biana-v Biana Vendramini

Natal, época de paz, comemoração, resiliência e harmonia, mas não para uma pacata cidadezinha de aproximadamente vinte e cinco mil habitantes, cuja data seria marcada por acontecimentos macabros e indescritíveis, de fazer crianças terem terríveis pesadelos e temerem sair de suas casas no dia de Natal.


Conto Impróprio para crianças menores de 13 anos.

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Natal, época de paz, comemoração, resiliência e harmonia, mas não para uma pacata cidadezinha de aproximadamente vinte e cinco mil habitantes, cuja data seria marcada por acontecimentos macabros e indescritíveis, de fazer crianças terem terríveis pesadelos e temerem sair de suas casas no dia de Natal. Todo o pesadelo que se materializou para a cruel realidade de seus residentes começou na primavera do ano 2000, quando crianças começaram a desaparecer misteriosamente em um curto intervalo de tempo sem deixar qualquer rastro ou pista do que poderia ter ocorrido, o que coincidiu com a chegada de um novo habitante na cidade há alguns meses.

Não tardou para que suspeitas fossem levantadas pelos cidadãos contra George, um senhor na faixa dos sessenta anos e novo residente do velho casarão na parte mais afastada da cidade onde em seus primórdios localizava-se o antigo cemitério. O mesmo havia conseguido um emprego temporário de Papai Noel no centro comercial com a aproximação do Natal. Como a própria polícia não parecia demonstrar-se efetiva na investigação dos desaparecimentos, alguns dos próprios moradores da cidade, abalados por suas perdas resolveram por conta própria fazerem justiça com as próprias mãos, ainda que não possuíssem provas concretas contra o suposto suspeito.

George foi trancado em sua própria casa na véspera de Natal enquanto a estrutura era incendiada por completo em retaliação por seus possíveis crimes. Boatos dizem que ele havia acabado de retornar de seu trabalho e ainda estava vestido com sua fantasia de Papai Noel e que pôde ser ouvido a quilômetros de distância seus gritos agonizantes à medida que seu corpo queimava vivo nas labaredas. Quando o incêndio foi finalmente contido pelos bombeiros na manhã de Natal e a polícia já havia cercado todo o quarteirão para impedir os bisbilhoteiros de atrapalharem, o corpo de George foi encontrado em total estado de carbonização e completamente irreconhecível.

No entanto, algo muito mais tenebroso foi descoberto naquele dia, pois foram encontradas partes humanas decepadas e embrulhadas em caixas de presente no sótão da casa onde as chamas não conseguiram chegar. Logo foi constatado através da perícia que os restos mortais encontrados pertenciam às crianças desaparecidas, confirmando por fim as acusações dos crimes cometidos pelo mesmo, que ficou conhecido como o assassino do Natal. Embora o mistério do desaparecimento das crianças havia sido desvendado, a população da não mais tão pacata cidadezinha ainda viveria um pesadelo ainda mais aterrorizante em um futuro não tão distante…


(...)

A campainha tocou em meio a toda a algazarra pós ceia de Natal.

— Diego! Vai ver quem está tocando! — avisou a chefe da família aos berros ao mesmo tempo que lavava a louça na cozinha.

— É o Caio, mãe — esclareceu o rapazote já se encaminhando à porta. — Tô indo.

— Vão direto para a casa do Caio, andar na rua de madrugada é perigoso. E trate de voltar amanhã antes do almoço — orientou-o sem cessar seus afazeres.

— Tá bom… — assentiu o garoto revirando os olhos.

— Feliz Natal, cara! — desejou o amigo abraçando-o assim que o avistou.

— Feliz Natal.

— Simbora que eu to doido para te mostrar a bicicleta maneira que ganhei, a gente pode andar com ela amanhã.

— Daora.

— E você? O que ganhou? — indagou Caio com curiosidade à medida que caminhavam pela calçada.

— Nada… — suspirou Diego com certa frustração. — Minha mãe não tinha dinheiro para dar presente para todo mundo, então só comprou para a Bruna. Sabe como é, privilégios de irmã caçula — explicou gesticulando com as mãos. — Minha avó mandou roupas para mim e para Natália… Mas quem é que quer ganhar roupas no Natal?

— Dar roupa de presente deve ser coisa de velho, sei lá. Ainda bem que não tenho irmãos, assim não preciso dividir presente.

A certo ponto do caminho Caio teve uma brilhante e ousada ideia ao adentrar em uma ruela estreita ao invés de seguir o típico caminho para sua casa.

