fuyuka_hideki Adrielle Victória

Alguns dias parece ser muito difícil para Uchiha Sasuke levantar da cama. Seus olhos veem o mundo pelas cores preto e branco. Mas os olhos azuis intensos de Uzumaki Naruto dão cor a todo o cinza presente em sua vida. E mesmo com todos os 'nãos' que já escutou do amigo, Naruto nunca desistiu de tentar vê-lo sorrir e ser feliz. Sasuke, ninguém nasce amando outro ser humano.


Fanfiction Impróprio para crianças menores de 13 anos.

#SasuNaru
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Mirror

“Apenas uma vez eu gostaria de saber que sou suficiente.”

O som do despertador parece alto demais em meus ouvidos. Ou talvez seja apenas o silêncio sepulcral dentro do quarto que o faça se propagar tão intensamente. Não importa, de qualquer maneira. Com a inspiração mais profunda que se pode tomar, tentei inspirar alguma coragem para levantar da cama. Parece mais difícil hoje do que os dias que já se passaram. O som de nada retorna depois que desligo o aparelho. Somente meus pensamentos são escutados agora, dentro da caixa de minha cabeça que deveria ficar calada e vazia pelo menos quando estou sonolento.

Com as solas no chão frio, mexo os dedos sentindo a temperatura. O pescoço pendendo para frente, os olhos fechados, deixo as palmas correrem pelos fios de cabelo. Sinto alguns nós ao longo do comprimento. Quando foi a última vez que me preocupei em penteá-lo? Posso dar um jeito nisso na hora do banho.

Quando chego ao banheiro o reflexo que vejo no espelho não é satisfatório. A pele branca demais, um pouco de olheiras pela noite não tão bem dormida. No pescoço pende o brasão da minha família em uma corrente — Uchiha. Cocei a nuca quando finalmente me dispus a entrar no box e ligar o chuveiro.

Estar de férias do trabalho foi a melhor coisa que me aconteceu nesses últimos dias. E hoje é apenas o terceiro dia de minha longa folga do serviço. O alarme tocando cedo é por conta da visita de alguém. Mesmo com todos os meus esforços, Naruto não sabe o que significa não, muito menos quero ficar sozinho ou um me deixa em paz. Não há motivos para a sua visita. Ele simplesmente disse que estava vindo, e não me deixou argumentar contra.

O conheço há alguns anos. O loiro alegre e desbocado entrou na empresa pouco depois de mim. A diferença é que trabalho no Setor de Contabilidade, enquanto o Uzumaki no RH; depois de nos encontrarmos algumas vezes nos corredores, e na estação do metrô, passamos a almoçar juntos no refeitório do prédio.

Não demorou muito depois que sentei na mesa para tomar café da manhã, para ouvir a campainha tocando. Arrastando os pés, fui devagar para a porta. Recebendo um brilhante sorriso quando a abri.

— Bom dia!

— Bom dia...

— Acordou agora?

— Estaria dormindo se você não viesse até aqui.

— Se eu não viesse, você passaria o dia todo na cama.— Passou por mim, trazia algumas sacolas. — Comprei algumas coisas para comermos. Não precisa cozinhar, vou pedir nosso almoço. Mas, caso não queira, posso ajudar a fazer.

— Não vai trabalhar?

— Houve um pequeno vazamento na cozinha do refeitório ontem. O prédio foi evacuado e hoje está tendo serviço para a verificação da segurança e todo aquele blábláblá. — Já estava na cozinha, quando o alcancei, ele desfazia os sacos que trouxe. — Inclusive, estou faminto. — parando de mexer no armário, olhou em minha direção, seus grandes olhos azuis tão intensos. — Como está hoje? — Dei de ombros. — Vamos, Sasuke, se esforce um pouco. Isso não é uma resposta.

— O de sempre.

O escutei suspirando, além de resmungar algo que não escutei, voltando para sua pequena atividade. Sentou em uma cadeira próximo a mim quando acabou, servindo-se de uma xícara de café, passando manteiga em uma torrada. Mantinha os olhos em meu rosto enquanto comia. Rolei os meus, lhe questionando o por quê.

— Estou pensando no que vamos fazer hoje. Estava pensando em ir no parque do shopping, o que acha?

— Estou bem em casa.

— Que roupa vai usar pra sair? Estou pensando naquela sua calça preta. Está um pouco frio, então use uma blusa mais agasalhada.

— Naruto.

— Podemos dar uma passada no cinema e ver quais os filmes em cartaz.

— Naruto.

— Podemos almoçar fora ao invés de pedir delivery.

— Naruto! — Ele arregalou os orbes. — Eu não vou.

O silêncio nos rodeou enquanto ele provavelmente pensava em algum bom argumento para me fazer sair de casa.

— Seu último dia de trabalho foi na sexta, correto? — Afirmei com a cabeça. — Hoje é segunda. Você não sai há quase três dias. Não quero te ver se fundindo com seu colchão nessas férias. Vamos, por favor.

Admiro o esforço que ele faz para me ajudar de alguma forma. Mesmo que me faça sentir como um estorvo por fazê-lo se preocupar.

— Posso dormir aqui no final de semana também, te fazer companhia enquanto falamos mal do chefe. — Acompanhei seu riso. — Nós vamos, não é? — Erguia a sobrancelha em expectativa.

— Falando assim parece que não tenho muita escolha em recusar. — Suspirei.

— Você finalmente percebeu? — gargalhou.

— Não precisa passar o final de semana, saía com a Hinata, ela está esperando um convite seu. — Voltei a prestar atenção na minha fatia de bolo, que já não parecia tão apetitosa.

— Eu venho na quinta, depois do expediente, sexta é a minha folga, já recebi o dia que irei precisar compensar o transtorno de ontem. Mas antes devo passar em casa e pegar algumas roupas. Vou embora na segunda. — Havia ignorado completamente a minha fala, e não fiquei chateado com isso.

Essa letargia sempre esteve comigo. Essa sensação de cansaço, de não ser capaz de sentir felicidade, se intensificou após a morte de meus pais. Apesar de a tempestade com raios e trovões ter virado chuva quando o loiro aqui comigo entrou em minha vida. Sua alegria acaba dando cor ao mundo preto e branco que vejo através das minhas íris. Foi nunca época em que o pedido de demissão rondava meus pensamentos todos os dias, o tempo todo. Ir ao trabalho era minha pena e o despertador de manhã o meu carrasco.

Ao longo dos meses fui desenvolvendo um carinho especial pelo Uzumaki. Combinado a uma grande admiração por sua personalidade e paixão pela vida. Na verdade, não conheço alguém que tenha algo de ruim para falar sobre ele. E se houver, com certeza será completamente sem fundamentos.

Além dele tenho mais uma pessoa a qual estimo, essa eu digo com todas as letras que amo. Chama-se Uchiha Itachi e é meu irmão mais velho. Mora em outra cidade, mas sempre que pode vem até aqui. Suas visitas sempre me deixam de bom humor. Assim como as do loiro.

O mais novo me ajudou a limpar a mesa quando terminamos. A decisão de cozinhar foi minha, tenho os ingredientes para fazer algo, não é necessário gastar dinheiro com entrega; mas por hora, vamos apenas sentar no sofá e assistir qualquer coisa enquanto conversamos sobre besteiras.

