luninhasan Luninha San

Para livrar-se da culpa, Lucy Heartfillia precisava voltar a amar Ao sentir o toque quente das mãos de Natsu Dragneel sobre seus ombros, Lucy recuou instintivamente. Seu coração começou a bater descompassado e o pânico a invadiu. O mesmo pânico que sentia desde que... Mas desta vez não havia compreensão no rosto daquele a quem ela aprendera a gostar como amigo. Havia raiva, havia a impaciência de um homem que reprimira o desejo por muito tempo e não tinha mais disposição para esperar!


Fanfiction Anime/Mangá Para maiores de 18 apenas.

#nalu #258 #drama #hentai #universo-aternativo #fairy-tail
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Recordações Amargas

— O que aconteceu, Lucy? Você costuma chegar às seis e já são mais de sete. Aquele seu patrão charmoso a segurou até agora? — Levy perguntou curiosa.

— Desculpe, mas a gente vai ter que deixar a conversa para depois. Natsu vem me pegar daqui a meia hora.

— Natsu? É assim que você o trata? — perguntou surpresa — Imagine se eu não chamar o meu patrão de "senhor..." É capaz do escritório vir abaixo!

Lucy já estava acostumada com a curiosidade de Levy sobre seu relacionamento com Natsu, por isso não se deu ao trabalho de responder. No começo, quando chegou a Londres, ela morava sozinha. Mas depois que... bem, depois que começou a aparecer no escritório com olheiras e um ar exausto por causa dos pesadelos, Natsu lhe sugeriu que dividisse o apartamento com outra moça.

Levy era simpática, a sua maneira, tinha os cabelos azulados e era muito pequena pra idade que tinha. Também era secretária e trabalhava para o presidente de uma grande firma de seguros. Tinha um noivo que servia no exército e com quem se encontrava a espaços irregulares. Sim, Levy Mcgarden seria a companheira ideal, se não fosse por aquela curiosidade sobre ela e Natsu Dragneel, seu chefe.

— E onde vocês vão esta noite?

— Vamos assistir à première de um filme chamado “Instintos” — Lucy respondeu pela porta entreaberta do banheiro, enquanto tirava a roupa de trabalho.

— Nossa, vai ver isso com seu chefe?! dizem que as cenas são..bem, quentes e...

Quase automaticamente Lucy tapou os ouvidos, para não escutar o resto do comentário. E não ficou surpresa ao ver que suas mãos tremiam quando terminou de se despir.

Tomou um banho rápido, evitando olhar para o próprio reflexo no espelho do pequeno banheiro. De volta ao quarto, abriu o guarda-roupa e tirou o modelo que tinha planejado para aquela noite. O vestido preto ia muito bem com sua pele clara, e o lenço de seda ao redor do pescoço suavizava o conjunto com sua estampa delicada. Seus cabelos loiros quase dourados desciam lindamente até a cintura. No trabalho, costumava prendê-los atrás da cabeça por estarem cumpridos demais.

Tinha pouca roupa, mas tudo da melhor qualidade. Como secretária e assistente pessoal de Natsu Dragneel, ela precisava estar sempre bem vestida. Afinal, sendo sócio majoritário de uma importante imobiliária de Londres, Natsu estava em permanente contato com pessoas muito ricas. E não demorou para Lucy compreender que a aparência realmente importava.

Durante os Três anos em que vinha trabalhando para ele, ela aprendeu a mostrar um ar distante, suficientemente frio para conter as investidas dos clientes mais atrevidos. E não se incomodava que o pessoal do ramo a apelidasse de dama de gelo. Nem de longe eles podiam imaginar que aquela pose fazia parte de uma decisão consciente de se manter afastada dos homens.

Só Natsu sabia, e também sabia por quê... o relógio marcava sete e vinte, logo ele chegaria.

Estava vestida de maneira simples, mas ainda assim formal. O vestido realçava discretamente a cintura fina, e os seios vantajosos, os sapatos de salto alto davam um toque sofisticado. Aplicou rapidamente a maquilagem e se afastou para analisar o efeito. Seus olhos eram castanhos e tinha um tom chocolate. O rosto delicado e oval exibia maçãs levemente rubras e um nariz pequeno e reto.

Já não havia mais tempo para arrumar os cabelos, por isso deixou-os soltos como estavam. Passou um leve perfume floral, e para acentuar as curvas dos lábios apenas pincelou um suave batom cor-de-rosa.

