Eles eram como a escuridão devorando cada pequeno feixe de luz, era a forma mais vívida que se podia enxergar o terror e assim como a própria escuridão, era discreta. Esses eram eles, um gigantesco monstro que se escondia nas sombras.
Durante todo o tempo que estive neste emprego, vi as situações mais macabras e grotescas possíveis. Tive a infelicidade de presenciar como o ser humano pode ser uma criatura demoníaca dentro de uma fantasia de músculos, carne, ossos e pele. Conheci pelo meu caminho desde pequenas facções ocupadas em venda de droga até repugnâncias como o mercado negro, torturadores, pedófilos, entre outros.
— Estamos lidando com uma volta relevante das ações da máfia russa no mercado negro, o que inclui um grande potencial de vendas. — Não eramos inocentes, sabíamos do que essas vendas se tratavam. — Graças às descobertas feitas essa semana, é indubitável que esse crescimento repentino se trate de intervenção da máfia Romena. Com esse crescimento, nosso alvo principal do momento é o evento planejado pela russa, onde será realizado um leilão de vítimas de tráfico humano. Participaremos infiltrados; o planejamento do plano de combate ainda está sendo feito, mas toda ajuda é muito bem-vinda.
Completada minha fala, a reunião chegou ao seu fim e os agentes presentes começaram a deixar a sala, contudo, minha preocupação não se aproximava de um final.
A situação estava cada vez menos propensa para todos nós; a ascensão de grandes e poderosas máfias eram sempre um alerta vermelho em relação ao perigo eminente e como chefe da operação, a segurança de todos era meu dever e responsabilidade.
— Boa sorte com seu projeto, Sarian. — Ouvi o tom debochado e sarcástico por baixo dos murmúrios. Como em qualquer meio que envolva relações sociais, é impossível agradar todos, especialmente esse maldito cara. — Quero ver se vai funcionar a ideia.
— Obrigada pelas palavras gentis, Joseph.
Disse de forma superficial. Já conhecendo bem com quem lidava, não valia a pena. Mas claro, minha mão, escondida no bolso do sobretudo lhe mostrava o dedo do meio.
Assim que deixou a sala, juntei todos os relatórios usados na reunião para levá-los até meu escritório, onde seriam revisados e suas informações passadas para meu quadro. Segui em direção a sala, a qual por passar 90% de meus dias dentro dela, aconhecia melhor que minha própria moradia.
— O que está acontecendo na Máfia Romena?…
Questionei a mim mesma, arrumando brevemente a papelada que transportei.
Para despedaçar esse silêncio, ouvi subitamente alguém bater à porta, seguido pelo som do teclado numeral da tranca eletrônica e seu aviso de que a senha estava correta. Não precisei olhar, era óbvio quem se tratava
— Olha o que eu trouxe para você! — Disse simpaticamente, me trazendo não um copo, mas sim uma garrafa inteira de café. — Para comemorar sua ótima reunião.
Riu enquanto me entregava o recipiente.
— Diga isso ao Joseph, talvez assim esse canalha aprenda a dar um pouco de valor ao meu trabalho. — Peguei um copo, o levando até a mesa, onde tirei de suas gavetas alguns frascos de remédio, colocando a quantidade prescrita dentro do recipiente. — E muito obrigada pelo café, Leo.
De todas as pessoas deste lugar, podia dizer com toda certeza que Leonardo era quem mais confiava. Por mais que sempre costumasse selecionar os agentes que me seguiriam em missão, ele era o único em quem confiaria minha vida. Tudo isso se dava ao forte vínculo de amizade criado entre nós, havia se tornado uma família para mim.
Trabalhei com seu pai em meu emprego anterior, e assim que soube que eu estava indo para a FBI, contou-me que seu filho caçula gostaria de seguir a mesma profissão. Vendo a empolgação de Leonardo, acabei me oferecendo para ser sua tutora assim que tivesse experiência o suficiente.
Nossa diferença de idade era de onze anos e por mais que ele fosse um adolescente na época, eu sentia como se estivesse preparando uma criança para um campo de guerra.
—Estou surpreso em ver esse pessoal se manifestar novamente.
Disse enquanto olhava para o quadro, parecendo ler uma das notícias fincadas neste.
— Isto é o que me preocupa, se eles entraram em total silêncio por um longo tempo, o que os fez querer subir ao topo novamente? — Disse tomando mais um gole. — Na verdade, tudo me preocupa em relação a eles.
— E quanto a Rússia, julga ser muito perigoso com essa mudança?
— A máfia Russa por si só já é um grande perigo. Eles já têm uma certa fama em relação ao tráfico humano, o que pode ser o alvo principal. Sendo assim, por ora teremos que dar foco a eles para tentar os conter. — Após um curto silêncio, um breve riso. — Ao mesmo tempo eles não perceberam o grande perigo que se meteram ao procurarem apoio de uma máfia tão traiçoeira como a romena.
— E quanto ao plano? Como está indo? — Deu um sorriso breve na última frase, em seguida pegou o copo de café, prestes a beber, mas então recordou dos remédios e assim o colocou de volta sobre a mesa. — Eu nem sabia que já tinha um plano antes de você falar. Poxa! Não acredito que não me contou isso antes.
Disse fingindo reclamar, mas logo a expressão séria se quebrou em um riso nasal.
— Descobri essa noite a localização deles, então passei a madrugada fazendo. — Me levantei, indo até o armário onde guardava os documentos e de lá retirei algumas folhas, voltando ao meu lugar. — Por isso não deu tempo de avisar.
Comentou enquanto deslizava os papéis pela mesa em sua direção.
Ao me ouvir, com suas duas mãos segurou em uma das minhas e olhou com uma parcela de pena.
— Já ouviu falar em “dormir”? É muito bom, você devia tentar, sabia?
— Hahaha, muito engraçado, Leonardo.
— Desculpa, prossiga.
— Eles são completos parasitas. O quanto mais cedo acabarmos com a infestação, menos caos e destruição será deixado para trás. Nós temos a melhor solução para isso.— Comentei confiante enquanto traçava a caneta vermelha pela xerox que havia tirado de um dos documentos.— Eu consegui a planta do local onde acontecerá o leilão, a próxima etapa é rastrear a movimentação interna e aperfeiçoar o planejamento com a divisão dos serviços, mas isto consigo fazer hoje à noite.
— E eu me encarrego com o restante do processo.
Assisti Leonardo se levantar, pegando alguns documentos e me mostrando, como se esperasse pela minha confirmação sobre se podia ou não levá-las consigo. Em alguns segundos recebeu o meu silencioso “sim” em forma de aceno com a cabeça.
Seu turno terminava antes do meu, então já estava acostumada a vê-lo sair mais cedo. Eu só deixava o local depois das 23:00.
— Só mais uma coisa antes de sair. — Chamei sua atenção. —Avise a ela sobre o progresso do caso. Vai deixá-la contente.
— Com toda certeza.
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