Música tema: Fools - Troye Sivan
15 minutos.
É o que está escrito no quadro negro, se destacando em branco num garrancho que não combina em nada com a aparência delicada da professora de física. Estou fitando aquilo, o aviso, que diz que daqui quinze minutos a prova terminará. Mordo o lábio enquanto desvio daquilo e foco em Baekhyun, não muito longe de mim. Geralmente, ele senta ao meu lado ou atrás de mim, pois nesse último fica mais fácil para que ele se incline e sussurre coisas no meu ouvido. Comentários que apenas nos interessam. No entanto, hoje, um pouco antes da prova, a professora nos trocou de lugar
Ela sabe que nós somos muito amigos e que temos uma cumplicidade invejável, e talvez por isso tenha acreditado na grande possibilidade de nós passarmos cola. Eu não a culpo, acho que se não fosse tão medroso, passaria mesmo e talvez tirasse uma boa nota nessa matéria. Porque entre tantas as outras, essa é a que pode me reprovar. Minhas notas nunca foram as melhores, mas com certeza são muito ruins em física. Porém, na noite passada eu e Baekhyun passamos a noite estudando.
Foi um tipo estranho de festa do pijama na casa de Kyungsoo — o seu namorado —, onde em vez de assistirmos um filme engraçado ou fazer bagunça, acabamos debruçados sobre livros de física e matemática, estudando e estudando. Kyungsoo é realmente bom com números, então para cada dúvida que tínhamos, ele as sanava sem pestanejar muito. E os seus pais são muito legais, mas a sua avó, que está passando um tempo consigo, não é lá muito comunicativa. Ela constantemente ficava nos encarando, como que querendo saber de que espécies éramos.
Eu conhecia aquele tipo de olhar.
Mas sabia que ela não fazia por mal. Baekhyun havia me explicado a situação e naquela madrugada, eu mesmo havia constato quando sai do quarto, de fininho, afim de um pouco de ar fresco, longe de toda aquela áurea de amor correspondido que sempre tinha quando Kyungsoo e Baekhyun estavam juntos. Pois veja bem, eu sei que eles se amam. Só um idiota não ver o modo como o amor transborda dos seus poros e inundar o ar a sua volta, mas eu queria ser um idiota. Não que eu ache que Baekhyun não mereça, é apenas que a inveja feia e forte costuma crescer devagar em mim quando os vejo juntos, além do desconforto de nunca ser amado daquela maneira.
Contudo é como dizem por aí: alguns tem sorte, outros não. Eu faço parte dos outros, junto com um bocado de gente de olhares feios. Desconfio até que a avó de Kyungsoo faz parte desses outros, porque naquela madruga encontrei-a na cozinha.
Lembro que ela me olhou longamente antes de me oferecer um copo de leite e depois me fazer algumas perguntas. “O que Baekhyun é para você?”. “Isso de namoro é verdade mesmo?”. “Você é como ele?”.
Sim, senhora. Nós dois, eu e Kyungsoo, somo como Baekhyun.
Ela ficou magoada com a resposta, acho que isso arruinava os seus sonhos de ver o neto casado e com filhos, uma bela garota como esposa. Contudo, está tudo bem. Vamos dar um desconto para essa pobre mulher que não consegue acreditar que seu netinho querido foi arrastado sem pudor para esse mundo horrendo da homossexualidade. Assim como vamos dar um desconto aos pais de Baekhyun, que o expulsaram de casa com nada além da roupa do corpo ou aos pais de Chanyeol, que entraram em um voto de silêncio para o com filho que diziam amar.
10 minutos.
É o que está marcando no quadro agora. Baekhyun me olha por sobre o ombro, a ponta do dedão na boca indicando que ele está confuso e nervoso. Provavelmente não lembra como terminar uma questão, a resposta certa fugiu da sua mente. Seus olhos encontram os meus e acho que de alguma forma estou refletindo o mesmo medo da reprovação do seu olhar.
Ele sorri. Pequeno e simples, afim de me tranquilizar.
Observo quando meu amigo volta a olhar para baixo e meio tenta rabiscar uma resposta aceitável no papel de prova. Decido fazer o mesmo, mas quando leio as questões novamente, não há nada que eu queira rabiscar.
Acabo levantando da minha cadeira mais cedo que o esperado. Entrego a prova para a professora e saio da sala, tentando dizer a mim mesmo que das cinco questões propostas, ter duas em branco não é ruim. E pode ser que não seja mesmo, já que respondi três e se elas estiverem certas, minha nota não cairá tanto.
