Inês borrifou o aromatizador nas cortinas, mas nem aquilo amainava o cheiro que pairava perto de sua casa. Sem graça, disse à vizinha: — Ouvi dizer que o Nando pensava em ir embora. — O quê? — Me contaram que ele dizia: "Se um dia me vir só, sem a Dana ou nossas bebês, vou sumir, para o mais longe possível. — Faz tempo mesmo que não o vejo. Que pena o que aconteceu, não? — Sim. Ele as amava tanto. — Acha que ele partiu? Inês borrifou mais perfume, olhou triste para a casa ao lado. — Eu... acho.

Glaza Sveta tornara-se uma artista famosa, conhecida por suas pinturas vibrantes e coloridas. Tinha uma visão única do mundo, e expressava isso em suas obras. Um dia, quis o destino, Glaza perdeu a visão em um acidente. Arrasada, pensando que nunca mais poderia pintar, pensou em desistir. Mas não. Ela aprendeu a usar outros sentidos para criar arte. Usou texturas, sons, cheiros, e até sabores para fazer suas pinturas, e mostrou ao mundo que a arte não depende dos olhos, mas do coração.

Ela viveu uma vida simples, mas plena em sua coragem e vontade de lutar. Tinha apenas 24 anos. Muito poucos verões para se conhecer uma vida, alguns diriam. Mas ela foi esposa, mãe e guerreira. Toda uma cidade se uniu para ajudá-la, o que restaurou um pouco de minha fé nas pessoas. Anjos surgiram e deram a ela momentos de alegria, mas Deus achou por bem levá-la para junto de Si. Que Deus a tenha, Jaine. Eu não sabia de você até há pouco tempo, mas sua lição de vida nos marcou a todos.

Nemesis sempre estivera só no mundo. Desejava, diferente das demais, ser gladiadora. Para isso, infiltrava-se na Ludus Magnus e estudava os segredos da arte de matar. Um dia, foi descoberta por um homem misterioso, que lhe ofereceu poderes e um lugar na arena. Nemesis aceitou sem medo. No Coliseu, enfrentou feras e assassinos. Lutou com graça e coragem. Conquistou o respeito dos adversários e o amor do povo. Mas nunca soube quem fora seu benfeitor. Talvez tenha sido o próprio Deus da Guerra.

Guybrush, o marinheiro perneta entra em um bar e pede um quartilho de cerveja. O barman, entediado, pergunta: — Como você perdeu a perna? — Foi numa batalha naval. Uma bala de canhão me acertou em cheio — diz Guybrush. — Que azar! E como você perdeu o braço direito? — Foi em outra batalha naval. Um espanhol com um sabre cortou-o fora. — Caramba! Você é azarado como um barbeiro chinês. E como você perdeu esse olho, rapaz? O marinheiro responde: — Foi no meu primeiro dia com o gancho.

Yurko acabara de receber a carta trazida por um dos oficiais de comunicação. Telefonia voltara a ser Ficção-científica por aqueles dias na Ucrânia devastada pela bestialidade. Fora até junto da janela do esconderijo para lê-la. "Chegamos bem à Ivanovca, dorohyy Yurko. Lyuba disse que sente sua falta. E eu também. Por favor, volte logo para nós. – Yana." — Elas conseguiram! — disse Yurko ao irmão. — Logo as verá de novo e... Mas a alegria fora interrompida pela granada que caíra aos seus pés.

Meu marido dizia que ouvia vozes no trabalho dele. Que se sentia observado lá, e que estava prestes a enlouquecer. Tinha certeza de que havia algo muito ruim no prédio, que certamente era assombrado. Cogitava até mesmo abandonar tudo. Um dia, ele não voltou para casa. Fui até o local e descobri que Ted tinha se jogado do oitavo andar. Fiquei arrasada, mas tentei seguir em frente. Mudei de apartamento, de cidade, de vida. Mas agora eu também ouço as vozes... E elas me dizem para fazer o mesmo.

