Assim é eu e tu. Eu leio, tu me lê. Tu escreve o que eu não leio E me fazes um buquê. Eu escrevo no meu seio Com a tinta que me amas. Pois o verbo amar não veio Plantar as mesmas chamas. Fogo e papel não se dão. Por isso as letras inda ardem E as flores enchem o chão. Nossos gestos são discretos. Pois o amor é semente miúda Que amolece pedras e desertos. Já vimos árvores frondosas Tombarem arriadas de amor; Inícios cheios de rosas Queimarem com estridor. Nosso enredo continua.

Depois de os amigos muito insistirem, lá estava Oligofanto, em um banco afastado da multidão. Era um evento público e todos haviam comparecido. Mas Oligofanto não estava lá. Um menino se aproxima e pergunta: "Por que você não queria vir?" "Não vim" "Você está aqui" "A consciência que eles têm da minha presença, sim. Mas eu, não. "Por quê?" "Tenho medo do mar." "Não estamos no mar. Estamos no meio de uma multidão. "Tente alcançá-los" O garoto toca em outro que passava. Oligofanto diz:

Eu sonhei que fazia um barquinho de papel e punha amigos, também de papel, para navegarem comigo. Nos divertimos à beça, até que alguns deles me feriram. Corte de papel é um dos piores. Então, como no país do Sonho as únicas linguagens são o riso e o pranto, eu chorei. Os bonequinhos se molharam e pesaram o barco, que acabou afundando. Quem foi o culpado? Eu? Os bonequinhos? O barco? A culpa foi do Sonho. Se fosse realidade, não teria acontecido.

Não se enganem ao me ouvirem gargalhar. Pois a tristeza do mundo jamais me engana, nem mesmo com sorrisos. É uma tristeza que está impregnada em tudo. Quem chora muito costuma ter vista boa; não há colírio melhor. Minhas lágrimas são meu modo de rir quando estou sozinho; ao passo que meu sorriso são as lágrimas que eu posso mostrar ao público.

A fulana pede para a outra uma foto do óculos desta, pois queria comprar um modelo igual; A ciclana pede uma comida igual a da outra, pois queria sentir o mesmo prazer; A beltrana compra uma roupa igual a da pessoinha do lado, porque, como aquela argumenta: "quero ficar bonita igual a ela." Sinceramente, tem gente que não é capaz de compreender que o sorriso que saiu na minha cara veio de dentro de mim, não foi comprado. E quantos não precisam fazer uma viagem pra dentro de si, a fim de

Quem, dos mais de oito bilhões de seres humanos deste planetinha, não espera e deseja que seus momentos felizes se repitam? Atirem-me pedras! Mas atirem as grandes, para que eu acorde dos meus devaneios constantes, ou durma pra sempre em um deles. É duro ter que aceitar que a felicidade não são pedaços, migalhas ou fatias de uma receita onde os ingredientes bons estão distribuídos irregularmente. Cansei, sabe! Vida é surpresa, é novidade. Ficar sonhando com sucessivos momentos de prazer e que

Arre! Estou farto de promessas das religiões. Paraíso, céu, nirvana. Será que a vida deixará de ser vida por causa de uma época? Vivamos a vida! Quem vive tempo é ponteiro de relógio. Eu passei a viver no instante que vim ao mundo. Será que Deus programou os horários da natureza errados? Se estou vivo nessa hora, então minha vida é agora. Minha vida não é um futuro. Me contento apenas com um PRESENTE.

Magnífico desfile dos púbis purpurinados com o pólen do cio! Está chegando a festa do palhaço, na qual o maior mascarado é o próprio carnaval, que, descaradamente, revela a todos a futilidade, a maior e mais camuflável de todas as máscaras.

 “Yhuri entra na casa, decora o olhar com os quadros da parede, e afirma: “Deve ser bom ser artista!” Minhas palavras estancaram na boca, esperando ocasião mais oportuna. Yhuri passa em frente de casa e me vê chorando na porta. “Por que você está chorando?” “Esse é o preço de ser artista. Tenho tanta arte na alma, que ela transborda de meus dedos e olhos, tocando e enchendo tudo à minha volta: minha poesia, meus desenhos e as pessoas que não tem o coração furado.”

Literatura não trata-se meramente de um tiroteio de palavras bem escolhidas, senão de sentimentos bem escolhidos. As palavras servem apenas para dar som aos sentimentos, mas elas nunca devem sensacionar primeiro ou mais que eles.

As mulheres estão feridas. Ah, não, mas não todas. Apenas aquelas que tem todo e SOMENTE o verdadeiro valor da fertilidade para mostrar. Estão por toda a parte, tentando cobrir as feridas com curativos. E andam por aí com band-aids em volta dos quadris e seios. Mas, apesar de serem curativos ENORMES, parece que não é o suficiente para cobrir a ferida que lhes infligiram no pudor: ele foi dilacerado. Pobrezinhas, de esparadrapos no corpo! Há band-aid para todos os gostos, principalmente os maus.

Existimos apenas segundos por vez. Pra que pensar tanto no que será? Talvez nem seja. Pra pensar no que foi? Existimos agora, somente o curto instante de agora. Um segundo antes já se torna passado. Um segundo além já é futuro. No presente não há muito o que pensar. Basta viver e pensar o milésimo de segundo do presente instante. O que fomos pode ter sido longo. O que seremos poderá ser mais longo ainda. Mas o que somos é muito breve.

Perguntam para saber se sou feliz: O quanto tu és maduro e adulto? Eu digo para mostrar que és infeliz: Felicidade é medida pela infância. Tal pergunta chega a ser insulto. Adulto é triste. Feliz é minha criança.