Me afasto da sala, indo direto para o teatro. Vou esperar Baekhyun lá para que possamos nos jogar sobre o palco do auditório e reclamar das questões e da professora.
Há alguns alunos no corredor, mas nenhum deles olha na minha direção. Alguns garotos se dignam a me lançarem olhares feios, mas ninguém se aproxima. E eu tenho que agradecer a Kyungsoo por isso, mesmo que grande parte que o moveu a isso tenha sido Baekhyun e não eu. Eu apenas sou a aparte extra naquilo. Mas preciso agradecer do mesmo jeito, pois faz exatos três semanas que ninguém mexe comigo. Ninguém mais me aborda depois das aulas, ninguém esbarra em mim no corredor, ninguém me chama por nomes feios... Do mesmo jeito que não fazem mais isso com Baekhyun.
Agora eles apenas nos toleram, nos ignoram como se fossemos cães sarnentos esfomeados. Por mim, está tudo bem. Quer dizer, quase tudo bem. Há alguém que não é capaz de me ignorar por completo, o que é péssimo porque enquanto ele não me ignorar, não sou capaz de ignora-lo também. Então para todas as vezes que ele olha na minha direção, acabo olhando de volta. E ficamos nos encarando, do jeito mais doloroso que existe, porque ele não é capaz de se aproximar e nem se afastar e eu não sou capaz de me mexer se ele não der um passo primeiro, porque já estou cansado de ser tão enganado assim.
Há machas arroxeadas em volta do seu pescoço, consigo perceber apesar da gola levantada da sua camisa. Jongdae é bom em esconder as coisas e provavelmente deve ter inventado uma mentira incrível sobre essas marcas, mas eu sei a verdade.
Baekhyun me contou o que aconteceu consigo, o porquê daquelas manchas roxas no seu pescoço durarem tanto tempo. “Ele amarrou uma corda em volta do pescoço e tentou se matar, se não fosse por Minseok, Jongdae estaria morto agora”. Estaria morto do mesmo jeito que Chanyeol, morto da mesma maneira. A diferença é que Jongdae escolheu algo mais limpo e doloroso. Porque no fim das contas, estava apenas se punindo por ser esse monte de homem erguido sobre covardia. Enquanto Chanyeol estava apenas escapando para um lugar melhor, se é que existe mesmo um lugar melhor.
Mas o pouquinho de esperança que existe em mim me faz acreditar que existe sim e que Chanyeol está lá, fazendo a única coisa que sempre quis: sendo feliz.
Jongdae me encara mais um pouco e o encaro minimamente enquanto passo por si, são belíssimos segundos em câmera lenta. São pouquíssimos segundos para todas as palavras silenciosas que parecem flutuar em minha direção. Eu não quero lê-las, não quero saber o que significam porque nós dois já passamos por isso vezes o suficiente para que eu saiba que não combinamos.
O melhor a se fazer é seguir em frente, digo a mim mesmo e é isso o que faço ao continuar andando, deixando aquele garoto para trás. Ele não me segue e uma parte de mim agradece por isso enquanto a outra só sente decepcionada. Mas é apenas quando chego no auditório da escola que me deixo suspirar, que deixo um pouco daquela carga de paixão reprimida aparecer junto do meu coração descompassado.
Eu sou um tolo. Um maldito idiota por ainda me deixar ser tão afetado assim pela presença daquele Kim. No entanto, mesmo que eu queria continuar me recriminando por isso, não tenho tempo porque no segundo seguinte, Baekhyun está pulando nas minhas costas e me levando ao chão, enquanto a sua risada preenche todo aquele vazio que sempre existiu no meu peito.
— Aí meu Deus! — ele tem coragem de exclamar como se não fosse o culpado daquela surpresa em forma de queda.
— Você está me esmagando. — reclamo, mas tudo que Baek faz é encostar o queixo sobre meu ombro direito enquanto, meu rosto está encostado no chão e o seu corpo praticamente deitado sobre o meu.
E mesmo que eu não olhe, sei que está sorrindo do jeito mais travesso que existe, porque Byun Baekhyun é todo trabalhado em risinhos e brincadeiras fora de hora. Terrivelmente extrovertido esse garoto, coisa que não combina muito com meu humor negro ou o jeito tímido de Kyungsoo, mas de alguma forma fora do comum nos equilibramos ali, sobre uma linha esquisita que chamamos de amizade.
