Notas do Autor:
Essa fanfic é uma prenda da Gincana do Biscoito do FNS (Fanfics Naruto Shippers) #QueroBiscoitoFNS #GincanaFNS.
A história se passa no Universo Ninja e tem como tema principal "Primeira vez", focando no couple KakaYama/YamaKashi/ViniQue.
É importante ressaltar que o tempo aqui não é linear, mas os fatos se mostram de uma maneira fluída, tal qual a memória de Kakashi, uma vez que são narrados por ele.
Essa one-shot é dividida em pequenos atos que levam o nome de fenômenos naturais e coisas relacionadas à chuva, que é a nossa grande protagonista juntamente com o casal.
Me despeço aqui, boa leitura!
- Komorebi.
Já em nossa primeira despedida, eu sabia que não seria a última.
E com o tempo pensei que jamais sentiria necessidade de tê-la, por fim.
- A Tempestade.
Por trás da colina, de onde a luz do sol descia sem nenhuma pressa, estava o céu em fogo.
A luz alaranjada já tomava todo o horizonte e eu ouvia o melancólico crocitar dos corvos. Subi vagarosamente em uma marcha sôfrega até o topo, estava difícil de respirar e meus músculos formigavam torpes pelo esforço.
“Você a matou...”
O tom de sua voz soava desdenhoso. Aquele curto emaranhado de palavras diretas e repletas de indiferença me atingiu com mais força do que qualquer outra coisa que ele já tivesse feito. Mesmo que eu já tivesse tentado de várias maneiras livrar-me daquele eco, ele me perseguia há semanas. E sempre que eu ouvia sua voz, sua imagem imediatamente enchia minha mente.
Fecho os olhos e repito a frase. Afundo os meus dedos no chão úmido coberto pela grama alta da colina em um movimento automático a fim de aliviar a tensão que voltava a crescer em mim.
“Por que você a matou?”
“Por que você a matou?”
“Por que você a matou?”
Aquela frase se repetia freneticamente em meus pensamentos, quase podia ouvir sua voz chegando aos meus ouvidos e a raiva cega me consumindo novamente. Eu o via ali, imobilizado sob mim, esperando o último golpe que daria fim a sua existência, fim esse que ele parecia aceitar pacificamente, exceto pela súplica muda em seus olhos.
- Que inferno!
Eu queria amaldiçoá-lo por ter dito aquilo, por me fazer pensar tanto em algo que eu daria tudo para esquecer. Queria o machucar, fazer qualquer coisa que o fizesse se sentir tão mal quanto eu me sentia, mas mais do que qualquer coisa eu me amaldiçoava por não conseguir esquecer aquilo e tampouco conseguir machucá-lo.
- Como você sabia que eu estava aqui, Senpai?
Sua voz despertou-me de meus pensamentos. Virei-me o procurando e o vi sair de seu esconderijo.
- Tenzō, você estava me seguindo novamente?
- Claro que não, Senpai. Só estava me certificando que você está bem.
- E por que não estaria?
- Não creio que A Fundação desistiria tão facilmente.
- Eles não ousariam ir contra um decreto do Sandaime.
- Eu não duvido nada. Senpai... – Ele parecia sem jeito. – Eu ainda não me acostumei a ser chamado de Tenzō por tantas pessoas. Na Anbu é sempre Tenzō pra cá e Tenzō pra lá, que às vezes eu me confundo e nem respondo. Hoje Yugao-senpai me deu um murro por estar me chamando há um tempão e eu não ter respondido.
- Com o tempo você se acostuma. E Tenzō é um nome muito melhor que Kinoe, de qualquer modo.
- Virga
Hoje, quando penso naquele tempo, nunca consigo estabelecer uma sequência para os acontecimentos. Existiam algumas cenas que mais facilmente permeavam meus pensamentos. Algumas imagens flutuavam suavemente em minhas memórias, transbordando o tempo e forçando meus sentimentos margem à fora. E aquele sentimento, ele sim eu me lembrava com exatidão.
Os dias em que despreocupadamente o via seguir-me de um lado à outro foram mais breves do que eu gostaria. Deles eu me recordo principalmente do sentimento de conforto e naturalidade que sua presença me trazia. Ele era alguém fácil de conviver, fácil de gostar, era quase como ter um filhote por perto.
