druh19 DRuh19

Durante sua estadia em Londres, o primogênito da coroa francesa, Adrien Agreste, é surpreendido com o sumiço de seu primo em meio às festividades pagãs do Halloween e o surgimento de Marinette, que tenta lhe mostrar o lado real do, até então desconhecido, Dia das Bruxas.


Фанфикшн Мультфильмы 13+.

#fanfic #adrinette #marichat #miraculous #halloween #mistério #au #ladybug #cat-noit
0
1.4k ПРОСМОТРОВ
Завершено
reading time
AA Поделиться

O Carmesim


Londres, 31 de Outubro de 1780;

Por Adrien Agreste.


A garoa castiga a capital inglesa novamente, como já era de se esperar desde o dia em que coloquei os pés naquele navio junto de meu primo. Hoje completo oficialmente dois meses longe de casa, longe da minha tão adorável Versalhes e toda a brisa que os jardins me proporcionaram junto de minha mãe.

Como um bom francês, não pude deixar de notar como a capital e o Palácio de Buckingham deixaram a desejar; os dias chuvosos e cinzentos parecem tirar toda vida dos camponeses e nobres como se estivessem assolados pela peste.

Olho para fora da janela e ainda não consigo enxergar a Lua, pois não há nada além das nuvens carregadas. Agarro o casaco branco e encaro a máscara vermelha que me entregaram, eu não deveria estar animado para um baile de Halloween; principalmente por ser um festival pagão.

Suspiro duvidoso e vejo as duas cartas com o selo de Versalhes que enfeitam minha mesa, mas não faço questão de abrir; sei o que tem dentro de cada uma delas. A rainha, minha mãe, faz de tudo para deixar bem claro como um primogênito na linha de sucessão deve se portar como representante francês em uma terra inglesa, então não preciso ler nenhuma linha.

Duas batidas na porta me tiram os pensamentos. O valete do rei entra nitidamente atônito; seus olhos entregam a situação e deixam claro que a problemática é inteiramente minha.

— Alteza — ele diz, mas não continua.

— Sim, pode falar — Coloco a máscara em meu rosto e encaro o reflexo do espelho.

— É seu primo, senhor — o mais velho murmura baixo e abaixa a cabeça como se soubesse que estava encrencado.

Viro-me para ele e espero que continue mais uma vez, mas o valete parece não querer continuar aquela conversa.

— Diga logo de uma vez — peço e tento não parecer irritado.

— O arquiduque de Vanily sumiu durante o começo da manhã — ele finalmente diz e sinto minha respiração parar. — Ele saiu desnorteado para ir até o centro e insistiu que precisava ir, mas não retornou até agora! Não temos notícias e os guardas não conseguiram achá-lo na cidade, apenas seu cavalo.

— E o rei? — pergunto.

— Todos os guardas estão de prontidão e à procura de outros vestígios — explica com a cabeça ainda baixa.

— Outros vestígios? Então quais já existem? — Junto as mãos em frente ao corpo.

— Não temos nada… — ele sussurra.

Não contenho um resmungo. Conheço Félix mais do que conheço meus próprios pais, sei de seus limites, suas fraquezas, seus casos, seus inimigos e suas dívidas; ele sempre foi cauteloso em terras inimigas. Fecho os olhos para poder pensar por apenas um segundo e tento não entrar em pânico.

— Um nobre francês perdido em terras inglesas… — sussurro para mim mesmo.

— Sua Majestade está cobrindo esforços para achar o arquiduque, senhor — o valete fala mais uma vez.

— Sei que está — respondo. — Com a falta de dinheiro e a baixa na economia inglesa, suponho que um acordo com a França é realmente necessário. — Encaro-o, vendo o semblante preocupado do homem. — Seu rei precisa realmente de mim, mas eu preciso mais do arquiduque. Sem Félix, sem acordo. — Vou até ele e bato em seu ombro, assim saindo do quarto e olhando pelos corredores.

— Alteza! — o valete balbucia ansioso e corre até mim.

— Suponho que o rei queira me ver. — Tento adivinhar o rumo da conversa.

— Sim! — ele responde eufórico e tenta não gaguejar. — Ele o convida para chá da tarde.

— Obrigado, mas não. Inclusive, já é noite.

— Mas o senhor está em…

— Terras inglesas, cortejos, blá, blá, blá — retruco irritado. — Meu braço direito sumiu e seu rei quer comer! Diga para ele que nos veremos no baile de máscaras. — Começo a andar a passos largos.