— Como foi a prova? — pergunta, ignorando o meu desespero em estar sendo morto lentamente pela pressão do seu corpo
O castanho andava meio gordinho ultimamente, mas eu nunca diria isso em voz alta mesmo que ele tivesse total certeza sobre isso depois que não conseguiu entrar no seu jeans predileto na semana passada. Era tudo culpa de Kyungsoo e de seus dotes culinários, além da sua mãe também. A senhora Do era gentil assim ao fazer lanches para Baekhyun levar para a escola quando o mesmo dormia ali, o que acontecia quase sempre. E no começo do dia, até mesmo eu ganhei um lanche feito pela mãe de Kyungsoo, já que tínhamos passado a noite ali na nossa maratona de estudos.
— Mais ou menos. — respondi e o castanho rolou de cima de mim, me fazendo respirar fundo em seguida. — E você?
— Estou confiante. — fitei o seu rosto sorridente.
Estava deitado de peito para cima no chão do auditório enquanto me mantia deitado de bruços, na mesma posição que fui derrubado. Não estava realmente olhando para mim, fitava o teto enquanto a boca se abria para mostrar os dentes em um sorriso bonito, o que era indicativo suficiente para mostrar que ele não sorria por ter ido bem na prova, mas sim por estar lembrando de Kyungsoo. Era normal que esse tipo de coisa acontecesse, sabia porque acontecia comigo também.
Me pegava constantemente viajando em meus pensamentos afim de alcançar Chanyeol ou Jongdae, mas ao contrário de Baekhyun, não era nenhum pouco saudável que eu fizesse isso comigo mesmo porque em vez de bem-estar, tudo que vinha era a velha ânsia de não aguentar mais continuar com aquilo tudo, mas havia feito uma promessa a Chanyeol, então apenas aguentaria firme.
— Devíamos comemorar. — ele tornou a falar quando de minha boca não saiu nenhum tipo de comentário decente.
O nós incluído na sua frase, me alertava que não falava mim e si mesmo, mas sim de nós três, pois para tudo que Baekhyun gostava de fazer, sempre arranjava um jeito de arrastar Kyungsoo junto, principalmente depois que comprou aquela skooter já que agora Kyungsoo não tinha mais desculpas para acompanhar Baekhyun em seus passeios noturnos. E não é que isso fosse ruim de alguma maneira, mas era apenas que ter Baekhyun só para mim parecia cada vez mais impossível, pois mesmo quando o Do não estava aqui, eu podia sentir a presença dele emanando do Byun de uma forma que nunca aconteceu quando o mesmo namorava Chanyeol.
Acho que de repente eu estava sendo injusto com Baekhyun ao parecer tão ranzinza diante do seu namoro. Porque era bem óbvio que Baekhyun estava bem melhor nas mãos de Kyungsoo do que jamais estivera nas mãos de Chanyeol. Não que o Park fosse um mau namorado, mas era apenas que Baekhyun sempre foi um tanto incontrolável, curioso demais e para tudo que queria, Chanyeol não lhe negava. Na verdade, os dois costumavam fazer muitas coisas juntos, coisas essas que não eram tão saudáveis assim. E bem podia ser que eu já estivesse participado de algumas dessas coisas, mas não era como se eu apoiasse.
Porém, com Kyungsoo era diferente pois de uma forma esquisita, ele conseguia controlar o jeito impulsivo de Byun Baekhyun e mantê-lo na linha.
— Eu não posso. — falei e dessa vez não era mentira. — Tenho que organizar o baile. — uma verdade chata, mas verdade.
Na semana passada Kim Junmeyon, o professor de história, havia feito uma proposta para a diretoria sobre ter um baile de despedida para os formandos desse ano, o que incluía a minha turma. Houve uma votação entre os alunos e a proposta acabou sendo aceita e dessa forma eu terminei como o encarregado da organização, porque sendo o líder do clube de teatro fazia sentido que eu organizasse isso.
Baekhyun era meu secretário nesse quesito, mas como ele tinha que dividir o seu tempo entre estudar, namorar e trabalhar, então não lhe sobrava tempo para me ajudar e foi assim que seu cargo foi passado — temporariamente — para Kim Junmeyon. Ou seja, para todas as noites que eu ficava depois da aula para arrumar a decoração junto de alguns alunos voluntários, Kim Junmeyon estava ali também. Era esquisito, porque ele era o professor de história. A única figura adulta em meio a um bando de adolescentes sem vida social, além de ser um velho conhecido.