Via-o de tempos em tempos, seja pela vila, em campos de treinamento, ou em qualquer missão. De início ele era como um felino, sempre alerta e disposto a atacar no menor sinal de ameaça. Era seu modo de sobreviver. Eu jamais o julgaria. Em seguida se tornou um garoto rígido consigo mesmo, frio, calculista, amedrontado, revoltado, sagaz, arrogante, presunçoso, amável, paciente e teimoso.
Com o tempo, o vi crescer. Vi suas relações se desenvolverem, seu corpo ficar mais forte, sua personalidade se moldar, cada item de si mesmo se criar até o que as pessoas vêem hoje.
Mas sempre fui privilegiado.
Eu o via onde ninguém mais o via: eu o via In natura. Onde ele pertencia. Em meio à chuva e terra molhada.
Todas as noites, manhãs ou tardes em que havia a chuva, havia ele.
Era como uma maldição. Onde eu sempre sairia inundado, transbordando Tenzō.
Não me lembro exatamente quando comecei a olhá-lo com outros olhos, só sei dizer que foi muito antes de eu sequer imaginar.
Certa vez deparei-me sendo incapaz de tirar meus olhos de si. Por mais que eu tentasse evitar, algo dentro de mim buscava a resposta de uma pergunta não dita, em seus olhos.
Sentia um incômodo em meu peito, como se algo o comprimisse, uma angústia e medo do desconhecido.
Talvez tudo tenha começado logo após sua chegada à Anbu.
Era uma dessas malditas missões tediosas de reconhecimento, eu já não as suportava, e o fato de um novato que me seguia por toda a parte como um filhotinho órfão ser designado para ela só piorou tudo. De Kinoe a Tenzō, ele se transformava de um ninja menos ferrenho para um pré-adolescente falante e confiante demais, cunhado de um sorriso quase acintoso. Em minha mente já elaborava mil possibilidades de ele estragar tudo com seu falatório.
Foi em um desses momentos em que eu me encontrava distraído, perdido em pensamentos, que realmente o notei de fato, pela primeira vez. Seus cabelos castanhos desciam um pouco a baixo dos ombros, e sua pele havia adquirido um suave bronzeado, por nossa breve estadia em Suna.
Foi ali que comecei a me tornar consciente de sua presença, para minha própria surpresa.
- A Chuva.
- O que ele quis dizer com “você voltou?”
Ele sabia o que aquela pergunta significava, mas não pretendia explicar-lhe nada, de qualquer modo. O fato de ele o perguntar a respeito, de certo modo o irritava profundamente. Ele deveria saber muito bem o que aquilo queria dizer.
- Senpai, você não está autorizado a me dizer nada a respeito, certo? Eu preciso descobrir sozinho todos os detalhes...
“Moleque planta idiota.”
Eu o amaldiçoava mentalmente, sabendo que ele não compreendia nem um pouco minhas motivações. De nada adiantaria dar-lhe alguma dica, caso eu fizesse ele entraria em combustão ali mesmo.
- Fique e se concentre no seu treinamento. Temos que terminar isso antes da chuva chegar aqui.
- Eu estou concentrado.
Ele se esforçava pra se concentrar e comprimia seus lábios em uma tensa linha de resiliência . Já fazia um tempo que ele aparentava estar mais distraído e atrapalhado que o normal, e eu me perguntava o motivo por trás disso. Era irônico me preocupar com o quê distraia o meu motivo de distração, mas eu não podia evitar me sentir curioso a respeito de tudo que o envolvia.
- Eu não consigo! Senpai, eu preciso descansar um pouco.
Ele havia falhado inúmeras vezes em selos básicos, isso não era nada usual. Antes que eu tivesse a chance de reclamar sobre perder minha tarde toda o vendo resmungar ali, uma suave garoa despencou sobre nós logo se transformando em uma chuva incessante. Nos escondemos numa espécie de abrigo de madeira que ele construiu na base de uma grande arvore. Ficamos ambos ali encolhidos no pequeno espaço em silencio, o único som que ouvíamos era o da chuva caindo ruidosamente contra o solo e madeira, além de alguns trovões ao longe e resmungos desconexos que Tenzō fazia.