— O que eu não daria para ter um corpo assim? — foi a observação de Levy, quando Lucy reapareceu na sala de estar. — Afinal, o que se passa entre você e o Natsu? Vocês trabalham juntos, saem juntos, parecem íntimos... e no entanto ele sai com outras mulheres, também muito lindas por sinal.

— Natsu é meu patrão, mas também é meu amigo, não temos nada um com o outro Levy, portanto ele pode sair com quantas mulheres quiser.

Sempre que Levy a questionava daquele jeito ela se punha na defensiva. Mas era verdade, Natsu era seu amigo... Nenhuma outra pessoa que não tivesse partilhado aquela sua experiência poderia compreender o que os unia. Ninguém a podia conhecer melhor. Ele estava lá quando... foi ele quem a ajudou a se reerguer.

— E também seu amante?

— Levy! Você sabe muito bem que não.

— Eu não entendo, Lucy. Está na cara que você gosta dele, é impossível que não goste, e Natsu é muito atraente. Eu jamais deixaria escapar um homem desses. Mas é só eu sugerir que existe alguma coisa entre vocês dois que você fica pálida como se eu estivesse dizendo uma obscenidade.

A campainha soou, salvando-a de ter que responder.

Mesmo sabendo que só podia ser ele, Lucy entreabriu a porta sem soltar a corrente da trava de segurança, até ver aquela figura alta e familiar, elegante no traje de noite.

— Pronta? — ele sorriu.

Assim que ela abriu a porta, Natsu recuou um passo e deixou-a seguir na frente. Ele era o único que compreendia a sua necessidade de manter uma distância física.

Nem parecia que só fazia três anos desde que eles se encontraram pela primeira vez, Lucy pensou.

Havia aparecido no escritório dele para se candidatar ao emprego de secretária e entenderam-se logo de início. Naquela época, estava há pouco tempo em Londres, na companhia dos avós. Tinha perdido os pais aos dezessete anos e por isso aprendera a se virar sozinha há muito tempo. Aos vinte e um, aparentava ser mais velha e amadurecida.

Natsu tinha vinte três quando se conheceram, um homem alto e bronzeado, cabelos rosados e sorriso contagiante, educado e claro, muito bonito, mas ela suspeitava que o mesmo escondesse uma personalidade complexa.

Ela havia gostado daquele ar reticente, do modo como os olhos negros observavam a feminilidade do seu corpo e de como, assim que a entrevista começou, ele voltou a atenção apenas para suas qualificações e atributos profissionais.

Não precisou de mais de um mês para ficar claro que ambos trabalhavam muito bem juntos, cada um conservando uma certa distância profissional. E assim estava bom para ela, que bem cedo na vida foi obrigada a reconhecer que, por ser atraente e bonita, enfrentaria inúmeros problemas com o sexo oposto.

Já perdera a conta dos homens que a convidaram para ir para a cama e lembrava-se de como reagiram com raiva e desprezo cada vez que ela recusou. Aparentemente achavam muito natural que uma garota bonita estivesse pronta para satisfazer-lhes o apetite sexual apenas em troca de alguns elogios.

Por outro lado, o casamento, ou mesmo o encontro de um grande amor, não fazia parte das preocupações de Lucy. Possuía um bom emprego, e Natsu a prevenira de que o trabalho incluiria viagens para o exterior, especialmente para a Flórida. Ganhava bem, sentia-se realizada com a profissão... Sim, estava bastante satisfeita com a vida que levava.

Embora seu relacionamento com as outras moças do escritório fosse cordial, não tinha nenhuma amiga íntima. Sua posição de secretária e assistente pessoal de Dragneel a colocava hierarquicamente bem acima das outras secretárias, que tendiam a tratá-la com uma certa cautela. Isto, porém, não a perturbava, desde criança aprendera a conviver com a solidão e até gostava de um pouco de isolamento. Tanto que nunca pensara em morar com outra pessoa... mas tudo mudara, e agora havia noites em que acordava coberta de suor e com um grito preso na garganta. Nesses momentos, só o fato de saber que Levy se encontrava do outro lado da parede é que a impedia de enlouquecer.