Se quer fazer uma coisa que não seja do meu jeito, não conte comigo. Se é pra ser sem meu jeito, também será sem meu pé, sem minha mão, sem meu tempo, meus olhos e coração.

Sentimentos são do coração o trilho Que o destino tecem em cada pegada. Se as pegadas do pai não se juntam ao filho A sina se perderá no decorrer da estrada.

Estava vendo q artistas não vendem sua arte... Todas essas verdades são realmente tristes. Mas eu penso que artista produz para artista. Arte nunca foi e nunca será capitalismo. É a necessidade das almas raras. Se todo o mundo fosse artista, não haveria nada de especial em você ser você. O Artista é a exceção, o louco, o escândalo, a contradição, a fuga da regra. Vender? Tudo bem, precisamos de dinheiro para sobreviver. Mas, infelizmente, em um mundo de cegos o que vende é óculos.

Se quer me tocar profundamente, roce de leve; se quer que meu olhar se desvie, basta um cintilar puro e transparente, porém genuíno; se quer chamar minha inteira atenção, fique paradinho e apenas desabroche o que você tem de mais verdadeiro; se quer me conquistar, só é preciso o mínimo gesto do melhor que há em você; mas se quer me impressionar, mostre-me toda a sutileza da avassaladora sinceridade e a potência da desvalorizada sensibilidade.

Sou criança Mas não sei chorar Sou criança Mas não sei rir Sou criança E não sei brincar Brincar na leveza De tudo fluir Não sou adulto Mas sei chorar Não sou adulto Mas vivo a sorrir Não sou adulto E só sei brincar A brincadeira séria De chorar rindo A tristeza de existir.

Escute, poeta amigo: Tem gente que é tão triste, tão infeliz e pobre, Sinceramente eu te digo, Que a última vez que riste, Pesaroso, tu descobre, Que o sorriso é abrigo Do que a tristeza consiste. Não há choro que sobre Nem alegria falsa contigo Disfarçando que contriste. Cresça o riso e dobre Até fartar mais um mendigo Do vazio em que persiste. Tanta diversão só encobre Um poço sem fim no umbigo. Há risos que choram mais triste. *"Vocábulo de sangue", Canto V

"Viu a nova música da sua cantora preferida?" "Sim." "O que achou?" "Triste. É bom para ouvir quando se estiver em uma bad." "Como assim? Quando se está triste, tem que ouvir música alegre." "E quando se estiver alegre, tem que ouvir música triste?"

Ela é luz de som, É divina energia; A vibração no tom Da hereditária magia. Tu, eleito da arte, Sabes do que falo. Nada pode apagar-te Ou sequer sufocá-lo. Levas dentro do peito Outro universo invisível. Por meio dele, satisfeito, Vives outra vida incrível. O poema completo está no capítulo V de Vocábulo de sangue.

SAZÕES DA PLENITUDE Não caio de tristeza, Nem pulo de alegria, Não morro de amor, Tampouco de euforia. Rio e sangro Como toda a gente. Mas choro e sinto De modo que ninguém sente. Minha dor é o vento Que traz a melancolia Vinda do fim do mundo E choveu enquanto eu ria. Deixo rolar o rio; Bóio nele indiferente. O pranto que derramo É pra dar força à corrente. Se o dia é sol,  Se a noite é treva, Torno-me mais um SE Que o acaso leva. * Vocábulo de sangue, cap. V

Fogo a queimar dentro Outro fogo insano; Chama do momento Divino e humano. Essa chama acende, Ilumina e aquece; É a via que se estende Quando o coração padece. Arda sempre a luz Que a arte em nós fustiga! Seja ela a cruz E a bendita amiga! Pois o mundo anda frio, Seco e sem cor. Sejamos pois o rio A lhe encher de amor. Façam fluir a poesia Na pira de cada peito, Para arder todo dia O sentimento eleito. Sejam da arte a candeia, A torrente que acalma, A luz que incendeia De arte a nossa alma!

Tendo um pedacinho de chão vestido de verde, não peço mais nada. Com a sombra das árvores no coração Tenho noite, manhã e madrugada. Só quero de musgo coberto o vão Onde meus pés nus se firmam, Decorando meu modesto salão. Quero as belas jóias que rimam Com a natureza do coração. Quero o báculo, o pixídio e a noz. São meu tesouro e a diversão Que selo no peito a sete nós. Quero o cheiro da estação Que eterniza meu viver; As sete estações que são As texturas do meu ser.

Se você calar tudo por dentro, será capaz de ouvir as vozes da floresta. As árvores guardam memórias antigas, tão antigas quanto a terra em cujos corações estão enraizadas. Porque tuas raízes se enlaçam com as delas. Vocês estão conectados e carregam a mesma seiva.

Completamente relaxada na cadeira, Ebony exclama: "Tu fez um paraíso, aqui!" "Pode vir sempre que der vontade. Meu jardim está aberto a todos que sabem apreciar as flores." "Eu posso dar uma volta nele sozinha?" "Claro. Vou até fechar a porta dos fundos, para você chorar à vontade." "Como advinhou que era isso que eu ia fazer?" "Porque eu mesmo faço isso, quando quero regar o lado de dentro do jardim."

