a olhá-lo, aquele tom de dourado que eu não suportava vindo daquela criatura de um olho só.


– Uni... duni... tê... – os olhos da criança sendo esmagada não conseguiam deixar de focar naquele enorme olho que alternava entre um pinheiro e uma estrela cadente, o menino transbordava tamanho desespero que até o mínimo ato de piscar era impossível pra ele – Salame mingue...


Ele estava escolhendo; o monstro estava escolhendo quem iria morrer naquela tarde e o garoto obviamente não queria ser o escolhido. Dividido entre a vontade de viver e o temor de perder sua irmã; o medo por tudo era o que prevalecia.


– Por favor, Dipper! Eu não quero morrer!


– O sorvete colorê...


Não, ele não estava selecionando ninguém, ele já havia escolhido antes mesmo daquela, até então inocente, música começar.


– O escolhido foi... – o ar faltou, expelido de seus pulmões à força; a garganta fechara, impedindo que o oxigênio fosse reposto. Ele sorriu, mesmo sem boca ou alguma testemunha para provar, o menino viu, o ser sorriu para ele.


– Você!


Não!


Com puxão de ar, o monstro desapareceu e foi substituído por um cenário escuro: meu quarto. Foi a conclusão que eu havia chego após meus olhos se acostumarem com a escuridão e as formas dos móveis se tornarem visíveis.


O puxão de ar instintivo deve ter sido tão forte que além de me forçar a acordar, fez com que meu corpo fosse impulsionado para frente, fazendo-me sentar. Ofegante, passei minha mão trêmula por meu cabelo úmido de suor e limpei as outras gotas  que ousaram cair.


Perdi a conta de quantas vezes essa mesma lembrança havia voltado para me assombrar, trazendo de volta à tona aquele mesmo verão em que a morte esteve tão próxima. O dia em que eu considerei deixar minha irmã morrer à ser eu o escolhido e alguma coisa dentro de mim dizia que Bill sabia disso.


Diferente daquela tarde, no meu pesadelo, meus tivôs não interferiram em sua seleção, pelo contrário, eles não faziam parte daquilo. Eram apenas Mabel, a criatura e eu.


Engoli à seco com a ponderação, procurando acalmar meu coração agitado. Eu já deveria estar acostumado, desde o dia em que deixamos Gravity Falls para trás esse sonho vem atormentando minhas noites, mas a cada madrugada que se passa eu percebo que é impossível esquecer a coloração de seu olho sádico ou o cheiro de morte que ele exalava.


O silêncio do ambiente era tanto que apenas a minha respiração irregular, produzia algum som.


Ao olhar para o relógio ao lado de minha cama pude constatar ser 1:28 da madrugada. Cedo demais para levantar e mesmo que minhas pálpebras pesassem e meu corpo lutasse para voltar a me deitar, em busca de repor as noites mal dormidas, eu não queria voltar à dormir, pois ceder ao sono seria o mesmo que implorar para que o pesadelo viesse.


Clack.



Reconheci o barulho vindo do corredor, era o chão de madeira rangendo. Quem estava acordado a essa hora?


Tirei o único lençol que cobria meu corpo da noite quente da Califórnia, devagar, preocupado caso fosse um ladrão. O barulho se repetiu, dessa vez mais próximo do meu quarto, eram passos. Meus pés calçados apenas por um par de meias brancas, tocaram o chão e no meio do caminho até a porta, sem ao menos conseguir distinguir o que era, minhas mãos agarraram um grosso e gélido objeto que serviria para atordoar o invasor.


Os próximos passos pararam em frente à minha porta, minha mão livre pousou na maçaneta fria, apertei ainda mais a coisa que eu havia pego e aproximei-a de meu corpo; puxei a porta contra mim de uma só vez, procurando pegá-lo de surpresa, mas antes mesmo que eu pudesse soltar um grito de guerra, duas mãos taparam minha boca, embora não fosse preciso: o choque me impedia de reagir, muito menos de gritar.


Cedi sem ao menos tentar utilizar de minha arma.

Shhh – sussurrou – Fica quieto!


Espera, o quê?