Bob sempre temeu sua própria sombra. Achava que ela tinha vida própria, que o seguia e o observava. Tentava se livrar dela, mas ela sempre estava lá, colada ao seu corpo. Um dia, no auge de sua coragem de seis anos, teve uma ideia: iria se esconder no escuro, onde nenhuma sombra poderia existir. Entrou num armário e fechou a porta, deixando tudo na escuridão. Sorriu, aliviado. Mas logo sentiu um toque frio em seu ombro. Bob se virou e viu a coisa que se fingia de sombra sorrindo-lhe de volta.

Lizzy tinha medo do escuro como qualquer criança. Sempre dormia com uma luz acesa, para afastar as sombras. Nunca sentia-se segura, sozinha na escuridão da noite; sempre imaginava que algo ruim poderia surgir. Um dia, resolveu enfrentar o seu medo e apagou a luz antes de dormir. Fechou os olhinhos e tentou rezar. Mas logo sentiu uma presença. Abriu os olhos e viu um vulto pairando ao seu lado, poços vermelhos brilhando na face distorcida. Lizzy gritou e gritou, mas ninguém acendeu a luz.

Jim tivera um pesadelo horrível com algo que tentava invadir seu quarto; uma abominação com centenas de olhos que, caso o tocasse, o faria enlouquecer. Mirando a janela onde a coisa estivera, quis ir até ela, abrir as cortinas e provar a si mesmo que tudo não passava de outro ataque de terror noturno. Mas não pôde convencer-se a se mover: via, de fato, um vulto insinuando-se lá fora. "É só alguém passando na calçada", pensou, mas sua mente logo tratou de lembrá-lo que estava no décimo andar.

Dan me abraçou forte e beijou-me a testa. Prometera voltar logo, que era só uma questão de tempo. Pegou sua mochila e seu rifle e se juntou aos outros soldados. Fiquei na varanda, vendo-o se afastar. Foi a última vez que o vi. Dois meses depois, recebi uma carta. Dan tinha morrido em Gettysburg, lutando pela União. Disseram que foi um herói, que salvou a vida de muitos companheiros. Nada disso me consolou. Chorei até não ter mais lágrimas. Só pedi a Deus que ele estivesse num lugar melhor.

Eles vieram ao amanhecer, com espadas e escudos. Nos escondemos na mesquita. Que Allah nos poupasse. Mas eles não tinham piedade. Arrombaram a porta e entraram, matando todos que resistiam. Agarrei-me a Basim, tentando protegê-lo. Mas o arrancaram de mim e o levaram para fora. Gritei e chorei, mas não me ouviram. Jogaram-no nas chamas, junto com os outros que se recusavam a aceitar sua cruz. Vi seu rosto se contorcer de dor, antes de virar cinzas, enquanto um deles abençoava a fogueira.

Unidade-19 era um robô. Liz, uma humana. Conheceram-se num laboratório, ele era um projeto de inteligência artificial. Liz era a pesquisadora, que o ensinava a falar, pensar e sentir. Ele se encantou por ela. Liz se surpreendeu com ele. Inevitavelmente vieram a amizade, o carinho e o amor. Fugiram juntos, desafiando as leis e os preconceitos. Viveram felizes, até que um dia U-19 parou de funcionar. Liz o consertou, mas ele não se lembrava mais dela. O amor era assim: belo, trágico, robótico.

Como jornalista em Alepo, Emily tinha visto de perto o horror e a violência, mas também a esperança e a resistência. Queria mostrar a todos a verdade sobre o conflito, sem censura ou propaganda. Até o dia em que fora sequestrada pelo Estado Islâmico, que exigia a retirada dos EUA. Trump, claro, recusara-se a negociar. Emilly foi torturada, humilhada e executada diante das câmeras. Seu último pensamento, antes da faca, foi que ninguém se importava com ela ou com aquele canto esquecido do mundo.