É por volta de setembro, Vinte e um ou vinte e dois, Que aqui em Teresina Orbitam cinco sois. É quando vem a primavera Que o caboclo pena. Há sol no céu; Há sol no chão; Há o sol dos ipês; Mas há o que queima o juízo E o que aquece o coração. Começa em setemBRO; Pula para outuBRO; E corre para novemBRO; Terminando em dezemBRO. Esse são os quatro sóis; Nosso B-R-O-BRÓ. Porque já em agosto O sol primeiro não tem dó. E o caboclo diz com desgosto: "Setembro nem chegou E já tá esse calor"

Ah, meu sonho, meu sonho azul! E dourado e verde e branco, Cresce e toma conta de mim Floresce nesse meu flanco Me transformando em jardim! #trecho de um poema. O texto completo está no capítulo IV de "Vocábulo de sangue"

Há muitos que se embriagam. Eu, eu me embriago de poesia Da arte que as tristezas águam Na simplicidade que inebria.

O coleguinha de dezenove anos, rostinho de boneca de cera e desenhado com a ponta afiada da sensualidade, se reclama: "Ainda solteiro" "Porque quer", digo-lhe. "Ninguém me quer" "Ou você não quer ninguém. Enquanto tiver medo de levar um fora, vai ficar nessa. Teu valor não se mede com régua alheia." "Não vou me humilhar pra quem não me valoriza" "Se seu orgulho vale mais que sua felicidade, então já tem tudo o que precisa"

No tempo da minha avó, as pessoas paravam por causas naturais, o curso comum do universo. Uma chuva, por exemplo, obrigava a maioria a entrar nas casas. Os meninos deixavam as brincadeiras ao ar livre e voltavam-se a jogos de tabuleiros; os velhos, dispunham-se a contar histórias. No fundo, nada parava. Mas, hoje. Hoje tudo já está parado. E qual seria a data de hoje? Qual a data destes tempos? Não há data. Não há tempo. Tempo é algo que não existe, nos dias que se chamam hoje.

Você tem pensamentos negativos? Quem não? Nunca os externe! Não os profira em voz alta, nem em voz baixa. Senão, eles ganham vida, abrem asas e voam, indo pousar nos galhos da realidade. Subsequentemente, conhecem um par, se unem e partem para a terra de origem, cujos ovos serão chocados em sua cabeça e cujos filhotes hão de se alimentar do seu coração.

Foi no mês de outono Que um anjo veio a mim Com beijos nas asas Voando no meu sono. Na inocência chegaste! Na inocência partiste! No sopro das tuas plumas Voei nos beijos que deixaste. *esse e outros poemas estão compilados em "Vocábulo de sangue"

Sou daqueles que vivem devaneando, no mundo da lua. Olho uma foto e parece que estou mais na foto do que em mim. Sabe...? Aquelas fotos antigas de interiores com decoração palaciana... Sinto o ambiente da imaginação, inalo seu perfume, ouço seus ruídos mais sutis, o som de meus dedos roçando a tapeçaria, o brando e gostoso calor do feixe de luz perfurando a gaze fina de poeira e me abraçando. Tudo o que imagino, pra mim sempre é tão real, que quando se torna real parece uma fantasia.

A vida é um belo passeio Por um imenso jardim, Com a cova de outros no meio E a sua esperando no fim. Uma bagatelazinha😁

Eu tenho uma lembrança com minha avó que remonta aos meus doze anos. Já na época, eu era observador e cismado com as coisas e o mundo. Minha avó tinha um filho adotado gay. Eu e meus primos o considerávamos tio como os demais. Certa vez eu cheguei para minha avó e indaguei: "Por que a senhora adotou ele? Por que o ama?" Ela disse: "Porque 'eles' não são amados". Aquilo me marcou para sempre. Cresci admirando a coragem 'deles' e ao mesmo tempo tendo pena. Quem tem muito para gastar, investe alto.

Amigo não é aquele sopro esporádico e social que de vez em quando esvoaça os cabelos da necessidade ou faz cócegas nos ouvidos da fofoca. Amigo é quem passa por nós, deixando um pedaço do próprio coração e levando um pedaço do nosso. É emprestar mutuamente esse transplante cardíaco e compor nosso todo.

Não pude deixar de refletir que, embora há quem leia assiduamente, suas cognições são insipientes, pífias, irrisórias. Desculpa! Não usei essas palavras para me exibir. Usei para não usar outras, como deploráveis, patéticas ou pobres. Porque, realmente muitos desenvolvem o lado objetivo e concreto do cérebro, porém, o lado subjetivo, cognitivo e abstrato é tão paupérrimo, que chega a parecer que nem têm. Leem, leem, leem e morrem nas páginas.

Sou intenso. Porém, intensamente suave. Gosto de sutilezas. Até quando cheiro e toco uma flor é tímidamente. Gosto de pensar que sou apenas um silfo, um espírito voejando perto delas. E quando a beijo, é mais um adeus do que uma saudação. Levemente, então, desprende-se a fantasia de um beijo, como uma poesia escrita entre meus lábios e a superfície das pétalas.

O amor às vezes nos faz sangrar Mas é o sangue que nos faz fluir. O importante é não parar de sentir. Que de sentimentos se enche o mar. Escrever, compor, pintar e esculpir. Servimos de lenha para a arte queimar Nesse incêndio gostoso de amar, Queimando até o coração se partir.

Não amamos as pessoas porque são do jeito que gostaríamos que fossem. Pelo contrário, amamos mesmo que elas sejam aquilo que não gostaríamos que fossem. E é isso que prova o amor de verdade, porque é pra isso que ele existe.

Eu escrevo porque o vazio existe e a minha alma está incompleta. No silêncio sou alegre; no barulho, triste. Sou humano e divino. Sou poeta.