— Ei, onde você está indo? — questionou Diego sem entender porque haviam desviado da rota habitual. – Sua casa é seguindo reto.

— Eu sei inteligência, mas quero passar em um lugar antes.

— Você tá louco? Nossos pais nos proibiram de chegar perto desse lugar — alertou ao se dar conta de onde especificamente o amigo planejava ir, mas sem deixar de segui-lo. — Se alguém nos ver lá vai nos dedurar e vamos ficar de castigo para o resto das nossas vidas.

— Ah, para de ser cagão — provocou Caio apressando o passo. — É noite de Natal, não vai ter praticamente uma alma viva na rua. Se a gente for rápido meus pais nem vão desconfiar que desviamos do caminho.

— Mas tá muito tarde, é perigoso andar na rua à noite… — alertou Diego cessando subitamente os passos.

— Para de ficar repetindo esse discurso da sua mãe — repreendeu o outro já a certa distância e determinado a seguir adiante. — É provavelmente a única chance que a gente vai ter, não seja estraga prazeres. Se você não vier eu vou sem você — concluiu dando-lhe as costas.

— Você só me mete em furada… — Diego coçou a nuca ainda relutante em embarcar em tal aventura delinquente noturna, porém, como não queria perambular sozinho pela rua, acabou cedendo à chantagem do amigo e partiu em seu encalço.

Após alguns minutos de uma correria de tirar o fôlego, a dupla chegou ao seu destino, o antigo casarão, que no presente momento não passava de ruínas em meio a cinzas. Grades foram levantadas cercando o terreno abandonado para impedir a entrada de bisbilhoteiros. Ambos permaneceram na calçada oposta onde era possível ter uma visão ampla do que um dia foi o antro de carnificina do serial killer de crianças.

— Já vimos, agora podemos ir embora — solicitou Diego com receio de serem vistos, mas principalmente por possuir certo temor dos boatos que passaram a circular pela cidade após o incêndio da residência, ao contrário do amigo.

— Não me diga que está com medo? — perguntou Caio em tom de zombaria. — Qual é? Já faz um ano e mortos não levantam de suas tumbas, principalmente alguém que virou cinzas. Além do mais de uma forma ou de outra esse louco fez um favor para nós tirando o Billy do nosso caminho, agora aquele idiota não vai poder fazer bullying com mais ninguém.

— Eu não tô com medo, só não quero que descubram que viemos aqui — resmungou Diego tentando parecer o mais corajoso possível, no entanto, só de olhar para os escombros além da grade um arrepio já subia por sua espinha. — E por pior que uma pessoa seja, ninguém merece morrer, principalmente de uma forma tão cruel…

— Meu pai me contou que antes de ser o esconderijo do assassino esse lugar era um cemitério — continuou Caio, sem preocupar-se com a opinião do amigo. — Já pensou se o espírito dele retornasse e quisesse vingança contra a cidade? — indagou na intenção de amedrontá-lo.

— Se isso acontecesse, seria bem mais provável que o espírito dele fosse atrás daqueles que o mataram em busca de vingança. E eu não queria estar na sua pele — Diego devolveu a provocação com um sorriso maroto na extremidade dos lábios, recebendo uma cotovelada no braço logo em seguida.

— Mas como isso é só história para boi dormir que as velhas fofoqueiras daqui contam para assustar as crianças burras, não tenho com o que me preocupar. E você está com inveja porque meu pai foi um dos heróis da cidade, porque se não tivessem matado aquele maluco, com certeza ele estaria até agora fazendo mais vítimas. Quem sabe se não estaríamos mortos também…

— Vira essa boca para lá.

Inesperadamente um tilintar sutil de sinos pôde ser ouvido por ambos, o ruído estranhamente parecia vir de dentro do que restou do casarão. Mas como seria possível haver alguém ali àquela hora em uma noite de Natal?

— Ouviu isso? — inquiriu para Caio com preocupação.

— Deve ser só algum animal passeando pela casa mal-assombrada — zombou o amigo dando de ombros despreocupadamente. — Melhor a gente ir antes que você comece a ver fantasmas, mas antes… — no instante seguinte pegou uma pedra do tamanho da palma de sua mão e a arremessou com toda força. O projétil voou sobre a cerca e acertou em cheio uma das vigas de sustentação expostas da estrutura quase que completamente comprometida, fazendo a parte atingida vir abaixo causando um estrondo que certamente ecoou por todo o quarteirão. E com isto o tilintar cessou abruptamente. — Agora podemos ir — concluiu, pondo-se a correr para longe dali.

