Baekhyun e Kyungsoo se encontraram – não pela primeira vez, mas fingir isso torna tudo mais romântico – na esquina do condomínio. Era algo perto das duas da tarde e Kyungsoo usava uma sombrinha, enquanto o Byun protegia a epiderme com um boné branco.
Os olhares se encontraram curiosos, encararam-se em silêncio, avaliando um ao outro disfarçadamente, e um deles tossindo no final para iniciar o diálogo.
– Você também ouviu? – Kyungsoo perguntou, indicando com a cabeça um som de miado que vinha não de muito longe.
– Sim. Estava descendo a rua e então ouvi... Será que está machucado? – Inquiriu de volta, ouvindo o miado mais alto e caminhando até o som. – Ah! – Gritou quando o gato atirou-se em seus pés após tentar engatinhar. – Está com a pata ferida.
– Estou vendo. – Kyungsoo se agachou no chão, deixando uma das mãos, a que não segurava a sombrinha, acariciar a pelagem um pouco suja porém macia do gato. – Precisa de cuidados... Pode deixar, eu cuido.
– Por que você? Meu irmão mais velho fez medicina, eu sou o mais apto para cuidar dele!
Kyungsoo encarou-o em completo tédio. – Seu irmão não mora com você, eu já cuidei de um gatinho, logo, sou o mais apto.
– Isso não é justo! Não podemos cuidar nós dois? – Baekhyun resmungou, fazendo um bico com os lábios em descontentamento. Se iam levar experiência em conta, havia cuidado de seu primo de treze anos, logo, poderia cuidar de um gato também, era quase a mesma coisa!
– Não me leve a mal, Byun. Mas eu não acho que você vai conseguir me ajudar muito. – Deu de ombros. – Você é um pouco crianção demais, um gato é um filho, é preciso ter muita responsabilidade e-
– Ei, Kyungsoo! – Baekhyun o interrompeu, enfiando um dedo em seu rosto, a pose ofendida enfeitando a cena. – Eu sou seu hyung, então me respeite.
– Eu só disse que é muita responsabilidade, você já é muito ocupado com a faculdade, não vai dar conta-
– Isso é um desafio? Pois eu posso provar que consigo ser um melhor pai que você.
– O que-
– Eu proponho guarda compartilhada. No final do mês descobrimos de qual casa o Bob gostou mais.
Kyungsoo raciocinou, levantando-se do chão, deixando que a sombrinha caísse e que o sol pudesse iluminar com perfeição seus brilhosos cabelos escuros. – Você não vai me deixar em paz se eu não concordar, não é?
– Não e eu sei onde você mora.
– Claro que sabe, somos vizinhos. – D.O bufou. – Tudo bem. Mas o que é Bob?
– Ele! – Baekhyun pegou o gato de pelagem branca no colo e mostrou em frente ao seu rosto. O gato miou.
– E se for menina?
– Vai ser Boba!
Kyungsoo piscou lentamente e se arrependeu mentalmente do que havia aceitado fazer. Seria um mês longo, sem dúvidas.
Segundo dia – 06/04/19
Baekhyun se atrasou para faculdade naquele dia, acordou com o quinto despertador, o de quase nove horas.
– Está atrasado. – O pai disse assim que o viu descer as escadas, tropeçando no único pé em que tinha um tênis, detalhe, o cadarço não estava amarrado. Caiu da escada, como era previsto, bateu a cabeça no começo da escada e grunhiu de dor alto o suficiente para que Kyungsoo, do outro lado da rua, saindo para sua faculdade de jornalismo, parasse e se colocasse na ponta dos pés para descobrir o que acontecia. – Não corra na escada.
– Obrigado, pai! – Resmungou de volta, pondo a mão na testa, sem sinal de sangue, mas o local latejava.
– Café da manhã?
– Não posso, estou atrasado, mas como algo na cantina da faculdade. Até mais tarde, beijo!
Abriu a porta com tudo e pode ver Kyungsoo tentar disfarçar que estava bisbilhotando. Sorriu e espremeu os olhos na direção do vizinho, praticamente zombando dele. – Perdeu algo aqui, Kyungsoo?
– Só ouvi um barulho e fiquei preocupado, não pode me culpar por zelar pela vida da comunidade. – Levantou o nariz e começou a andar, deixando um Byun bobo para trás.