Tentei resmungar, mas as mãos continuavam sufocando minha voz; tirou-as de minha boca devagar, como se ainda estivesse com receio de que eu fosse gritar.

– O que pensa que está fazendo, Mabel?! – murmurei da mesma forma em que ela havia feito.


– O papai e a mamãe estão conversando na sala... – ela anunciou, calando minha boca.


– Apenas... conversando, não é?... – ela assentiu levemente, confirmando.


– Até agora, sim. Eles não levantaram a voz uma vez sequer. Vamos, eu estava ouvindo umas coisas interessantes – ela voltou em passos mansos, mas depressa para frente do meu quarto, próxima à escada.


Abandonei a arma, que mais tarde eu viria a reconhecer como o meu taco de beisebol, no mesmo canto em que Mabel havia me abordado, antes de claramente a seguir. Embora fosse mais de uma hora da manhã e não havia – não deveria haver – mais ninguém acordado à essa hora, eles falavam tão baixo que mesmo naquela distância, não era possível ouvir tudo o que diziam.


– Eu não concordo com isso! – era a voz de nossa mãe, eles estavam cochichando tanto quanto Mabel e eu anteriormente.


– Sabe que é a melhor opção, nós…


– Não! Nós não podemos deixá-los voltar para aquela cidade! Você viu como eles voltaram de lá! Mesmo nunca tendo dito nada para nós, sabe que coisa boa não foi!


– Mais do que isso, eles parecem ter amadurecido, não vê?


– Amadurecido? Eles não precisavam amadurecer! Não entende? A única coisa que eles precisavam ter feito era serem crianças, curtir a infância e não passar por traumas naquela cabana caindo aos pedaços! – a voz de minha mãe aumentava de volume inconscientemente a cada argumento.


– Eles não são mais crianças, precisam de aventuras algumas vezes e traumas? Vamos lá, eles não estão traumatizados…


Nossa mãe soltou uma risada seca, quase desacreditada.


– Aquele garoto não tem uma boa noite de sono há quanto tempo?! Ele gritava no meio da noite! Sabe o que é ouvi-lo e não poder fazer nada?!


Automaticamente, seu comentário fez-me sentir constrangido, eles ouviam aquilo...? Sempre tiveram um sono tão pesado que eu acreditava que não percebiam nada, e já que nunca questionaram, a minha conclusão manteve-se a mesma...


– Ele também é meu filho! Não se esqueça disso, Linda! – Mabel tremulou ao meu lado, embora aquela estava longe de ser a pior briga deles, ela sempre ficava sensível quando ouvia essa voz dura de nosso pai. Apertei sua mão e ela retribuiu o aperto sem ao menos olhar para mim – Além disso, eles gostam de lá. Concordo que eles tenham voltado cheios de segredos, mas eles estavam felizes, não enxerga isso?


Era quase como se eu pudesse ver minha mãe negar com a cabeça como quando ela fazia quando era contrariada.


– Eu não vou deixar que eles voltem para lá. Se você quer fugir…


– Quem está fugindo aqui é você! – sua voz se sobrepôs ao de minha mãe. Mabel tomou um susto com o tom e pressionou ainda mais minha mão – O nosso casamento está acabado, deixe de tentar esconder isso! Essa viagem promocional que recebemos pode ser a salvação disso. E tem mais, eles já têm 16 anos de idade, foram três anos inteiros proibindo-os de voltar à Gravity Falls com desculpas estúpidas! Você pode não gostar, mas aquela gente faz parte da nossa família e se eles se sentem bem em ficar com a família, quem somos nós para impedir alguma coisa?


Minha mãe parou de falar, abalada por ele ter finalmente dito aquilo. Ver seu marido pronunciar o fim do casamento que resistiu por tantos anos, parecia ser um desastre para qualquer um.


– Ainda assim, eu... – o tom choroso não permitiu que ela terminasse sua fala.


– Meu amor, – meu pai se acalmou e suavizou a fala, simpatizado por sua dor – precisamos fazer isso, sabe bem. Um mês, apenas um mês para eles se resolverem com o que quer que tenha ocorrido e um mês para restaurarmos nossa vida inteira. Quando ele acabar, veremos o que vamos fazer depois – ela suspirou.