Mais doloroso é quando ficamos tristes por sermos tão sensíveis a ponto de nos apegar a um poema e sentirmos dor por não ter mais que o breve vôo dos versos em nossa tela. Ter pessoas de verdade, paupáveis; sentir seus corações e existir junto com elas, se tornou quase tão raro como um conto de fadas. Elas passam por nós apenas como meras palavras, reflexões de um coração ferido, muitas vezes sozinho, que só precisa de um amigo para juntar folhas secas em um parque num fim de tarde.

Você poderia ter um dos melhores, senão o melhor, amigo de sua vida. Teria um pai, um irmão e um companheiro, tudo em um só. Mas você é covarde e prefere viver através de uma máscara. Quando a pessoa se esconde, ela nega a todos que a amam a chance de mostrar ao mundo a verdadeira pessoa que você é. Mas se continuar oculto pelo personagem que você mesmo inventou, você nunca saberá o que é ser amado e o que é viver. Porque delegou isso ao seu avatar. Você não passa de um mero fantasma acuado.

Leram correto o título. Mas essa, diferente da outra pandemia, é aceita com orgulho e propagada sem medidas de precaução. Não há vacina para ela; nem se quisessem. Ela é dispersada pelas mãos estéreis; cresce nas cabeças ocas; e produz o fruto podre da superficialidade. É incrível como as massas são facilmente contagiadas. Bastou um submarino afundar perto ao Titanic, pra todo mundo, enfim, começar a pensar na brevidade da vida. O cérebro do mundo age como manada. Aonde a vaca vai, vai o boi.

Cheiro não há melhor que o de livros puídos, Em estantes escuras e velhas guardados, Com o perfume do coração de tempos diluídos, E o hálito e beijos das traças nas páginas selados.

Depois de assistir a "Ladies in lavender", a sensação que fica é de impotência; monótono, mas universalmente tocante. Faz-nos refletir, no mínimo. No máximo, nos assalta com a verdade inescapável: não envelhecemos por dentro. Embora venha a fraqueza dos ossos e juntas, as rugas e a flacidez, a paixão continua acesa, viva, ardendo no peito como outrora. Olhar um rosto jovem e apaixonante através das órbitas de uma casca idosa deve ser aterradoramente frio e torturante...

E pensamos conosco: se eu tivesse de volta meus vinte anos, talvez eu pudesse me aproximar, tocar sua face e, quem sabe, ser correspondido e até ganhar um beijo de amor. Sim. Ele arde. Arde violentamente com uma madeira que jamais se consome, mas que está cercado de paredões incomensuráveis de gelo; uma singela labareda inextinguível sob as sombras severas, frias e implacáveis da velhice.

Já não existe mais amor. O tesão tomou conta de tudo. No fim das contas, descobrimos que os que ainda amam são as crianças, sejam as que estão sem a casca da vida adulta, sejam as que estão presas dentro dela. De volta ao meu sonho! É sempre o sonho e sonho eterno. De volta à solidão, à ausência de corações estéreis de sentimentos, secos de amor. De volta à companhia, à companhia das presenças consistentes, de coisas mais palpáveis que a fantasia.

Ser Humano é uma coisa realmente muito complicada. Sabia? Porque às vezes podemos nos sentir como um Nada, um grão de areia, uma partícula de pó; e, em contrapartida, nos sentirmos Tudo, tudo em um só momento, todas as vidas ao mesmo tempo. É como eu imagino Ser Pai.

Não há resultado melhor que o processo. Pois, pra mim, o resultado nada mais é que a junção de cada etapa, de todos os processos. Portanto, se você não aproveitar cada etapa, seu resultado não será completo.

Se me interrogassem o que o terceiro movimento da nona sinfonia de Beethoven me faz sentir, talvez a maioria esperasse ouvir "Tristeza". Mas não, tristeza não. Eis o porquê. Essa melodia é muito semelhante às ondas do mar, que rugem, e ondeiam, e escrespam e rebentam, sem nunca passarem da praia. A diferença é que a música não tem nada de revoltosa. Ela é o perfeito som do conformismo. Como disse Cecilia Meireles: "vivendo de nunca chegar a ser."

Ela é a brisa fraca em uma estação fria; tão suave que não tremula sequer a roupa da vegetação, porém, mesmo débil, faz agitar os pensamentos das folhas. Nada de Alegria; Nada de Tristeza; Nada de bom; Nada de mal. Nada. Só Nada. Ela é a voz do "Desisto! Que os ventos me levem aonde quiserem. Estou entregue ao fluxo inexorável do tempo, e cansei de lutar contra as suas correntes. Ela é o silêncio de todas as outras vozes, aos pés da qual tudo se calará, restando apenas o Nada, o Nulo, o Vazio.

Um colega chega indignado. "O que foi, pessoa?"indago. "Veja!", diz ele mostrando-me no celular uma conta do Instagran. E diz:"Como pode uma criatura dessas ter esse monte de seguidores? O que tem pra ver aqui? Com indiferença e humor, digo: "Simplesmente a porcentagem de coliformes no mundo está cada vez maior que os de bom-senso e amor próprio. Hoje eles aplaudem a quantidade de coliformes, a forma dos coliformes, e até o som que os coliformes fazem ao bater na água de suas cabeças.

Será que devemos fazer tudo o que der vontade? Eu, por exemplo, já tive vontade de matar alguns. Mas isso não envolve mais o meu querer, pois invade o querer do outro, ou nesse caso o não querer morrer. Mas há desejos que DEVEM existir concretos, não só pensados. Viver à sombra do desejo de outros é se matar pra si. Não queira uma fama de mentira, um existir de agradar. Vive teu desejo! sem matar outros e antes que te mate. Não exista ideal, mas real, mesmo que invisível. Exista! como você é.