— Hoje é Halloween, Alteza! — O valete me segue. — O fim da colheita é muito importante para falarem sobre um acordo entre reinos.

— Sim, sim! Conheço esse festival Irlandes pagão, mas estamos na Inglaterra, não é mesmo? — comento. — É um tanto engraçado.

— O rei gosta de agradar seus parceiros econômicos…

— Ou está sem dinheiro para poder negar um pedido irlandes — afirmo, porque sei que é verdade. — Diga que o verei mais tarde. — Sorrio e tento sumir antes que ele possa correr atrás de mim de novo.

Olho para trás e percebo que ele desistiu de me seguir pelos corredores de Buckingham; um problema a menos até o começo do baile. Continuo a andar e sorrio gentilmente aos que estão passando por mim, parecem curiosos quanto ao sumiço de Félix, mas não dizem nada.

Viro novamente em mais um corredor e chego até o quarto de meu primo, que está com a porta aberta, apenas as camareiras ocupam o espaço e não parecem me perceber por ali.

— A Dama Carmesim apareceu na noite passada! — uma das mulheres sussurrou. — Foi vista no jardim.

— Eu ouvi os sussurros a noite toda. — A outra fez o sinal da cruz em frente ao peito.

— Quem? — pergunto curioso e ouço um pequeno grito causado pelo susto.

As duas se viram em minha direção e se desculpam por não terem me visto, mas digo que tudo bem; o que me intriga mesmo é o medo na voz delas por causa da conversa.

— A Dama Carmesim é uma lenda muito antiga aqui por Londres, Alteza — ela diz. — Dizem que ela sempre aparece na semana do Halloween e leva algumas almas não afortunadas.

— Assim como Tânato ceifa vidas na religião pagã dos gregos? — Não consigo deixar de esboçar um sorriso brincalhão.

— Não acredita na fúria dos espíritos, Alteza? — a camareira pergunta e recebe um tapa da colega sobre os ombros. — Ai! Só estou perguntando — ela resmunga e aperta o ombro.

— Não, não acredito — murmuro com um sorriso. — Acredito apenas em Deus — concluo e olho ao redor, o quarto já foi arrumado e talvez não tenha mais nenhuma prova para me ajudar. — Podem sair por um momento — digo, andando até a mesa que deveria ter os pertences de meu primo.

As gavetas estão organizadas com cartas de Versalhes e Roma; nada mais. Sobre o móvel há mais papéis, canetas tinteiro e uma caixinha com alguns anéis e um colar carmesim. Conheço a vaidade do arquiduque por anéis, mas a jóia vermelha é novidade.

Não contenho minha curiosidade e pego o colar, que possui uma inscrição e a pedra parece nitidamente polida.

Invocare alios moments iam fuit cum ea… — repito o que está gravado na prata.

— Alteza... — Ouço um sussurro, coloco o colar em seu lugar e me viro para a porta, não vendo nada além da madeira.

— Quem está aí? — Olho em volta e ando até a saída, não há ninguém além dos vultos dos que passam pelo salão ao lado.

— Alteza! — A voz estridente de Kagami chega até meus ouvidos e não contenho um susto.

— Madame Tsurugui — falo e tento recobrar minha postura.

— Acabei de saber sobre o arquiduque. — Ela faz sua melhor cara de preocupada e agarra meu braço. — Tenho certeza de que os guardas irão encontrá-lo. — Sua mão direita é rápida para arrumar minha máscara.

— Assim espero — digo e sorrio.

— O baile já vai começar — Kagami esbanja um sorriso e também arruma sua máscara, que diferente da minha, transparece o preto. — É o seu primeiro Halloween, não é?

— E espero que seja o último — sussurro entre dentes.

— Tenho certeza de que irá gostar! Temos muita comida, brincadeiras, danças, fogueiras e histórias. — O brilho nos olhos dela é nítido. — E será uma boa distração até acharem o arquiduque — ela conclui.

— Talvez. — Continuo a sorrir e seguimos juntos em direção ao salão.

O local está repleto de enfeites, que, em minha opinião, não deveriam estar em um baile. Existem abóboras, velas tortas, alguns aglomerados que parecem teias e vários ramos de trigo sobre as mesas. Todas as lareiras estão acesas, as roupas dos convidados parecem mais chamativas do que o comum e suas máscaras são bizarramente agonizantes.

A música baixa, porém agitada, toma conta do salão e corre até a saída, a qual está completamente aberta e cheia de pessoas ao lado de fora sob as tendas. Há enfeites em todas as fontes e pinheiros que compõem o jardim, e algumas crianças parecem se divertir em algum tipo de brincadeira com doces.