– Ei, me espere. – Baekhyun correu até ele, pondo-se a caminhar logo depois, meio ofegante e todo desconcertado. – Como está o Bob?
– Donnie, você quer dizer.
– Se é para por um nome tão besta como esse bem que poderíamos colocar algo como... Hm, Trump?
– Não diga besteiras! O Estado Unidos conseguem nos ouvir.
Baekhyun torceu a cara numa expressão de pena. Não sabia se pessoas estranhas como Kyungsoo estavam condicionadas a acreditar em teorias de conspiração, mas torcia para que ele não colocasse minhocas como aquelas na cabeça de Bob.
– Isso nem existe!
– Existe sim! Meu professor passou um trabalho sobre meios de comunicação e como eles podem nos manipular. Os Estados Unidos conseguem nos manipular em propagandas na TV e até mesmo em músicas nas rádios, é verdade, eu pesquisei!
– Táaa bom, né. – Saiu andando na frente, deixando um boquiaberto Kyungsoo para trás. – Aliás, vou passar na sua casa mais tarde para pegar o Bob, hoje é meu dia, lembra? Não deixe o Estados Unidos levarem ele embora, tá bom? Buuu! – E riu, quase perdendo o ônibus em seguida.
Lá pelas três horas Baekhyun retornou, perdeu o primeiro ônibus para voltar e assumiu que aquele não era seu dia de sorte. Estava esgotado e com um trabalho em grupo para fazer que estava para o tirar do sério, sua mente era um loop infinito da sala se organizando para o trabalho e lhe sobrando somente Park Chanyeol e seu telefone e o outro garoto chinês que não sabia falar a língua deles por isso vinha acompanhado do primo que era fluente em coreano.
Ah, e todos ainda teriam de caber em sua minúscula sala!
Bateu na porta da casa de Kyungsoo um minuto antes das quatro. Ele atendeu a porta com uma roupa diferente e óculos de grau, supôs que ele já havia chego há muito tempo. – Vou pegá-lo. – D.O avisou, sumindo por um minuto e reaparecendo com um gato com um pelo tão branco que poderia cegar, trajando uma roupa de tubarão. – Eu o levei ao veterinário ontem, ele tomou uma vacina e o Dr enfaixou a pata machucada, ele também fez alguns exames, mas não é nada com que precise se preocupar-
– Não pode levá-lo ao médico sem me dizer! Precisam dos dois pais presentes para fazer as coisas! – Baekhyun ralhou, magoado por não ter acompanhado Bob em sua primeira visita ao médico.
– Baekhyun, não pira. – Kyungsoo revirou os olhos, pressionando as têmporas para acalmar-se. – Traga-o amanhã nesse mesmo horário, ok?
– Você é chato, ok? – Deu língua, virando-se com o gato no colo e caminhando para casa. Ouviu a porta bater atrás de si e encolheu os ombros. – Ele é chato, não acha Bob? – O gato miou.
Sétimo dia – 11/04/19
Kyungsoo estava sentado escorado em sua janela, no segundo andar da casa, olhando para a casa de Byun Baekhyun, do outro lado da rua, esperando que o garoto despontasse lá com seu gato em mãos.
Era algo perto das cinco horas da tarde, o sol começava a se pôr no horizonte e Kyungsoo sentia a preocupação crescer no peito. Quis ligar para Baekhyun, mas não tinha seu número. Quis bater no portão dele, porém, não sabia se tinha tanta coragem assim para isso.
Decidiu então esperar, a primeira hora ficou olhando pela janela. Depois pelo olho mágico em sua porta, e por fim, quase às sete, decidiu sentar-se na calçada.
A luz da cozinha não estava acesa, o que só piorou a situação para Kyungsoo, que jurou que Baekhyun havia sido sequestrado a caminho de casa e até que o Sr. Byun chegasse, Donnie morreria de fome.
Um pesadelo!
E por fim viu-se caminhando até a casa do outro lado da rua. As pernas davam passos largos para que chegasse mais rápido até o vizinho, o coração estava desparado e a boca não conteve-se somente com bufadas de ar quente, teve de gritar por Baekhyun na porta; – Baekhyun?!
