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A dele, a sua, a minha e a de todos nós



Atolados dos pés a cabeça, sobretudo a cabeça, estamos nós imersos no mais denso e profundo lamaçal de estupidez. A nossa própria arrogância nos empurrou para o abismo, selando a porta de saída com a prepotência, deixando-nos reféns de nossos soberbos pensamentos narcisistas. Não podemos ou não queremos enxergar a possibilidade viável de que cometemos erros? Assim como também não podemos negar, mesmo que quiséssemos, o terrível fato de que possuímos um corrosivo jeito de ser e viver, no entanto, não sabemos se o que enxergamos como veracidade de nossa personalidade, poderia assim ser considerado, de maneira a afirmar com extrema convicção aos olhos de todos.



O seu dedo veementemente apontado para salientar e validar o comportamento daquele que de alguma forma te incomoda e te deixa desconfortável, é somente um acusador e, voltados para si, estão três. Nós não nos vemos enquanto designamos um olhar reprovador e fulminante ao erro do outro. Não nos é permitido por nós mesmos, pensar no quanto podemos estar ferindo, magoando, enraivecendo aquela pessoa com palavras, atitudes e pensamentos, que para nós, parecem normais, simples, inofensivas. Sentamo-nos no confortável assento da hipocrisia, esquecendo deliberadamente de atitudes condenáveis que praticamos diariamente, para apontar com errônea propriedade, atos semelhantes aos nossos, que os outros fazem.


Enquanto nossas almas lutam para alcançar um estágio evoluído de compreensão e estabilidade, transcendendo nossa natureza egoísta, destrutiva e autoritária. Os nossos corpos se mostram pouco propensos a isso e somos constantemente estapeados na face, pelas verdades sobre quem de fato somos, quando o orgulho não está nos cegando. Falhamos porque podemos falhar e sofremos, fazemos sofrer, porque podemos, à medida que sentimos raiva e levamos outros a passar. Mesquinhos os machucamos, quando nos sentimos feridos por alguém, certas vezes nem sequer precisamos de tais desculpas. Nossa visão de universo, certo e errado, justo e injusto é ínfima, inverossímil.



Essa absurda ignorância a respeito da vida do outro é de tamanho descomunal. Você e eu não sabemos um do outro ou do próximo, o suficiente para entender ou assimilar atitudes, pensamentos, preferências, medos, gostos… O porquê disso? O porquê daquilo? Às vezes nós próprios não compreendemos o que se passa conosco, no coração, mente. A outra face da ignorância vem da negligência feita a razão. Você humilha, briga, julga, profere xingamentos, saindo de sua “razão”, atacando implacavelmente, se esquecendo de que essa não é melhor estratégia para alcançar um melhor resultado.



Estamos todos neste barco furado, nesse abismo, vivendo essa realidade. Custa-nos exclamar a plenos pulmões:


“— ME PERDOEM OS QUE FERI!”


“— ME DESCULPEM OS QUE OFENDI!”


O que nos falta, para ignorarmos nosso eu?


Ou para abolirmos nossa “verdade incontestável” e sanar de vez essa fome de razão o tempo todo?



Aprendemos desde pequenos a lutar por nossos próprios interesses. Ouvindo, vendo, reproduzindo as ações de todos ao nosso redor. Afinal, fomos jogados nessa selva, projetados para sobreviver por instinto e nos tornar reis de nosso território, vencendo qualquer oponente, seja de maneira correta ou nem tanto assim. Sinais subliminares são enviados a todo momento, de várias formas e com diversas intenções. Antes de sequer vir ao mundo, vencemos a guerra, para ter o direito de nascer, ser o primeiro, único. E então, sem possuir as armas mais eficazes e poderosas, usamos as que temos, apelando para o censo de justiça e bondade de quem é designado a nos manter vivos, saudáveis, capazes de no futuro sermos independentes. Eles nos mostram o caminho, nos ensinam como podem ou querem, a sua “fórmula de vitória”.


Surpreendentemente não tarda vir a tona todo potencial de perigo que nos cerca. Ainda na infância e adolescência nossas relações interpessoais revelam um provável caminho pelo qual dificilmente, não iremos caminhar. Conflitos se iniciam, promovendo nosso amadurecimento, exigindo um posicionamento a favor ou contra algum tipo de pensamento, filosofia, princípio ou desejo. Encurralados pelas circunstâncias, escolhemos um lado, somente um nos é permitido; esquerda ou direita, ignorância ou conhecimento, ficar estagnado, preso na caverna, ou evoluir e desvendar os mistérios da humanidade, provar, conquistar. E sendo assim, o que poderia qualificar a motivação de alguém como algo impróprio? A partir de qual ação se pode julgar como sendo uma pessoa ignorante em se tratando de conhecimento?