Ao fundo, em uma mesa repleta de iguarias e nobres, o rei ergue uma das taças em minha direção, mas prefiro ignorar por enquanto.

— Vamos dançar? — Kagami chama minha atenção.

Sorrio de volta e penso por um segundo antes de responder. Félix está desaparecido e eu estou aproveitando um baile de máscara ao invés de procurá-lo, chega a ser um incômodo.

— Uma dança e depois podemos voltar ao quarto se preferir — ela fala e eu acato.

— Gosta do Halloween? — pergunto, pegando em uma de suas mãos e a levando para o centro da dança.

— Por que não gostaria? — Kagami murmura entre os primeiros passos. — Costuma ser um dos festivais mais animados de Londres.

— Animado… você quer dizer devasso? — rio baixo.

— Devassidão também é boa para a alma, às vezes — ela também ri.

— Não discordo de você — digo ao lembrar da noite passada e vejo parte de suas bochechas à mostra tomarem a cor rubra. — Mas todos aqui parecem nitidamente famintos. — Olho em volta por um momento.

— Vivemos constantemente mascarados… — ela sussurra. — Mas hoje mal conseguimos discernir o semblante um do outro, então não há vergonha em nos mostrarmos de verdade.

Não digo nada, apenas continuo a encarar seu rosto e ver a pouca expressão que a máscara não consegue suprimir.

— Concorda comigo? — Kagami pergunta curiosa.

— Em parte — digo, olhando de relance para alguns convidados. — Não totalmente… — Pego-me entretido no brilho carmesim entre os nobres e me recordo do colar no quarto de meu primo. Nem toda pedra consegue brilhar dessa forma.

— Alteza? — ela me chama e olha para trás em busca de saber o que tanto tira minha atenção.

— Acho que preciso beber algo — falo ao final da música.

Recolho minhas mãos e me despeço em busca de encontrar o brilho carmesim novamente, assim andando em direção a mesa de bebidas. Muitas mulheres parecem gostar especialmente do vermelho durante as celebrações do Halloween, o que me deixa levemente frustrado, já que há mais colares vermelhos do que eu realmente gostaria.

Pego uma das taças expostas e me recolho entre a multidão que passa até o jardim. Eu não deveria esperar encontrar alguma coisa sobre meu primo em meio a um baile, mas o colar vermelho instigou minha curiosidade ao ponto de poder esperar a dona ir até o quarto para buscá-lo.

Tento dar o primeiro gole no vinho, mas meu ombro é empurrado bruscamente, derramando todo o conteúdo de minha taça ao chão e manchando a barra de minha calça. Viro-me para saber quem poderia simplesmente ter desviado de mim e encontro uma máscara vermelha sobre olhos azuis.

— Perdão, Alteza — ela curva a cabeça e passa rapidamente por mim com uma das mãos sobre o pescoço.

Vejo o estado de minhas calças e sigo a mulher com o olhar; seria mais respeitoso ter ficado e me encarado, mas parece que correr é do feitio dela. Suspiro pela mancha feita na roupa branca e percebo a movimentação da garota até os corredores do sul, os quais levam até o quarto de Félix.

Deixo a taça sobre a mesa novamente e não resisto a tentar descobrir o porquê da correria dela. Sigo-a por entre a multidão, passo entre os que estão dançando e vejo Kagami logo à frente.

— Alteza, suas roupas…

— Eu sei — respondo sem ao menos parar de andar e ouço um resmungo de frustração por tê-la deixado falando sozinha.

Viro em direção ao sul do Palácio, mas não encontro mais nada além dos guardas que guardam cada entrada. Ando mais alguns passos e abro a porta do quarto, que está nitidamente vazio.

Frustração.

— Perdão pelo vinho. — A voz ressurge como um fantasma em meus ouvidos e me pego assustado mais uma vez nesta noite. — Eu não deveria correr dentro do Palácio.

— Eu deveria conhecê-la? — pergunto e me viro. Estou em Londres há dois meses, sei de todos os nobres que residem em Buckingham.

— Não, Alteza. Sou uma convidada — ela responde com um sorriso. — É Halloween, minha época favorita do ano. — Encara minha roupa. — O senhor está vestido do quê? — pergunta. — Todos parecem algum tipo de monstro ou animal, mas você… — Ela me analisa. — Só usa uma máscara qualquer.

