Minha alegria era imensa, ia ao cinema com minha mãe. Enquanto esperava, observava a mãe maravilhosa que eu tinha, linda e jovem, cheia de vida, a mulher perfeita. Ninguém tinha uma mãe mais bonita e vaidosa que a minha!
Fomos para o cinema de mãos dadas. No caminho, passamos em frente à casa do meu amigo Júlio, cuja mãe era imensa e sem graça. Corremos muito para chegar à sessão, compramos os ingressos e ficamos na fila gigante para comprar meus docinhos. O cinema estava bombando de gente, eu realmente pensei que o lugar fosse cuspir todas aquelas pessoas para fora, como a gente vomita quando come demais e a barriga não aguenta.
Mas mesmo se o cinema vomitasse toda a gente, eu me agarraria com o máximo de força na pilastra da frente dos banheiros e seguraria a minha mãe também, só para não perder o filme! Eu estava muito animado para entrar na sala escura e meus pés dançavam de um lado pro outro, enquanto saíamos da fila dos doces e íamos para a da sala. Mas minha mãe perdeu todo o interesse em entrar e me puxou para fora da fila. Pedi, implorei que voltasse e nada! Quando o filme estava para começar, ela resolveu entrar.
Havia vários lugares para nós e eu ia mostrando: “lá, olha aqui, mamãe, achei mais dois”, mas ela não queria nenhuma das minhas sugestões. Não entendia o que estava acontecendo com minha mãe, até ela resolver escolher três lugares vazios. Nos sentamos e um homem acabou sentando do outro lado de minha mãe.
O lugar era horrível, na minha frente uma mulher se mexia o tempo todo e o filme era uma história chata de amor enjoada e sem graça como a mãe do Júlio. Minha mãe começou a me explicar o filme e eu, feliz com a sua atenção, comecei a comer meus doces. Foi aí que vi minha mãe pousar sua mão no joelho do homem desconhecido ao seu lado. Tudo perdeu a graça. O filme se tornou um inferno e eu queria matar aquele homem.
A sessão acabou. Minha mãe se levantou, olhando uma vez para o homem, e saiu me levando como se nada tivesse acontecido durante o filme. No caminho de volta para casa eu estava péssimo, não queria conversar e dei a desculpa de estar com dor de dente.
Passamos em frente à casa de Júlio e diminui meus passos, vi a sombra da mãe dele pela janela; ela estava lá, colocando a mesa do jantar, cuidando de sua casa e de sua família.
Quando chegamos em casa, papai estava lendo jornal na sala de tv como sempre fazia antes do noticiário. Não sabia o que fazer. Minha vontade era contar tudo o que eu vi, gritar com o máximo de força tudinho o que eu vi naquela sala escura cheia de gente!
Minha mãe, sem me entender, foi pegar uma aspirina para o que ela acreditava ser dor de dente, falando alto para o meu pai, com voz animada, que eu não tinha entendido o filme, que eu não tinha entendido nada.
Depois que engoli a
aspirina com um pouco de água, me sentei no meio do sofá, entre papai e mamãe,
para ver o noticiário. Olhei o rosto do meu pai, grisalho e feio. Prendi as
lágrimas e lhe dei um braço apertado, apenas o mais apertado que conseguia,
exatamente da forma como me agarraria à pilastra do cinema se eu fosse
vomitado.
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