– Eles têm apenas 16 anos, essa não é a maior idade que se tem para encarar o mundo.


– Sei que você tem medo, eu também tenho, mas eles deixaram de ser crianças há muito tempo.


E então eles se calaram, como se entrassem em um acordo mudo sobre o que deveriam fazer. Mas mesmo para eles, essa discussão já parecia ter findado.


– Dipper, – Mabel sussurrou para mim, falando tão baixo que tive que me esforçar um pouco para compreendê-la – posso dormir com você hoje?


– Pode.


Estávamos prestes a voltar ao nosso quarto quando o veredito foi tomado:


– Amanhã mesmo mandaremos as crianças para Gravity Falls.


Não ficamos para ouvir muito mais; enquanto eles arranjavam os detalhes de ambas as viagens e faziam algumas ligações, fomos para meu quarto e nos acomodamos em minha cama. O relógio já indicava 02:17pm e a noite havia esfriado consideravelmente, mas ainda assim, não foi o suficiente para fazer com que eu levantasse e pegasse um cobertor.


Eu estava com medo; com aquele frio na barriga incômodo como quando temos ao descer em alta velocidade do pico mais alto de uma montanha-russa ou apenas quando o carro levanta alguns centímetros ao passar por uma lombada repentina.


Essa era uma ótima analogia: montanha-russa, era assim que eu me sentia. A minha felicidade era indescritível, voltaríamos para aquela cidade localizada no fim do mundo! Eu veria a Wendy, o Soos, meus tivôs e toda aquela gente metida a caipira em poucas horas…


Nossa, isso estava realmente acontecendo? Mas ainda tinha os meus pais, eles...


– Acha que eles vão se... divorciar? – encarei-a com certa admiração, era como se ela tivesse lido minha mente.


Hum... – resmunguei verdadeiramente pensativo, procurando uma forma de tranquilizá-la, eu sabia que ela tinha pavor disso, não apenas por eles se separarem, mas por poderem separar a gente. E após perder o Waddles, não acredito que ela vá conseguir perder mais alguém – Claro que não, a mamãe e papai se amam, eles apenas estão... perdidos. Você não diz que eles têm a melhor história de amor que existe?


– É... talvez apenas amar não seja suficiente para suportar uma relação, às vezes. – não soube o que dizer, ouvi-la falar assim não era mais uma surpresa após todos os problemas que tivemos quando voltamos de Oregon – Boa noite.


O ensino médio foi uma surpresa para nós, não apenas pela matéria, eu me dava bem com elas e ajudava Mabel no que podia, mas sim pelas pessoas. Idealizamos tanto em nossos sonhos que foi no mínimo decepcionante.


Zombavam constantemente de Mabel por conta de sua personalidade imatura e levada como infantil; e já o meu problema era ser inteligente e um pouco reservado, não que eu me considere um antissocial, mas sim, eu passava mais tempo na biblioteca ou na sala dos professores do que em festas, vendo séries ou jogando os jogos da moda. Não éramos os únicos da escola a seguir esse padrão, mas ainda assim éramos os gêmeos esquisitos.


Houve um tempo em que Mabel tentou se tornar um deles, foi até que engraçado. Ela se rebelou contra seus bichinhos de pelúcia, glitter e moletons, fez com que o papai comprasse todas as roupas e maquiagem de uma revista famosa e se vestiu assim por um mês inteiro. Ela se enquadrou bem, andava com um grupo de garotas bonitas, não era como nos filmes que ela repentinamente passou a andar com as populares do colégio, era apenas mais um grupo de garotas como tinha em todos os lugares, nada muito especial. Entretanto, pode-se dizer que Mabel em si ficou popular, principalmente ao receber dezenas de cartas no dia dos namorados, sendo que a maioria eram de outras garotas. Eu peguei no pé dela até não poder mais, sabe? Coisas de irmãos.


Não me lembro como, mas em algum momento ela se cansou de tudo isso e voltou ao normal. Não foi nem um pouco inesperado que isso fosse acontecer, contudo, para suas amigas pareceu um choque, porém como qualquer outro boato, sua popularidade se apagou aos poucos como se nunca tivesse existido. Todavia, isso não impediu-a de continuar a receber cartas perfumadas de outras garotas no ano seguinte, embora em menor quantidade.