— Não gosto de fantasias — digo e percebo um colar carmesim em seu torso; sua estrutura é diferente da encontrada no quarto de Félix, mas a pedra parece ser a mesma. — E a sua fantasia? — pergunto curioso.

— Não reconhece? — Ela abre os braços e dá uma volta, assim rindo.

— Deveria? — Não contenho em rir junto.

— Cabelos negros como a noite, olhos azuis como o céu, vestes vermelhas como o sangue e um colar em prata e rubelita? — A empolgação na voz dela é notável, mas continuo indiferente. — Sou a Dama Carmesim! Nunca ouviu sobre mim? — ela conclui levemente chateada.

— Parcialmente. — Comprimo os lábios; eu deveria ter ouvido as camareiras até o final. — Não sou fã das lendas inglesas.

— Versalhes não tem lendas antigas para assustar crianças? — ela pergunta.

— Algumas — murmuro. — Por que estava correndo… — Faço uma pausa, não tenho ideia de seu título ou nome. — É…

— Marinette! — diz em alto tom. — Chamam-me de Marinette. — Junta os braços em frente ao corpo. — Fiquei sabendo sobre o arquiduque, sinto muito por ele — ela termina de falar e ignora minha pergunta, sei como muitas garotas costumam fugir de pretendentes mais velhos e indesejados durante os bailes, então não refaço a pergunta. — Quer me acompanhar até o jardim? — Marinette pergunta e me estende a mão.

Encaro sua mão e olho para trás, o salão continua cheio e cada vez mais barulhento entre as máscaras e fantasias bizarras. O olhar de Kagami é longínquo, mas sei que está em mim.

— Alteza? — Marinette me chama novamente e retrai alguns dedos.

Levanto-me com os olhos ainda no salão e finalmente aceito sua mão. Por meses não faço outra coisa a não ser ver o rosto do rei ou passar as noites ao lado de madame Tsurugui em meus aposentos; um novo rosto me é merecido.

Aperto seus dedos e tento ver o nosso reflexo no espelho dos corredores até a saída. Pisco diversas vezes e a puxo com calma até o espelho, pois posso jurar ter visto apenas o meu reflexo enquanto passávamos.

— Algum problema? — Marinette solta minha mão e entrelaça nossos braços.

— Não, acho que não! — digo com os olhos na imagem dela, não é um fantasma.

Chegamos até o jardim e nos juntamos aos outros durante a dança da colheita. Junto minhas mãos as dela e a giro uma vez antes de trazê-la para perto de novo; seu sorriso me parece realmente genuíno. Entrelaço nossos dedos e continuamos os passos até o fim.

— Vamos, Alteza! O senhor não parece nada animado dançando — Marinette diz com um sorriso. — Prefere beber alguma coisa?

— Não, só preciso me acostumar com o seu ritmo. — Giro-a de novo e coloco suas costas contra meu peito, ela tem muita energia para uma única dança.

— Então mostre querer dançar. — Ela fica de frente para mim mais uma vez e segura as minhas duas mãos, dando pequenas voltas com elas. — O senhor não sorri, não ri, não parece aproveitar nada.

— Meu… — tento falar.

— O arquiduque sumiu, sei disso. — Marinette corta minha fala. — O rei vai encontrá-lo logo, deveria se preocupar menos! Quantos nobres morrem em Londres?

— Como pode dizer algo assim e esperar…

— O arquiduque de Vanily tem muitas amantes por Londres, ele só está se divertindo. — Agarra minha mão mais uma vez e eu a giro.

— Isso é uma afirmação ou uma hipótese? — Semicerro os olhos e vejo um sorriso brincalhão surgir nos lábios dela.

— Não há sangue, nem armas, testemunhas, vestígios e nem um corpo, Alteza! Só estou dizendo o que meus olhos veem — ela sussurra perto demais do meu rosto durante outro rodopio.

— Não me conforta. — A música acaba e recobro minha postura.

— Ficar preocupado vai trazer seu primo de volta? — ela pergunta e volta a ficar do meu lado.

Aceito as mãos de Marinette em meu braço novamente e andamos em direção às mesas do jardim. Ela parece inquieta sem a minha resposta, mas não diz nada, apenas sorri para os que passam por nós dois.

— O que está achando de seu primeiro Halloween? — mais uma vez ela pergunta algo.

— Estranho… — digo. — Não consigo reconhecer quase ninguém com as máscaras, as vestes são bem diferentes do que eu esperava para um festival de colheita e todos estão tomando mais vinho do que o normal.

