Vitória
Terminar um noivado não deveria ser algo ruim. Principalmente se o motivo fosse receio de levar um pé na bunda, eu não queria a fama de abandonada de forma alguma. Quer dizer, ele terminaria comigo, eu sentia em cada célula do meu corpo. Então o boato se espalharia pela editora rapidamente, como uma infestação, e eu me tornaria a coitadinha.
Não, definitivamente não.
Eu só não sabia que meu ex-noivo assumiria um namoro com a minha assistente e eu me tornaria algo parecido com uma pária.
Ouvia os cochichos pelos cantos, sem poder socar ninguém, afinal levaria uma justa causa bem merecida.
Beber... eu precisava de vodka dupla ou algo ainda mais forte. Foi isso que eu fiz.
— Mais uma dose, por favor — pedi ao barman.
Minha cabeça rodava e eu sabia que acabaria com uma puta ressaca na manhã seguinte.
Mas, quer saber? Dane-se!
Virei a dose e mais outra... Tudo parecia promissor agora que a bebida amenizou minha frustração.
Levantei para ir ao banheiro, meio que trançando os pés. Não deveria ter vindo beber sozinha, mas a minha amiga não estava disponível e esse, sem dúvidas, era um caso de vida ou morte.
Defcon um!
Acabei rindo ao perceber que as pessoas pareciam se movimentar diante dos meus olhos, mesmo que estivessem paradas.
Acho que bebi demais.
Avistei dois homens conversando no balcão, mais adiante no bar e foquei neles. Pareciam ser a mesma pessoa ou eu estava pior do que imaginava.
Fui andando, até que...
— Opa! — Um dos bonitões me segurou pela cintura quando eu tombei em cima dele.
Queria botar tudo pra fora e se ele não saísse da minha frente, não daria mais para consertar o estrago.
— Desculpe — murmurei, me recompondo na medida do possível.
Ele era um gato, ainda que eu estivesse bêbada feito um gambá, não conseguiria ignorar aqueles olhos verdes.
— Você está bem? — perguntou e sua a voz soou como um tiro no meu coração.
— Ah, sim! — ri, meio histérica.
— Não parece bem — ele afirmou, abrindo distância de mim.
Ele era... Uau.
Então vi sua aliança.
Claro, ele era casado.
Que beleza!
— Vini — o outro chamou. — Ela vai vomitar.
E foi exatamente o que eu fiz, aquela noite não poderia ser melhor. Vomitar na frente dos dois homens mais atraentes do bar não estava nos meus planos, mas ver minha assistente com o meu ex também não. E cá estamos nós.
— Vou chamar um Uber, para onde você vai? — O cara gentil perguntou, enquanto eu limpava a boca precariamente.
— Não precisa — neguei, me afastando a passos trôpegos e vacilantes — Tô ótima!
— Tem certeza? — insistiu — Lucca, não quer levar ela em casa?
— Eu? — O outro revidou, se afastando. — Ela vai vomitar tudinho no meu carro. Não, obrigado.
— Você é um idiota — resmunguei sem me abater.
Ele soltou uma gargalhada sarcástica.
— Você praticamente vomitou em cima da gente e eu que sou idiota? — questionou, incrédulo.
— Completamente — eu disse, saindo do bar com o restante de dignidade que me restara.
Se a vida era uma festa, eu definitivamente perdi meu convite e estava aqui só de penetra.
(...)
Não lembrava exatamente como chegara em casa, devo ter pedido um Uber. Em hipótese alguma eu viria com aquele cara idiota, se fosse o outro que usava aliança, poderia até pensar na possibilidade. Mas eu não era nenhuma talarica.
Levantei meio sonolenta e fui ao banheiro. Ao me olhar no espelho, constatei que não limpei o rosto ontem à noite. Dormir maquiada deveria ser um crime e eu provavelmente me arrependeria de cometê-lo depois. Só não estava parecendo um panda porque a maquiagem era de boa qualidade e a prova d'água. Não que isso me consolasse no momento.
Estava só a capa do Batman de tão cansada. A cabeça doía por causa da ressaca e o gosto amargo na boca só piorava a situação.
Bebi água da torneira mesmo, só para aliviar a sensação ruim e espalmei as mãos na pia. Olhei a imagem refletida diante de mim por vários segundos, soltando um suspiro derrotado.
A que ponto cheguei? Precisava rebobinar... Meu ex-noivo estava namorando a minha assistente, mas não era o fim do mundo, certo? Lavei o rosto e limpei a maquiagem com demaquilante. E ali estava, a garota pálida diante de mim parecia comigo, mas estava derrotada demais para ser.
Meu celular tocou, então voltei para o quarto. Era a Melinda, provavelmente querendo saber como eu estava depois do porre federal que tomei sem ela.
— Alô.
— Vick.
— Ligou pra saber como foi minha noite de merda? — perguntei, sem querer parecer rude.
Mel não tinha culpa por eu estar naquela situação.
— Acho que sim, fiquei preocupada — respondeu, apesar da minha aspereza anterior. — Desculpe não poder ir com você, fiquei presa no trabalho.
— Tudo bem — suspirei — Eu tomei um porre e paguei o maior mico na frente do cara mais gato do mundo. Tipo, eu vomitei quase em cima dele.
Pelo menos era sábado e eu poderia curar minha ressaca sozinha. Também teria dois dias para me recuperar da notícia que recebi.
— Estou indo aí, vamos fazer compras e você vai se animar um pouco — disparou, parecendo confiante. — Então pode me contar em detalhes o que aconteceu.
— Não estou muito a fim de sair, amiga — afirmei, me jogando na cama. — Mas se quiser vir aqui, podemos maratonar alguma série e pedir comida pelo delivery.
— Considerando que te deixei na mão ontem, parece justo — acabei rindo.
— Estou te esperando.
— Até já, beijinhos.
Finalizei a ligação e deitei de barriga para cima, largando o celular no colchão. Melinda era minha melhor amiga, acho que não saberia viver sem ela. Meu pai morava fora do Brasil e minha mãe me abandonou quando eu era recém nascida, portanto não me restou ninguém para ouvir meus lamentos. Cresci com o meu pai, até ele perceber que não queria mais cuidar de mim e decidir se mudar para o Canadá. Como eu não queria abandonar tudo e viver com ele num lugar frio e distante. Decidi ficar, desde então tenho me virado sozinha. Acho até que estava me saindo bem, era uma redatora de sucesso em uma das editoras mais conceituadas do Brasil e até alguns meses estava prestes a me casar.
Quando foi que as coisas começaram a dar errado na minha vida? Quando percebi Denis distante o suficiente para me fazer desconfiar? Quando passou a me dar desculpas para me encontrar fora do trabalho? Ou quando eu senti um perfume feminino vindo de sua camisa? Se respondeu todas as opções, acertou.
Puxei na memória a noite de ontem, lembrando do cara que me segurou. Ele era tão gato, a única coisa que estragou o clima foi aquela maldita aliança no dedo.
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