- Qual é o problema?
- Nenhum.
- Ok!
Havia decidido encerrar o assunto por ali quando ele afobado, voltou a falar.
- Senpai, eu me sinto muito atormentado e não sei mais o que fazer. Me ajude!
- O que aconteceu? Yugao te bateu de novo?
- Não! – Ele disse carrancudo. – Eu não tenho um passado e isso me atormenta. Na verdade eu até tive, mas não é como se realmente tivesse existido já que não me lembro de nada. E na Fundação diziam que não temos passado e nem futuro, e isso faz sentido. Como posso ter um futuro sem ter um passado e saber quem eu realmente sou? Árvores não vivem sem raízes.
- Às vezes não ter um passado é melhor do que ter algum do qual se arrepende. Não se preocupe tanto com isso, olhe ali... – Apontava uma grande rocha coberta por musgo. – O musgo...
- O que tem o musgo?
- Ele é a prova de que não precisa ter raízes para viver. Não se preocupe, garoto planta.
Ele sorriu de modo sincero e totalmente adorável e eu quis me socar ou socá-lo por me sentir tão tentado a abraçá-lo, mas me limitei a pegar minha kunai e traçar uma linha no chão nos separando.
- Você é fofo demais, não ouse passar por essa linha. Respeite os limites.
[...]
Várias tardes se passaram em meio a treinamentos que quase sempre eram interrompidos pela chuva. De certo modo eu me sentia grato pela chuva, era como um presente. Aquelas tardes eram mais do que o suficiente, mesmo que a maior parte do tempo passássemos em silencio ou lendo alguma coisa. Era confortável e seguro estar ali, certo também.
Antes que me desse conta, eu ansiava pela chuva. Antes de dormir, e assim que acordava, eu desejava que chovesse para vê-lo novamente.
Quando eu era criança sempre ficava a observar o céu quando meu pai estava fora em alguma missão. Eu tinha a sensação que ele ficava longe demais, inalcançável. É por isso que eu gosto da chuva, ela trás consigo o cheiro do céu e o aproxima de nós, perto o suficiente para tocar.
- Precipitação.
Aquele dia havia começado com cheiro de orvalho. O sol já se espreguiçava por entre a neblina da madrugada. Estava frio e úmido. Eu sentia todo meu corpo se estremecer a cada rajada de vento que soprava em meu corpo naquela manhã. Minhas mãos gélidas me incomodavam de tal maneira que não conseguia mantê-las quietas.
Ouvia o som de sua respiração pesada ao meu lado. Seu nariz vermelho fungava insistentemente enquanto ele se obrigava a manter a pose.
- Você acordou cedo.
- Eu gosto de ver o nascer do sol.
Eu sabia disso.
- Senpai...
- Hum?
- Como é amar?
- Han... Que repentino. Acho meio difícil explicar isso.
- Você já amou?
- Acho que sim
- Como sabe que está amando e não apenas gostando?
- Acho que é quando a despedida se torna insuportável.
Ele se manteve em silêncio, sério sobre seus próprios pensamentos.
- Senpai, acho que amo alguém.
Eu não sabia o que dizer ou como me sentir com aquilo, ele definitivamente estava crescendo e eu não esperava que isso acontecesse tão cedo. Era um fato que eu não podia controlar, e no fundo eu temia que ele mudasse demais e não fosse mais aquele quem eu conheci. Um tempo depois ele voltou a me questionar a respeito do amor, como se eu realmente entendesse o que aquilo significava, imaginava que tipo de visão ele tinha de mim.
- Senpai, como é se sentir amado?
- Eu não sei como explicar isso.
- Como você reagiria com uma confissão inesperada?
- Eu ficaria surpreso...
Eu tentava pensar em como responder adequadamente, como suprir o que ele esperava que eu dissesse, mas aquilo não parecia ser o suficiente.
- Senpai, Yugao disse que me ama. O que eu faço?
Senti o ar me faltar e meu corpo se atrapalhar, numa reação instintiva e falha minha epiglote me sabotou. Engasgado, eu tentava recuperar o ar enquanto ele me encarava com os olhos arregalados demais naquela expressão assustadora.
