Naruto entrou na casa pedindo licença mais por hábito do que por educação. Considerava aquela quitinete quase um segundo lar.
Tirou os tênis no genkan e invadiu a pequena sala calçado com meias brancas.
Kiba entrou em seguida, repetindo o ritual. Com meias brancas quase idênticas.
— Ta abafado pra caralho aqui — Naruto se jogou no sofá, pegando o controle remoto e ligando a televisão.
— A porra do ar condicionado quebrou de novo — Kiba resmungou e foi abrir a janela. Morava naquele pequeno apartamento, vantajoso em inúmeros sentidos. O aluguel era barato, ficava perto de uma estação do metrô e era um bairro sossegado, mas com todo tipo de serviço disponível. A Konbini vinte e quatro horas salvava-lhe o pescoço com frequência. Por outro lado, o prédio era meio velho. O ar condicionado vivia pifando, havia infiltração no corredor, o elevador estava fechado para manutenção desde que Kiba veio morar ali, um ano atrás.
— Que foda, cara. Street?
A pergunta referia-se ao jogo que colocaria no console do X-Box One.
Era o último domingo das férias de verão. No dia seguinte as aulas recomeçariam e os meninos diriam adeus ao tempo vago. Não que Kiba tivesse tanto tempo vago assim, ele tinha um arubaito lavando pratos em um restaurante de lamen. Sua mãe e sua irmã mais velha ajudavam a pagar a faculdade e o aluguel. As outras despesas ficavam por sua conta. Foi o trato para conseguir se mudar para Tokyo. Não era o melhor administrador, por sorte ganhava a refeição no serviço e quando sobrava comida na cozinha, os funcionários dividiram entre si. Era seu jeito de viver!
Naruto era um amigo que conheceu logo que começou o curso. Eles faziam várias matérias juntos, a simpatia foi imediata. A amizade também.
Desde então se encontravam às vezes pra rachar uma partida de videogame, assistir filmes ou apenas comer e conversar. Isso quando o namorado mal-humorado de Naruto permitia. Sasuke não ia muito com a cara de Kiba e sempre tentava atrapalhar os amigos de se divertir. Naquele domingo Sasuke estava visitando o irmão.
— E o truque das janelas? — Naruto perguntou depois que Kiba abriu os vidros da janela da sala e o ar arejou um tanto.
— Abandonei essa vida, cara. Não posso mais deixar as janelas todas abertas. Peguei trauma.
— Por quê? — Naruto escolheu o personagem e deixou o controle de lado — Tem cerveja?
— Tem. Tá na geladeira — os dois foram para a cozinha. Naquele cômodo, a grande janela de vidro estava coberta com um lençol improvisando uma cortina.
— Que isso, Kiba? — Naruto riu. As estampas de Pokémon eram uma coisa digna de se ver.
— Não debocha, maldito! A culpa é do meu vizinho. O cara do prédio grande que fica de fundo com esse — arremessou uma longnek para Naruto, que pegou a garrafa geladíssima e girou a tampinha, já virando uma bela bolada.
— O que o seu vizinho fez? — passou as costas da mão pelos lábios, para secá-los um pouco.
Kiba abriu a própria cerveja, encostando-se na pequena pia.
— Sabe aquelas coisas bizarras que só acontecem comigo? Foi algo assim... — desconversou.
— Conta isso direito, caralho!! — Naruto queria detalhes!
Kiba respirou fundo e se preparou para partilhar seu momento lamentável.
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Era uma sexta-feira, o último dia de aula na faculdade. Ele foi dispensado do arubaito, porque era época de balanço das vendas, o local estaria fechado para conferência.
A alegria de Kiba era absoluta!! Ele conseguiu recuperar todas as notas baixas do semestre. Colegial era brincadeira de criança perto de toda a cobrança no Ensino Superior.
Mas o garoto era assim. Dava seus tropeços e então corria atrás do prejuízo!!
Sim!
Milagre de verão!!
Ele fechou com algumas notas acima da média mínima. Inclusive aquele terror psicológico chamado de “Antropologia Social”, ministrada por Kakashi-sensei. Inexplicavelmente, ele terminou o primeiro bimestre com uma nota “-3” na prova. E quase enlouqueceu. Como alguém consegue dever nota em uma prova?!
Kiva sempre achou que o zero era tipo o chão: quando alguém cai, dali não passa.
Ledo engano. Inuzuka Kiba se tornou o mito do curso que conseguiu um troféu “-3” para a sua coleção de fracassos.
Desde então Antropologia Social passou a ser o terror. Estudava a matéria sempre tinha uma folga! Quase respirava os conceitos. Não entendeu muito, mas decorou quase tudo. O resultado valeu a pena. Terminou a segunda prova com nota dez!! Isso garantiu a média seis e meio, porque a segunda prova tinha peso dois.
Uma tonelada de pressão saiu de seus ombros e ele pode aproveitar as férias com liberdade. Seria terrível reprovar a matéria e contar pra mãe. Já tinha dezenove anos, mas a mulher bravia era bem capaz de lhe arrancar as orelhas.
Nesse clima de animação - ele era foda, ele se recuperou no melhor estilo protagonista de shonen mangá - Kiba chegou no prédio em que morava e foi direto para as escadas. Sua quitinete ficava no terceiro andar.