— Quando seu irmão vem te visitar?

Naruto e Itachi se dão muito bem. Desde o primeiro dia que se conheceram já parecia que tinham anos a fio de amizade. O Uchiha mais velho tomou um susto ao ver mais alguém em minha casa. Tanto que me questionou em particular se estávamos envolvidos em algum relacionamento e eu não havia contado. Óbvio que não. Na verdade, eu nem sei qual é a vibe do Naruto, esse assunto nunca pareceu importante entre nós, sendo assim, nunca foi levantado o questionamento sobre nossas sexualidades. Não que eu já não tenha ficado curioso a partir desse dia, porém, nem mesmo sei como abordar esse tipo de coisa. Você simplesmente pergunta ou tem que haver toda uma preparação de terreno antes? Fica aí minha dúvida.

— E então? — Escutei o loiro perguntando, franzi a testa em resposta. — Você aí, me encarando, não me respondeu.

— Estava? Desculpa. Perguntou sobre meu irmão, fiquei a pensar sobre quando viria. Faz alguns meses que não nos vemos.

— Faz mais ainda para mim. — Recostou a cabeça no encosto do sofá, olhava para o teto. — Gosto dele, é um cara legal.

— Eu não poderia concordar mais.

Uzumaki Naruto é um homem bonito. Isso é outra coisa a qual ninguém pode negar — sendo de qualquer sexo. Seus cabelos são loiros e arrepiados. Os olhos grandes e extremamente azuis. Assim como a pele levemente bronzeada. É alguém por quem as pessoas se sentem facilmente atraídas, ainda mais com a grande ajuda de sua personalidade alegre e festiva.

Eu nunca pensei de forma concreta e decisiva sobre os meus sentimentos a respeito dele. Não sei se por não saber o que sinto com certeza, ou por algum receio de descobrir algo que não me faria bem — como viver num amor platônico. Definitivamente não quero estragar a amizade que construí com ele. Seria o meu fundo de poço. De alguma forma estranha Naruto se tornou minha âncora. Não posso liberar a corrente de meu navio e deixá-lo ir — com a grande diferença de que seria eu quem afundaria; voltei a olhar à televisão quando percebi estar perdido em seu perfil outra vez enquanto pensava.

Vamos fazer o prato favorito do loiro para o almoço, lámen. São mais de onze e meia, por isso já estamos na cozinha. Comemos algumas besteiras, então o fato de ser meio-dia não afeta em nada. Estamos satisfeitos, por hora. Ele gosta de cozinhar, já eu não posso dizer que sou esse fã assíduo. Acabo fazendo para não morrer de fome. Por isso o outro tem muito mais prática e agilidade dentro da cozinha e no modo como se move para fazer os pratos.

Levou pelo menos trinta minutos até tudo estar devidamente cortado, picado, e o que mais fosse preciso, sendo posto na panela e no fogão.

— Que horas você quer sair? — perguntei, sentando na mesa.

— Perto do lanche pra mim está ótimo. — Ele mexia a panela.

— O que vamos fazer até lá?

— Não sei, o que quer fazer? — Dei de ombros, ele riu. — Não espere que eu dê todas as ideias.

— Não estou esperando. Estou sendo sincero.

— Certo. Vou aceitar sua desculpa.

— Não é uma desculpa.

— Okay, Sasuke, okay. — Ainda ria de leve.

Seu riso é contagiante. É outro motivo pelo qual gosto de tê-lo por perto. Ouvi-lo rir sempre te faz desejar o mesmo. E desejar que o sentimento presente no momento não acabe.

— Hoje você está muito disperso. Tudo bem?

— Apenas pensando.

— Posso saber no quê?

— Em quem, é o melhor termo.

— Ah... Certo. — Ovi mordendo o lábio, olhou para dentro da panela por alguns segundos. — Está interessado em alguém da empresa?

— Não, não. Não exatamente.

— Certo. — Silêncio.

Sua atenção se voltou completamente ao que estava cozinhando. E foi assim até a hora do almoço. E mesmo quando estávamos nos arrumando para ir ao shopping, o achei distante. Geralmente Naruto é bem elétrico e não para de falar quando se sente à vontade. O que vejo agora é alguém quieto e silencioso.

— Tudo bem? — perguntei quando começamos a seguir para a estação do metrô. — Você não fala muito desde que estava no fogão.

— É? Desculpa. Estou pensando.

Reprimi a vontade de rir ao escutá-lo usando minhas palavras. Então seguiremos nessa atmosfera que nos envolve.

Ele e eu já tivemos pouquíssimo contato físico. Lembro de termos nos abraçado algumas vezes, como em ocasiões festivas do calendário e nossos aniversários. Pensando bem, raramente sentimos nossos corpos juntos. Mas pelo que me lembro, a sensação tê-lo nos braços é boa. Seu corpo exala calor e aconchego.

— Não vai me dizer o que há? Seu silêncio está me matando.

— Não é nada. — Rolou os olhos, limpando a garganta em seguida. — Sobre o que quer falar?

Pensei em dizer que gostaria de falar sobre o que se passava na cabeça dele. Porém, preferi perguntar como iam as coisas na empresa e como foi a história desse tal vazamento. Os olhos do outro pareceram se iluminar diante da ideia de parar de martelar a própria cabeça com alguma ideia absurda. E a partir disso, passamos a conversar quase normalmente outra vez.

Aparentemente tudo só voltou ao normal quando chegamos no parque e começamos a nos distrair com todos aqueles brinquedos. Estávamos empenhados em conseguir levar pelo menos um prêmio digno para casa. Gastamos um bom tempo — e dinheiro — tentando, até conseguirmos um pequeno urso de pelúcia. Não conseguiríamos um muito diferente pelas lojas do centro, custando no máximo 20$. Pode ter certeza de que não foi apenas isso que gastamos até ganhá-lo.

— Ficaremos pobres até a quarta geração se quisermos aquele ali. — Apontou para um enorme urso no topo do armário de trocas de pontos. O homem no balcão acabou rindo de sua cara de perplexidade.

Passando pelos cartazes do cinema, Naruto decidiu que gostaria de lanchar enquanto assistia algo. Mesmo que fosse o filme mais bobo. Não havia como dizer não. E aqui estamos na fila para a entrada após passarmos na Mc Donald’s para lhe comprar algo para comer. Aproveitei para fazer o mesmo, faz horas que almoçamos e gastamos bastante energia no Play Center.

Sentamos na última fileira, a sessão estava vazia, mesmo com os assentos marcados, podíamos escolher qual fosse mais confortável. Tanto que por não ter muita gente, estavam todos espalhados pela sala. Olhando daqui parece até engraçado. Outra observação que pude fazer é a quantidade de casais. Aparentemente todos escolheram uma sessão vazia para vir namorar. Claro, por que não, não é?

A tarde em si foi muito divertida. O Uzumaki pareceu esquecer aqueles momentos de completa distração depois que questionei o que havia. Sei que não esqueceu, está apenas fazendo o mesmo que eu e tão bem quanto.

Quando foi a hora de irmos embora, eu sabia que nos restava apenas os momentos dentro do metrô até que a quinta chegue.