Por essa eu não esperava. Pra essa eu não estava preparado. Eu realmente não imaginava algo assim.
- Você gosta dela? Se você gostar então dê uma chance a ela, e se não, a agradeça e seja educado e sincero.
- AAAAH ENTENDI! Obrigado, Senpai, você me ajudou muito.
Ele disse já correndo a caminho da cidade. Enquanto eu o via se distanciando, pensava em como deveria tentar seguir em frente e me permitir mais, assim como ele fazia.
- Nimbostratus.
Era um verão estranho, sufocante, úmido demais.
Era apenas a terra morta, os estrondos dos trovões, clarões, e o inicio de uma incessante garoa que parecia anunciar os acontecimentos mais solenes do mundo.
O vento soprava pela planície escurecida e gelada. O céu continuava carregado e cinzento, como o prelúdio de uma tempestade, mas o que de fato caía naquele entardecer era um deprimente chuvisco.
Aos poucos, à medida que a tarde se arrastava, uma linha escura estendia-se no horizonte. O tecido cinzento coloria-se de manchas em movimento, perseguindo-se e repelindo-se mutuamente, seguindo uma a outra sem parar.
A luz atingia as árvores, embrenhando-se pouco a pouco por entre as copadas espessas.
Ele estava sentado num plano um pouco mais elevado que eu, mantendo uma distância cautelosa.
- Senpai, me desculpe.
Ele iniciou de modo incerto, aguardando algum sinal de que devesse continuar. Evitava olhar para seu rosto, de algum modo ele deixava-me angustiado, angústia essa que eu tentava em vão ignorar.
- Você está se desculpando pelo que exatamente?
- Por ter ignorado suas ordens e abandonado a missão.
- Você não parece estar realmente arrependido, Tenzō.
- E não estou.
Ele disse calmo, de modo que deixasse claro que ele não se sentia culpado. Era como se ele dissesse nas entrelinhas que só estava se desculpando para que tudo pudesse voltar ao normal. Não que isso fosse possível, aquela estranheza não nos abandonaria tão facilmente.
Apoei-me em meu braço direito ao me levantar e virar para olhá-lo. Ele mantinha a incerteza em seus olhos. Sem deixar espaços para arrependimento. A angústia queimava em meu peito e eu sabia que prolongar tal desentendimento seria tortura, então dei-me por vencido. - Obrigado por ter voltado.
- Agora quem não está sendo sincero é você, Senpai.
Um som irritante escapou de imediato de seus lábios. Era um risinho baixo, daquele típico sabichão que declara que sabia desde o inicio como aquilo acabaria.
Eu me sentia extremamente irritado e estúpido diante dele. Irremediavelmente inadequado, mas enquanto isso, outra parte de mim na verdade estava feliz por aquilo ter acabado.
- Isso parece significar que estamos quites.
- Talvez...
Ele fingia estar pensativo. Aquele tipo de olhar perdido que ele mantinha enquanto fingia pensar em algo muito além de nós me fazia divagar mais do que deveria, mais do que era seguro.
- Talvez?
Aproximei-me alguns passos em sua direção para encarar aqueles olhos traiçoeiros que se perdiam em algo muito além dos meus desejos. Sentia uma leve excitação imaginando o tipo de futilidade aleatória que ele me pediria em troca dos meus atos impensados. Sorri ao pensar se ele me cobraria uma quantia imensa de dangos ou coisa parecida.
- O que vai ser dessa vez?
- Torta de nozes!
Ele empinou o nariz orgulhoso confirmando minha suspeita sobre sua personalidade admirável.
Não pude deixar de achar graça. Era como se um misto de ataques de fofura, excitação e desespero me inundasse. Mais um passo eu dava adiante enquanto despia minha máscara e a guardava em meu bolso. Ele parecia empalidecido nos primeiros instantes que eu o toquei. Seus olhos arregalados acompanharam o meu sorriso e vi seus lábios se separando ao receber o afago em seus cabelos. Eu queria beijá-lo, sem dúvidas nenhuma, mas jamais ousaria a tal. Aproveitei-me ao deslizar minha mão pela sua têmpora, orelha e pescoço, até descansá-la em seu ombro esquerdo. Seu rosto se ruborizava e eu já esperava pelo sorriso tímido, a mania de esfregar a nuca e o desviar de olhos tão comum, mas ele não os fez.