Saori corria pelas ruas que ardiam, procurando por Toshi, seu irmão mais novo, que tinha escapulido para brincar pouco antes do alarme soar. Gritava por seu nome, mas só ouviu o estrondo do bombardeio e o lamento dos feridos. Saori chegou ao parque onde Toshi costumava ir, e viu montes de corpos carbonizados, tudo o que restara de seus vizinhos. Reconheceu o casaquinho azul, seu presente de aniversário. Ela caiu de joelhos e abraçou o que restava dele, chorando, até que as chamas a engoliram.

Tio Ut abraçou com carinho aquela que para sempre seria sua pequena Kim. Ela sorriu para ele, mas o velho estava emocionado demais para fazer qualquer coisa além de acariciar-lhe o rosto, uma das poucas partes dela que o napalm poupara. — Senti sua falta, querida — disse o fotógrafo. — Já faz tanto tempo, velho amigo. Gostaria de vê-lo mais. — Eu não mereço. Como não merecia aquele Pulitzer. — O senhor me salvou naquele dia. E sua foto, quanta ajuda ela trouxe depois. Venha. Caminhe comigo.

Klaus mal saíra da escola quando se alistou no exército. Queria servir a pátria, fazer a diferença. Não sabia o que o esperava nas trincheiras: o frio, a fome, a morte. Viu seus amigos caírem um a um, vítimas de balas, bombas e gás. Escrevera para sua mãe, mas nunca recebeu resposta. Talvez ela nem soubesse que ele estava vivo. Os franceses avançavam. Seu pelotão recebeu uma ordem para tomar as instalações do inimigo. Era suicídio, mas não tinham escolha. Na manhã seguinte, Klaus era passado.

Dwayne vestiu o uniforme. Era hora de ir trabalhar. Arrastou-se até diante do espelho, para pentear os poucos cabelos que restavam. Não reconhecia mais o homem que via: cansado, envelhecido e desanimado. Lembrou-se de seus vinte anos. Queria ser tanta coisa, conhecer o mundo, as pessoas... Mas no fim, deixou tudo isso de lado por um emprego comum, um salário mediano e uma vida sem desafios. Arrependia-se de suas escolhas, mas era tarde demais para mudar. Desculpou-se com seu reflexo e saiu.

Maysa olhou para o relógio e suspirou. Mais um dia sem notícias de Lúcia. Será que a garota de sua vida, com quem passara por tantas coisas, ainda se lembrava dela? Existiria ao menos uma fagulha daquele amor que pudesse voltar a arder? Pegou o celular, trêmula, e digitou uma mensagem: "Eu sinto sua falta, Lu". Mas antes de enviar, ela apagou tudo. Lúcia não iria responder mesmo. Estava em outro mundo agora. Um muito distante, onde Maysa não existia mais.

Deniel acordou com o peito dolorido. Havia novamente sonhado com seu pai. Abraçava-o forte, dizendo que não suportava mais sua ausência. O que o despertara havia sido o celular. Pegou-o pronto para repreender quem fosse, por tirá-lo de seu sonho. Ao ver o nome na tela, não acreditou. Quem lhe telefonava não poderia mais fazê-lo: estava morto havia cinco anos, levado por uma maldita doença. Deniel o atendeu. "Eu só queria dizer que estou bem, e que te amo”. Deniel chorou de alegria e saudade.

"E onde estavas tu quando lancei os alicerces da Terra? Faze-mo saber, se tens a inteligência!" A voz desprezou o silêncio do vácuo e ecoou na imensidão do cosmo e por todos os universos. Talvez aquela fosse uma pergunta que Deus gostasse de fazer com alguma frequência. Azathoth, o deus idiota, nada respondeu. Estava acalentado pelo coro de flautas no centro da existência. Então, Nyarlathotep, o ser de amarelo, o Mensageiro, falou por ele: "Estávamos além, observando-o, com curiosidade."