Enlouquecer... enquanto Natsu abria a porta do carro, ela reprimiu uma expressão de dor. Depois do que tinha acontecido, pediu que ele a liberasse do contrato de trabalho, pois achava que não teria condições de continuar dando conta do serviço, mas ele recusou. Ao contrário, fez-lhe companhia durante suas crises depressivas e de choro, permanecendo a seu lado enquanto fosse necessário, e então passaram a ter um novo conceito um do outro.

A amizade dele era a coisa mais importante que a loira possuía. Embora gostasse do emprego, sempre poderia achar outro, mas jamais encontraria um amigo igual a Natsu.

E, mesmo assim, havia aspectos da vida dele que ela não conhecia, porque ela mesma preferia que fosse desse jeito. Sabia que Natsu tinha outras... amigas. Mulheres que aceitavam ir para a cama com ele. O rosado nunca fizera segredo de que tinha uma vida sexual plena, o que não acontecia com ela, mas, por uma espécie de acordo de ética profissional, nunca tocavam no assunto.

Ele estivera noivo, uma vez. Foi durante uma das crises de depressão de Lucy que ele contou, querendo consolá-la. Falou da dor imensa que sentiu quando sua noiva havia morrido num desastre de automóvel. Natsu era muito jovem naquela época, dezenove anos mal completos. E depois disso nunca mais pensara em se casar. E por que deveria?, ela pensou. Era dono de uma bela mansão em Magnólia, de um apartamento incrível em Londres e hóspede frequente dos melhores hotéis do Japão. Gostava da liberdade da vida de solteiro. Mas se ele se casasse... Lucy desviou o curso dos pensamentos, recusando-se a imaginar essa possibilidade.

— Alguma coisa errada? — perguntou ele enquanto dirigia.

Como sempre, ele possuía uma sensibilidade aguçada para perceber suas variações de humor. No trabalho, nunca tocavam em assuntos pessoais, mas agora não estavam no escritório.

— Não, nada.

— Hummm... não está muito comunicativa hoje, não é? — A voz dele revelava mais surpresa do que aborrecimento.

Lucy conhecia bem esse autocontrole, que só deixava transparecer os sentimentos que ele queria, mesmo em relação a ela. Pela agenda do escritório e pelos jornais, tinha uma boa noção de quantas mulheres ricas e sensuais saíam com ele, no entanto ele evitava muito bem qualquer conotação sexual no seu modo de agir quando estavam juntos, que lhe era difícil imaginar esse seu outro lado.

Mas existia esse outro lado... Ela estremeceu de maneira quase imperceptível, mas Natsu não deixou de notar.

— Está com frio? —perguntou. — Vou ligar o aquecimento. Parece que o outono chegou mais cedo este ano.

Já era setembro, mas o verão havia sido bastante agradável. Até mesmo a pele delicada de Lucy ganhara um bonito bronzeado, se bem que apenas nos braços e nas pernas. Nem na pequena área descoberta do seu apartamento ela teve coragem de vestir um biquíni. Aliás, na última vez em que estivera na Flórida, esse comportamento causou espanto nas mulheres dos sócios de Natsu. E foi novamente ele quem a salvou, comentando casualmente que Lucy tinha a pele muito clara e se queimava com muita facilidade no sol.

Somente eles dois sabiam a razão de ela relutar tanto em mostrar o corpo em público. A dor física pode desaparecer com o tempo, mas a vergonha nunca. Natsu lhe propôs que procurasse um psiquiatra, mas ela se opôs de tal maneira que ele acabou desistindo.

O que um psiquiatra poderia lhe dizer que já não soubesse? Que não havia nada do que ela devesse se envergonhar? Que ela não tivera culpa do que aconteceu? Que ela não era a única pessoa no mundo a sofrer um ataque sexual? Sem perceber, deixou escapar um gemido.

— Você está bem? — ele perguntou preocupado, vendo sua palidez.

— Sim, eu estou.

— Espero que não seja nada que nos impeça de ir à première. Luxus Dreyer está contando com a nossa presença.

Luxus Dreyer era um dos clientes mais ricos da imobiliária. Ele contratara a empresa de Natsu para encontrar um bom apartamento à venda em Londres. Era um produtor de filmes americanos e os convidaram para assistirem à estréia de seu último filme.

— É claro que não. Estou ansiosa para assistir.

Apesar da escuridão dentro do carro, pôde sentir a tensão de Natsu. O que ela teria feito para deixá-lo assim? A última vez que o vira tenso tinha sido naquele incidente infeliz no escritório.