— Obrigado pela tarde, nos vemos na quinta, okay? — Já se levantava após o aviso da chegada de sua estação. — Toma, foi seu mérito ter ganhado. Fez a maior quantidade de pontos.

— Fique com ele. Obrigado pelo dia. — Sorri sem dentes. — Nos vemos na quinta.

Era de se esperar que os dias se arrastassem em minha frente. As horas — os minutos — pareciam não passar. Algumas vezes cheguei a acreditar que havia acabado a bateria do relógio da cozinha, até perceber que o ponteiro dos segundos se movia.

Passar a semana sozinho foi mais difícil do que sequer pensei que poderia ser. Mesmo com o loiro mantendo contato sempre que possível; talvez estar no trabalho não fosse assim uma coisa tão ruim em minha vida quanto pensei. Estar sem nada para fazer é um pouco desnorteante. Você faz o que precisa ser feito e então acabou. Sem prazos. Sem cobranças. Sem bater ponto. Sem intervalo de almoço. Sem Naruto.

Fiquei surpreso ao perceber a quinta feira já no calendário. Sabia que o mais novo chegaria faminto e por isso tratei de fazer algo para quanto ele chegasse, seria por volta das oito. Arrumei um colchão na sala, e deixei um filme de comédia no pause. O clima está frio, então, acredito que dar algumas risadas com umas piadas bobas não seja ruim para aquecer ambos.

Tomei banho para deixar o banheiro livre. E não muito depois de todos os preparativo estarem no ponto, escutei a campainha tocando. Sinto-me com bastante energia para recebê-lo. E foi só abrir que vi aquele belo sorriso brilhante, porém cansado do dia corrido que deve ter tido na empresa. Sextas são sempre os piores dias.

— Olá.

— Oi. — Dei passagem. — Vá tomar banho, te fiz o que comer.

— Jura? Obrigado. Passei tão depressa em casa que nem mesmo percebi o quanto estava com fome.

— Isso é um milagre.

— Não seja cruel. — Rolou os olhos. — Volto logo.

— Lave atrás das orelhas.

— Não enche. — Ria pelo corredor.

Esperei que voltasse para comermos o jantar juntos. Perguntei como havia sido seu dia no prédio e daí se desenvolveu diversos assuntos posteriores. Meu humor está realmente muito bom hoje. Quero agradecê-lo, mas sinto que seria demais. Como sobremesa, levamos para a sala um dos potes de sorvete que o loiro comprou quando esteve aqui no início da semana.

Quando o longa metragem estava na metade, começamos a escutar os pingos de chuva contra os vidros. Levantamos para fechar as janelas da casa. E levamos mais um edredom para a cama improvisada da sala, a partir de agora é certeza de que irá esfriar; assistimos mais dois filmes antes que eu percebe os olhos grandes do outro se fechando durante o quarto da noite. Era de se esperar que ele dormiria alguma hora. Ainda resistiu bastante a força do sono.

Fui até o quarto pegar o abajur, liguei na tomada mais próxima ao colchão. Desliguei tudo e deitei ao seu lado para dormir também — não antes de puxar as cortinas da janela. Caso esquecesse, seríamos acordados às cinco da manhã. Acordamos por volta das dez. Fui o primeiro a despertar. A temperatura amena me fez questionar por um momento se foi certo termos dormido num lugar tão próximo ao chão frio. Mas dei de ombros logo após o pensamento. O que está feito não pode ser desfeito. Segui para começar a preparar o café da manhã. Apesar da pouca roupa que uso, ainda não sinto os efeitos da baixa atmosfera. Talvez porque fechamos tudo logo quando os primeiros pingos de chuva apontaram em meus ouvidos.

— Bom dia. — Olhei para trás, em direção a voz. Naruto estava de pé na porta da cozinha, recostado contra a moldura da entrada, usava o edredom por cima dos ombros, tinha o rosto sonolento. Seus cabelos estavam ainda mais bagunçados. O movimento que fez para esfregar o punho no olho me fez questionar os pensamentos que viriam a seguir.

— Bom dia. — Coloquei a chaleira sobre a mesa.

— Quando acordou?

— Não mais do que dez minutos atrás.

— Vou dar um jeito em meu rosto. Volto logo.

Não tem nada de errado com seu rosto.

Depois de preparar a mesa, segui para o quarto. Tomei um breve banho, e já estava pronto para comer. Naruto me esperava olhando para o nada na cozinha.

— Finalmente, achei que iria me deixar morrer de desnutrição.

— Não seja exagerado.

Começamos muito bem o dia. E eu desejava arduamente que assim ele seguisse até a hora em que fossemos deitar novamente no travesseiro.

— Onde eu dormi?

— Na metade do filme.

— Podemos começar de novo?

— Claro.

Na hora de almoçar seria o mesmo processo do início da semana. Cozinharemos perto do meio dia, não se preocupando com o horário que o prato ficará pronto. Gosto dessa liberdade na rotina. É sempre bom não precisar saber que horas são e o que preciso fazer algo.

Após o café da manhã, arrumamos algumas coisas dentro de casa. Já era mais do que a hora de passar pano no piso. Tirar o pó da estante, e mudar os lençóis de cama. Colocamos um ritmo musical que ambos pudéssemos curtir, e fizemos tudo mais rápido que eu esperei. Duas pessoas vai sempre facilitar o trabalho doméstico.

— Vim aqui para aproveitar minha folga e o final de semana, não para ser sua empregada.

— Ora, muito obrigada pela ajuda, vossa majestade.

Recebi um riso gostoso em retorno, assim como um soquinho em meu ombro.

— Idiota.

O deixei livre para tomar banho primeiro, enquanto eu comecei a guardar os produtos que usamos, e levar os panos sujos para a lavanderia nos fundos.

Eu não havia pensado muito no meu irmão nesses últimos tempos, mas depois do questionamento do Naruto, estou com o mais velho na cabeça. Adoraria receber uma ligação sua hoje. Já que eu não posso fazê-lo, seus horários de plantão são sempre muito confusos. Nunca consigo contatá-lo. Então fico à deriva. Apenas esperando que o mesmo me dê um sinal de sua vida. E entendo também que o outro Uchiha tem alguém para dar atenção.

Shisui era o melhor amigo do meu irmão antes de se tornar seu namorado — marido. Meus pais sempre admiraram o relacionamento que ambos tinham, mesmo quando ainda não havia nada firme. O companheirismo deles sempre me encheu os olhos. Itachi é um bom ser humano, e com certeza merece estar com alguém como ele. É uma pena que eu não posso acompanhar os dois de perto.

O meu irmão já me fez o convite de morar com ele, porém não posso aceitar. Me sentiria um completo intruso em sua casa. Mesmo sendo família. Por isso, optei por vir para tão longe. Quase duas horas de distância. Não escondo que o deixei puto quando disse para qual parte da cidade estava vindo. E mesmo trabalhando, o outro ainda me manda uns agrados todos os meses — ser médico lhe rende um bom capital mensal.

Admiro e amo muito meu irmão.