— Ah, o baile. — disse sem muito interesse.
E realmente não parecia interessado. De todos os alunos daquela escola, meu amigo era o único que não parecia querer chegar perto de um baile de formatura, coisa que era muito estranho. Porque ele bem podia trazer o namorado para dançar até o sol nascer, pois até onde eu sabia, Baekhyun adorava dançar.
— O que há com você? — resolvi perguntar. — O que tem contra bailes de formatura? — deitei-me de lado no chão para poder fita-lo melhor.
— Não tenho nada contra bailes. — se defendeu, cruzando os braços sobre o seu corpo e o rosto ficando sério quando fitava o teto. — É só que...
— Que...? — incentivei quando ele mesmo se interrompeu.
— Bailes, sabe. — disse simplesmente e eu balancei a cabeça diante da confusão que era Byun Baekhyun, meu melhor amigo.
— Não, não sei. — tentei mais um pouco, queria que ele falasse de uma vez.
Hoje, especialmente, não estava no melhor dos meus humores para poder tentar adivinhar os pensamentos do meu amigo confuso.
— Aish. — soltou, frustrado com a minha recusar em tentar adivinhar. — É só que um baile de formatura significa o final do ano letivo, então nós estaríamos formados e... e eu ainda não sei o que fazer depois daqui. — e com daqui, entendi que ele queria dizer escola.
Eu também não havia escolhido exatamente o que queria fazer, quer dizer havia algo na minha mente, mas não me achava capaz de seguir isso até o fim. E além do mais havia os meus avós para cuidar, então não havia realmente um jeito de seguir isso sem deixá-los e tudo que eu menos queria era deixá-los. E por isso achava que podia me dar bem ao continuar trabalhando na nossa barraca de peixe na feira, pois mesmo que eu decidisse por alguma faculdade, não achava que conseguiria equilibrar o trabalho e os estudos, porque eu escutava o que falavam da faculdade, como tudo era mil vezes mais puxado lá. E se eu tinha as minhas inseguranças, quando minha vida era um tantinho mais fácil que a de Baekhyun, então podia muito bem imaginar que meu amigo tinha as suas.
Mas esse motivo não me parecia suficiente para não levar Kyungsoo ao baile.
E uma delas parecia ser o que fazer depois que o colegial terminasse.
— Ainda não escolheu o curso que quer fazer? — perguntei.
— Você sabe o que quero fazer. — falou e dessa vez deitou-se de lado para me fitar. — Eu só não acho que vou ser bom o suficiente para conseguir entrar.
— Claro que consegue. — sorri tentando tranquiliza-lo. — Você é inteligente e talentoso, eles seriam uns idiotas se não te aceitassem.
Baekhyun sorriu minimamente pra mim em resposta, mostrando que não acreditava em nenhuma das minhas palavras. E eu queria poder fazê-lo acreditar, mas não sabia como. No entanto, não é como se fosse preciso, porque no minuto seguinte, cortando qualquer coisa que ele fosse me dizer, o sinal tocou, indicando que deveríamos voltar para a sala de aula.
Ele me ajudou a levantar e em silêncio seguimos para a sala de aula.
— Você devia levar Kyungsoo. — acabei dizendo depois que sentamos em nossos lugares.
— O que? — se fez de desentendido.
— Devia levar Kyungsoo ao baile. — fui mais claro.
Baekhyun deitou a cabeça castanha sobre os braços na mesa da carteira, fechou os olhos e ficou em silêncio em vez de dizer algo. Respeitei, mas ainda o observei durante um tempo até desistir da sua resposta e virei-me para frente. Mas a verdade era que seria bom se Baekhyun fosse ao baile junto de Kyungsoo, porque eu estaria lá, como organizador, cuidando para que nada saísse do lugar e não queria me sentir sozinho. Tudo bem que Jongin também estaria lá, mas só porque tivemos um papo interessante no recreio há dois dias atrás não queria dizer que éramos melhores amigos.
— Não quero leva-lo ao baile. — acabei escutando meu amigo dizer, um pouco baixo demais, mas como tinha poucos alunos na sala ainda, escutei. — Chanyeol me prometeu que me levaria. — confessou igualmente baixo e eu parei a minha de pensamentos.