Tenzō ergueu sua mão direita até meu braço e o segurou. Seu toque passou de leve e incerto para um aperto firme e um sentimento de uma atitude instintiva que brilhava em seus olhos. Eu daria minha alma aos seus céus para saber o que ele tinha em sua mente e a cada segundo que se passava meu peito se contorcia numa onda de desespero e ansiedade. Senti o ar me faltar ao passo que ele abaixava meu braço e me obrigava a diminuir a distância entre nós. Era uma tortura cruel. Era como se ele me domasse aos poucos e provocasse para que todo o medo em mim se aflorasse, para então ele o devorar e se satisfazer com toda a minha esperança.
Eu encarei seus lábios trêmulos e tive a sensação de que ele fez o mesmo com os meus. Meu coração fazia escândalo em meu peito quando ele parou centímetros de concretizar o ato.
Os segundos se tornaram horas dentro de minha cabeça enquanto ele prendia a respiração tão perto de minha boca. Ao aliviar seus pulmões, senti seu nariz roçar meu rosto. Meus olhos se fecharam ao sentir uma onda de arrepios tomar minha coluna, nuca e costas. Ele ergueu sua cabeça devagar, escorregando seus lábios nos meus. Pude sentir sua respiração quente contra a maçã esquerda de meu rosto, e então novamente um escorregar de lábios em direção ao meu queixo. Eu me sentia um tolo ébrio em seu poder. Prendia-me ao máximo em minha incapacidade de o tocar e ao mesmo tempo implorava peço fim de tal tortura. Ele estava brincando com fogo e eu quem estava queimando. Mais uma vez ele apertou sua mão em meu braço e ergueu seu rosto. Foi quando finalmente pressionou seus lábios entreabertos contra os meus. Foi muito mais lento e úmido que meu fôlego me gritava.
Ele me beijou.
Tenzō me beijou.
Foram apenas 10 segundos. Os 10 segundos mais longos de toda a minha vida. E enfim ele o fez. Ainda tomava consciência disso quando ele se afastou e ergueu seus olhos para os meus.
Era êxtase o que sentia. Ele me pedia por uma resposta e eu tomei a decisão mais errada de toda minha vida: O beijei de volta. Com toda a súplica que meu interior gritava. Com toda intensidade que minha paixão me ordenava.
Sentia sua língua invadir minha boca, devolvendo toda umidade que havia perdido nos últimos 10 segundos de queda.
Um esfregar das pequenas saliências ásperas de nossas papilas. Já não fazia ideia de quanto tempo se passara desde o início daquele ato. Nem ao menos lembrava-me de quando ele havia me soltado e me acariciado a nuca. Meu braço imobilizado se prendia de maneira desconfortável entre nossos corpos, enquanto eu mesmo forçava minha própria dor, puxando Tenzō contra mim o mais forte que podia.
A velocidade dos beijos foi diminuindo com o ritmo de nossas respirações.
Eu tinha medo de abrir os olhos. Medo de ser apenas uma ilusão ou de encontrar algum sentimento negativo em seu rosto.
- Eu não sei... - Sua voz saiu fraca e falhada - por favor, só não fuja.
Abri os olhos e pela minha surpresa, ele ainda mantinha os dele fechados, com as sobrancelhas enrugadas. Mas que pensamento idiota! Eu jamais fugiria. Inclusive me sentia surpreso de ele ainda estar ali sem ter se desculpado.
- Tenzō... – O chamei e minha voz saiu tão falha quanto a dele. Tinha tanto a dizer, mas nada faria sentido nesse momento. - O que foi isso?
- Eu não sei.
Ele abriu seus olhos e tudo o que vi foi um reflexo de mim mesmo. Foi então que entendi o significado de ser humano.
Encostei nossas testas. Enquanto sussurrava "está tudo bem". E então ele me abraçou. Forte o suficiente para que eu pudesse sentir seu coração disputar corrida contra o meu.