Além do ensino médio, as brigas de nossos pais se tornaram mais intensas e constantes...


A cada semana que se passava era um motivo diferente para gritar aos quatro ventos a raiva que sentiam um pelo outro. Houve um tempo  em que achávamos que eles acabariam se matando, mas Mabel não aguentou ficar mais calada e se intrometeu. Gritou ainda mais alto que eles, chorando: “vocês têm filhos!”. Não sei qual foi o impacto que causou à eles ao serem lembrados de suas responsabilidades como pais, mas após isso eles passaram quase um mês sem ao menos discutir e quando brigavam, tentavam ao máximo não gritar.


Era como meu pai havia dito há minutos atrás: o casamento estava acabado.


Não preciso nem comentar sobre a saudade que eu sentia da pequena cidade de Oregon, não é? A cada ano, era uma desculpa diferente do porquê não poderíamos voltar para lá, desde meus tivôs não terem retornado da viagem ao desbravar os sete mares, até uma falsa epidemia espalhada pela cidade inteira.


“É um risco vocês pegarem uma epidemia também, não acham?”


Mesmo que os jornais não falassem sobre isso.


Mas dessa vez parecia real, daqui à algumas horas iríamos estar em um ônibus de apenas ida para Gravity Falls. Era de verdade, mas para fechar com chave de ouro, tinham os pesadelos.


A única coisa que não havia mudado mesmo depois de tudo isso, era a minha relação com a Mabel. Ela poderia ter me ignorado enquanto se arrumava e curtia sair para festas e shoppings com suas amigas metidas, mas não, sempre que me via sozinho em algum canto vinha encher o meu saco. Embora isso me irritasse às vezes quando eu estava concentrado, acho que sou grato à Mabel por isso.


– Boa noite, Mabel – a respondi, tarde demais. Ela já havia adormecido pacificamente, diferente de mim que passei o resto da noite sendo atormentado pelos meus próprios pensamentos.


[…]


– Já pegaram tudo?


– Sim, senhora! Nossa bagagem já está cheia e estamos prontos para zarpar, capitã! – Mabel respondeu-a prontamente, ao mesmo tempo que lhe fazia uma saudação.


Naquela mesma manhã, aproximadamente umas 7 horas, meu pai apareceu em meu quarto com o intuito de avisar-nos para fazermos nossas malas, pois passaríamos o verão em Gravity Falls. Não demonstrou surpresa em ver Mabel em minha cama, da mesma forma que não a demonstrou a me ver acordado àquela hora; sentado na cama com uma caneca quase vazia de café já frio em mãos. Ele sabia que eu não havia dormido e eu não precisava nem olhar para mim mesmo para saber, já que minhas olheiras me denunciavam acusadoramente.


Ao contrário dele, tivemos que fingir estarmos mais surpresos que um garoto que foi levado ao circo pela primeira vez. Ainda que parte da minha surpresa fosse real, pois mesmo que eles parecessem ter entrado em um consenso na noite passada, eles poderiam voltar atrás com essa ideia, mas eles não haviam o feito.


– Tem certeza? Escova de dentes, shampoo, toalhas? E o seu creme para acne, Mason? Você sempre acaba esquecendo ele e…


– Mãe! Temos tudo o que precisamos, não se preocupe. –eu disse.


Ela tinha razão sobre a acne, assim que fiz 14 anos, elas vieram sem poupar esforços me fazendo ter de começar a passar pomada para diminuir a oleosidade do rosto; melhorou, em partes, mas não posso dizer que acabou com todas. Entretanto, elas diminuíram consideravelmente fazendo com que atualmente eu tenha apenas uma aqui, outra ali, mas nada muito gritante.


O pior dessa situação toda era Mabel, ela não tinha uma única espinha, era uma injustiça comigo e com todos os outros adolescentes! Como podia? Éramos gêmeos, mas tão diferentes.