A vizinha deles saiu no portão, tinha luvas térmicas e uma bandeja com biscoitos recém assados em mãos. Ela espreitou, mentalmente fazia um interrogatório, tombou a cabeça para o lado e por fim entrou na casa outra vez.
– Eu hein. – Kyungsoo reclamou, enfiando o dedo na campainha outra vez, e mais uma e outra e por mais vezes até que a mesma vizinha saísse e gritasse para que parasse de apertar aquele inferno antes que ela enfiasse uma fornada de biscoitos quentes como brasa em um local não muito apropriado. Kyungsoo acatou, afastando-se da porta, se virando a tempo de Baekhyun, com a rapidez de uma lesma, abrir a porta.
– Quem é?
Kyungsoo virou-se novamente, os braços cruzados e uma expressão não muito receptível. – O que você fez com o Donnie?
– Com que- Ah! Bob, ele tá bem... Eu acho. – Olhou para trás, vendo o gato jogado no sofá, bem em cima da almofada preferida de seu pai. – Olha ele ali! Bob, psi, psi.
– Seu idiota, era pra ter me levado ele há mais de duas horas! – D.O ralhou, escancarando a porta e entrando sem pedir, passando por baixo do braço estendido de Baekhyun. – Pode ficar ciente de que não vai pegá-lo amanhã e que ele ficará comigo até o fim da semana.
– Amanhã eu passo lá. – Baekhyun respondeu, escorando-se ao lado da porta, cruzando os braços e desafiando Kyungsoo com os olhos.
– Ligarei para a polícia. – O moreno avisou, virando-se para encarar o dono da casa com Donnie em mãos, mas teve de prender a respiração e apertar o gato para conseguir manter a pose de mãe ofendida, pois Baekhyun ostentava um físico impressionante e desnudo em sua frente.
– Mandarão a viatura mais próxima da região e então você vai conhecer o segundo avô do Bob. – Baekhyun desencostou da porta, penteando os cabelos rosados e rebeldes de um cochilo da tarde para trás.
Kyungsoo esqueceu-se de que o pai de Baekhyun era policial e amaldiçoou toda a família Byun por ser tão bem sucedida em termos profissionais. – Não apareça! – Avisou, apontando-lhe um dedo.
– Você invadiu a minha casa e chateou a minha vizinha, possivelmente ficarei sem janta porque não sei cozinhar e é ela quem me trás biscoitos, por isso, não vai me impor nada. Amanhã passarei na sua casa, nesse mesmo horário para compensar hoje, e então você vai me entregar Bob e ficaremos por isso. Ok?
Kyungsoo absorveu a informação de que Baekhyun não sabia cozinhar e que estaria perdido sem a vizinha lhe dando biscoitos e saiu da casa sem ao menos despedir-se. Afrouxou o aperto em Donnie e soltou o ar. Sentia-se 0,02% culpado por ter estragado a janta de Baekhyun e ao chegar em casa, deixou que Donnie escolhesse o que fazer e juntou todos os ingredientes que precisava para fazer bibimbap. – Vó, volto em alguns minutos. – Avisou já saindo na porta.
E pela segunda vez no dia bateu a porta de Baekhyun, a lua já tomava conta do céu e as estrelas brilhavam forte. Baekhyun abriu a porta sem demora, ainda não vestido e com um livro em mãos. – Ué, já é outro dia?
– Não, seu idiota. Você disse que não sabe cozinhar, não é?
– Sei fazer suco de pózinho, acho que já tá bom. – Respondeu envergonhado, coçando a nuca e deixando os bíceps marcados.
Kyungsoo revirou os olhos e entrou sem ser convidado outra vez. Apesar de tudo as famílias D.O e Byun eram conhecidas, rumores de que a vóvó D.O havia se engraçado com um vôvô Byun no passado e blá blá blá. Tinham jantares nos dias de ação de graças e às vezes calhava de um aniversário ou outro um bolo dentro de uma vasilha visitar cada residência. Baekhyun e Kyungsoo se conheceram crianças e dividiram brincadeiras de crianças estranhas nos fundos dos quintais. Baekhyun gostava de queimar minhocas com lupas e Kyungsoo de fazer piscina para formigas.
Eram crianças terríveis, e pioraram no ensino médio.