Nós nunca falávamos de Chanyeol exatamente. Ainda era recente demais, ainda doía demais, ainda não estávamos prontos. Mas havia momentos assim que ele surgia no assunto, no meio da conversa e era impossível tira-lo de lá sem dizer o seu nome em voz alta. E aqui estávamos nós, invocando a imagem dele e sofrendo por isso, porque Chanyeol nos prometeu tanta coisa, não é?
“No festival de verão, te verei cantar”. — era a sua promessa para comigo, em outra vida quando não éramos esses garotos quebrados. Parecia distante e perto demais ao mesmo tempo, em minha mente. E eu bem podia imaginar como não devia ser para Baekhyun, afinal eles tinham sido namorados. Deviam ter feito planos, deviam ter compartilhado alguns sonhos e agora, que ele estava sozinho aqui, não conseguia evitar lembrar-se dele quando os seus planos sonhados juntos pareciam estar querendo realizar-se ao lado de outra pessoa.
Era como trair Park Chanyeol.
— Nem sequer contei a Kyungsoo sobre o baile. — continuou falando, eu ainda sentado de costas para si já que minha cadeira ficava à frente da sua. — Eu... eu não saberia dizer porque não quero leva-lo.
Porque você não quer trair Park Chanyeol mais um pouco, respondi mentalmente. Pois Kyungsoo podia sentir-se culpado por namorar Byun Baekhyun, mas o garoto também sentia-se da mesma forma mesmo que o sentimento que nutria pelo Do não fosse nenhum pouco insignificante quando comparado ao que sentia por Park Chanyeol. No entanto, para a confusão que Baekhyun não queria olhar, eu já tinha olhado e sabia muito bem porque ele não queria levar o namorado ao baile da escola.
A culpa que sentia por não ter amado Park Chanyeol direito estava crescendo dentro de si a cada vez que comprovava o tamanho do sentimento que havia entre si e Kyungsoo, justo Kyungsoo que era um dos melhores amigos do Park. Era como trai-lo, certo? Mesmo que ele tivesse escolhido não estar mais entre nós, era traição, não era? Porque ele amou esse garoto de todo o coração e merecia receber uma fração de volta, mas o Byun nunca conseguiu fazer isso direito. Enquanto, eu... Eu fui capaz de amá-lo de longe, com o meu coração rejeitado.
— Sabe sim. — confrontei-o e Baekhyun ficou calado.
Você não é burro, Baekhyun. Sabe muito bem porque está mentindo para Kyungsoo desse jeito, assim como sabe porque está mentindo para si mesmo.
A professora entrou na sala e durante o resto da aula não trocamos nenhuma palavra. Mas de qualquer forma não era necessário. Nos conhecíamos a um bocado de anos, então era fácil ler suas emoções apenas de fita-lo de canto de olho. E mesmo quando o sinal do fim das aulas do dia tocou e ele levantou-se apressado, para correr até o seu trabalho no shopping, não trocamos nada além de olhares, mas estava estampado nos seus olhos castanhos o eterno pedido de desculpas que ele sempre me ofereceria quando tocávamos no nome do nosso garoto impulsivo.
Meu amigo, que sabia me ler melhor do que eu mesmo, sabia que eu tinha amado Park Chanyeol mais do que a mim mesmo e que de todas as pessoas que ele deixou para trás, eu era o mais ferido. Porque enquanto todos os outros foram correspondidos na fração do amor que lhe davam, Chanyeol não foi capaz de me olhar como mais do que um amigo. O melhor amigo do seu namorado. E Baekhyun sabia disso e talvez, por isso sua culpa aumentasse mais, o que não era justo.
Mas no fim das contas, éramos todos um bando de garotos injustiçados.
***
— É seguro que esteja aí em cima? — alguém perguntou.
Do alto da escada que eu estava, olhei para baixo apenas para encontrar a figura despojada de Kim Junmeyon, mesmo que estivesse usando uma das suas famosas camisas sociais de botões. Mas a gola estava amassada e os primeiros botões abertos, deixando a camisa branca fina de dentro, a mostra e um pouco de pele também. E era justamente esse pedaço de pele claro que fazia as alunas olharem constantemente na sua direção ou se voluntariarem para o trabalho na organização quando sabiam que ele era um tipo de ajudante-supervisor. Eu não reclamava, porque mais mão-de-obra me dava esperanças de terminar isso logo e poder dormir até tarde novamente, sem o estresse que o medo do fracasso me causava durante a noite.