Vejo dois jovens no meio do grupo. Um queria mostrar trejeitos de gay, sem ser; o outro trejeitos de macho, além de si. Mas ambos iam mal na atuação. O que queria parecer gay, tinha jeito de macho; o de macho escondia desejo de gay. Cheguei para os dois e disse: "Eu estou percebendo o que tentam esconder" "Esconder? Esconder o quê?", perguntam, pegos de surpresa. Com pessimismo, apenas digo: "Nada, nadinha, só nada, De um nada como sempre só, Que faz rir à gargalhada, De uma ilusão de dar dó."

Sempre que alguém nos faz algum mal ou nós mesmos fazemos a alguém, é bom lembrar que os adultos de hoje são as crianças traumatizadas de ontem. Ajuda a perdoar os outros e até a nós.

Ao chegar, percebemos como é vão Queimar todo o Eu em fogo indolor Por uma estação que logo passa. Mas Cruz e Sousa é ódio e amor, Gozo e agonia, glória e desgraça, Para tu, que a chama eterna amas. Cruz e Sousa reúne todos os eus Do universo de emoções humanas. Ele é dor, sonho, demônio e Deus Lidos em gritos e rimas soberanas.

Lê Vinícius de Moraes? Excitante! São faíscas de corações em brasas. Lê-lo é rejuvenescer por um instante; É voar ao sol e incendiar as asas. Mas meu tempo de moço já passou. Vinicius é poesia pra uns momentos. Momentos de paixão que já não sou. Quando vemos a juventude a lentos Passos cedendo às raízes da velhice, Paixões são folhas secas ao chão Murchando nos períodos da tolice.

O olho do mundo está sem lente e mais se atola na imundície, com sua tendência míope e rasa. A voz do mundo está sem dente para que a língua não se partisse e parasse de lamber o ego em brasa. Embora eu não seja atraente sou tão arte que na superfície ela transparece e extravasa. Mas se gabar disso é indecente pra que seu despeito não se ferisse com as plumas de minha asa.

O repórter faz um teste, perguntando aos brasileiros: "Qual o continente onde o Brasil fica?" Respondem: "É América? Não. Acho que é outro." E, assim, se repetem as respostas. Uma mais absurda que a outra. Deus amado! Daqui há uns dias, vão perguntar: "Em qual corpo você mora?" E vão responder: "No celular?"

Não gosto de pessoas. Detesto pessoas. Mas tenho que admitir que há uma única coisa nelas que as tornam interessantes pra mim: elas são misteriosas, enigmáticas. Pessoas tentam o tempo todo aparentar o que elas não são. Mas de vez em quando, deixam escapar traços sutis de coisas que não condizem com o que elas tentam aparentar. E eu acho isso muuuuuito instigante. É 'instigantérrimo'.

Nunca gostei de seminários. Eles me davam a sensação de estar sendo inalado. Parecia-me que as pessoas tornavam-se rostos gigantes e caricatos, sugando pelos olhos indiferentes ou gulosos a energia vital contida em minhas palavras. O objetivo era entrar neles. Mas eu sentia o contrário: serem absolutamente eles através de mim e anulando meu eu.

A frase do informativo dizia: "Como você saber quem foi em uma vida passada?" Imbecil! Pronto. Resposta automática. Se no passado já era isso, imagina agora, com efeito cumulativo... O que não deve ser? Deveriam se preocupar com o que são. Ou melhor, com o que desejam ser.

Já tentei enturmar-me tanto com a chamada realidade, que o que obtive preencheria tranquilamente toda uma ficção louca e absurda de pesadelos. Essas coisas reais não se mostraram mais convincentes que a imaginação. Ela, com seus trajes suntuosos me agasalham, e, mesmo roçando de leve, me tocam muito mais a pele do concreto que qualquer das ditas 'realidades da vida'. O real externo é paupérrimo. Não gasto meu tostão nisso. Por isso, deixei de viver fora de mim. Cá dentro, é que faço-me real.

Sabe o que eu tenho notado? Alguns artistas célebres, como Mahler e Olavo Bilac criam e defendiam que a elevação da humanidade só se daria por meio da intervenção feminina. Até o próprio Jesus deu privilégios às mulheres que nenhum outro discípulo teve. Já notaram que quando a liderança é feita só por mulas machistas o resultado é só excremento? O mundo precisa do feminino, do etéreo, do inefável, do subjetivo, do poético. São as flores que encantam. Os bois e jumentos só adubam e aram a terra.

O poeta é aquele que profetiza através dos sentimentos o que o intelecto não é capaz de perceber.

A velhice é uma festa de período indefinido, na qual as doenças se reúnem aos poucos para tomar o vinho das lágrimas sobre o nosso féretro. Os convidados costumam chegar aos quarenta. Daí, não para mais. É a multiplicação do vinho que acontece quase de modo imperceptível.

A menina comia o biscoito metodicamente, seguindo um padrão na disposição das mordidas. Digo para a mãe dela: _ Sua filha é metódica. _ Sim. Mas isso não é bom. _ Como não? Isso mostra que ela tem senso de ordem e simetria. _ Não. Isso é coisa de gente anormal. _ E ela puxou a quem? Tu é assim? _ Nã. Eu sou normal.Tu fala isso porque nunca foi ao psiquiatra. _ Você já foi? _ Já. _ Então quem está na posição de anormal de nós três? Mais uma que não se conhece. É preciso outra para lhe mostrar.

Falo às outras sensações viventes fora de mim. Alguém aí sentiu a mudança de estação no ar? O cheiro do outono é inconfundível e nostálgico. Ele me passa a impressão de estarmos imersos em uma lembrança perene, vendo o tempo todo fantasias na idade das coisas, desde o hálito terroso do húmus ao brilho sonâmbulo das horas; até a própria textura dos objetos parece despertar sombras de histórias envelhecidas.