O dia não foi muito diferente do que esperei. Jogamos alguns jogos no vídeo game, e depois do jantar viemos assistir alguns filmes — começando pelo que Naruto havia visto pela metade. Hoje está mais frio, por isso estamos pensando se vale a pena dormir no colchão, no chão, e correr o risco de pegar um resfriado. Precisamos decidir logo antes que alguém pegue no sono.

O próximo da lista foi um romance escolhido pelo loiro. Não sou muito chegado ao gênero por diversos motivos. Um deles é que não consigo me imaginar sendo tão suficiente para alguém que me ame dessa mesma forma. A forma de que seria capaz de desistir de tudo para ficar comigo.

AH... Apenas uma vez eu gostaria de saber que sou suficiente.

No final das contas, mesmo com ambos acordados, decidimos permanecer na sala. Talvez fosse a preguiça, ou apenas o fato de estarmos confortáveis. Pegamos alguns lanches para continuar assistindo, mas o resultado foi nos voltarmos para uma conversa completamente paralela, porém, com o tema que estávamos assistindo.

— Você já amou tanto alguém que sentiu seu coração doer?

Não me olhava quando questionou. Parecia até um pouco envergonhado com isso. A resposta se entalou na minha garganta. Mal consegui formular um pensamento concreto e conclusivo.

— Não precisa responder, esqueça que perguntei.

— Não. — Balancei a cabeça para me firmar na Terra. — Eu fiquei surpreso. Acho que não. Nunca gostei de alguém a ponto de me sentir assim. — Silêncio. — Você já?

— Não sei, exatamente. — Deu de ombros. — Eu não estou certo do que é amor, sabe? É quando se tem vontade de ficar o tempo com essa pessoa? De escutá-la rir de uma piada que você fez? De conversar sobre qualquer coisa? Eu já pesquisei bastante sobre esse sentimento... Diferentes significados que levam à mesma coisa. Parece uma doença, Sasuke. Você começa sentindo frio na barriga, de repente o coração bate forte. Você se pega sorrindo sozinho por lembrar de algo, pensa que está louco. E talvez esteja mesmo. — Suspirou, passando a mão nos cabelos em seguida, ainda não havia me encarado.

— Você tem se sentido assim ultimamente?

— Não ultimamente apenas, já faz um tempo. É estranho. — Juntou os joelhos para o peito. — Estranho porque nunca esperei me sentir assim, em momento nenhum. Não por essa pessoa. Mesmo sabendo que não escolhemos.

— É alguém lá da empresa? — Afirmou com a cabeça. — Aah. —Oque eu digo agora? — Quer alguma ajuda quando eu voltar das férias? Mas antes, é alguém que conheço? — afirmou outra vez.

— Mas eu não quero sua ajuda, okay? — Esticou as pernas de volta, recostando no encosto do sofá. — Eu já sei o que vou fazer.

— Vai me contar?

— Amanhã. Amanhã eu conto. — Olhou em meus olhos. Me entregando um largo sorriso em seguida.

Percebi que protestar seria inútil, por isso apenas concordei. Depois disso não demorou muito para irmos dormir.

Sábado.

Naruto conseguiu me adular o suficiente para me convencer a ir até o parque que chegou na cidade semana passada. Eu não havia me preparado para um passeio desse nível. Fui pego completamente de surpresa, e tenho certeza de que passei um bom tempo olhando seu rosto — em choque — antes de conseguir formular o primeiro não.

Mesmo que tenhamos dormido tão tarde no dia anterior, ainda assim fui obrigado a levantar cedo para preparar o almoço com o loiro. Afinal de contas, vamos sair logo depois de comer. Eu não fazia ideia do porque estava acordando àquela hora, até receber a grande notícia.

Estou torcendo os olhos para o relógio a cada segundo, desejando com sinceridade que o tempo passe bem devagar. Não estou com o humor bom para sair de casa. E mesmo assim não quero falar ao Uzumaki. Vi o quanto estava empolgado com a ideia, e o quanto se esforçou para me fazer ir junto. Não quero decepcioná-lo. Nem ver aquele sorriso triste de quem aceita que não estou no embalo. Farei esse esforço por ele. Ele já faz bastante por mim. Tentei tirar esse fato da cabeça. Parar de pensar por algum tempo que daqui a pouco estaremos indo em direção a um parque de diversões — são apenas onze da manhã.

Não conversamos muito durante esse tempo em que estávamos fazendo coisas de casa. Enquanto ele olhava algo dentro de sua mala, eu estava dobrando os lençóis de cama e cobertores que usamos. Em seguida, o loiro seguiu para lavar a louça. Fui tomar banho para esfriar os pensamentos. O mais novo me substituiu dentro do box em seguida; o mesmo foi durante o almoço. Cada um dentro de sua própria mente, vez ou outra entrávamos em algum assunto aleatório que logo morria após alguns comentários. Porém o clima entre nós é tranquilo.

Trocamos de roupa bem rápido. E para não ser um grande transtorno, pegamos um táxi na esquina da rua. O caminho é longo, e levamos pelo menos quarenta minutos para conseguir ver os primeiros indícios da roda gigante. A partir disso o outro pareceu um pouquinho mais excitado por estarmos tão perto.

Compramos nossos ingressos após alguns minutos na fila não muito longa. Carimbamos os pulsos e passamos portão a dentro. Nem mesmo tive tempo de pensar quando minha mão foi segurada e fui arrastado na direção de algum brinquedo que eu não fazia ideia de qual era.

— Ei — não segurei a risada —, vamos chegar lá. Calma. Está vazio, dá pra aproveitar bastante.

Apesar de ter diminuído os passos, ainda estava muito elétrico enquanto caminhávamos em direção a Montanha Russa. A fila pequena fez com que já fôssemos os próximos a entrar. Novamente fui arrastado para o primeiro vagão. Não protestei, o homem ao meu lado estava a todo o vapor. Mesmo que já tenhamos nos encontrado fora da empresa diversas vezes, é a primeira que o vejo nesse nível de excitação.

— Vamos na roda gigante quando ficar escuro. — Sentamos para aproveitar do pequeno lago artificial que havia em um dos cantos.

— Você que manda.

— A fila deve estar um pouco grande, mas a gente aguenta, não é?

— Estamos aqui para isso.

Já rodamos as principais atrações pelo menos três vezes cada. Porém, por agora algumas delas começaram a acumular mais pessoas, e demoramos cada vez mais para entrarmos nos ditos. Mas nem por isso o outro parece menos feliz.

De onde estamos sentados visualizei um carrinho de algodão doce, ofereci ao mais novo que aceitou sem hesitação.

— Podemos ir na cabine de fotografia?

— Agora? — Ele concordou. — Com algodão doce e tudo?

— Claro.

Havíamos passado por ela algumas vezes enquanto rodamos para cima e para baixo. Não havia fila alguma do lado de fora, me fez pensar que talvez o pessoal não goste tanto assim de fotos — sou uma delas, admito. Mas já que estamos aqui, por quê?

São seis fotos por ficha. Tiramos vinte e quatro. E dividimos entre nós aleatoriamente, sem escolhermos quais as nossas preferidas. Parece mais justo já que cada um pagou duas. Tenho certeza que ficamos satisfeitos. Colocamos tudo dentro de uma sacolinha com as coisas que compramos de recordação da nossa visita.