- Foi melhor do que imaginava. - confessei.
- Senpai! - Ele se afastou rapidamente me encarando com as bochechas e nariz vermelhos.
- Agora você fez isso parecer estranho.
- Chuvas de Convecção.
Não conseguia esquecer a sensação de sua língua fazendo cócegas no interior de minha bochecha horas mais cedo. Concordamos que o melhor para aquela noite seria se fizéssemos um jutsu de proteção no esconderijo e ambos tentássemos dormir, uma vez que faltava pouco até o raiar do sol e que apesar de eu ter me ferido, a missão ainda teria continuidade amanhã. Ele se encarregou de espalhar os selos e armadilhas pelo local para detectar qualquer invasor, e por fim, construiu uma cúpula protetora com seu jutsu de madeira para que dormíssemos.
Oh, Céus! Oh, inferno!
Eu já não sabia mais o que praguejar a essa altura. Tenzō havia me beijado e não demonstrou arrependimento algum, por mais que tivéssemos ignorado o fato nos momentos seguintes.
Ele arrumava dois leitos individuais no pequeno espaço da cúpula. Cada um num extremo.
Ao terminar, ele se deitou de costas para mim, respirando fundo e se mexendo a cada 2 minutos, impaciente. Sentia frio, uma vez que tivemos de apagar a fogueira para conseguirmos dormir. Sem pestanejar, arrastei as minhas coisas para perto dele, e me deitei. Apesar dos seus resmungos, continuei ali. E aquela se tornou uma das noites mais tensas de minha vida. Já havia dormido com mulheres, muitas por sinal, inclusive já havia dormido com ele em outras missões, mas nunca o ar se tornou tão sufocante como agora.
Talvez fosse pelas memórias do início desse anoitecer, talvez fosse por meus desejos terem se concretizado horas mais cedo quando seu corpo se esfregava contra o meu e suas mãos arrepiavam minha nuca.
Eu encarava suas costas sentindo minhas têmporas queimarem, como se ele exalasse um calor intenso demais para manter-se perto
Minutos se passaram enquanto eu encarava suas costas. Senti-me tentado a tocá-lo, mas algo maior travava meus músculos de tal forma que eu jamais o alcançaria.
A certa altura da noite, suspeitava de seu sono profundo. Então ele suspirou pesado e se virou pra mim com os olhos bem abertos me olhando duramente.
Eu não sabia exatamente o que via ali, poderia ser medo – provavelmente - mas com toda certeza havia expectativa. E compreender isso me desarmou por completo.
Eu odiava aquela inquietação em meu peito e o medo que se apossava pouco a pouco de minha alma, mas eu também o amava. Eu amava o medo, se é que aquilo realmente era medo. O impulso que ele me trazia era o que eu amava, o impulso de estreitar cada vez mais a distancia entre nós.
Arrastei-me em sua direção minimamente e aguardei a sua próxima reação, ansioso.
Meu coração batia enlouquecidamente, o sentia desde as pontas de meus dedos até minha garganta.
"Eu preferia que não me amasse."
Ouvia a voz em minha mente sabendo o que aquilo significava. Antes que tivesse a chance de novamente estender a distancia entre nós, foi como se eu tivesse recebido uma rajada de vento no rosto, fazendo com que meus cabelos se arrepiassem. A sensação que veio em seguida não era de frieza, mas sim calor, um calor úmido e sedutor difícil de ignorar.
Eu mantinha meus olhos fixos nos dele por minutos que pareciam infinitos, incapaz de desviar-me ou reagir.
- Eu quero.
O ouvi dizer. Não havia absolutamente nada que eu pudesse dizer ou fazer para dissuadi-lo, e eu não queria. Aquela frase não dava espaço para dúvidas ou medo. Toquei seu rosto suavemente, ele não recuou. Havia uma cumplicidade muda naquele silêncio.
- Eu também.
Disse e o vi estremecer com um suspiro profundo.
Ele tocou minha mão com a sua enquanto eu acariciava seu rosto e também se arrastou minimamente em minha direção. O silêncio era gritante sobre nós. Sentia como se um terremoto estivesse acontecendo em meu corpo quando me movi novamente em sua direção e mais uma vez ele correspondeu repetindo o mesmo ato.