Acabaram por se afastar, mas nunca se mudaram. Cumprimentavam-se esporadicamente, mas não havia mais entrosamento entre eles. Foi triste, mas necessário.
Kyungsoo jamais seria capaz de se perdoar se deixasse Baekhyun sabendo de coisas sobre sentimentos e ele na mesma frase.
– Eu deveria deixar você morrer, assim seria uma competição a menos no mercado de trabalho. – Resmungou, soltando a bacia com ovos, pepino, cenoura e macarrão cru na bancada. – Vou te ensinar a fazer bibimbap e você vai pode sobreviver por mais duas semanas.
O peito nu de Baekhyun encontrou o dorso coberto de Kyungsoo quando ele se aproximou por trás, procurando por algo específico na bacia. – Cadê a carne?
Kyungsoo, arrepiado da cabeça aos pés, engoliu em seco para não gaguejar. – E-eu sou ovolactovegetariano, Baekhyun.
– Isso parece um palavrão, mas eu sinto de alguma forma que é tão ruim quanto. Diz pra mim o que é?
– Eu não consumo nenhuma carne animal, mas incluo ovos, leite e derivados na minha alimentação. – Explicou pacientemente, empurrando Baekhyun com o cotovelo.
– Que chato.
– Não é chato! É questão de humanidade, não deveríamos tirar vidas inocentes apenas porque queremos! Ovos e leites são extraídos naturalmente, nos certificando de que os animais foram bem cuidados e que estão felizes e dividir um pouquinho de leite e-
– Seus filhos.
– Conosco- Baekhyun! Não são os filhos deles, os ovos não são germinados.
Baekhyun riu, afastando-se do outro e se jogando no sofá. – Agradeço pela aula, e por fazer a janta.
– Fazer a janta? Eu não vim fazer a janta, vim ensiná-lo a fazer a janta. Você quem vai cozinhar. – Kyungsoo riu por cima do ombro. – Agora vem aqui para que eu comece a aula.
Décimo quinto dia – 19/04/19
Kyungsoo odiaria admitir que eles haviam criado algum tipo de convivência novamente. Acabaram por se encontrar no ponto de ônibus com mais frequência, ofereciam muito mais do que cordiais sorrisos e ‘olás’ quando iam trocar Bob/Donnie de casa e arriscavam comentar sobre memórias da infância enquanto ofereciam água ou biscoitos um para o outro.
Baekhyun era bastante ocupado com a faculdade e vivia reclamando de um trabalho em grupo, que Kyungsoo teve que ajudar, não tinha jeito. E Kyungsoo também não escapava de responsabilidades, cuidando da avó e fazendo as aulas extras da faculdade.
Por mais que a amizade tivesse esfriado há muito tempo, às vezes, na noite calada, enquanto esperavam o sono os acometer, Kyungsoo e Baekhyun pensavam que poderiam tentar fazer dar certo uma nova vez.
– Olá senhor Byun, como você está? – Kyungsoo cumprimentou ao adentrar a sala dos Byun às sete da manhã. Baekhyun calçava o sapato restante e comia um pão ao mesmo tempo.
– Estou bem, meu filho, você também parece ótimo. Quanto tempo não os vejo juntos, o que aconteceu? Cometeram um assassinato? – Brincou, piscando um olho na direção deles. – Quer tomar café?
– Adoraria, mas já estamos atrasados. Vem, Baek. – Kyungsoo segurou a gola do uniforme alheio e foi o arrastando pela rua até o ponto de ônibus. Mal percebendo que usara de um apelido antigo para dirigir-se ao vizinho.
Senhor Byun assistiu-os partir da porta de casa com, Dobbie, como era chamado o gato agora, em seu colo, ressonando alto. – Ah, Dovie, eu os vi nascer e agora os vejo indo juntos para faculdade. Devo estar ficando velho...
Décimo sétimo dia – 21/04/19
Por mais que já se encontrassem nos fins de aula com uma frequência grande, naquele dia era especial, pois Baekhyun e Kyungsoo decidiram sair juntos. Por mais que estudassem no mesmo prédio, não conseguiam se ver por terem horários muito diferentes e por Kyungsoo fazer a maior parte das aulas em casa – havia optado pela faculdade semipresencial para cuidar da avó e não via problemas nisso.