— Halloween é mais do que máscaras e colheita! — Marinette tomba a cabeça sobre meu ombro e faz uma pausa antes de continuar. — Ele é cheio de rituais e homenagens! As fogueiras repelem as bruxas e louvam a Rainha da Morte.

— Louvar quem? — tento reprimir uma risada, mas percebo que ela está falando sério. — Acredita mesmo nisso?

— Bom, estou aqui em pessoa, não é? — a garota ri e arruma sua máscara. — A Rainha da Morte, A Dama Carmesim.

Olhou-a de lado e vejo seu semblante gozador, ela não parece nem um pouco medrosa por estar falando de coisas tão sérias como lendas pagãs em uma celebração considerada real.

— Você sabe muito sobre ela, madame — murmuro entre um gole de vinho.

— Gosto de como escrevem sobre eu nunca mentir, sobre minha devassidão, de como sempre levo almas comigo e de como o mundo me teme. Qual homem teme uma mulher?

— Devassidão — repito uma das palavras e ignoro o jeito estranho de como ela fala na primeira pessoa. — Faz sentido agora.

— Acha o Halloween uma celebração carnal, não é? — ela ri.

— O olhar das pessoas diz muito — comento. — Todos aqui esperam alguém em suas camas no fim da noite.

— Você também? — Marinette pergunta sem medo e me recordo de Kagami. — Vossa Alteza parece estar incomodado com isso.

— Bom. — Ignoro a primeira pergunta e respondo a seguinte. — A vida é mais que desejos carnais.

— Não seja hipócrita — ela ri com o olhar fixo em mim; toda sua delicadeza e ingenuidade parecem ter sumido por um momento.

— Perdão? — Encaro-a de volta e vejo o semblante dela voltar ao antigo.

— Seu quarto nunca está vazio pela noite, Alteza — Marinette murmura. — A madame Tsurugui acha que é a única que frequenta seus aposentos, mas não faz ideia da senhorita Rossi.

A voz me falta e meus olhos não conseguem sair dos dela.

— O prazer carnal não é um pecado, mas a mentira é — ela continua. — Bom, o prazer em um casamento não é, mas Vossa Alteza também não é casado.

— Não tem medo de dizer essas coisas para mim? — pergunto quase sem ar.

— Vossa Alteza ficou irritado?

“Ela não é apenas uma visitante?”, penso e sinto um arrepio passar por meu corpo.

— Alteza! — Ouço a voz do valete do rei e ignoro a última fala de minha companhia. — Seu primo foi encontrado!

— Eu disse que ele deveria estar apenas na cama de alguém também — Marinette fala atrás de mim.

Olha-a com incômodo e vejo a garota me encarando alegre; nunca ninguém me dirigiu a palavra de tal maneira. Abaixo minimamente a cabeça em uma despedida, assim seguindo o valete para dentro do Palácio em busca de entender o sumiço de Félix.

Subo pela escadaria até o salão e olho para trás uma única vez, vendo a garota ainda parada no mesmo lugar e com os olhos em mim. Sua boca continua curvada em um sorriso bem delineado pelo batom vermelho, enquanto suas mãos permanecem calmas em frente ao corpo e balançam levemente.

Aperto os olhos e volto a olhar para frente, seguindo os passos rápidos do valete até os corredores do sul. Passo pelas pessoas, que parecem curiosas pela volta do arquiduque e sorrio para Kagami assim que trocamos olhares.

A visão de Félix me alegra, ele parece bem e sem nenhum arranhão aparente sobre sua pele ou vestes. Sua feição é de confusão e ele não parece entender o porquê de tantos guardas e outras presenças em seu quarto.

— O que aconteceu com você? — Agarro seus ombros e ouço a risada dele.

— Como assim? Eu fiquei trinta minutos fora e vocês me deram como desaparecido!

— Félix… — Olho para os guardas e o valete, que também não entendem a situação. — Você sumiu um dia inteiro! Já é de noite.

— Do que você está falando? Fiquei até agora no baile e sumi alguns minutos para o labirinto de arbustos — ele comenta sem vergonha.

— Saiam, por favor — peço aos demais e depois encaro meu primo. — E com quem você estava? — Tento entrar no seu jogo de loucura.

— Isso importa? — Félix ri de novo. — É Halloween e eu só decidi aproveitar como todos os outros.

Suspiro e rodo o anel em meu anelar, não sei o que fazer com meu primo, que mesmo parecendo bem, está totalmente perdido no tempo e no espaço. Dou uma volta pelo cômodo e reparo no cordão prateado que sai do bolso de Félix.