Incontestáveis. Nossos instintos primitivos de uma ignorância comportamental, violenta e arcaica, se mostram rebeldes, sempre que algo foge ao nosso controle. Demandando uma postura austera, madura e controlada, que muitos de nós em diferentes situações, por diversos motivos, não conseguimos demonstrar. Em dado momento, a realidade se esfrega em nossa cara, não deixando brecha para outras interpretações. Simples e objetiva, nos mostra as opções de obter o que nos é vital para superar certos limites que conduzem ao ostracismo velado.


A premissa de que somos criaturas solitárias, que necessitam da companhia de semelhantes para um melhor desempenho no teatro da vida, deixa-nos numa encruzilhada. Não obstante, ainda que viver em sociedade leve discrepância a nossa individualidade… Dói-nos exercer empatia mediante o próximo?


De certa maneira nossa memória é furtada, se buscamos motivos pelos quais sentimos afinidade pelo outro. Oras! Para que exercitar benevolência, em lugar de impiedade? Qual o sentido de promover provas contra si mesmo, assumindo seus erros, se podes inocentar-se e acusar o outro? Qual a vantagem em ajudar alguém que precisa, se não ganharia nada com isso? Devo me preocupar com o mal que minha incompreensão gera? Ou mesmo, com todas às vezes que agi com rispidez?


Afinal… O que ganhamos saindo de nossa adorável zona de conforto, para pensar e pesar nossas atitudes, pensamentos e certezas que primeiramente e unicamente, em muitos casos, só favorece a nós?


Obtemos o quê, além de um profundo bem-estar, por saber que fomos úteis para alguém, proporcionando uma melhora em sua realidade?


Ou mais o quê? Depois de uma confirmação de felicidade palpável, por sabermos ser o motivo de sorrisos alheios?



Para nós, contrariar essa natureza má e egoísta, buscando positividade, entrega e auto-afirmação, seja na forma do reconhecimento de que falhar é provável, mas entender, aceitar e tornar-se melhor, pode vir a ser a prova de que há bondade alcançável inclusa nesse receptáculo hostil, afrontoso e perverso que somos nós… Raça humana.



16 de Maio de 2021 às 23:55 5 Denunciar Insira Seguir história
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Fim

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J Carreir Apenas. . . “Escrevendo ideias impossíveis de ignorar” (⌒_⌒;)

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JM Joabe Mansk
Vivemos em um Mundo no qual a ignorância, a falta de empatia e amor, afetam nossa relação com o próximo e até com nós mesmos. Devemos nos lembrar de que, independente da religião, status social, raça, gênero... iremos ao pó. Não podemos nos esquecer que somos feitos de matéria orgânica (fato científico) e que uma hora iremos partir. Por isso, o Mundo já está uma “merda”, para que mais merda? Já dizia Mahatma Ghandi: “Olho por olho, uma hora acabamos todos cegos” e também disse Apóstolo Paulo: “Não te deixes vencer do mal, mas vence o mal com o bem”
July 03, 2023, 02:20
Max Rocha Max Rocha
A ironia é prima-irmã da amargura... e a forma mais cômoda de expiar a própria culpa é atribuí-la a terceiros. Somos todos humanos, imperfeitos e injustos para com o próximo. Uns mais do que outros porém. Texto sábio e reflexivo. Abraços do Fantasma.
May 19, 2021, 14:05

  • J Carreir J Carreir
    Olá ^^ Obrigada pelo comentário! De fato. Somos todos hipócritas em certos momentos de nossas vidas, mesmo sem sequer o perceber ( nesses casos é menos pior rs ) Já que, os que fazem conscientemente sofrem de sérios distúrbios. Narcisismo, sociopatia e psicopatia são só algumas das definições. Embora tenhamos partes boas e ruins, como Yin/Yang, em algum momento escolhemos um lado que irá predominar e temos que torcer tanto por nós, quanto pelos outros, para que o lado bom se sobressaia e venhamos a agir de acordo com ele. May 19, 2021, 14:39
Estella Monteiro Estella Monteiro
Só Deus sabe como é difícil tentar enxergar pelos olhos dos outros e ver suas razões, ainda mais quando estamos envenenados pela raiva causada por uma discordância. Admiro quem reconhece sua parcela de culpa, busca autoconhecimento e entendimento e entender o lado do outro, mas se o outro não fizer o mesmo, só nos resta ter pena. Muito bem escrito, palavras bem colocadas e mensagem forte. Parabéns.
May 18, 2021, 12:08

  • J Carreir J Carreir
    Obrigada^^ Realmente é uma tarefa dificílima, que demanda muito altruísmo, este que muitos nao tem. São pesos e medidas, mas como bem sabemos nossa raça ( humana ) é má e egoísta por natureza, nao sendo confortável abdicar de nossa adorada razão, nao fazemos questão de nos por no lugar do outro. Infelizmente, nao é tão normal encontrar quem o faça, mas vamos torcer para que isso mude, o quanto antes... Bjs ~(^з^)-♡ May 18, 2021, 14:07
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