Decidiram sair para conversar sobre bobeiras e provas, tomar sorvete juntos e outras coisas idiotas de quase-adultos, mas no meio do caminho Kyungsoo lembrou que estava com dor de garganta e Baekhyun que era alérgico ao emulsificante utilizado na composição da sobremesa.
Pensaram em uma solução rápida para o problema e avistaram as barracas de fast-food da feira estrangeira, então decidiram comer hot-dog, mas antes que pagassem, Baekhyun gritou que Kyungsoo era vegetariano pois o mesmo havia esquecido, e Kyungsoo o lembrou da alergia a pimentão contido no molho do fast-food.
Riram como idiotas e rodaram a cidade atrás de algo que pudessem comer sem problemas. Pensaram em pipoca mas Baekhyun não comia pipoca, lembraram de uma vendinha de pastéis, mas Kyungsoo não gostava de coisas fritas, pensaram em salgadinhos de vento, mas concordaram ambos que aqueles biscoitos não faziam bem a saúde, e no final do dia terminaram em um hortifrúti comprando maças e outras frutas.
– O dia foi um desastre! – Baekhyun reclamou, mordendo a pera que tinha em mãos. Kyungsoo negou ao seu lado, enfiando um morango na boca.
– Discordo, além de não termos consumido nada com agrotóxicos, ainda ajudamos os microempreendedores locais, o que é muito importante se você não quer deixar uma pegada ecológica muito grande.
Baekhyun riu porque não entendeu o que aquilo queria dizer, era de exatas! Mas achou bonito o jeito que Kyungsoo parecia especialmente focado em conscientizar tudo e todos.
– Por que está me olhando como um tapado? – Kyungsoo inquiriu, franzindo a testa em careta. – Tem semente no meu dente? – Tentou tirar com a língua, mas não sentia nada de errado, continuou perguntado a Baekhyun o que havia de errado mas ele não respondia. – Baek?
– Você parou de falar comigo... – Baekhyun lembrou subitamente. – E até hoje eu não sei porquê... Kyung, o que houve? Eu fiz algo de errado? Disse alguma coisa errada? Comi muita carne? Deixei muita pegada ecológica?
– N-não, Baekhyun. – Respirou fundo, sabia que algum dia teria de falar, sabia que não poderia protelar ou esconder mais. Mas não tinha coragem, não quando haviam quase voltado ao tempo de criança, sem brigas idiotas, sem discussões, apenas sentados e conversando civilizados. Kyungsoo sentia muitas saudades de ter um confidente, nunca conseguira ter uma amizade como a que teve com Baekhyun, e nunca conseguiu esquecê-lo também.
– O que foi então? – Ele insistiu, o rosto deformado em frustração. – Por favor, me diz!
– Não foi nada! – Respondeu no mesmo tom, recuando. – Nós só entramos em uma bifurcação e cada um seguiu um lado.
– Não, não foi isso, eu lembro que você parou de me responder, parou de falar comigo assim que entramos no ensino fundamental. Faz mais do que três anos que você sai da sua casa toda manhã e finge que não me vê. O que eu fiz?! – gritou, segurando Kyungsoo pelo ombro. – Eu não consigo começar isso tudo de novo sem pensar que a qualquer momento você pode me virar as costas de novo!
– Eu não vou fazer isso, Baek. – Kyungsoo respondeu baixo, os olhos lacrimejando, ardendo. – M-me solta, por favor.
Baekhyun ficou em silêncio, encarando o vizinho com firmeza, esperando a resposta que queria, mas não obteve. Aproximou o rosto de Kyungsoo e por alguns centímetros não foi capaz de beijá-lo, por fim abaixou a cabeça até que estivesse com ela colada no peito de Kyungsoo, contou até dez para controlar a respiração e se levantou.
Por dentro não pensava, e por fora só agia.
A mãe o havia deixado, o irmão havia se mudado para longe, o pai quase não ficava consigo e o único amigo que teve em sua vida fez questão de abandoná-lo quando ainda eram crianças. Aprendeu que as pessoas não ficavam por muito tempo e tinha medo de deixar Kyungsoo entrar outra vez... Não sabia se aguentaria deixar mais alguém partir para longe, mesmo que o longe fosse somente ali do outro lado da rua.