— O que é isso em seu bolso? — pergunto e depois olho para a caixa de joias sobre sua mesa.

— Eu prometi devolver o colar carmesim da próxima que vê-la — ele responde brincalhão.

— Para quem exatamente? — Não contenho a curiosidade e puxo o colar de seu bolso, para depois abrir a caixa e ver que o antigo cordão já não está mais ali. — Este colar estava na sua caixa de joias. — Não contenho a irritação.

— Não, estava no pescoço da garota vestida de Dama Carmesim — Félix fala com normalidade e depois sorri sem vergonha, sei como ele não teme falar de suas amantes.

— Você estava com ela até agora? — murmuro irritado e me lembro de Marinette.

— Desde quando Vossa Alteza se preocupa com isso? — comenta com desdém. — Ela me visitou uma semana inteira, hoje só decidi retribuir.

— Félix, eu estava dançando com ela até cinco minutos atrás — falo ainda irritado.

— Muitas mulheres estão de Dama Carmesim. — Félix anda até a porta e gira a maçaneta.

— Então me diga o nome dela! — pedi.

— Marinette, Alteza. O nome dela é Marinette, duquesa de Valhalla. — Meu primo sai do quarto e não me deixa dizer mais nada.

Não contenho um resmungo e um chute contra a cadeira ao lado da mesa; isso é o suficiente para aquietar meu nervosismo e ir atrás de Marinette. Guardo o colar em meu bolso e saio do cômodo. Peço para o valete ficar de olho em meu primo enquanto procuro pela garota de vermelho.

O olhar curioso da multidão de convidados passa sobre meu primo, que está mais a frente, e depois cai sobre mim. Não consigo deixar de parecer irritado com a situação toda e nem um sorriso poderia mudar isso, nem mesmo o bom humor de Kagami, que chega em mim de uma só vez.

— Fico feliz que seu primo esteja bem — ela diz ao meu lado e me oferece uma taça de vinho.

— Eu também — digo, mas não aceito a bebida. — Preciso ficar um pouco sozinho — continuo mesmo sendo mentira, pois meus olhos estão atrás da garota de olhos azuis.

— Claro, nos vemos mais tarde. — Kagami sorri e recolhe seu vestido para o lado contrário.

Sigo para o jardim e encontro muitos vestidos vermelhos e cabelos negros, mas nenhum deles vem acompanhado de olhos azuis. O labirinto de arbustos me parece um lugar tentador para procurar, mas a minha inquietação pelo colar me faz querer pegá-lo de meu bolso como se ele mandasse em mim.

Agarro a joia e engulo com dificuldade, pois consigo sentir os olhos de Marinette em mim e eles podem me perfurar a qualquer momento. Viro-me para a direção deste sentimento e a vejo sorrir para mim enquanto continua a conversar com outro convidado. Ela abaixa a cabeça em um cumprimento e abandona seu lugar ao mesmo tempo que me olha; ela sabe que vou segui-la.

Guardo o colar e ando com pressa por entre as pessoas até o lado norte do Palácio. Há poucos convidados nesta ala e eu consigo enxergar o vestido vermelho de Marinette um pouco distante. Acelero o passo e alcanço seu braço.

— Alteza? — Ela parece confusa.

— Porque a pressa? — pergunto.

— Pressa? Não, senhor — responde ainda confusa. — Precisa de algo?

— Isso é seu — afirmo e mostro o colar

— É mesmo. — Ela franze a testa e depois pega. — Seu primo tinha pego ele de mim! Sorte minha ter dois colares de rubelita.

— Você mentiu para mim — digo irritado. — Sabia do Félix.

— Não, eu estive com ele ontem, não hoje — respondeu com desdém. — Pensei que a noção de tempo dele voltaria mais rápido, não fazia ideia.

— Quem é você? — Quero parecer cético sobre qualquer tipo de lenda pagã.

— Você sabe quem eu sou — ela diz com um sorriso largo. — Já respondi isso.

— Mentiu para mim, não disse ser uma duquesa.

— Não menti, você não perguntou meu título. — Ela balança a cabeça e fecha seu semblante. — Eu não minto.

— Chega desse teatro de Halloween, Marinette — suspiro e dou um passo para trás.

— Qual teatro? — ela ri.

— Por Deus — digo sem paciência.

— O senhor me chamou, assim como seu primo. — Marinette parece séria. — Invocare alios moments iam fuit cum ea — ela repete o trecho e sorri. — Félix tem vontade de continuar vivendo, mas e você, Alteza?