Sempre questionei o porquê de tantas instituições educacionais. É curso escolar; curso acadêmico; e curso regilioso. Mas para quê, se nunca vemos a prática de toda essa instrução? Crianças vão às escolas para aprender pornografia, deliquência, ou a serem youtubers, influencers... Influenciar outras mentes débeis. Ensina-se tudo nessas escolas, menos a si mesmos. As pessoas têm medo de si, de ficarem sós com os próprios sentimentos. Aprendem e ensinam tudo. Mas não se ensinam e não se aprendem.

Postei um vídeo de um dançarino de ballet. O cabeleireiro estranha e pergunta: _ Vixe! Tu é gay? _ O que tem a ver uma coisa com a outra? _ Esse cara todo efeminado. Essas musiquinhas de barbie. Sei não... Ultimamente tenho me sentido mais burro que a cota comum aos homens. O problema é que meu cabelo cresce rápido demais.

"Você não se importa com ninguém. Só ama a si mesmo." "Só posso dispensar aos outros o que o meu Eu tiver aprendido com ele próprio. Daí, eu compartilho com as pessoas fora de mim também."

A 'musga'(recuso-me a chamar de música) só repetia "soca, soca, soca". A repetição deveria mesmo socar algo na cabeça de quem compôs e de quem ouve. Mas pudera! Com a falta de neurônios corroídos pela canabis sativa, não é difícil imaginar os neurônios caçando conexões novas, e, por falta, ficam indo e voltando com as mesmas notas, o mesmo refrão, refletindo essa miséria moral e intelectual, não só da cabeça, mas, principalmente, do coração.

"Solte o pássaro", aconselha Ana. "Mas eu gosto dele. Por isso o quero perto de mim", responde a amiga. "Ele não está perto de você" "Como não?" "Sentimentos habitam corações. E o dele está bem longe daqui. Está nas matas, nos vales e nas montanhas. Pois é isso o que ele ama: a liberdade. "Eu amo ele" "É por isso que seu coração está enjaulado, porque você ama o cativeiro.

Há mais valor e beleza na raíz do orabutã do que deixam aparentar sua seiva sangrada e suas flores carnavalescas; e mais tessitura neuronial em seus frutos do que a analogia da esfera oca na ponta da chuteira.  Brasil não deve ser a floresta pornográfica pintada por mãos estranhas e aprendidas por sem/mentes. Somos um mosaico.Mas podemos exibir uma imagem mais digna do luxo de nossa terra.Leiguice não é cultura;modéstia não é pobreza;erotismo não é naturalidade;valor é essência, não alegoria.

A língua vulgar sai de várias bocas, mas é sempre a mesma. Pois quando não evacua do átrio de cima, fala pelo átrio de baixo. Depois de declamar o poema "Divina comédia", de Antero de Quental., alguém ousa comentar: _Quer dizer que você defende que Deus é apenas uma invenção? _ desenbesta a língua vulgar a expressar sua tola opinião. Nessas horas, convêm-nos apenas dizer-lhe: _ Eu queria somente ler o poema. Deixa os teus resíduos fisiológicos dentro da cabeça. É o lugar deles. Deixa! Deixa!

Em qualquer casa que eu venha a morar, serei nela apenas um fantasma vagando. Nenhuma estará à altura de minha vivenda. Meu verdadeiro lar é cá dentro, onde residem minhas histórias, minhas poesias e refleções. É nelas que eu moro; é nelas que estou vivo. O Eu de fora é apenas uma sombra projetada pelo verdadeiro habitante.

Se uns de meus escritos Lhes incomodam e ferem, Os dons que nos diferem Atestará os espíritos. Pois com dedo e língua Vós só produzis veneno. Eu vou criando, sereno, O que vos leva à míngua. Irão morrer me vendo Continuar rimando. E quero ver queimando Antes de ver morrendo.

Por que amo o passado? Eis um excelente porquê. Talvez não seja exatamente o passado que amamos. Eu mesmo, se pudesse, não ousaria voltar no tempo. Dizem que andar para trás dá azar. Nem tanto por isso. A vida é a mais fresca e intensa das sensações; ruminar o que já foi provado é desespero. Não amo o passado. Amo as coisas que passaram no teste de qualidade e ficaram cristalizadas em um momento eterno. Eu apenas transformo o cristal em um colar para combinar com as novas roupas.

Quem se transborda no próprio abraço, não busca se trancar em outros corações. Quem precisa da aceitação de outros, das duas uma: ou o vazio é grande demais para preencher, ou o conteúdo é insignificante.

A natureza é perfeita e fonte da mais genuína inspiração. Sua simetria está presente em tudo no universo; desde os pólos do planeta aos dois hemisférios do cérebro humano. Até mesmo no que diz ao subjetivo e abstrato, é posível ver esse equilíbrio. Um exemplo disso é o racional e o emocional. Inteligência sem sentimento é defeituoso, assim como o inverso também. Então, ao ler um poema, um conto, a bíblia ou até mesmo um texto acadêmico, ponha o raciocínio para sentir e o coração para pensar.

Circunstâncias extraordinárias geram coisas extraordinárias. Isso já foi dito várias vezes. Afinal, é a solitude e a alta pressão que determina a forja dos diamantes, em vez de pedras comuns. O segredo não está em resistir à pressão, mas em convertê-la em transparência. Irradiá-la na forma de luz. Pois se você a guarda, tudo o que se acumular em você serão trevas. E o que se acumula e abafa, apodrece. Como disse Cruz e Sousa, o Diamante Negro: "é preciso sentir a tua dor; ser a tua dor". Sinta!