Estava tentando alcançar um livro numa estante alta e perdeu o equilíbrio. Ele a amparou, segurando-a pela cintura. Bastou aquele contato, o cheiro masculino da loção após barba, para ela ser tomada de verdadeiro pânico, se afastar de imediato e ficar encolhida num canto. Isso acontecera há seis meses e a partir dali Natsu sempre tomava cuidado para não tocá-la. Não precisou explicar nada, ele havia entendido perfeitamente.

— Você leu as notícias hoje?

— Não.

— humhm...

Encontraram uma vaga a algumas quadras do cinema onde ele estacionou, e logo abriu a porta do carro para que a Lucy saísse. Enquanto caminhavam pelas calçadas movimentadas, um grupo de jovens passou por eles e acidentalmente um dos rapazes esbarrou em Lucy e a segurou para que ela não caísse.

— desculpe — o rapaz pediu e voltou a caminhar com o grupo que estava.

Lucy sentiu-se tomada por um intenso pavor, ondas de pânico a assaltaram, e então a voz de Natsu soou, segura e tranquila, fazendo o pesadelo sumir.

— Está tudo bem?

— Claro — ela mentiu sorrindo fracamente — Onde vamos nos encontrar com o Luxus?

— Devemos ir direto ao camarote principal. Creio que haverá uma entrada separada para o pessoal VIP... Sim, olhe. Acho que podemos entrar por ali. — Apontou para uma pequena entrada nos fundos.

Depois de apresentar a senha que Luxus Dreyer lhes dera, foram conduzidos a um luxuoso camarote, com ótima visão da tela. Meia hora depois chegaram os anfitriões. As cortinas se abriram.

— Prestem atenção nesse garoto. — Luxus indicou uma cena na tela. — Ele vai longe. Ainda vai fazer muitos atores famosos parecerem coisa do passado. Nós tivemos uma certa dificuldade para conseguir passar algumas cenas pela censura... não há nada de vulgar nelas, mas... Mas são de deixar os cabelos em pé — Luxus brincou, sorrindo para Lucy.

O sentido daquelas palavras chegou devagar, como num sonho. O Dreyer estavam rindo. Natsu também sorria, mas sua expressão era indecifrável. Lucy fez um esforço inútil para se acalmar , agradecendo por as luzes estarem apagadas. Embora sua vontade fosse sair correndo, manteve os olhos fixos na tela, reunindo toda coragem que lhe restava. Natsu sabia que o tema do filme era esse?

Talvez não, ela pensou. Afinal, cenas de sexo eram comuns no cinema, e mesmo na televisão estavam se tornando um fato corriqueiro. Notou que Luxus falava com ela e tentou prestar atenção.

— Nós tivemos um monte de problemas com a cena do estupro. Quero dizer, queríamos algo com muito realismo, que fosse capaz de transmitir toda a angústia da garota, de modo que a plateia pudesse entender sua reação posterior com o companheiro. Ela passa a evitar qualquer contato com os homens, então conhece esse cara e...

— Deixe que ela assista ao filme sossegada, Luxus. — Makarov Dreyer o interrompeu, era já um senhor de idade mas que também era muito famoso no mundo cinematográfico, depois virou-se para Lucy. — Sabe, este filme é a menina dos olhos do Luxus. Ele espera ganhar um Oscar, e merece. Os atores escolhidos atuam de uma forma tão realista que é impossível não se deixar levar pela emoção.

Lucy tentou se levantar. Precisava sair dali, não podia ficar sentada esperando o que ia acontecer na tela. Ondas de calor e de frio a assaltaram alternadamente, e uma sensação de enjoo já começava a se manifestar. Foi então que a mão de Natsu apertou o seu pulso de forma carinhosa.

— Sente-se por favor.

— Natsu, eu não quero assistir. Eu não sabia que era assim, você sabe que eu..

— Sim, eu sei — ele a interrompeu com suavidade. — Mas não pode continuar assim para sempre. Estou tentando te ajudar. Algum dia vai ter que parar e enfrentar os seus medos. Agora é um momento tão bom quanto qualquer outro para isso.

— Você me trouxe aqui de propósito?! Você sabia?...

— Sim, eu sabia. conversaremos depois, mas agora fique quieta ao menos que queira chamar a atenção dos Dreyers. Estou certo de que Luxus ficaria muito satisfeito em descobrir que ao seu lado está a melhor crítica para a atuação da atriz que ele poderia ter.