— Está bem apoiada. — falei, mas mesmo assim o vi se prostrar no pé da escada e segura-la pelos lados, afim de firma-la.
— Nunca se sabe o que pode acontecer.
Revirei os olhos e continuei o que estava fazendo: colando flores cor-de-rosa feitas de papel crepom na parede da quadra. Elas tinham demorado para ficarem prontas devido ao pouco pessoal na organização e por isso estávamos atrasados, o que significava que eu e minha equipe de oito pessoas teríamos que sair durante as últimas aulas se quiséssemos terminar isso a tempo. Claro, que seria mais rápido se as garotas parassem de babar pelo professor de história no pé da minha escada e se mais garotos aparecessem para ajudar-me com as caixas e trabalhos pesados. Mas sabia que pedir por garotos aqui seria demais, ainda mais quando nenhum deles queria receber ordens do garoto gay da escola.
Não demorou muito para que eu terminasse, já que com a pistola de cola quente ficava mais rápido cola-las na parede da quadra então por isso terminei antes do previsto e desci rápido da escada.
— Você não deveria estar ajudando a montar o palco? — perguntei ao professor de história.
Junmeyon me fitou de cima abaixo do jeito que sempre fazia, como se estivesse checando se estava tudo no lugar, todos os meus membros ainda inteiros. Não dava para culpa-lo por sempre fazer isso, quando tínhamos nos cruzado de uma maneira tão desastrosa no corredor da escola. Eu, fugindo de alguns valentões junto de Baekhyun e ele, procurando a sua sala.
— Estava vigiando você. — teve coragem de dizer e eu ri, porque ele me tratava como uma criança desastrada.
A criança que ele conheceu quando estava prestes a se formar nessa mesma escola.
— E além do mais, as garotas estão se saindo bem lá. — apontou com o queixo para algo atrás de mim e eu olhei, depois de enfiar a pistola de cola quente no bolso de trás do meu jeans.
Era verdade. Algumas garotas tinham ficado encarregadas de montar o palco, afinal não deveria ser um trabalho tão difícil, certo? Mas era trabalhoso e constantemente eu as via sentando para descansar depois de tanto martelar. Queria poder ajuda-las, mas estava ocupado demais em fazer o painel de decoração além de montar o ambiente de fotos.
— Não seja um professor maldoso. — falei. — Vá ajuda-las. — mandei enquanto começava a me afastar em direção ao painel.
Ainda o escutei suspirar, mas sabia que ele havia ido em direção à elas. Continuei andando em direção ao ambiente de fotos. Eu e Junmeyon havíamos montado esse, era apenas um lugarzinho para quem quisesse tirar fotos. Duas paredes de madeira fina se abriam como um livro, pintadas de azul escuro representavam o céu à noite. Pretendia pintar uma lua cheia em algum lugar e os galhos de uma árvore fantasmagórica, apenas para que os alunos entrassem no clima de Halloween pois a festa de formatura seria no fim de outubro, um mês antes dos exames finais, porque o diretor achou que ia ser interessante descontrair os alunos de toda essa seriedade que era entrar para uma faculdade.
E por isso o tema escolhido para o baile tinha sido festa a fantasia. Monstros famosos, o que era muito irônico porque nenhum aluno podia vir fantasiado de si mesmo. Mas estava tudo bem, ninguém precisava saber sobre suas identidades secretas.
Me ajoelhei diante da parede e procurei a caixinha com os pinceis e tintas que tinha deixado ali mais cedo. Seria melhor se Baekhyun estivesse aqui, porque ele era bem melhor do que eu em pinturas e nada em mim estava exatamente seguro sobre conseguir pintar algo decente aqui. Mas mesmo assim suspirei quando encontrei a caixinha com os pinceis. Puxei-a para mais perto de mim, deixando do meu lado. Tirei a pistola do meu bolso, pois estava incomodando e então peguei o primeiro pincel, mergulhei na tinta branca e aproximei da tela que era aquela parede de madeira.
— Você não parece muito seguro. — escutei e fechei os olhos com força antes de virar-me para trás e encontrar a figura pequena de Kyungsoo.
— O que está fazendo aqui? — perguntei ao passo que ele vinha até o meu lado e se ajoelhava do mesmo modo que eu.
— Mão-de-obra voluntaria, sabe. — respondeu. — Me dê o pincel. — pediu e eu o fitei incrédulo. — Sério, me dê o pincel. — acabei entregando ainda surpreso pelo pedido.