Vigésimo primeiro dia – 25/04/19
Naquela manhã de quinta-feira não fazia sol. As nuvens pesadas cobriam o céu, e antes de sair de casa Baekhyun lembrou de pegar o guarda-chuva preso no corrimão da escada e por mais que não estivesse atrasado, correu até o ponto de ônibus. Kyungsoo estava sentado lá, um livro pesava nas coxas cobertas por uma calça grossa camuflada. Ele levantou os olhos cobertos pelo óculos de hastes grossas e lhe deu um sorriso educado.
– Bom dia, Baekhyun.
– Bom dia.
Kyungsoo respirou fundo, sabendo que Baekhyun não estava de todo errado pelo gelo que lhe dava. Suas questões eram válidas e o medo de ser deixado de lado também... Mas será que teria coragem o suficiente para lhe dizer o que rondava a cabeça e doía no peito?
– O dia está bonito hoje, não está? – Insistiu, vendo-o olhar o céu.
– Não gosto de dias chuvosos.
– Não gosto de dias com sol. – Kyungsoo riu.
– Eu sei. Sempre fomos yin yang um do outro. – Baekhyun respondeu num soprar de ar, enfiando as mãos no bolso do casaco e tirando os fones de ouvido de lá, não queria parecer uma criança mimada, mas não achava justo que Kyungsoo o deixasse mais triste do que dias sem sol.
– Baekhyun... – Kyungsoo iniciou, olhando para os pés se movendo com ansiedade. – Eu gosto de você, foi esse o motivo de eu ter me afastado. Achei que você me odiaria por ter deixado isso acontecer e decidi que seria melhor deixar isso tudo de lado, tentei ser apenas seu amigo mas não consegui, o que eu sentia era muito mais forte e eu precisei meu afastar de uma vez. Eu sinto muito se te magoei, sinto muito por não ter contado, mas me entenda por favor-
– O ônibus tá vindo. – Baekhyun retirou o fone e se virou, Kyungsoo o olhava com a boca aberta e os olhos úmidos. – Estava falando comigo? Desculpa eu estava com fones.
Kyungsoo horrorizou-se pela confissão aos ventos e se levantou o mais depressa que pode. – S-só avisei que ia levar Dobbie em sua casa.
– Ah. – Baekhyun concordou e entrou no ônibus. Por uns segundos tentou adivinhar o que Kyungsoo teria lhe dito, e se era alguma coisa importante, mas não deixou que a dúvida o corroesse por muito mais tempo e retornou os fones aos ouvidos.
Um mês – 05/05/19
Baekhyun passou umas semanas desconfortável levando e buscando Dobbie, começava a achar que a paternidade viera muito cedo e às vezes arrependia-se por isso. Mas logo dissipava aquele pensamento e tornava a pensar em como ter o gatinho ao seu lado o ajudara a perder o constante sentimento de solidão.
Aquele dia era o dia em que Dobbie precisava decidir em qual casa ficaria. Estava apreensivo, pensava que perderia Dobbie e Kyungsoo, os dois, de uma vez só. Chorou na madrugada, olhando a casa vizinha pela janela, cantou músicas da Lana Del Rey e fez uma chamada para Yixing, confessando que sentia borboletas no estômago toda vez que Kyungsoo sorria e que o google o dissera que tinha câncer no estômago devido ingestão de insetos. Chorou um pouco mais porque Yixing era o garoto estrangeiro em sua sala que não entendia nem falava nada de coreano e no fim ele murmurava várias vezes a única palavra que conhecia: wae?
Quando o relógio apitou às 09h da manhã, banhou-se e escovou os dentes. Vestiu um moletom surrado e calças de um desenho antigo. Desceu as escadas com Dobbie no colo e saiu e casa.
Do outro lado da rua, na casa vizinha, Kyungsoo ajeitava o cachecol, repetindo o discurso que gravara na noite passada para o espelho. A avó assistiu um programa aleatório na TV e murmurava coisas sobre jogar no domingo de prêmios.
– Eu amo você desde o dia em que aprendi sobre a forma de amor além da parental, amo você por cada mínimo detalhe seu, amo seu sorriso, seu cabelo rosa, seu guarda roupa excêntrico e suas piadas sem graça-
– Vá conversar lá fora, meu filho. – A avó pediu, interrompendo seu discurso.