Caio manda uma mensagem a Oliver: _Você parece irradiar poesia do sangue, do suor, da saliva. Tu deve ter uma personalidade forte. Oliver diz: _Intragável. Não tenho amigos humanos. Invejado, mal julgado e criticado. Mas apesar do sentimento que as pessoas me dispensam, eu sinto o contrário por mim mesmo. Eu me amo. Tanto, que no fim de minha vida eu poderei olhar pra dentro e ver tudo o que conquistei, e poderei olhar pra fora de minha transparência e me felicitar por tudo o que não levarei.

Oliver ouvia o adagio do Concerto para piano, de Ravel. Caio chega pra ele e diz: _Nossa, cara! Como você pode aguentar ouvir uma música dessas? Parece música de enterro? Oliver responde: _Fernando Pessoa já disse: "Toda a poesia reflete o que a alma não tem. Por isso a canção dos povos tristes é alegre e a canção dos povos alegres é triste. _E por que você a ouve? Para colocar tristeza e dor dentro de si? _Porque eu não sinto como se ela estivesse entrando em mim, mas saindo de dentro de mim.

Vejo em meio à sombria sociedade A luz pobre e falsa de uma chama. De perto, vi que era sua felicidade Evaporando a fumaça da bagana. Talhado no rosto um riso disfarça O que apaga dentro e acende fora. Possui o calor e o cinza da fumaça, Cuja luz se vai, mas o odor demora. As cinzas que persistem faiscando Lembra as suas frias esperanças Que um dia sorriram brilhando Quando ainda eram puras crianças. *o poema se encontra no livro "Vocábulo de sangue"

É só eu, ou alguém mais tem a desagradável impressão de que a felicidade da grande maioria das pessoas é apenas como a ponta acesa de um cigarro? E evapora tão rápido quanto a fumaça fétida de sua pobre chama?

Cheguei à conclusão de que as melhores histórias infantis são aquelas que conseguem tocar em especial as crianças que envelheceram só por fora.

Poesia não se lê apressado. É preciso degustar cada verbo e adjetivo com sentimento, para só então sentir o gosto do sangue ou das lágrimas do poeta. Há quem renasça em cada estrofe, ou que morra em cada verso. A poesia traduz por linguagem escrita o próprio Espírito que nutre de beleza as vidas; não somente as alegres, mas também as tristes. Pois tudo o que tem ou desperta sentimentos está vivo, embora em parte morto. Afinal, são os sentimentos que nos fazem conscientes da beleza da vida.

Se quer de fato viver, sonhe; Pois, a vida que chamais de realidade, Não passa de um pesadelo, O ronco de um monstro insone. Ria da indiferença e da fatalidade! Vê o teu sonho e passe a vivê-lo! Não seja como o monstro um clone Que só sente o real da carnalidade.

Você ama? Eu amo você! Independente de conhecê-lo ou não. Sabe o por quê? Porque nós brilhávamos; eu e você. Porque, um dia, eu e você estivemos juntos, compondo o corpo de uma estrela a milhões de quilômetros daqui.

... Nós vemos! Sim... Entretanto, quantos de nós realmente é capaz de sentir a chama da humanidade se extinguindo por trás desse olhar cândido? Quem ainda possui coração para sentir que é a própria inocência do mundo refletida nesses pequenos olhos? Sim! Vemos a nossa própria espécie definhando no abandono, na busca dos aplausos lucrativos. Pergunto-me o que será aplaudido no final e quem dará as últimas palmas.

O mundo ainda é mundo,e não há entre os homens o que ser visto de belo,que não seja comercializável.Existe a caridade,mas ela tem que render interações virtuais;ainda vemos a beleza da inocência infantil,mesmo nas ruas e em frangalhos,mas ela é vista através das lentes apelativas da popularidade, que se alimenta da fome das crianças; é possível ver os mais frágeis e imaculados dedos serem manchados pela necessidade de obter o pão, o calor, o afeto, mendigando nas calçadas do capitalismo. ...

Não insista em queimar sentimentos a seres que já são cinzas! Não ame quem cujo coração lhe nega a voz! Derrame sua chuva cardíaca sobre quem lhe dá atenção, quem lhe respeita e admira. Pois brotará a maldição quando você não corresponde ao amor que lhe devotam.

Dizem que o tempo é relativo. Já li até que ele não existe. Portanto, não há ano velho e novo. Somos nós que morremos e renascemos a cada instante, em pequenas dores e simples alegrias. Pois prazer não define viver. Depende do quanto esse instante foi significativo e nos renovou, nos fez amanhecer. Se não fez diferença positiva, então não há ano novo. Mortos não têm idade.

"Te amo tanto, que chega a doer as partes da vida que vivo sem Você." Esse foi o bilhete escrito com carinho por minha esposa e deixado em cima da mesa de desenhos. Eu sempre durmo primeiro que ela. Como também acordo primeiro, ela deixa esses presentinhos matinais.

Sim, sou passional. Tudo o que faço é apaixonado. Quando leio, é nu. Até quando escrevo é pelado. Despido no bem como no mal. Sou intensamente cru. De coração descarnado. E foi porque feriram-no Que floresço pra todo lado. Mas não de prazer carnal. Vivo pela arte enamorado. Pois amar sem arte é viver mal Uma vida já sepultado.