A tarde passou rápido, ou foi apenas porque não estávamos preocupados com o passar do tempo. Logo os últimos raios de sol estavam desaparecendo no horizonte do parque. As luzes estavam sendo ligadas, e um festival de cores começava a contornar os ferros das estruturas.

— Acho que está quase na hora. — Olhava para aquele grande círculo lento. — Podemos esperar escurecer um pouco mais, ou — me encarou.

— O que você quiser.

— Certo. Vamos fazer algo por enquanto. Esperar que o céu esteja completamente escuro. Tenho certeza de que a cidade ainda está aproveitando os últimos raios. Espero conseguir ficar no alto. — Deu de ombros.

— Todos devem pensar a mesma coisa.

— Ah, isso é um fato. — Estamos caminhando devagar em direção aos bancos que sentamos mais cedo. E torcendo para que não estejam ocupados, afinal, o número de pessoas aumentou consideravelmente desde que chegamos.

Não foi o mesmo assento, mas conseguimos. Naruto tirou as coisas da sacola para analisar melhor o que havia comprado; um dos souvenirs era uma pequena roda gigante, que dando corda girava lentamente. Parei para analisar as fotos que vieram para as minhas mãos. Estavam muito divertidas. E talvez um sorrisinho involuntário tenha estado em meu rosto durante todo o tempo que fiquei observando-as.

Está sendo um dia e tanto. Eu não me perdoaria se houvesse dito não mais uma vez e ele cedesse ao meu desejo. Não depois de ver o quanto ele estava empolgado com todas as possibilidades de quando chegamos até agora.

— Quer comer mais alguma coisa antes de irmos até lá?

— Acho que é uma ótima ideia.

Saímos a procura do espaço de refeições. Como estavam todos muito ocupados em sair de uma atração para outra, isso deixa o restaurante sempre vazio. Procuramos uma mesa mais afastada de toda aquela música e aglomeração, logo nos preparando para fazer nosso pedido. Já que encontramos um bom lugar, uma janta substancial é a melhor opção. Quando chegar em casa, a única coisa que faremos é tomar banho para dormir.

Naruto comeu sem conversar muito. Parecia pensativo e olhava muito para o último lugar que iríamos. A visão daqui não é perfeita, porém é possível enxergar boa parte da estrutura. Até pensei em questionar, mas o raciocínio foi cortado pelo seu comentário em relação a outra coisa.

Descansamos até por volta das sete e meia da noite. Era hora de ir para a fila e aguardar nossa vez. Aqui ela não é a mais cobiçada dos brinquedos, por conta disso, em comparação aos outros, sua fila está relativamente menor. E cada estadia nas cabines dura cerca de vinte minutos. Bem, temos todo o resto do tempo aqui; entramos na terceira remessa.

O Uzumaki parecia ansioso para saber onde ficaria parado. E quando finalmente demos um solavanco e paramos, ele levantou os braços. Não estamos exatamente no centro, mas se compararmos a um relógio, seríamos o número um. Daqui conseguimos ver a cidade lá longe. Seus prédios bem iluminados. Mas o que mais interessante de se ver era o parque lá embaixo. Muitas pessoas que parecem formigas, e vários pontos luminosos ao redor.

— Certo, eu tenho cerca de quinze minutos agora. — Tomou uma respiração profunda. — Lembra de ontem? Quando eu disse que já faz um tempo que me venho me sentindo... Apaixonado, por alguém? — concordei com a cabeça. — Eu não sabia como fazer isso. — Ovento bateu, bagunçando ainda mais seus cabelos já loucos pelas violentas voltas que demos na montanha russa, por exemplo. — Ainda não havia me declarado para ninguém anteriormente.

— Posso te ajudar com isso, te disse. Não precisa fazer sozinho.

— Você ainda não entendeu, não é? — Soltou uma baixa risada. — Sempre que eu te vejo meu coração bate loucamente. Sinto a barriga fria. Quero estar com você. Fazer coisas com você. Te ter por perto nem que seja para apenas sentir seu cheiro enquanto estamos abraçados, mesmo que esses contatos sejam raros. — Suspirou, ainda olhava para o nada. — Eu sei que nunca conversamos diretamente sobre nossas sexualidades, eu sei que eu não deveria estar dizendo uma coisa dessas assim do nada, é, mas eu também sei que meu peito parece que explodiria a qualquer momento se não me abrisse.

Estou absorvendo as palavras que acabei de escutar. Estou encarando seu rosto, mas não sei se estou realmente vendo. Sou eu? Eu sou a pessoa por quem o Naruto se apaixonou?

— Eu... — Tentei começar, mas franzi a testa quando repensei o que havia escutado.

— Entendo que nunca tenha gostado de alguém tanto quanto eu. Aquela com certeza teria sido a minha resposta para aquela pergunta se alguém me perguntasse antes de te conhecer, ou alguns meses depois. Mesmo sendo tão diferente de mim, me sinto completo quando estamos juntos. Me sinto acolhido. Ainda que você não seja a pessoa mais carinhosa do mundo. Sempre tento e me esforço para compreender o que você passa. — Olhou em meus olhos. — Eu sempre quero ver um sorriso em seu rosto, ou ouvir sua risada. Decidi que gostaria de te fazer feliz ao longo dos dias em que passamos a almoçar juntos. Eu não sabia como lidar, tinha receio que percebesse. Tive medo quando seu irmão questionou se tínhamos alguma coisa. Não podia deixar transparecer a decepção que senti por não haver de fato um nós. Você sempre foi o suficiente para fazer meu dia melhor, mesmo que não saiba disso.

Minha cabeça está uma loucura nesse exato momento. Não sei o que pensar, nem se devo responder de alguma forma que diriam ser a correta. Deus do céu. Nunca acreditei que isso fosse possível. Não acreditei que um dia esse momento chegaria.

Estamos nos olhando com intensidade, estava tão fixado em seus olhos que notei sua aproximação vagarosa. Até que seus lábios encostaram de leve nos meus. Seus poros exalam insegurança. Eu retribuo? O que faço? Estou nervoso. Quando percebi sua tentativa de afastar-se, o puxei pela nuca, fazendo daquele termo contato um beijo real. Senti o alívio que tomou conta dele, pela tensão que diminuiu em seus ombros. E durou o suficiente para deixar ambos envergonhados.

Beijei meu melhor amigo.

Naruto voltou para casa. O clima não ficou estranho entre nós, porém, também não posso dizer que estava como antes, claro que não. Ele havia se declarado, e eu não dei nenhuma resposta em relação a isso. Bem, não podemos considerar um beijo como uma resposta, correto? De qualquer forma, não passarei o resto da semana sozinho, o meu irmão está para aparecer ainda está tarde, e espero que seja o quanto antes. Não aguento mais pensar sobre essas coisas, preciso de alguém para compartilhar o que houve. Uma segunda opinião é sempre muito bem vinda. Se tratando dele posso contar todos os detalhes do que aconteceu.

Esperei ansiosamente a sua chegada após o almoço, e lá para as três da tarde, escutei o som da campainha. Alcancei a maçaneta em um pulo, recebendo o outro num abraço apertado.

— Como está, irmãozinho? — perguntou depois de um tempo comigo ainda nos braços.

