suianne Suianne Souza

-Bom dia querida. -meu pai me abraça -Feliz aniversário. -Bom dia, obrigada. -dou um beijo em seu rosto. -O que pretende fazer hoje? -ele pega minha caneca favorita e me serve o café. -Acho que vou tentar dormir um pouco agora, mais tarde eu e umas amigas vamos sair. -falo e bebo um grande gole da xícara. -Sim, é uma boa ideia, mas sabe a regra:... -”Em casa até a uma da manhã” -digo o imitando. -Pode deixar. -Tenho que sair agora, mas qualquer coisa que precisar é só me ligar. Te amo. -ele beija minha testa. -Também te amo pai.


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Capítulo único

Sentada na sacada do meu quarto com minhas pernas penduradas no ar, me enrolo ainda mais no cobertor quando uma brisa gelada me atinge. Um pouco a frente o relógio na torre da igrejinha da cidade marca 5:30 da manhã. Os primeiros raios de sol surgem no horizonte, os pássaros começam a cantar e uma neblina domina o conjunto de árvores que os moradores insistem em chamar de bosque.

Meus olhos começam a pesar, efeito da falta de sono. Passei a noite na sacada com Nina, minha gata, deitada ao meu lado enquanto abraçava o caderninho em meu colo. Hoje é dia 7 de Julho, meu aniversário, o dia em que completo 18 anos. Hoje é dia 7 de Julho, o dia em que completam 15 anos desde que minha mãe partiu.

Meus olhos se enchem de água, pisco algumas vezes mas uma lágrima rebelde escorre pelo meu rosto. Já fazia algum tempo desde a última vez que chorei por causa da minha mãe. No começo eu me trancava no banheiro e me sentava debaixo da pia, ficava lá chorando por horas abraçada ao caderno. Com o tempo passando a imagem dela foi sumindo aos poucos, primeiro a sensação do seu toque, depois seu cheiro, até desaparecer completamente. Hoje tudo que me lembro sobre como ela era é por causa do caderno e as fotos nos álbuns.

Ah, esse maldito caderno! Já perdi a conta de quantas vezes o li. É o diário da vida dela, desde que ela era uma garotinha, até o dia antes de ir embora. Nele ela fala sobre seus sonhos de viajar e conhecer pessoas, sobre seu primeiro beijo, os protestos feministas nos quais ela se envolveu, sobre como conheceu meu pai e o dia que decidiu ir embora.

Limpo meu rosto com as costas da mão e respiro fundo. Sei porque ela foi e entendo seu lado. Ela sempre foi uma daquelas pessoas que fazem tudo o que querem, que correm atrás dos seus sonhos não importa o que aconteça. Sim, eu entendo isso, entendo que ela foi tentar sua carreira como atriz e tudo mais. O que não consigo entender é porque ela nunca tentou entrar em contato, porque ela simplesmente resolveu esquecer que tinha uma família que se preocupava com ela.

As lágrimas voltam a escorrer e eu deixo que molhem meu rosto. Meu pai, um homem com 40 anos, nunca se queixou de nada. Nunca mais mencionou o nome dela na minha frente, nunca disse que sentia falta dela, mas eu sei que às vezes ele também chora.

O sol já se exibe no céu que agora está completamente azul, a neblina se dissipou, o movimento nas ruelas começa a aumentar, na cozinha, no andar de baixo, escuto o barulho de panelas e sei que meu pai está preparando o café da manhã.

Quando eu era menor costumava imaginar como seria se algum dia a encontrasse novamente, o que eu diria, o que ela faria, como ela estaria, ou se algum dia eu poderia encontrar ela novamente. Talvez nos esbarraríamos na rua e não fossemos capazes de reconhecer uma a outra. Será que ela se arrepende? Será que sente minha falta também? Será que… São tantos “serás”.

Relutantemente me levanto, deixo o cobertor e o caderno na cama, vou até o banheiro e lavo meu rosto. Depois desço as escadas e entro na cozinha onde sou recebida pelo cheiro do café recém-feito.

-Bom dia querida. -meu pai me abraça -Feliz aniversário.

-Bom dia, obrigada. -dou um beijo em seu rosto.

-O que pretende fazer hoje? -ele pega minha caneca favorita e me serve o café.

-Acho que vou tentar dormir um pouco agora, mais tarde eu e umas amigas vamos sair. -falo e bebo um grande gole da xícara.

-Sim, é uma boa ideia, mas sabe a regra:...

-”Em casa até a uma da manhã” -digo o imitando. -Pode deixar.

-Tenho que sair agora, mas qualquer coisa que precisar é só me ligar. Te amo. -ele beija minha testa.

-Também te amo pai.

Me sento à mesa, a casa está completamente em silêncio novamente, e me sinto estranhamente em paz, olho a comida na mesa mas não sinto fome, então só jogo um pano de prato por cima para afastar as moscas. Termino de beber o café e lavo a xícara.

Ouço o barulho irritante da campainha, por um instante penso em ignorar e deixar a pessoa tentando até achar que não tem ninguém em casa e desistir, mas então me obrigo a ir até a porta. A campainha toca outra vez e eu suspiro impaciente. Abro a porta e ela está ali, igual as fotos dos ábuns.

-Oi filha. -ela sorri e apesar de tudo me sinto feliz.

14 de Dezembro de 2019 às 00:01 0 Denunciar Insira Seguir história
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Fim

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