Antón tinha acabado de chegar em casa, exausto como todos os dias desde que se mudou para Moscou na expectativa de realizar seu grande sonho: dançar em uma companhia de renome e se firmar no balé clássico; como já imaginado, os treinadores não pegavam leve, ainda mais com um estrangeiro que nem entendia o idioma. Ele jamais cogitou reclamar do tratamento recebido.
Estão preocupados, por isso são tão rude. Ditava para si todas as noites, quando pensamento de desistência reinava em sua mente.
Foi até a mesa de estudos e ligou o toca-fitas, pouco se importou com a música que iria ouvir; seu repertório se estendia apenas em clássica e poucas anos trinta aos cinquenta. Se jogou na cama e fechou os olhos esperando pelas primeiras notas do violino invadir seus ouvidos e acalmar sua mente perturbada.
Isso, no entanto, não foi o que aconteceu. Longos segundos de profundo silêncio invadiu o pequeno apartamento, mas logo foi substituído por uma risada. Se fosse para descrevê-la, Antón usaria a palavra diabólica, já que apenas ela fez o medo lhe dominar.
Se levantou, pronto para desligar o aparelho e jogar a fita com defeito fora, porém uma voz mansa o impediu ao começar a falar.
“Olá, meu querido Antón, como está? Acho que esta pergunta é um tanto contraditória, afinal eu sempre sei como está se sentindo. Estou lhe observando, e quando não posso, tenho quem o faça.
Não me ache estranho, só sou um homem apaixonado e por essa paixão estou sendo movido. Não vou dizer que estou fazendo coisas que jamais imaginei; você não é minha primeira vítima e dificilmente será a última.
Estou chegando perto de você, meu amor. No momento estou do outro lado da rua, mas logo irei atravessar, invadir o apartamento e lhe fazer meu; anseio por esse dia com toda minha alma. Estou louco para sentir a batida do seu coração acelerado pela epinefrina, assim como o pulsar do seu lindo pescoço contra minha mão, esta que está pronta para te estrangular.
Com essa bela declaração, acabo essa mensagem.
Até logo, meu querido. E não ouse fugir, pois eu saberei onde estará.”
Antón engoliu a seco e tomou coragem para chegar mais perto do aparelho.
Aquilo era só uma piada de seus colegas. Repetia para si ao longo da noite, e com esse pensamento foi para o mundo dos sonhos, local em que nada seria capaz de machucá-lo.
Infelizmente, ao fechar os olhos, não pode notar que ele já havia entrado.
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