— Menina, você ouviu o que aconteceu? Parece que aquele vizinho da esquina viu o casal que se mudou quase agora passar na frente da casa dele com correntes e chicotes. Ele ficou preocupado, já faz uns dias que todo mundo escuta uns barulhos estranhos do quintal deles, aí acredita que ele chamou a polícia achando que eles estavam torturando alguém? Acabou que a polícia só viu uma intimidade de casal, do tipo que um gosta de bater e o outro de apanhar, sabe? Todo mundo saiu envergonhado!

Me angustio quando te decepciono. Me entristeço com o jeito que me trata. Me aborreço com minhas próprias falhas. E me falta amor para me amar de novo. Não sei o que fazer ou falar. Não sei se fico quieta e a vejo confundir isso com desinteresse. Ou se falo algo e a vejo julgar que estou sendo soberba. Como posso me provar? Como posso te fazer parar de julgar? Minhas lágrimas não são o suficiente, ou eu que não sou?

É deprimente perceber que se um vidro fosse colocado entre nós, ele conseguiria captar o meu calor direcionado a ti e a sua frieza direcionada a mim. Após presenciar tão triste cena, ele seria capaz de chorar por mim, pois já não me sobraram lágrimas guardadas para isso.

Meus pensamentos voam, como pássaros no céu. Mas se dispersam feito nuvens após uma batalha com o vento. Às vezes brilham como a lua cheia. Já outras vezes, eles se mantêm na escuridão da lua nova. Mas não importa o jeito, eles sempre me fazem companhia. Da mesma forma que a onde acompanha o mar.

Acima, o céu estrelado. Abaixo, buzinas de carro. Ao longe, eu vejo montanhas. Já perto, sininhos tocando com a ajuda do vento. Parece confuso e desnorteado, mas para mim, é o som e a imagem da vida que chega aos meus sentidos. Coisas da vida que quero poder encontrar todo dia.

Deitada em minha cama, encaro a janela embaçada. Duas pequenas gotinhas disputam uma corrida sem plateia. Apenas eu as encaro, apenas eu me importo. Enquanto as gotinhas vão descendo a janela, meus olhos se fecham durante o percurso. Antes do término da corrida, já estou no mundo dos sonhos. Mesmo sem saber o resultado, sei que tudo acabou em paz. Porque assim que a chuva voltar a corrida vai se reiniciar e mais uma vez, mesmo sem importância, elas vão fazer tudo de novo, sem arrependimentos.

Uma menina entra em seu quarto e chora olhando os enfeites que ela ganhou de amigos e parentes. As lágrimas caem enquanto ela pensa que tudo que ali se encontra poderá desaparecer assim que descobrirem que não é quem todos pensavam que fosse.

Depois de correr quilômetros da minha maior inimiga, desisti, sabia que não poderia evitá-la. Dou meia volta e encaro a figura encapuzada, que era eu mesma.

Ela olha ao redor e vê bonecas e pelúcias com camadas de poeira espalhadas pelo quarto. Um resquício da criança que já existiu em seu lugar e da infância que ela não aceita largar. Quanto tempo mais terá que passar para que ela possa caminhar sem medo para o futuro?

Fecho meus olhos enquanto me concentro no barulho da tempestade que acontece do lado de fora. Por quanto tempo mais terei que aguentar esse rugido do céu que me atormenta há anos? Quando poderei finalmente abrir meus olhos e enxergar um dia ensolarado novamente?

Durante a noite, enquanto todos ficam de cabeça baixa olhando os celulares, eu olho para cima e vejo o sorriso que o céu me manda com essa Lua Minguante e vou para casa dormir feliz. Porque enquanto todos estão ocupados, eu tenho um céu risonho só para mim.

Da janela do seu quarto ela vê o céu estrelado. Pontinhos de luz fazem uma ponte da terra ao céu. Ela abre a janela e caminha sobre a ponte. Ela se vê flutuando, mas e as pessoas que a olham de longe?