Kyungsoo respirou fundo e foi abrindo a porta, vendo que do outro lado da rua alguém fazia a mesma coisa.
Ambos Baekhyun e Kyungsoo se encararam, piscando lentamente, e então caminharam até a rua. Baekhyun soltou Dobbie no chão, encorajando-o a decidir com quem queria ficar.
Dobbie caminhou um pouco para frente, fazendo com que Baekhyun sentisse o peito doer já sentindo-se sozinho, e Kyungsoo sorriu contido. Mas logo depois o gato voltara até Baekhyun, que preparava-se para pegá-lo e levá-lo para dentro outra vez, mas Dobbie mostrou-se muito confuso ao afastar-se novamente, e por fim, o gato saíra desfilando pela rua até deitar-se na grama recém cortada da vizinha deles.
– O que será que isso quer dizer? – Kyungsoo aproximou-se.
– Que ele quer viver na rua, talvez. – Baekhyun deu de ombros, sentindo-se esgotado. – Bom, é isso. – Preparou-se para virar e ir para casa, mas Kyungsoo o chamou.
– Baekhyun eu preciso te contar uma coisa.
– Sou todo ouvidos.
Kyungsoo ficou nervoso com aquela afirmação, sentia que iria pirar, mas respirou fundo e começou a dizer o seu discurso de mil e um motivos pelo qual o amava e- – Eu amo você Baekhyun.
O Byun franziu o cenho. – Eu também amo você, foi meu primeiro melhor amigo, por mais que tenha me deixado por nada-
– Não! E-eu, realmente amo você. Foi por isso que eu precisei me afastar, eu fiquei assustado com a sua reação e-
– Espera, Kyungsoo, eu não estou entendendo. – Baekhyun apertou o ombro do vizinho ao vê-lo empalidecer pelo nervosismo. – Respire, respire. Agora me diga, o que aconteceu?
Kyungsoo respirou fundo fechando os olhos, deixou que a mente ficasse vazia e esperou o coração parar de socar o peito com tanta força para retomar a fala. – Quando éramos mais novos, descobri que gostava de você mais do que amigos deveriam gostar, achei que você me odiaria se eu lhe contasse, por isso mantive para mim. Anos passaram e eu não conseguia mais simplesmente esconder, então eu optei por me afastar, pensei que seria mais fácil de superar essa paixão... Mas o tempo passou e nada mudou, e quando eu fui ver nós já éramos estranhos um para o outro.
– Kyung-
– Não! Pera, deixa eu terminar. – Engoliu o bolo na garganta, sentindo o aperto do Byun intensificar no ombro. – E-eu sinto muito por ter te deixado, sinto muito se o magoei, eu não queria isso... Por favor, Baekhyun, me perdoe-
Baekhyun encostou os lábios ao do amigo, sentindo as lágrimas dele infiltrarem os lábios colados. O que estava fazendo não tinha certeza, só sabia que o amigo era incrível e que tê-lo confessando sentimentos tão genuínos para si o deixara feliz. Feliz demais.
– O- o quê? Por que fez isso? – Kyungsoo o afastou, secando o rosto rapidamente. – Você não é... Ou é?
– Sou o quê? Gay? – Franziu a testa e viu o amigo concordar, riu então. – Não existem só gays ou heteros, bobo.
– Então você é o quê?
– Nem todas as coisas precisam de definição... Mas se vai te deixar mais confortável, eu me relaciono com as pessoas que eu gosto... E eu bem que sinto que estou gostando de você da mesma forma que você gosta de mim. Mas não tenho certeza, talvez você vá precisar fazer mais bibimbap para que eu decida.
Kyungsoo controlou um sorriso, socando o ombro dele para descontrair. – Não seja idiota.
Baekhyun soltou uma risada, sentindo o peito aquecer. – Posso te beijar de novo? Da forma certa agora? – Esperou o amigo assentir e o trouxe para perto devagar, começando o beijo com um selo simples, até aprofundar.
– Miau – Donnie enroscou-se nas pernas dos dois miando alto.
– Acho que ele decidiu ficar com nós dois. – Kyungsoo comentou.
– E por mim tudo bem dividir ele com você. – Baekhyun concordou.
Merci pour la lecture!
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