Lucy quase perdeu o fôlego. Natsu sempre se mostrara paciente e compreensivo, por que estava agindo daquela maneira? Foi sempre amável e complacente, Pelo menos desde a noite em que havia sido atacada e ele a salvara. Havia cuidado dela com um carinho enorme, fizera tudo para tranquilizá-la. Convenceu-a a contar todos os detalhes do que acontecera, mas depois nunca mais discutiram o assunto.

— Natsu, por favor, eu não posso. Por favor. — cochichou próximo ao ouvido dele, começava a sentir as mãos gelarem

— Lucy, já se passaram três anos — ele argumentou da mesma maneira com paciência. — E você não melhorou. Se houve alguma mudança, foi para pior.

— Não é verdade.

— Não? Então me diga com quantos homens saiu nesses últimos três anos. E quantos deles você deixou que a beijassem? Nenhum, não é? Basta ver como se encolhe se eu sem querer encosto em você. No escritório, preciso ficar o tempo inteiro atento para não chegar muito perto. Olhe, o que aconteceu com você.

— Não aconteceu nada comigo! — ela cortou, desesperada sua voz já não era mais apenas um sussurro. Tinha os punhos fechados sobre as coxas, as unhas cravadas nas palmas das mãos. Não conseguia acreditar que fosse Natsu a lhe falar daquela maneira.

— Você quase foi estuprada. — ele disse apenas pra ela — Foi atacada da maneira mais brutal por uma gang de garotos que deliberadamente ficaram à sua espera, Lucy. E eles teriam conseguido violentá-la se eu não tivesse escutado o seu grito.

Ela tapou os ouvidos as lágrimas já começavam a preencher seus olhos.

— Não... não, você me prometeu que nunca mais teríamos que falar sobre isso. Natsu...

— Ei, vocês dois. Não estão interessados no filme? — perguntou Luxus.

Aproveitando a interrupção de Luxus, Lucy afundou-se na poltrona, recusando-se a olhar na direção do rosado. Seu corpo todo tremia.

Tentou se concentrar no filme. Com uma espécie de fascinação mórbida, ficou olhando a atriz de Hollywood vivendo o que era praticamente uma reprise do que lhe acontecera. Só que, no seu caso, os violentadores eram um grupo de rapazes que tomavam o mesmo ônibus que ela, à noite. Muitas vezes, enquanto esperavam no ponto, faziam piadas obscenas a respeito dela. Então, uma noite, surpreenderam-na quando ela saía pela estreita passagem, nos fundos do prédio do escritório. Era pleno inverno, e os grossos agasalhos que ela usava ajudaram a salvá-la. Não podia imaginar como eles haviam descoberto o lugar onde trabalhava, embora mais tarde Natsu suspeitasse que a houvessem seguido.

Mal tivera tempo de gritar, antes que a atacassem. Natsu apareceu correndo, alertado por aquele único grito.

Se ele não estivesse descendo as escadas naquele momento... Se ela não tivesse dado aquele único grito no momento exato... Eles pareciam colocar as mãos em todos os lugares, tapando-lhe a boca, rasgando as roupas, entre palavrões e risadas grosseiras.

Chegando inesperadamente, Natsu pôde contar com o fator surpresa, e conseguiu afugentá-los com facilidade. Mas não antes de Lucy levar alguns tapas e ficar apenas de calcinha. Enquanto ele a carregava até o carro, as lembranças se repetiam, quase a levando à loucura. Estava em estado de choque e se debateu até desmaiar.

Quando voltou a si, viu-se no banheiro do apartamento dele. Nunca estivera naquele apartamento, mas não se encontrava em condições de reparar no estilo masculino da decoração, predominando o ouro e o marfim. Ainda com a cabeça girando, tentou escapar das mãos do rosado, que limpava e tratava de suas feridas.

— Lucy, acalme-se. Agora você está em segurança. Eu só quero terminar de limpar os machucados. Tome, beba um gole de água e deixe-me levá-la para a cama do quarto de hóspedes. Se quiser eu chamo um médico e... amanhã falaremos com a polícia.

— Não, a polícia não. — Sua recusa fora em tom de horror. Só a ideia da publicidade que haveria, a deixava paralisada.

— Lucy...

—Não, por favor...