- Senpai... - Ele parecia tímido e incerto ao me chamar. - Posso te beijar?
Nesse exato momento parecia que a gravidade havia abandonado meu mundo. Eu sentia cada pequena parte de meu corpo formigar como se eu tivesse sido eletrocutado. Apenas aquela pergunta era o suficiente para destruir qualquer parede que houvesse entre nós.
- Eu me sinto incapaz de dizer "não".
As palavras saíram como um desabafo.
Eu queria beijá-lo, queria sentir sua língua deslizar na minha como mais cedo. Eu precisava dele. Eu ansiava por ele. Mas sua mente era indecifrável demais para mim. Talvez fosse apenas curiosidade, e sendo assim, eu seria um pecador se avançasse o tanto que desejava. Então só me bastava esperar que ele continuasse a me matar aos poucos.
Antes mesmo que eu pudesse de fato assentir, seus lábios já estavam nos meus se movendo de forma afoita, faminta e necessária. Naquele momento já não existia mais certo ou errado, não havia espaço para diferença de idade, medos ou dúvidas.
Éramos apenas nós dois, nada mais.
Sentia sua mão deslizar por meu pescoço e seus dedos arrepiarem os cabelos de minha nuca. Ele os puxou e eu apertei sua cintura em resposta.
Eu deixava que ele me levasse pelos caminhos de seus desejos e curiosidades.
Conforme ele me arranhava as costas por cima do tecido da camisa, eu deslizava minha mão por seu braço até sua clavícula e seu maxilar. Quando ele deslizou os dedos gelados por dentro de minha blusa, acariciando a pele de que reveste minhas costelas, me arrepiei e instintivamente afundei meus dedos em uma de suas nádegas.
Antes que eu pudesse me dar conta ele já havia tirado sua camisa. Demorei alguns segundos para me recuperar mentalmente da visão de ter-lo curvado sobre mim seminu enquanto me despia. Eu acompanhava cada movimento seu com atenção, notava-o se demorar propositalmente com os dedos segurando o fecho de minha calça, como se quisesse me ver ainda mais ansioso.
"Ela está tentando brincar comigo?"
Ele se ajoelhou e se remexeu se equilibrando da melhor maneira que podia para me despir as calças enquanto eu o ajudava, erguendo meu quadril.
Eu queria poder arrancar suas calças e atirá-las ao longe também, mas o meu braço esquerdo quebrado me impossibilitava.
Ele me tocou. Nós nos tocamos, com paixão, curiosidade, anseio e timidez, disfarçados de medo, incerteza e silêncio. Não avançamos ao nível de um homem com uma mulher. Nossa inexperiência barrava nossos impulsos, mas não diminuía nosso desejo. O modo como me manipulava e como me tocava denunciavam serem as mesmas carícias que fazia a si mesmo. Seria inocência minha pensar que aquela era sua primeira vez, pois eu mesmo já havia me relacionado com mulheres, mas ainda assim o egoísmo dentro de mim gritava: “É a sua primeira vez”. Assim como a minha. Era a sua primeira vez como um homem amando outro homem. Era a primeira vez de Kakashi e Tenzō. A nossa primeira vez.
- Petricor.
[...]
O tempo passava e a tensão entre nós não parecia diminuir ou dar indícios de que se dissiparia em algum momento. Nos primeiros meses optamos por fingir não notar nada, mas estávamos cientes demais um do outro, e isso tornava tudo ainda mais difícil. Fomos designados para algumas missões juntos e quase não falávamos diretamente um com o outro. As poucas vezes que havia diálogos entre nós eram por alguma reclamação ou brigas sem sentido. Um tempo depois me tornei líder de um novo time, o time sete. Algumas vezes eu recorria a ele com desculpas de que precisava de conselhos sobre como ajudar meus alunos, e ele sempre estava disposto a me ajudar. Eu me aproveitava como podia, mesmo que não achasse que fosse um dos métodos mais maduros de conseguir sua atenção.