— Você não sabe do quanto eu preciso de você aqui. — Olhei em seus olhos, ele franziu a testa.

— Aconteceu alguma coisa?

— Irei contar tudo, acomode-se primeiro. — Dei passagem, ajudando a carregar as poucas malas logo depois. — Quanto tempo irá ficar?

— Uma semana. O Shisui foi visitar a família, passei dois dias com eles, e vim te ver. — Sentou-se na ponta da cama. — Não me respondeu, como vai você?

— Confuso, meio desnorteado.

— O que aconteceu, Sasuke?

— Naruto aconteceu. — Sentei no chão de frente para ele, as costas no guarda-roupa.

— Tudo bem. Você não precisa ficar comigo apenas por conta das coisas que eu te disse. — Acariciava minha bochecha de modo termo. Seu olhar era sincero, um sorrisinho adornava seus lábios. — Estou falando sério. Não quero te pressionar a ficar comigo, ou ficar somente porque sabe que sinto algo. Não é assim que funciona, certo?

Quando fomos dormir eu não conseguia pensar em outra coisa. Ainda sentia a textura dos lábios dele contra os meus. O carinho de suas mãos em meus cabelos. E o olhar acanhado que recebi quando a roda gigante deu um tranco para começar a descer.

Não estou dizendo que foi ruim, obviamente que não. É só que, não estou acostumado a sentir emoções que têm grande relação com a felicidade. Todo o meu corpo parecia pegar fogo quando tomei a atitude de não deixá-lo recuar. Assim como percebi o aquecimento em meu peito ao saber que aquele último olhar foi por algo que fiz acontecer.

— Estou esperando.

— No começo da semana passada eu o recebi aqui. Houve um problema na empresa, deram folga para todos, saímos para o shopping durante a tarde. E ele se ofereceu para passar o final de semana comigo. Chegou na quinta, foi embora segunda no horário do expediente. Nós fomos ao parque que chegou na cidade no sábado. E, acontece que nos beijamos na roda gigante. — Vi a boca do meu irmão se partir para questionar algo, mas pedi que esperasse, ele concordou. — No dia anterior, enquanto estávamos assistindo um filme, ele me questionou se eu já havia gostado tanto de alguém que senti meu coração doer. Conversamos sobre o assunto durante um tempo, mas foi só isso. E no parque, ele se declarou para mim. Eu não sabia o que fazer... Quando ele me beijou, e percebeu que eu não iria retribuir, começou a retroceder, mas não deixei. O clima não ficou estranho, mas... — Suspirei.

— Mas não é a mesma coisa — concordei. — Como foi?

— Bom. — Dei de ombros.

— Como vocês estão?

— Não nos falamos desde que ele partiu. Eu não sei o que falar. Eu não o mereço... Ele é bom demais para alguém como eu. — Ei, não chore agora. Tomei uma respiração profunda. — O Naruto merece alguém que possa fazê-lo feliz. Não consegui nem dar a droga de uma resposta. O que mais posso fazer por ele? — Dei um riso sarcástico. — Eu disse não tantas vezes para a nossa ida ao parque. E ainda assim ele me convenceu. Tsc. Eu não queria deixá-lo triste. Sua alegria lá era contagiante, e eu me sentiria realmente mal por tirar isso dele. Ele planejou que fôssemos, e que estivéssemos na roda gigante quando acontecesse.

Itachi apenas me observa enquanto penso sobre o que se passou. Mesmo que eu tenha parado para refletir durante esses dias que se passaram, não havia dito como me sinto em voz alta. Tudoparecetãobagunçado.

Naruto está arrumando as coisas para ir embora amanhã de manhã, estou de pé na soleira do quarto observando seus movimentos. Ainda vamos dormir na sala hoje.

Durante o café da manhã foi o momento mais normal que tivemos, parecia que o sábado não havia existido em nossas vidas — pelo menos não na minha. Por hora esqueci do que havia se passado. Até o momento de ele se despedir.

— Nos vemos em breve. — Segurava a pequena mala com ambas as mãos. Tinha um sorriso curto nos lábios. — Se cuida, Sasuke. — Inclinou-se, beijando o canto de minha boca antes de virar as costas e partir.

Levei um tempo absorvendo o que houve. Até voltar para dentro de casa, sentar na cama e olhar nossas fotos impressas no parque.

— Você era o único que não enxergava o quanto Naruto gosta de você. Eu já havia conversado com ele sobre isso. Apenas para confirmar a certeza que tinha. Ele só não dizia nada com medo de que a amizade de vocês desmoronasse.

— Não quero começar algo e machucá-lo no meio do caminho.

— Não precisa ficar com ele se não sente o mesmo. Foi o que o Uzumaki disse, não foi? — Balancei a cabeça em um sim. — E é a maior verdade que pode existir. Olha, Sasuke. — Parecia procurar as palavras certas. — Eu adoraria te ver namorando o loirinho. — Riu de leve. — Ele consegue fazer algumas coisas contigo que nem mesmo eu tenho a capacidade. A amizade de vocês é ótima... Seriam amigos com benefícios, entende? Foi assim que comecei também. Shisui foi o meu primeiro, e hoje é o último. — Olhava em meus olhos. — Não estou te pressionando a ficar com o Naruto. Estou dizendo como pode funcionar. Mas isso só depende de você. Ele pode ter dito que não precisa de uma resposta, mas claro que é bom saber como a outra pessoa se sente. Use esses dias para pensar no assunto.

— Eu lhe devo uma resposta.

— Algo assim. Se nossos pais estivessem vivos iriam gostar muito dele.

— Tenho certeza que sim.

— No meio de tantas outras pessoas, foi você quem ele enxergou. E eu sei do seu carinho por aquele homem. O primeiro beijo já foi dado.

O primeiro beijo já foi dado. Um beijo que me deixou à deriva por alguns segundos. Que rondou minha cabeça durante horas, dias.

“Você sempre foi o suficiente para fazer meu dia melhor, mesmo que não saiba disso.”, essa sua frase parece colada em minha mente. Pensar no que posso te responder irá fritar os meus miolos. Nunca cogitei que um dia estaria nessa posição. E muito menos que seria com o Naruto. Passeei a mão pelos cabelos, meus olhos ainda presos ao chão de linóleo.

Itachi e eu saímos para jantar. Por hora não fiquei pensando sobre nada do que eu deveria falar para o Uzumaki. Porém, isso também significa que minha mente trabalhará duro quando a cabeça repousar no travesseiro; nada muito diferente do que previ aconteceu. Girei de um lado para o outro, vendo seus azuis no meio da escuridão, ouvindo suas palavras tão nítidas outra vez. Não me tirou completamente o sono, entretanto, levei boas horas até conseguir pregar os olhos de verdade.

“Sempre que eu te vejo meu coração bate loucamente.”, não posso dizer que o mesmo acontece comigo, porém sempre fico feliz com a sua presença.

“Me sinto acolhido. Ainda que você não seja a pessoa mais carinhosa do mundo.”, você se sente acolhido por mim? Quase me sinto egoísta por pensar que não te retribuo nem metade do carinho que me passa. Estou sempre dizendo não sem nem ao menos pensar para seus convites. Me desculpa por ser assim. Por não reconhecer os seus esforços em me ajudar. Por não reconhecer os seus esforços para ser meu amigo. E por não dar o devido valor para a sua declaração. Te deixando ir embora sem qualquer retorno. Eu deveria te dizer tudo isso, mas não consigo. Desculpa.