— Baekhyun não sabe que você está aqui. — adivinhei.
— Pois é. — soltou apenas para confirmar.
Suspeito.
— Por que? — cruzei os braços quando o vi tocar a ponta do pincel na parede.
— Pelo mesmo motivo que ele ficou todo estranho quando o assunto era o baile de formatura. — explicou, então me fitou de canto de olho. — O que quer que eu desenhe?
— Você sabe desenhar? — desafiei.
— Bonecos de palitinhos bem bonitos, eu garanto. — brincou e eu ri.
Kyungsoo era legal, no fim das contas. Ele tinha um humor estranho que sempre ficava sobre a linha da ironia e do sarcasmo, coisa que combinava muito com sua língua afiada e de uma forma estranha me causava risadas, porque tínhamos piadas parecidas.
— Preciso de uma lua cheia assustadora e alguns galhos ali e aqui. — falei descruzando os braços e apontando onde queria tudo.
O namorado do meu amigo assentiu e começou a pintar.
— Como soube do baile? — perguntei curioso.
— Minha mãe passou por aqui e viu vocês todos agitados com materiais de decoração. — contou.
— E você comentou isso com Baekhyun. — adivinhei.
— Não. — meio riu. — Vai acontecer um baile na minha escola também e eu comentei sobre ele com Baekhyun, então ele ficou todo estranho e foi embora. — comprimiu os lábios grossos.
— Vocês brigaram? — não parecia certo que isso tivesse acontecido.
Eles nunca brigavam, quer dizer, havia algumas discussões bobas mas nada que fizesse o Byun sair de perto do Do, assim de uma maneira tão tempestuosa. E além do mais, ele parecia tão bem hoje de manhã, sorrindo para o nada do jeito que pessoas apaixonadas fazem.
— Na verdade, eu não sei. — confessou meio rindo e eu ri junto. — Ele só saiu da minha casa correndo como se eu tivesse o xingado.
Mordi o lábio. Eu sabia o que estava de errado com Baekhyun, mas não sabia se deveria contar isso a Kyungsoo. Optei por não dizer nada antes de falar com o Byun, apenas para não correr o risco de que ele passasse a me ignorar, do jeito que fazia com qualquer um quando estava com raiva.
— Apenas dê um tempo a ele. — falei e Kyung me ofereceu um sorriso de canto, um tanto desanimado demais. — Já que está se dando bem aí, vou beber um pouco de água. — fiquei de pé, espanei meu joelhos e depois comecei a me afastar.
Sai da quadra, pensando em que horas todo esse trabalho terminaria porque já me sentia cansado e amanhã seria o dia de trabalhar na feira, no lugar dos meus avós. Ia ser bem cansativo sair de lá e vir para cá, mas eu não achava que seria ruim quando minha mente ficava ocupada e me fazia não pensar em mais nada. Tudo se anestesiava quando eu estava trabalhando, então não era de todo ruim.
Parei em frente ao bebedouro no corredor, perto da cantina, e comecei a encher um copo de plástico.
— Aposto que não comeu nada desde o almoço e está enchendo o estômago de água. — reconheci a sua voz, mas não me virei.
Falava de um jeito descontraído como se fossemos melhores amigos, como se ele não tivesse filmado enquanto eu era machucado por seus amigos. Falava como se ele realmente gostasse de mim, do jeito que sempre dizia nas madrugadas que nos encontrávamos.
Continuei com o ato de encher o copo e depois leva-lo a boca. Era mais fácil assim, percebi. Ignore a fome e preencha o seu estômago com nada além de água. Estava ignorando Kim Jongdae e preenchendo minha vida com trabalho e as cenas de romance do meu amigo coreano. Bebi toda a água e joguei o copo vazio na lixeira ao lado do bebedouro então me preparei para me virar e ir embora, mas por algum motivo não me mexi. Fiquei parado, de cabeça baixa, encarando a lixeira esperando não sei o que daquele garoto atrás de mim.
— Não devia me ignorar assim. — o escutei dizer e eu molhei meus lábios com a ponta da língua.
— E o que eu deveria fazer? — tive coragem de perguntar, mesmo que baixo. — Quer que eu pegue meu celular e filme você pela escola? — dessa vez me virei para fita-lo, estava machucado o suficiente para deixa-lo ver.
— Luhan, você sabe que não foi assim... eu só...