Dois amigos conversando na calçada de casa. André pergunta para João: _Me contaram que você finalmente se declarou para o Vinícius. _Quase. _Como assim, 'quase'? _Eu fui falar com ele. Falar do que eu sentia. Dei-lhe uma flor. Confessei que o amo. Mas sabe o que ele disse? _O quê? _"Quero outro talo, não esse". _Uau! Você fez o quê? _Desisti. Ele não sabe ser amado. Algumas pessoas já estão há tanto tempo agarradas aos espinhos, que se tornaram insensíveis ao perfume da flor, à leveza do amor.

Caminhando pela rua, vi dois cães despreocupados passando rente a uma calçada. Dentro de uma casa, atrás de uma grade, outro cãozinho esganiçava-se de latir para os outros dois, que nem sequer olhavam para ele. Convicção não foba. Quem vive de latir para os de fora é porque já calou-se a voz de dentro.

Morrer de doença? Que horror! Quero morrer fazendo espetáculo, como o crepúsculo ou a flor; ou fazendo um sacrifício nobre, servindo de combustível ao vernáculo eterno da arte quando me for. Morrer de doença é morte pobre. Bicho é que morre de doença. Gente tem que morrer de amor.

Não festeje se eu me apaixonar por você. Se alegre se eu amá-lo. Porque a paixão se alimenta de coisas que fenecem. O amor, no entanto, se alimenta de coisas que não perecem, que não aparecem, mas que permanecem para sempre.

Em quantos lugares você já morou?  Com quantos sonhos já se distraiu?  Em qual deles realmente ficou?  Qual você deveras sentiu?  A carne incendeia e fustiga.  Não passa de uma mera distração.  Moramos onde mora a alma amiga.  Pois só se vive com o coração.

Dizem que a boa Arte imita a vida. Tá mais pra 'vida ruim imita as artes'. Porque é tanta gente de vida fingida Que anula o artístico das duas partes. Mas, 'desgosto' também é gosto. Basta tirar o prefixo e substituir por crucifixo.

Era a terceira vez essa semana que João ia à manicure. _Já estou sentindo-me sua amiga_ diz a profissional, já com a tesoura em ação. _Ah! Não para tanto. Amigos são como unhas: servem para coçar; aquecem as pontas dos dedos. Mas, por outro lado, juntam sujeira e podem até encravar. Unha encravada é podre! Porém, adoro cortar minhas unhas. Mal crescem, e eu já quero apará-las. Já desfiei várias roupas por causa de unhas; até já me feriram. A manicure fica sem jeito e calada o resto do serviço.

No centro da sala, os presentes regavam o corpo do finado, não só com lágrimas cerimoniais, mas com palavras deixadas pelo morto. Estas, eram na verdade, as lágrimas francas, pois eram as mais transparentes. O orador conclui a carta: "Não fui senão uma criança. Uma criança que riu das pequenas coisas e fui taxado de bobo, por amar infantilidades. O mundo já está maduro demais! Não é? Não peço desculpas por obrigá-los a ter que ouvir essas bobagens. Bobagens são as que nos obrigamos a calar."

Moravam relativamente próximos um pequeno rio e um pântano. Próximos o suficiente para que pudessem ver um ao outro. E se viam o bastante para fazer brotar a paixão. _ Vem cá para que eu possa dar-te um beijo _ diz o brejo. _ Não. Se eu for, nossas águas se tornarão uma só. Não seremos nem rio nem brejo. _ Você é um inrustido. Covarde! Tem medo de ser feliz. Por que queres apenas me olhar? _ Para que eu nunca venha a esquecer que um dia tu foste como eu, e que um dia eu posso ser como você.

Todos os dias vinha ao chiqueiro um pássaro de plumagem linda e canto mavioso. Os porcos todos paravam para escutá-lo. Mas sempre que chegava a lavagem, eles corriam para chafurdar a sua parte. O pássaro morreu. Vieram outros, cada qual com cantos diferentes. Os porcos, sempre reagiam igual. O mundo é um porco, que iniciou e continua com o mesmo grunhido, no mesmo tom, no mesmo acorde, sempre igual. Os pássaros são os poetas. Na falta de platéia, resta cantar a eles. Mas amo carne de porco.

Chorar é tanger males de dentro do coração sufocado de anseios, mas regar os latentes devaneios com a madurez do enternecimento. Têm-se gêmeos quando se chora: cansa menos e dispensa palavras; com as lágrimas se canta e ora as dores há pouco escravas.

Tenho minhas opiniões, meus princípios e posisões. Não preciso aderir aos seus nem você aos meus para convivermos em paz. Se o verde passar a ser vermelho, só para agradá-lo, como o vermelho poderá amar o verde, se ele deixou de existir por sua causa? Cada cor tem seu lugar e função. Se a mistura convier aos dois... Bem... Isso já é outra questão.

Se você faz esforço para simular sentimentos e qualidades que não são seus, em busca de mais felicidade, então essa felicidade não é sua, mas da pessoa que você inventou. Conheça a si mesmo; suas raízes. Pois é este solo que nutre os seus frutos e dá encanto às suas flores. Não floresça para os outros, mas para dentro. Quem estiver à sua volta sentirá o perfume e as benéficas sombras de seu jardim.

Após um dia de trabalho, a Riqueza chega para a Pobreza: _ Conseguiu muitos interessados? _ Sim. Vários _ responde a Pobreza. _ Que bom! _ Mas e você? Não conseguiu vender nada? _ Vender? Não. Meu item é grátis. Você vende? _ Sim. Veja! _ ela mostra o valor. _ Não consigo entender como você pode vender tanto o seu produto, ainda mais por um alto preço, enquanto ninguém faz questão do meu, mesmo sendo praticamente grátis. _ Simples: ponha o rótulo "na moda e popular", e todo mundo irá comprar.