Ainda ajudou a vizinha do segundo andar com as sacolas pesadas de supermercado. A boa ação apenas alimentando o próprio ego.
Na porta de casa, tirou os tênis no genkan. Entrou só de meias, porque ali não se preocupava com surippas. O pequeno apartamento não estava tão abafado. Kiba descobriu que deixar as janelas abertas arejava o ar, ficava mais fácil quando chegava à noite, cansado do serviço.
No genkan, arremessou a mochila para cima do sofá, errou e ela caiu no chão. Mas ele nem ligou, acontecia com frequência.
Estava de ferias!
Aprovado!!
Era oficial!!
— Segundo ano aí vou eu!
Colocou o pé no assoalho e girou os calcanhares num movimento rápido, ficando de frente para a porta que empurrou, fechando-a.
Dali já deslizou no melhor estilo moonwalk, imitando um famoso cantor pop. Percorreu toda a sala no passinho arrastado e, quando entrou na cozinha, lançou o melhor estilo freestyle. Braços para um lado, pernas para o outro. Kiba dominava aqueles passinhos porque eles não exigiam coordenação motora alguma.
Parou no meio exato da cozinha. A plateia imaginaria foi ao delírio!! Aos brados de “Kiba!! Kiba!! Kiba!” ele se empolgou e brindou aos fãs invisíveis com um belo solo de bateria. Com direito a efeitos sonoros improvisados e uma abundante chuva de saliva.
— BADUNTS!! — fingiu com elegância que as onomatopeias para os pratos não saíram agudas demais…
A plateia ficou de pé e a emoção do “rei do pop” explodiu a estratosfera. Sem poder se conter, girou com as meias, traçando um semicírculo ao redor do próprio corpo. Uma mão agarrou os órgãos genitais, dando um belo de um puxão. A outra mão subiu no ar, dedo indicador firmemente apontando pra cima.
— AAUU — o gritinho em falsete foi a cereja do bolo.
O pequeno show o deixou ofegante. Mas valeu a pena. Valeu muito a pena!! Aquela multidão na sua mente aplaudindo em pé e pedindo “bis”.
Abriu os olhos e um sorriso cheio de dentes de fazer inveja a tubarão. Estava de bem de frente para a janela da cozinha, que também deixava aberta para ventilar durante o dia e, então, a desgraça.
Ele notou o homem.
O vizinho do prédio chique que ficava de costas para o seu. Uma figura sinistra que já tinha visto perambulando no apartamento do outro lado. Que só vestia casacos esquisitos e óculos de sol, qualquer que fosse a hora do dia ou da noite.
Os prédios ficavam perto o bastante para tirar certa parte da privacidade. Conceito reincidente em Tokyo, com cada vez mais gente e menos espaço.
A questão é que ele ficava um andar acima. E isso dava uma visão panorâmica da cozinha de Kiba.
Caralho.
O homem levou a kobati que segurava até os lábios, soprou e deu um pequeno gole.
Caralho!
Kiba ainda estava com o dedo apontando para cima enquanto segurava o precioso. Suor frio escorreu pelas costas.
CARALHO!!
O vizinho levou a outra mão aos lábios, mordiscando um biscoito. Kiba sentiu o rosto queimar, provavelmente entrando em combustão. Por pouco não nasceu uma Super Nova na humildade daquela cozinha. Então ele recolheu os cacos da dignidade, deu meia volta e retornou para a sala, uma mão paralisada no ar, a outra grudada no meio das pernas.
Depois disso, Kiba esperou anoitecer. Sondou até ter certeza que o vizinho do outro prédio foi dormir. Só então teve coragem de ir fechar a janela e enfiar um lençol nos vãos, precariamente, ocultado o vidro. Desse dia em diante fechava todas as janelas, sem se importar com a falta de ar condicionado. Só abria a da sala e olhe lá. Ele sentiu-se muito envergonhado.
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— Eu tava dançando igual louco na minha cozinha, até olhar pro prédio que dá de fundos e aí que veio o trauma…
Naruto engasgou com a cerveja.
— O cara só assistindo?
— De camarote VIP e tudo mais — ele fez uma careta.
Naruto até tentou ficar sério. Mas ele imaginou toda a cena em sua mente e foi impossível segurar a risada. Apesar de sentir um pouco de pena por dentro. Teve que se apoiar no armário, riu tanto que as pernas fraquejaram e ele quase sentou no chão. Só não fez isso porque seria a morte da honra do amigo.
Kiba fez um bico. Pegou a longnek e voltou para a sala, para se acomodar no sofá e escolher um personagem de Street Fighter.
Naruto observou, tentando recuperar o fôlego. Virou-se para o lençol de Pokémon, era típico do outro terminar a história assim.
Ficou meio curioso para ver o homem. Por isso foi dar uma espiadinha atrás do pano. Vai que o voyeur estava por ali de novo?
— Anda logo, Naruto! — Kiba gritou da sala.
— Já vou, cara!
Levantou uma pontinha da “cortina” e teve uma nova crise de risos. Kiba tinha que tirar aquele pano!!
— Ei, maldito. Você não vai acreditar no que eu vi!! — foi gritando ao voltar para a sala.
E ganhou Kiba pela curiosidade.
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