Hoje é sexta feira. Desde a segunda não tive qualquer contato com o Naruto. E nem o próprio procurou contato comigo. Talvez esteja pensando em me dar liberdade para pensar sobre o assunto. Que falarei com ele quando estiver pronto. Isso só me deixa mais angustiado. Não gosto de tê-lo distante desta forma. Eu gosto do loiro e de sua companhia. Parece que tudo isso inclusive não está me deixando aproveitar os dias com meu irmão. Pareço e sinto-me tão disperso em nossa relação. Mas percebo também que ele entende o que se passa. Ah...

— Nunca conversamos sobre como foi o começo do seu relacionamento. — Sentei ao seu lado no sofá, deitando a cabeça em seu ombro.

— Você sabe grande parte da história.

— Sim, sei.

— Shisui sempre foi meu amigo. Me conhecia melhor que ninguém. Então, não consegui não acreditar quando disse que gostava de mim. Pois ele sabia dos meus defeitos, dos meus medos, do que me deixava magoado. E ainda assim foi capaz de me amar. Eu não encontraria outro melhor. Outro alguém que conhecendo o meu eu ainda me aceitasse plenamente. Que seria capaz de de não brigar comigo por responder de forma grossa por conta do plantão de várias horas que dei. Ou de recusar seu toque por cansaço. Nosso relacionamento funciona, porque não exigimos, não cobramos. — Colocou os dedos dentro de meus fios. — O Naruto é a pessoa mais pura e sincera que conheço—

— Eu não consigo lhe dizer como me sinto. Sou quase dependente de sua presença para dar cor ao meu dia. Não consigo dizer que quero estar ao seu lado. Que não quero que afaste-se de mim.

— Tenho certeza de que ele não tem uma bola de cristal.

— Tenho as minhas certezas sobre isso também. — Rimos baixinho.

— Você tem todo o tempo do mundo para dar uma resposta. Porém, o tempo pode passar diferente na perspectiva do outro. Ele estará lá para ouvir o que tem a dizer quando você estiver pronto, mas nada garante que o sentimento dele continue o mesmo, independente de sua resposta ser positiva ou não. Entende o que quero dizer? — Olhou em meus olhos, abrindo um curto sorriso que me deixou de testa franzida. — Sasuke, ninguém nasce amando outro ser humano.

Não tenho argumentos para nada do que me diz, e nem quero ter. Não há o que protestar; eu sei que não precisamos ficar juntos, sei que podemos tentar construir algo com o passar do tempo. Acredito que funcionaria bem para ambos. Mas essa decisão não deve ser tomada apenas por mim. Falarei com ele depois que me despedir do Itachi. Por agora preciso aproveitar os poucos dias que ainda nos resta juntos.

O convidei para ir ao cinema ontem, e hoje, no sábado, serei deixado algum tempo sozinho — o mais velho disse que quer fazer umas compras, mas que irá sozinho. A interrogação em meu olhar foi grande o bastante para fazê-lo rir. Com certeza ele quer me ver afundar no tédio.

Me joguei no estofado olhando para o teto. Se o objetivo dele é me deixar sozinho para pensar, muito bem, fez um ótimo serviço. Não tenho nenhum afazer de casa para ocupar a mente, e nem nada para inventar. Jogar vídeo game é uma opção, porém... Não é algo que estou muito afim. Mas já que estou precisando escapar de minha cabeça, pode ser que seja a melhor das opções. Quando dei o impulso de ficar de pé, a campainha tocou. Não pensei muito sobre, fui atender.

— Naruto?

— Oi. — Sorria timidamente. — O Itachi está? Ele me chamou para vê-lo.

— Acabou de sair.

— Sério? Que pena. — Mordeu o lábio. — Eu vou indo, então. Irei mandar mensagem. Marco com ele outra hora.

— Sim, claro. — Idiota, o que está fazendo? Chame-o para entrar, conversem! Chame-o!

— Nos vemos depois. — Levantou uma mão em umaceno desconcertado.

— Certo, nos vemos depois. — O que estou fazendo? O que estou fazendo? O que estou fazendo? O vi dar meia volta, apertava a alça da pequena mochila que carrega. Dei dois passos compridos, e segurei seu pulso. — Espera, não foi isso que eu quis dizer... Entra. Entra que eu preciso trocar de roupa e te levar em um lugar.

— Para onde estamos indo? — Já estamos no ônibus a caminho.

— Vai descobrir.

Levou pelo menos pouco mais de trinta minutos para descermos do automóvel. Atravessamos uma rua movimentada em direção a uma floricultura. Pedi três buquês, um dos quais ficou na mão do loiro. Mesmo que não entendesse o que estava acontecendo, segurou sem questionar. Voltamos para o outro lado, andando em linha reta por mais alguns minutos. O espaço foi se tornando menos movimentado à medida que o destino ia se aproximando de meus olhos.

— Você sabia que meus pais nasceram aqui? Nessa cidade, por isso escolhi vir para cá. — Tentei quebrar o gelo.

— Não sabia.

— O acidente que os matou foi onde o Itachi mora. — Paramos de frente a um grande portão, ao olhar para cima, Naruto arregalou os olhos.

Cemitério Bosque da Paz.

Caminhamos para dentro em silêncio. Percebi que o loiro se aproximou um pouco mais de mim quando transpassamos os ferros da entrada. Andamos bastante, até depois da capela, e mais um pouco. Se não pelas lápides, eu poderia dizer que estamos cercados por um belo bosque. O que não deixa de ser verdade, porém, seria um enorme e bonito parque para a família passar o domingo.

Diminui as passadas quando percebi estar perto. Parando de frente às escrituras em granito de Mikoto e Fugaku Uchiha. Inspirei fundo.

— Oi, mãe, pai. Quanto tempo, não é? — Depositei as flores sobre as covas brancas. — Hoje eu não vim com o Itachi. E gostaria de apresentar alguém... Esse é o Uzumaki Naruto. O meu irmão disse que vocês provavelmente iriam gostar dele, e não tenho a menor dúvida. É o homem mais incrível que conheço. — Deixei um risinho escapar. — E aparentemente gosta de mim pelo que sou. Mas não sei bem lidar com isso. Gostaria muito que estivesse aqui, mãe, para me dar um esporro, dizendo que estou deixando escapar minhas chances de ser feliz. E, pai, para me dizer que sou lento para essas coisas de amor. — Enfiei as mãos nos bolsos. — Sinto falta de vocês.

— Sasuke.