– Ah, querido... – franziu seu cenho num misto de preocupação e tristeza. Eu sabia que era pelo péssimo estado que eu me encontrava, dessa vez, além de envergonhado, eu me senti mal por forçá-la a fazer tal expressão. Mas, o que eu podia fazer? Os pesadelos também não eram culpa minha, não diretamente, e eu gostaria de acabar com isso tanto quanto ela.


– Ao invés disso, meu bem – meu pai cortou o que quer que estivesse passando por sua cabeça – não está esquecendo nada não?


Ela pendeu a cabeça para o lado, pensativa e como se uma epifania tivesse a atingido, ela arregalou os olhos e saiu correndo, gritando:


– Ai meu deus, minha escova de dentes e meus cremes! –  após a fala, nós rimos.


Ainda que ela fosse extremamente preocupada com os outros, sua memória quando se tratava de si mesma, não era das melhores, então sempre trazia esses momentos cômicos, quando eles não eram trágicos.


Eles não mencionaram muito sobre a viagem que eles estavam planejando fazer, fora o que ouvimos ontem, quando paramos em um posto de gasolina e meu pai saiu para abastecer o carro, minha mãe apenas disse que por causa da excelência do papai no trabalho, eles haviam ganho uma viagem de 2 semanas, nada mais que isso. Mas, também não insistimos nenhum pouco em saber mais, não era preciso dizer alguma coisa, mamãe sabia que nós possuíamos conhecimento do término desse casamento, e tinha como não saber?


– Certo, crianças. Tomem cuidado no caminho e não falem com estranhos, tudo bem? – Meu pai parou o carro próximo ao ponto de ônibus; brincando um pouco ao nos tratar como criança, mas com um toque de verdade ao fundo – É melhor irem rápido antes que o ônibus passe e vocês não vejam.


– Amamos vocês. – minha mãe encerrou.


Pegamos nossa bagagem do porta-malas e eles partiram viagem. Estranhei o fato de que minha mãe não deu a ideia de esperar que o ônibus chegasse para irem embora, mas não reclamei. Eu amava meus pais, contudo, era bom não ser superprotegido na maioria das vezes.


Se bem que minha mãe nem sempre foi assim, antigamente, ela era tão liberal quanto meu pai. Entretanto, à medida que fomos crescendo, sua preocupação pareceu somente aumentar. Não sabia se ela percebeu que éramos diferentes do normal e por isso previu problemas ou não, mas seu lado de mãe-coruja tomou uma imensidão ainda maior após o verão de alguns anos atrás.


Ao contrário do que meu pai disse, o ônibus não estava tão perto assim. Esperamos por mais ou menos 20 minutos antes de ele chegar; o que foi estranho, já que as únicas pessoas além de Mabel e eu presentes, era uma mulher tão magra que seu pulso mostrava apenas o osso e sua clavícula era muito funda. Mas isso não era o que mais chamava a atenção. Suas roupas eram esquisitas e tão coloridas quanto o próprio arco-íris, e em seus olhos, sobre suas bochechas fundas, havia um óculos escuro triangular. Para finalizar seu look, ela carregava um cachorro pequeno em seus braços.


Mabel estava encantada.


Eu tenho quase certeza de que não é permitido entrar em um ônibus com um cachorro, não sem a gaiola, mas o motorista não se importou. Não fez nem questão de olhar quem subia ou descia do automóvel, o chiclete que mascava parecia ser um entretenimento maior.


– Vem, Dipper! – Mabel andou rápido entre as poltronas para escolher um lugar. O que não era necessário, pois tirando a gente, havia apenas a mulher com seu cachorro e uma idosa no assento preferencial.


Minha irmã sentou-se na janela da poltrona do fundo, pois lá era mais alto; sentei-me com ela assim que terminei de colocar as malas no espaço superior. Não gostava tanto de sentar no fundo, além de balançar demais, era um lugar para cinco pessoas, o que permitia estranhos se acomodarem conosco.


– Eba, pegamos os melhores lugares! – ela pulou em sua poltrona; sorri de canto para ela mesmo que não concordasse com sua afirmação.


De início, os solavancos dados pelo ônibus eram suportáveis e até divertido, mas em um determinado momento o sono veio. Ele se aproximava aos poucos, como uma cobra cuidadosa esperando para dar o bote e quando eu percebi, estava quase caindo para o lado.