— Seu doido, quer que nos peguem? — exasperou Diego seguindo-o.


(...)

Naquela madrugada, por conta de seu sono leve, Diego despertou subitamente com o mesmo tilintar de sinos que desta vez aparentava provir do andar de baixo. Com receio do que poderia ser que estivesse fazendo tal ruído, tentou acordar Caio que estava na cama ao lado, mas sem sucesso, pois o mesmo dormia profundamente. Tratava-se de um som sutil, porém, ecoava em sua mente em uma intensidade que aumentava gradativamente. Sem ter muito o que fazer para cessar o barulho incômodo e atiçado pela curiosidade, reuniu toda coragem que possuía naquele momento e desceu com cautela em direção da sala de estar da casa do amigo.

Assim que pisou no último degrau da escadaria notou haver um vulto atrás da grandiosa e iluminada árvore de natal, ao se aproximar mais pôde ver que seja lá quem fosse trajava veste carmesim com detalhes brancos e um gorro nas mesmas tonalidades, entretanto, um pequeno detalhe chamou sua atenção. A vestimenta encontrava-se com sinais de estar chamuscadas ao longo de todo seu comprimento. Assim que pronunciou-se o tilintar cessou repentinamente:

— Senhor Roberto? — murmurou supondo ser o pai de Caio ali fantasiado como Papai Noel.

A última coisa que Diego viu foi uma face horrenda completamente carbonizada, com os ossos à mostra com um vazio negro e petrificante no lugar das órbitas oculares por onde escorria uma secreção viscosa de odor extremamente pútrido.

Na manhã de Natal a polícia já estava com um cerco armado ao redor da casa após a chamada dos próprios proprietários, para investigar um suposto crime de assassinato, pois os corpos de duas crianças haviam sido encontrados totalmente decepados, embrulhados em caixas de presentes sob o pinheiro de Natal. Após minuciosa perícia, por mais que não tenha sido encontrado digitais do suposto assassino, também não foi constatado sinais de arrombamento nas portas e janelas tornando o casal dono da casa os únicos possíveis suspeitos. Por fim, marido e esposa foram indiciados por homicídio pelo assassinato de forma brutal do próprio filho e do amigo.

No entanto, o que ninguém esperava é que daquele dia em diante nasceria uma tradição sinistra que condenaria a cidade a uma maldição perpétua com novos casos de homicídio com o mesmo padrão a se repetir ano após ano em pleno dia de Natal e cujo algoz seria praticamente impossível de ser detido, pois todos os indícios apontavam para um indivíduo que não pertencia mais ao mundo dos vivos.

4 de Novembro de 2022 às 23:42 16 Denunciar Insira Seguir história
9
Fim

Conheça o autor

Biana Vendramini Paulistana, amante da literatura e escritora contumaz desde 2015 dos gêneros fantasia, comédia, romance, drama, mas principalmente terror e suspense que são seus preferidos, almejando instigar leitores e fazer a diferença na literatura brasileira através de suas palavras.

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𝓘𝓼𝓪𝓫𝓮𝓵𝓵𝓮 𝓢𝓸𝓾𝔃𝓪 𝓸𝓯𝓬
𝓘𝓼𝓪𝓫𝓮𝓵𝓵𝓮 𝓢𝓸𝓾𝔃𝓪 𝓸𝓯𝓬
Capa 100% perfeita Descrição também História perfeita! Parabéns eu vou escrever um conto de natal inspirado no seu! Enquanto lia minhas pernas paralisaram sério! Até porquê eu sou curiosa e entraria nessa casa certeza!
December 05, 2022, 14:06

  • Biana Vendramini Biana Vendramini
    Olá e obrigada pelo comentário 😍 Fico muito feliz em saber que minha história servirá de inspiração para a sua ❤️ December 07, 2022, 23:57
Inkspired Brasil Inkspired Brasil
Oláa, Biana! Tudo assustador por aí? Por aqui, nossa… Ainda bem que não é Natal rsrsrsrs. Parabéns pela sua história! Gostamos muito de ler ela no desafio e conseguimos nos imaginar entrando nesse casarão junto com as crianças. Aliás, que personagens curiosos, né? Um sempre puxando o outro para encrencas… E que final assustador. Quando as maldições iniciam, sempre é bem aterrorizante e trazer isso para a história foi muito válido. Cidadezinhas pequenas, com poucos habitantes, sempre remetem a algo assustador e conseguiu trazer isso muito bem! Obrigada por ter participado do desafio. Espero que tenha gostado e que possamos te ver nos próximos!
November 14, 2022, 22:09

