Eu já fui padeiro. Nessa época morei em uma cidade onde predominava o sangue italiano, e um cara rico em melanina, como eu, tinha grandes problemas de adaptação. Era difícil fazer amigos naquela terra.
Já tinha meus 25 anos quando atendi pela primeira vez a Cristina. Ela tinha 19 anos, professora de matemática que ensinava equações e a fórmula de Bhaskara numa escola pública que ficava em frente à padaria.
- Me dá 5 pães, moço - comandava ela.
- Prontinho, embalados com todo carinho.
- Quanto é?
- Nada. Você pediu que eu desse, estou dando. É presente. Presentinho pra você.
- Ah moço, deixa de coisa - ela me pediu sem vontade.
- Deixar de coisa, como? - eu acrescentei já olhando com pecado - Eu quero é começar...
De inicio a professora levava na brincadeira. Tentei daqui, busquei de lá, procurei, insisti, joguei indiretas hoje, cedi mais uns pãezinhos amanhã, convidei agora, insisti depois, propus uma, propus duas, um dia...deu certo!
Marcamos um passeio à tarde. Estendemos até a tardezinha, que entrou à noite, que terminou depois do café da manhã. Que um mês depois foi um misto de risos e lágrimas. Ela estava grávida. Um deleite de histórias para aquela cidade preconceituosa. Uma tragédia para aquela família também cheia de preconceitos.
Conheci o pai de Cristina no 4° mês de gravidez. Ele me visitou na padaria, numa segunda de manhã, com uma bolsa marrom de couro que carregava a tiracolo.
- Negrinho, dentro dessa bolsa tem o seu salário de 2 anos. É um presente de despedida. Amanhã você vai embora pra nunca mais voltar, se ficar, até quarta eu te mato.
Ele saiu, deixou a bolsa e hoje eu estou aqui escrevendo essa história.
Obrigado pela leitura!
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