— Quem é você de verdade? — Dou um passo para trás.

— Marinette Dupain-Cheng, duquesa de Valhalla! É assim que me chamavam aqui durante o dia.

— Durante o dia? — Sorrio sarcástico, pois sei o que ela vai falar em seguida. — E durante a noite você é a Dama — rio dela.

— Você aprende rápido. — Marinette balança a cabeça em positivo.

O semblante dela é sério, mas tem uma pitada de graça. Nos encaramos por um momento e vejo seus olhos cintilarem entre o azul e o vermelho carmesim de seu vestido; eu não acredito em lendas urbanas.

Um arrepio passa por meu corpo, minhas pernas estão agitadas e meu cérebro grita para eu começar a correr. Viro-me para começar a me afastar e ela me chama como se estivesse aos pés dos meus ouvidos.

— Você me chamou, Alteza…

— Eu não acredito em fantasmas! — digo irritado e começo a andar de volta para o salão.

— Não é o que parece — ela grita de longe, mas não vem atrás de mim.

— Fantasmas não são reais! — Aperto o passo e olho para trás, ela não está mais lá.

Corro

Corro

Corro

“Fantasmas não existem”, penso enquanto sinto o ar fugir de meus pulmões.

Passo pela multidão e acabo trombando com o valete do rei, que segura meus ombros e percebe minha inquietação. Ele franze o cenho e parece esperar eu dizer algo, mas continuo quieto.

— Não se sente bem, Alteza?

— Diga-me. — Respiro fundo. — Quem é a duquesa de Valhalla? — Espero ouvir algo sensato.

— A duquesa foi uma antiga parceira comercial escandinava — ele fala preocupado. — O senhor quer sentar?

— E hoje ela é o quê? — pergunto e ignoro sua fala.

— Hoje? — O valete demora para falar, mas responde. — A duquesa morreu há dez anos atrás! Acho melhor o senhor sentar.

Balanço a cabeça em negação e nego suas mãos, preciso sair da multidão, preciso acordar desse sonho estranho. Agradeço pela preocupação do valete e tento andar para meu quarto, não me sinto bem. Minha pressão deve estar nas alturas e meu corpo parece estar em estado de alerta.

Acelero o passo mais uma vez, limpo o suor que escorre por minha testa e não consigo deixar de me sentir observado. Olho para os espelhos enquanto ando pelos corredores e vejo a chama das velas tremularem mesmo sem o vento da noite.

Lá está ela, sentada e brincando com o fogo do pavil.

Marinette mostra-se calma, serena e com o olhar sonolento. Ela sorri terna para mim e respira fundo; parece querer me confortar.

— Você gosta de ser um príncipe? — ela pergunta com a voz baixa.

— Gosto — respondo sem hesitar e continuo em alerta.

— Gosta da vida fácil, do dinheiro em abundância e de toda a devassidão de sua vida? — Seus grandes olhos azuis encaram meu corpo.

— Gosto — falo de novo e a ouço rir.

— As mentiras vão te matar, Alteza.

— Não estou mentindo. — Fico parado no mesmo lugar e não ouso me mexer.

— Acredita mesmo ser o escolhido de Deus para guiar o povo francês?

— Eu… — Perco-me na seriedade de seu rosto e hesito em continuar. — Acredito.

— Mesmo? — ela pergunta curiosa. — Mas o senhor compartilha dos ideais iluministas! Vossa Alteza defende governos constitucionais, o afastamento entre igreja e estado… da política e de seu direito divino, estou errada?

— Não — respondo e vejo um sorriso em seu rosto.

— Então diga a verdade. Vossa Alteza não é feliz aqui, mas podemos mudar isso.

— Eu gosto da minha vida, sou feliz! — respondo irritado.

— Não é! — Sua voz treme entre calmaria e raiva. — Você finge gostar e tenta tapar esse buraco em seu peito com seus desejos carnais. Você sente a solidão e o menosprezo do seu pai. Sua mãe é a única pessoa que mostra te amar, mas ela obedece ao rei, não há espaço na agenda dela para você. — Marinette levanta e me estende a mão. — Venha comigo, eu posso te dar toda atenção do mundo, você não vai mais ficar sozinho ou isolado, Adrien.

O espanto toma conta do meu rosto. É a primeira vez em muitos anos que alguém me chama pelo nome, mal lembrava dele. Meu coração erra uma batida e meus olhos tremem por um instante, pois eu sei que tudo o que ela disse é real, é a mais pura verdade em meu peito.