— Eu os visitava todo mês quando ainda morava na outra cidade. Eles pediram para que fosse aqui. Depois que me mudei, passei a vir de dois em dois meses. Depois seis, agora de ano em ano. Acho que o Itachi deve passar aqui antes de ir embora. — Meus olhos não saem das inscrições de seus nomes. Sinto todo o interior de meu corpo em erupção. — Naruto, eu— suspirei antes de prosseguir —, eu não deveria ter te deixado ir sem uma resposta. Espero que entenda que fui pego de surpresa. Esse buquê em sua mão, é seu. Me desculpa. Me desculpa te trazer aqui sem prepará-lo, me desculpa não dizer que é especial. Me desculpa se eu nunca te disse que faz o meu dia ter cor, que me faz sentir vivo. — Segurei seu rosto com ambas as mãos, seus olhos estão marejados. — Me desculpa por qualquer coisa. Não pude dizer a eles o quanto os amava, não tive a última chance... Sempre que encaro o meu reflexo no espelho penso o que poderia ter sido diferente. Cada dia é um e se diferente.

— Sasuke –

— Eu posso ser um péssimo amigo sempre te dizendo não sem pensar, mas não posso evitar — pôs o dedo no meu lábio para calar-me.

— Tudo bem... — sussurrou — Você precisava de um tempo para pensar, eu entendo. Eu não iria te pressionar por uma resposta. Nem mesmo esperava uma. Não tenho certeza se esse é o melhor lugar para conversar sobre isso, mas — deu de ombros —, não é como se o meu sentimento fosse mudar de hoje para amanhã, entende? Eu só não ficaria te esperando a vida toda.

Não pensei muito bem se seria desrespeitoso ou não pelo lugar que estamos, ainda assim me inclinei em sua direção e selei nossos lábios de forma terma.

— Obrigado por estar em minha vida. — Sorri sem dentes, segurei sua mão livre, virando o corpo para os túmulos. — Mãe, pai. Obrigado por tudo. Por favor, olhem por mim e por essa pessoa com quem tentarei fazer funcionar. Eu não o amo como a mamãe o amava, pai, e nem como o Itachi ama o Shisui. Porém, vou fazer o meu melhor para dar certo. Farei o meu melhor para deixá-lo feliz ao meu lado. Eu não o traria aqui se não estivesse decidido a isso. Eu amo vocês. Estarei de volta no próximo ano.

Saímos do cemitério em silêncio. Naruto ainda mantém a mão na minha. Parece pensativo, olha para o chão enquanto andamos para o ponto de ônibus.

— Podemos ir para minha casa? Preciso colocar as flores na água... — Foi um sussurro.

Podemos. Não é “Posso ir para casa?”. A caminho de sua residência, a cabeleira loira descansou em meu ombro. Ele havia enlaçado nossos dedos novamente quando nos sentamos. Demoramos menos para descer. Caminhamos ainda em silêncio pela rua quieta.

— Eu já volto.

Me sinto um pouco tímido. Falei algumas coisas lá, mas não sei muito bem o que devo fazer agora. Isso significa que estamos namorando? Ou que vamos começar a sair? Tenho vinte e quatro anos, mas é a primeira vez que estarei tentando alguma coisa; ouvi as passadas leves por perto, mas continuo sem saber o que falar ou como agir.

— Quer alguma coisa para comer?

— Não, estou bem. — Dei umas palmadas ao meu lado no sofá. — Eu entendi o que o Itachi fez. Te fazendo ir lá como se fosse para encontrar com ele — dei uma risada baixa —, porque sabia que eu ainda não havia criado coragem para ligar e te chamar para uma conversa.

— Obrigado, por me levar até lá. Sei que é um local íntimo seu e de seu irmão. Eu estou feliz... Só não consigo colocar para fora. — cobriu a boca com as mãos.

Já era noite quando seguimos para a minha casa.

— Finalmente você apareceu, onde estava? — Itachi assistia algo.

— Na casa do Naruto.

— Oi. — Passou por mim, indo abraçar o meu mais velho. — Estava com saudades.

Deixei os dois conversando, indo tomar banho, deixei a mochila do outro perto de minha cama. O loiro já havia se banhado antes de vir para cá. Pedimos uma pizza para o jantar; admito ter ficado um pouco sem graça na hora de dormir. Mesmo que semana passada tenhamos feito isso durante várias noites, e não pela primeira vez. Desta estamos em meu quarto. Parece mais íntimo. Vamos sair cedo amanhã. Nós três.

— Venha para mais perto— sussurrei. Beijei seu nariz quando se aproximou. Segurando seu queixo para me guiar aos seus lábios. São macios, carinhosos e doces. Sua mão acariciava meus cabelos. — Boa noite. — Selei sua testa.

— Boa noite.

O som do despertador parece alto demais em meus ouvidos. Ou talvez seja apenas o silêncio sepulcral dentro do quarto que o faça se propagar tão intensamente. Não importa, de qualquer maneira, hoje é sábado. Com a inspiração mais profunda que se pode tomar, tentei inspirar alguma coragem para levantar da cama. O som de nada retorna depois que desligo o aparelho, sendo cortado apenas pelo barulho de respiração do loiro ao meu lado.

Com as solas no chão frio, mexo os dedos sentindo a temperatura. O pescoço pendendo para frente, os olhos fechados, deixo as palmas passearem livres pelos fios de cabelo. Quando chego ao banheiro o reflexo que vejo no espelho é satisfatório. A pele branca demais pela falta de sol, um pouco de vermelho aqui e ali no peito. Culpa do Uzumaki.

Namorar esse homem foi a melhor coisa que me aconteceu nesses últimos anos. E hoje é apenas o quarto aniversário de namoro. O alarme tocando cedo é para que possamos aproveitar melhor o nosso dia.

— Ei, acorda.

— Já vou, já vou.

Passamos o dia fora. E para a nossa sorte, temos um parque de diversões na cidade — não o mesmo daquele ano, mas com atrações parecidas. Lógico que a roda gigante seria a nossa última. E aqui na fila estamos apenas aguardando nossa vez de entrar na cabine; ficamos entre o dez e o onze.

— E cá estamos nós outra vez, quatro anos depois.

Olhando seu perfil lampejos de memórias vêm voando em minha mente.

“— Olha que falando dessa maneira, eu posso acreditar que não gosta. — Seus lábios estavam tão juntos aos meus que a cada palavra um meio beijo era dado. — Mas, se puder fazer o sacrifício por mim, agradeço.

— Nunca é um sacrifício fazer amor com você.”

“— Já entendi que não está bem para sair hoje. — Sentou ao meu lado, acariciando meus cabelos. — Vou achar alguma coisa para assistirmos e passar o tempo.

— Obrigado.”

“— O Itachi está esperando.

— Tem certeza de que não vai?

— Absoluta. É um momento de vocês com eles. Até mais tarde.”

— Eu estava com muito medo naquele dia, pode crer. O coração batia feito louco. E quando você me beijou. Nossa, achei que fosse morrer.

— Naru.

— Não, eu falo, Sasuke. — Olhava dentro de meus olhos. — Obrigado por ser suficiente para mim.

Posso repetir isso muitas vezes ao longo da vida, mas tenho certeza que o beijo que recebi foi um dos mais doces de toda ela.

27 de Fevereiro de 2018 às 02:02 2 Denunciar Insira Seguir história
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Fim

Conheça o autor

Adrielle Victória Algumas das histórias estão exclusivamente no Spirit, sintam-se à vontade para dar uma olhada (°◡°♡) Fuyuka_Hideki

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Luh Hander Luh Hander
A.M.E.I!!!
February 28, 2018, 20:04

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