Mabel não percebeu de imediato, estava mais preocupada com a música que tocava em seus fones de ouvido, na paisagem urbanizada da Califórnia, e nos carros que vez ou outra ultrapassavam o ônibus. A garota apenas resolveu questionar quando eu disse que iria sentar no banco à frente ao nosso.


– Eu só quero encostar em alguma coisa para dormir – o que não era mentira.


– Devo ir com você?


– Não se preocupe, vai ser só uma soneca, pode continuar aí – e ela não insistiu muito mais.


Dormir era a última coisa que eu queria fazer naquele momento, a ideia de ficar acordado pela eternidade era tentadora, mas meu corpo não concordava. Precisava de apenas 30 minutos – ou uma hora –, deveria ser o necessário para conseguir me manter por mais tempo. Sim, era tudo pelo o que meu corpo implorava.


Agora que o sacolejar do ônibus não era mais tão insuportável, eu não iria acordar sempre que minha cabeça pendesse para frente ou meu corpo para o lado. Sem parar no ponto de ônibus como os outros ônibus faziam e seguindo esta mesma velocidade, não demoraria 8 horas para chegarmos à Oregon, mas entre 5 ou 6 horas, e isso era uma coisa boa.


Sem pensar em muito mais, pendi minha cabeça para o vidro da janela, observando a mesma paisagem que Mabel e fechei meus olhos, sucumbindo ao sono.


Diferente de todas as outras vezes, o sonho não começou do início de minhas lembranças onde Mabel e eu tentávamos convencer nossos tivôs a fugir. O cenário era escuro, mas o sufoco e a dificuldade de respirar estava presente.


Pinetree... – o dito inumano sussurrou e ainda que eu não pudesse vê-lo, sabia que ele estava ali.


Minha boca se abriu, se era para dialogar com a coisa ou gritar, eu não saberia dizer. Talvez o choque não permitisse que eu fizesse alguma coisa.


Lentamente, seu olho gigante e dourado surgiu juntamente à sua forma amarelada.


Bill... – seu nome escapou por entre meus lábios num último ofego.


Mabel começou a gritar atrás de mim, seu grito era tão desesperador e alarmante que me assustou. Virei o pescoço tão rápido que pude ouvi-lo estalar.


– Dipper, por favor! – ela berrou – Isso dói... isso dói tanto...! Eu estou queimando, Dipper! – sua voz foi se distanciando, quase como o soar mecânica de uma boneca derretida. Minha boca abriu novamente, mas dessa vez eu tive certeza de que era para falar com ela. No entanto, nem um único murmuro saiu – Dipper... você deveria ter me protegido... – sua fala ia sumindo aos poucos.


Precisei fazer um esforço enorme para tê-la em minha vista, mesmo que apenas um pouco e a visão que eu tive foi aterrorizadora. Não era apenas sua voz que soava como uma boneca quebrada, mas ela estava derretendo. Sua bochecha pendia para baixo, desgrudando do osso, quase como se as lágrimas expelidas pelos seus olhos tortos fossem ácido, um ácido sulfúrico que corroía tudo o que tocava.


A imagem foi demais para mim; fechei os olhos, mas queria tapar os meus ouvidos também. Mabel não gritava mais, ela soltava resmungos de dor, pedindo por ajuda e o barulho de sua carne desprendendo-se era grotesco.


Pare...


Implorei para alguém, implorei para que Bill parasse com isso. Mas, ele não pararia. O aperto de sua mão não se tornava mais solto, tanto que o que restou de minha irmã eram seus ossos, agora sendo quebrados um a um, num constante crack, crack, crack.


Abri meus olhos devagar, com medo, e o arrependimento me assolou ao me deparar com aquele sorriso. Bill sorria, seu sorriso era maldoso de extremo deleite para com meu sofrimento. Ele não tinha boca, então como poderia sorrir? Era aquele olho. Aquele olhar era tão extremista que parecia ser capaz de expressar qualquer emoção e a de agora, o sentimento que brilhava em seu olhar, era excitação. Completamente extasiado, ele sorria.


– Pinetree... – ele resmungou, no mesmo tom que minha irmã momentos antes.