Nunca pude fazer nada só meu, nada do meu agrado. Nunca pude perder a hora, acordar mal, dançar na chuva, participar de atividades ao lado da minha família, ter a atenção de meu pai ou encontrar um amor; o pequeno Adrien sempre ficou trancafiado em seu quarto até a maioridade.

— Como você pode fazer tudo isso sumir? — pergunto desconfiado, mas curioso.

— A morte é só um novo começo de algo muito maior, não é o fim! — Marinette fala com um sorriso. — Eu sou a prova, não é?

— Nunca mais vou ficar sozinho? — suspiro cansado.

— Vamos estar sempre juntos, por toda eternidade. — A mão dela continua estendida.

— Está mentindo — afirmo.

— Eu não minto, Alteza — Marinette retruca audaciosa.

O sorriso dela, diferente de todos que já recebi, parece real, genuíno e não uma máscara por trás de toda ganância e egoísmo que os seguidores da coroa francesa mostram pelo monarca.

Respiro fundo e tento não pensar em como sua voz doce e seu sorriso, até então genuínos, possam vir a ser uma armadilha por trás de algo muito pior do que minha atual vida como primogênito francês.

A indecisão toma conta de mim, mas por fim… eu aceito sua mão.

Marinette continua a sorrir com ternura e sinceridade, assim fazendo meu coração se acalmar e meu medo dela e de todos se esvair. Minhas preocupações como futuro rei não são mais minhas, e os malditos deveres da corte também não. Sorrio de volta e sigo seus passos para o fundo do corredor.

Passamos por quartos, salões e espelhos. Nosso reflexo é diferente de antes, pois apenas o meu reflexo surge, mas não me assusto. Não sei ao certo o que acabei de aceitar, contudo, o peso e o fardo sobre as minhas costas acabam de cair por terra.

Paramos entre os salões menos frequentados e então aperto sua mão; não sei o que vem depois.

— Marinette — Chamo seu nome e ela me olha curiosa. — Qual seu propósito com isso? — pergunto convicto, pois acredito que ela realmente não minta.

— Você é o primeiro a me perguntar — diz espantada, mas prossegue. — Nasci mulher, nasci em uma época de homens. Casei sem amor, vivi confinada, sozinha e sem paz, mas morri com ela — ela responde feliz. — Eu apenas faço o mesmo por pessoas como você, os afortunados, porém infelizes.

— Como um anjo da morte? — dou risada e ela tapa a própria boca.

— É a primeira vez que alguém me diz algo… bom? — ela mesma indaga. — Obrigada.

Aceno com a cabeça e vejo seu sorriso de novo, ele me trás paz e quietude. Fico parado no lugar enquanto ela se aproxima de meu rosto e acaricia minhas bochechas com as mãos.

Encaro seus olhos assim como ela encara os meus.

Nossos lábios se encontram.

Minhas mãos aconchegam seu rosto e sinto o calor da sua pele acalentar a minha em um turbilhão de sentimentos reprimidos, que, involuntariamente, aparecem em minha mente como se fossem um filme de toda a minha curta vida como um primogênito Agreste.

Não estou preso

Não estou sozinho

Não estou...

— Duquesa! — A voz estridente de Félix recobra meus sentidos e o ar expande meu pulmão abaixo do espartilho vermelho. — Posso chamá-la apenas de Marinette?

— Arquiduque — digo e o cumprimento. — Claro, somos amigos, não é? — Arrumo minha postura e a saia do meu vestido.

— Parece estar de saída — ele diz curioso. — O que faz sozinha neste salão?

— Estou me sentindo cansada, isso sempre acontece depois de um tempo longe de casa — respondo e estendo minha mão para dizer adeus. — Creio que um descanso me caia bem.

— Posso acompanhá-la até o quarto — Félix insiste e beija minha mão.

— Não estou hospedada no Palácio, mas agradeço.

— Também posso acompanhá-la até…

— Não tem necessidade. — Corto sua fala. — Agradeço a preocupação e pelo tempo que passamos juntos durante a última semana, mas eu posso me virar agora.

— Sozinha? — ele pergunta e parece preocupado.

Uma risada baixa escapa dos meus lábios, pois companhia é o que mais tenho desde o dia em que parti. Agradeço mais uma vez a preocupação dele e aperto meu precioso colar de rubelita carmesim.

— Eu nunca estou sozinha, senhor.

5 ноября 2021 г. 11:43 0 Отчет Добавить Подписаться
0
Конец

Об авторе

Прокомментируйте

Отправить!
Нет комментариев. Будьте первым!
~