— Segurou aquele celular no meu rosto quando eles estavam enchendo o meu corpo de drogas. É, eu sei. — sentia meus olhos se encherem de lágrimas e sabia que Jongdae podia vê-las. — Sabe, você podia ter feito qualquer coisa mas não fez nada. Eu achei que eu e você... eu realmente achei que nós podíamos dar certo.
Jongdae não me fitava. Não podia olhar no meu rosto e encontrar os seus pecados estampados ali, então permanecia com o rosto virado. Mas eu queria que me olhasse, queria que visse toda a dor que me causava e por isso me deixasse em paz de vez. E eu bem podia ter continuado falando, ter dito coisas horríveis, porém não fiz. Apenas fitei o modo como ele se encolhia diante da minha dor, mostrando que também sentia dor. Talvez estivesse arrependido, mas não dava pra acreditar mais nesse garoto. Então engoli toda a minha dor e contornei o seu corpo, sai dali devagar, decidido a deixa-lo para trás de vez.
Jongdae não fez nada em relação a isso.
Não correu atrás de mim e segurou o meu braço, não gritou por meu nome, não se pôs na minha frente e disse qualquer coisa para me fazer ficar.
Kim Jongdae só fez o que sempre fazia quando o assunto era nós: um grande nada. E eu nunca tinha achado que o vazio daquelas ações podia doer da forma que estava doendo agora, perfurando meu peito e me fazendo soluçar baixo a cada passo que eu dava para longe dele.
Meu Deus!, eu pensei, por que o nada tem que pesar tanto?
Tive que me encostar na parede do corredor, se não cairia no chão de joelhos e choraria até não me restar mais água no corpo. Queria me recompor quando respirei fundo, queria afastar um pouco a dor para poder seguir com meus afazeres na quadra, mas não conseguia. E isso me encheu de um raiva quente, que me vi socando a parede enquanto chorava.
Eu era um idiota.
Como podia estar chorando por alguém que nunca me deu nada além de algumas horas numa madrugada qualquer, longe dos olhares de qualquer um? Como eu podia estar sentindo tanta dor quando nunca houve nada entre nós além de uma foda gostosa? Eu era todo patético por depositar naquele garoto medroso meus sonhos de menininha. Porque, sim. Tinha me deixado levar pela fantasia de ter um romance leve e bobo como nos filmes, havia me deixado levar pela certeza de que Jongdae podia ser meu príncipe encantado que me salvaria de toda essa vida miserável que sempre tive. Acreditei que ele podia curar meus medos, que podia me acolher nos seus braços à noite quando o mundo estivesse sendo mal demais comigo. Mas isso fora só uma ilusão da minha mente carente.
Não havia casinha com um jardim na frente. Não havia filhos adotados. Não havia momentos românticos. Não havia nada disso. O que havia era apenas eu... sendo eu, com ninguém mais por perto, porque as duas únicas pessoas que eu já quis não servem pra isso. Um está morto e outro é um covarde.
Encostei minha testa na parede, de olhos fechados mordi meu lábio. Não queria mais chorar. Não queria mais sentir tanta dor, mas parecia difícil se livrar disso. Soltei um suspiro tremido e ergui as mãos para limpar as lágrimas do meu rosto, não dava pra chorar assim. Não aqui. Precisava me recompor e voltar ao trabalho, pois já era difícil ser o garoto gay da escola. Ser o garoto gay e chorão não dava. Eu podia deixar as lágrimas para mais tarde, quem sabe as despejasse antes de dormir. Sozinho, embaixo meu cobertor podia chorar baixinho toda aquela dor, sem testemunhas.
Assim que senti que as lágrimas não viriam mais, virei-me de costas para a parede. Respirei fundo e só então abri os olhos, apenas para tê-los se arregalando no segundo seguinte quando a imagem de Kim Junmeyon se fez presente diante de mim.
— O que aconteceu? — perguntou, soando preocupado como um irmão mais velho seria, acho.
Não tenho irmãos.
— Eu... eu... — não tinha uma resposta para isso além da verdade.
Ele tinha me pegado de surpresa, com a guarda baixa demais para conseguir pensar em alguma coisa decente para dizer. Mas mesmo quando meu cérebro trabalhava atrás de uma mentira convincente, sabia que não podia mentir para ele. Aquele homem tinha me ajudado quando ninguém mais podia fazê-lo e não dava para mentir assim, então fiz a única coisa que alguém quebrado como eu podia fazer, escondi meu rosto entre minhas mãos e chorei mais.
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