  • Biana Vendramini Biana Vendramini
    Olá e muito obrigada pelo comentário. Pois é, Natal está chegando e com ele muitas lendas urbanas que acontecem no Natal kkkkkkk O típico clichê das crianças que vão bisbilhotar no lugar errado, mas um clichê bem feito sempre é bem-vindo. E tragédias e maldições ocorridas em datas comemorativas sempre dão um toque de terror a mais na trama. Espero poder participar de mais desafios :) November 18, 2022, 01:49
CP Carol Proença
Confesso que fiquei com medo da história do de ver a capa ksksk eu adorei a ideia, o desenvolvimento da escrita e os detalhes. Você tem um grande futuro pela frente!
November 11, 2022, 01:00

  • Biana Vendramini Biana Vendramini
    Até minha mãe ficou com medo da capa kkkkkkkkk Obrigada pelo comentário, fico feliz que tenha gostado 😍 November 12, 2022, 03:09
Amanda Kraft Amanda Kraft
Seu conto retrata bem o perigo de se fazer justiça com as próprias mãos, embora, nesse caso, uma justiça merecida. Contudo, tais atos trazem consequências. Consequências essas bem exploradas por você. Parabéns. Um conto horripilante na medida certa.
November 10, 2022, 21:45

  • Biana Vendramini Biana Vendramini
    Obrigada pelo comentário, fico feliz que tenha gostado ❤ Me inspirei na história do Freddy Krueger na construção do meu conto. November 12, 2022, 03:08
Leticia Diniz Leticia Diniz
Me lembrou a infância quando vivia procurando fantasmas, que bom que não encontrei nenhum hahahaha. Gosto de histórias que criam tradições, todo ano alguém será escolhido, quem será o próximo?
November 08, 2022, 00:08

  • Biana Vendramini Biana Vendramini
    Fico feliz que tenha gostado :) Eu também adoro esses tipos de histórias ao estilo Sexta-feira 13 e A Hora do Pesadelo onde um padrão macabro de assassinato é decretado e ninguém está a salvo. É o velho ditado: Quem muito procura, uma hora acha. November 08, 2022, 01:08
Thays Diniz Thays Diniz
Adoro esses contos que literalmente ninguém é inocente até as crianças são bastantes cinzas nessa história. A mentalidade da cidadezinha é bem idade média, sinceramente nem despertou a compaixão elo seu futuro macabro. Amei a história arrasou como sempre.
November 06, 2022, 16:18

  • Biana Vendramini Biana Vendramini
    Você anda muito sombrio Mark, isso ae é característica de potencial a serial killer kkkkkkkkkk November 06, 2022, 19:20
Suzana Vieira Suzana Vieira
Adoro terror, principalmente o clássico, gostei muito de sua escrita, a mesma é bem corrida e fluida não nos desviando de modo algum da história, o que acho muito bom, os personagens, Caio e Diego, pode-se perceber que os dois são a típica dupla de medroso e obediente com um desobediente e pentelho, o que na minha opinião foi bem construído. Lhe desejo muita sorte e sucesso!
November 05, 2022, 23:59

  • Biana Vendramini Biana Vendramini
    Obrigada, fico feliz por ter gostado e pelo comentário, eu também gosto muito do terror trash e clássico e foi nele que me inspirei para esse conto. <3 November 06, 2022, 19:07
Wesley Deniel Wesley Deniel
Hummm... Uma ótima história no melhor estilo "Goosebumps". Crianças curiosas (e meio sádicas, por um deles comemorar a morte do bullying local, o finado Billy) sempre rendem um bom terror ! Adoro essa temática do Bad Santa (O Papai Noel Mau) e acho que você acertou no tom com esta, pois me remeteu muito clássicos como Silent Night, Deadly Night ou A hora do Pesadelo, com seu sinistro Freddy Krueger atormentando a galera – principalmente os que tem coragem de zombar do perigo. Parabéns ! Muito sucesso ! 🙂
November 05, 2022, 07:58

  • Biana Vendramini Biana Vendramini
    Obrigada pelo comentário e fico feliz que tenha gostado e que a história transmitiu a msg que eu queria, pois eu também adoro a temática de Papai Noel do mau e me inspirei justamente na história do Freddy Krueger para este meu conto. November 05, 2022, 17:44
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