Natsu acabou por concordar, e a loira passou três dias e três noites no apartamento dele. Seus nervos estavam em pedaços e qualquer ruído a punha aterrorizada. Durante todo esse tempo ele permaneceu a seu lado. No terceiro dia, ele a fez contar como tudo havia se passado, e ela o odiou por isso. Quando se debatia e chorava, ele a tomava em seus braços, consolando-a como a uma criança.

Agora era a primeira vez, depois disso, que Lucy se permitia recordar do ataque. Já havia esquecido de que Natsu a tocara e abraçara naquela noite e de como aquele contato fora bem-vindo...

Tinha se recuperado aos poucos, ao menos por fora. Por dentro... bem, por dentro ela sabia que jamais voltaria a ser a mesma. Quando sonhava, era com mãos masculinas rasgando suas roupas, seus gritos sufocados por homens que a atacavam. Apenas Natsu a fazia sentir-se protegida, porque não demonstrava nenhum interesse sexual por ela. Mas nem mesmo ele conhecia o sentimento de culpa que a atormentava. Culpa de... de quê? De querer ter sido estuprada? Um leve tremor sacudiu-lhe o corpo. Depois daquilo, tomava todas as precauções para não parecer atraente.

Sabia que a curiosa Levy não acreditava que sua relação com o rosado ficava num nível apenas platônico. Mas estava imune a qualquer sentimento de atração física. A simples ideia de ser tocada por um homem a repugnava e a fazia sentir-se doente.

— Agora, preste atenção nesta cena.

Lucy voltou à realidade com a voz de Luxus Dreyer. Percebeu que o filme tinha avançado um bom trecho e que aquela era justamente a cena de sexo que ele mencionara antes. Mesmo contra a vontade, não conseguia despregar os olhos da tela. O ator do filme tinha a pele bronzeada como a de Natsu, e aparentavam mais ou menos a mesma idade. Até a voz parecia ter o mesmo timbre, mas os olhos do ator eram azuis e os de Natsu, negros e profundos. No estado emocional em que se encontrava, Lucy teve a ilusão de que era Natsu que estava à sua frente, fazendo carícias lentas e sensuais no corpo da garota. A atriz atuava bem e passava uma profunda angústia. Mas, ao contrário de Lucy, lutava por vencer seus temores e superar o trauma. Ela o queria, e o desejava.

Por fim, Lucy conseguiu fechar os olhos e se manter desligada dos últimos minutos do filme.

Após a sessão, os Dreyers insistiram para que fossem jantar juntos. Enquanto esperavam a comida, Luxus se virou para Natsu e comentou com um sorriso:

— Aposto como não havia uma única mulher na plateia que não estivesse se imaginando no lugar da atriz.

— E então, Lucy, concorda com Luxus? — Natsu brincou.

O que ela poderia responder? Concordar seria admitir para si mesma que quisera fazer amor com... não com o ator, mas com ele, Natsu. porque foi o rosado que em sua mente estava na tela!

— Lucy era provavelmente uma das poucas mulheres na plateia a não se excitar com a atuação. — a jovem que até então acompanhante de Luxus, pronunciou-se pela primeira vez lançando a loira um olhar cúmplice. — Ao lado de um homem como Natsu Dragneel, ninguém se importaria com o ator...

— agradeço o elogio Mirajane... — ele respondeu, sem se mostrar embaraçado.

— Natsu e eu somos apenas amigos. — Lucy apressou-se a explicar, corando. — Não é mesmo, Natsu?

— Eu nunca contradigo uma dama — ele retrucou de modo pouco convincente.

Lucy viu que ele a olhava com frieza. Era como se estivesse com raiva dela. Por que o rosado escolhera aquela noite para revolver o passado? Apenas o filme tratava de um caso semelhante ao seu? No carro, ele havia perguntado se ela lera os jornais. Claro, era por isso! Para saber se tinha visto a resenha do filme... De repente, sentiu que um terreno que julgava seguro se tornava traiçoeiro. Será que ele estava cansado daquela amizade? Cansado da sua dependência emocional, da sua necessidade de usá-lo como escudo contra os outros homens?

Lucy começou a sentir muito medo. Medo de ficar sozinha. Medo de perder a amizade de Natsu. E, acima de tudo, medo daquela muda acusação que viu nos olhos dele.

24 de Abril de 2018 às 15:34 0 Denunciar Insira Seguir história
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