Um arrepio passou pelo meu corpo, queria chorar, chorar de pavor.


Uni... duni... tê...


O corpo de Bill pareceu se distanciar, cada vez mais longe até se tornar um ponto amarelo na imensidão escura, mas duas coisas suas continuavam comigo, seu braço preto não deixou de pressionar meu corpo nem por um segundo sequer e a sua voz ecoava na minha cabeça, quase como se essas ações me marcassem.


No entanto, o frio na barriga costumeiro –  o mesmo que eu senti no ônibus – denunciava que não era Bill quem havia se afastado, era eu quem estava caindo.


Isso lembrou-me da vez em que nos aventuramos pelo buraco sem fundo em Gravity Falls. Caía exatamente da mesma forma, mas o vento contra meu rosto expandia a falta de ar, quase como se a força daquele aperto não tivesse fim.


Meus olhos giraram na órbita, eu ia desmaiar, dessa vez eu realmente iria desmaiar e morrer. Mas não passava de um pesadelo, e sonhos não matavam diretamente.


A escuridão daquele lugar alterou-se num amarelo corriqueiro, não, no tom dourado odioso.


– O que pensa que está fazendo?


– Não me deixe aqui!


– Dipper...


– Estamos contando com você, garoto.


Eram vozes, embora distintas, eu me lembrava de cada uma. Eram meus amigos, era minha família. A decepção que eu alguma vez causei neles veio à tona. A forma como eu havia falhado com eles, a minha inutilidade.


... salame-mingue...


– Nunca deveríamos ter contado com você.


– Vê o que acontece quando tenta bancar o garoto-maravilha, pirralho?


"Por favor, pare! Eu não queria…”


– Pinetree…

– Você é meu irmão! Deveria ter me protegido!


“Eu tentei! Juro que tentei!”


– Não foi o suficiente!


“Nunca é!”


– Ei, está tudo bem.


Essa última eu não reconheci. Procurei como podia nas minhas mais vastas memórias, mas eu jurava nunca ter a escutado antes. Se tivesse, como poderia esquecer da suavidade daquela voz angelical?


– Você é inútil.


– Confie em mim, eu preciso de você.


Falava com tanta confiança, como se nunca tivesse que parar para pensar no que dizer, como se as palavras estivessem sempre prontas, num roteiro pré-preparado para ser dito. Mas, ainda assim soavam com tanta naturalidade e tranquilidade que foi impossível ignorar.


... o sorvete colorê escolhido...


– Sem você eu não sou nada.


As outras vozes pareciam ter desaparecido, tamanha era a autoridade imposta pelo anjo.


– Está cansado? Por quê não dorme um pouco?


“Não posso dormir.”


– Não se preocupe, eu estou aqui.


Eu tinha medo de morrer, sempre tive medo da morte. No entanto, aquele tom não permitia que eu a temesse, enchia-me com tanta força de vontade que eu aceitei a ideia de morrer. Eu poderia falecer ali mesmo.


Eu te amo.


... foi você…!


– Dipper! Acorda, droga! – puxei o ar com tanta força como na noite passada e tossi igualmente, acordando de meu pesadelo.


– Mabel...? – questionei após ver seus olhos marejados – O que houve? Por que está chorando?


– Por sua causa, seu imbecil! Você parou de respirar do nada, achei que fosse morrer! – ela fungou.


– Morrer...?


– Sem falar que você ficava sussurrando coisas nada a ver e às vezes se debatia, piorou quando começou a chorar!


Eu tinha chorado?


Toquei em minhas bochechas e ali estavam, o rastro molhado que denunciavam as lágrimas que por ali haviam escorrido.


– Desculpa, Mabel, eu…


– Com o que diabos você estava sonhando? – perguntou.


– Eu... eu não sei. – eu mesmo fiquei assustado com minha resposta. Mas ela era genuína, eu realmente não me lembrava com o que havia sonhado. Ao mesmo tempo que isso deixou-me aliviado, fiquei triste ao constatar isso.


– Por quanto tempo eu dormi?


– Tempo o suficiente para chegarmos à Gravity Falls.

21 ноября 2018 г. 3:48 1 Отчет Добавить Подписаться
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