Eu me sentia frustrado, mais do que qualquer coisa. Eu sou um homem adulto, de qualquer modo. Havia coisas que eu desejava e não fazia sentido agir como se não desejasse. Em uma dessas noites “adultas” ocorreu a cena mais constrangedora de minha vida. Eu estava sozinho em meu quarto, explorando meu corpo de modo recreativo, quando involuntariamente o chamei em meio à euforia, e para meu pavor ele respondeu. Quase tive um ataque cardíaco quando o vi ali parado em minha janela, como sempre fazia ao me visitar e entrar antes mesmo de se anunciar. Ele entrou, ficou ali parado me encarando inexpressivo e saiu novamente sem dizer mais nada.
“Que diabos foi isso?”
Ainda hoje me envergonho quando me lembro do ocorrido, mesmo já sendo Hokage e tendo passado por inúmeras situações de todos os tipos. Com toda certeza é mais fácil encarar a morte do que Tenzō me flagrando novamente. Apesar de todo o constrangimento, creio que essa situação foi o que resolveu tudo, pois pela primeira vez ambos ficamos cientes de como nos sentíamos.
Tenzō ficou meses sumido, e como em todas as outras vezes, a única coisa que eu fazia era desejar a volta da chuva e com ela o regresso daqueles dias.
Algum tempo depois, enquanto os céus se derramavam sobre Konoha, eu novamente o vi, completamente encharcado esperando em minha sacada.
Havia tanta coisa para ser dita, tantas perguntas que eu queria fazer, tantas acusações e ofensas, mas nós não tínhamos tempo a perder com aquilo. Em meio aos beijos urgentes, todas as dúvidas se sanavam, de algum modo. Não me lembro se fora ele ou eu o primeiro a avançar, talvez tenha sido a chuva que nos uniu por conta própria. Mesmo longe de seu alcance, nós continuávamos aquilo que ela começou.
Ele tinha cheiro de céu, de chuva e terra molhada no verão. Tinha gosto de hortelã e pimenta, quente demais para eu não me viciar. Eu pensei em pará-lo, mas já havia passado além do ponto da humilhação e desespero. Era saudade que gritava em seus lábios, ele tinha ânsia em suas mãos, e tinha a mim, assim como eu o tinha. Não sei dizer quanto tempo passamos naquela entrega. Não sei dizer como tudo começou ou terminou. Não sei nem mesmo dizer onde começava eu e terminava ele. Um caos angustiante crescia em mim e eu tinha ciência de que nada poderia aplacá-lo, exceto Tenzō.
Naquela madrugada, sem nada dizer ele se levantou e ficou ao meu lado, observando a chuva que caía ruidosamente lá fora. O cobertor que nos envolvia exalava o cheiro dele, na minha boca ainda sentia seu gosto, e tudo em mim estava repleto dele.
- Se continuar chovendo você vai me fazer companhia?
- Mesmo que não chova eu estarei aqui ao seu lado, Senpai.
Havia mais promessas naquela frase do que qualquer um poderia compreender, e desde então, pela primeira vez, eu já não precisaria aguardar os dias de chuva para tê-lo.
Notas Finais:
Komorebi: “O tipo de efeito de luz disperso e salpicado que ocorre quando o sol brilha através de árvores.”
Virga: Conhecida também como Chuva invisível, tipo de precipitação que cai de uma nuvem mas evapora antes de atingir o solo, enquanto ainda está a cair.
Precipitação: Em Metereologia, é a queda rápida de água para a superfície da Terra, sob a forma de chuva, neve, gelo ou granizo.
Nimbostratus: é uma nuvem cinzenta, baixa (até 3 km de altitude) e de grande extensão, muitas vezes sombria, cujo aspecto torna-se como um véu em consequência das pancadas mais ou menos contínuas de chuva ou de neve que, na maioria dos casos, atingem o solo. A espessura desta camada é, em toda a sua extensão, suficiente para esconder completamente o Sol.
Chuvas de Convecção: Chuvas de convecção são também chamadas de chuvas de verão na região Sudeste do Brasil e são provocadas pela intensa evapotranspiração de superfícies úmidas e aquecidas.
Petricor: é o nome do aroma que a chuva provoca ao cair em solo seco.
Merci pour la lecture!
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