vicentelobo Vicente Lobo

O sono REM além de ser responsável por promover a manutenção da memória e cognição saudável do ser humano, garante um equilíbrio geral do organismo, com a prevenção de problemas do coração, mentais e psicológicos. Estima-se que sua duração total é de uma hora. Contudo, em Itaguaí do Sul, as pesquisas da corporação SOGNO conseguiram alcançar o limiar em duas horas. Planejam ainda expandir essa duração, empregando seus benefícios no tratamento de patologias associadas a letargias. As consequências, no entanto, ainda não puderam ser investigadas. "O espetáculo em geral, como inversão concreta da vida, é o movimento autônomo do não vivo." Guy Debord. "Uma vida não questionada não merece ser vivida." Platão.


Science fiction Dystopie Déconseillé aux moins de 13 ans.

#alternativereality #339
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Prólogo

A esposa sorriu, retribuindo-lhe o olhar. A criança dormia, logo atrás. Já amanhecia, os raios de sol começavam a se estender pelo solo, atravessando a bruma que descia do ar e deslizava sobre o asfalto, à frente. O SUV vermelho cortou o ar úmido, deixando espirais de névoa para trás. Seguia tranquilo, pela PR-239. Há pouco, tinha atravessado a ponte sobre o Tibagi. À direção daquele veículo, Kiro pensou que, enfim, poderiam recomeçar tudo. Sonhos logo viriam à sua mente, uma sensação de paz tomou-lhe conta. E, então, o estrondo sucedeu-se. A lataria girou pelo ar e acabou presa numa árvore à esquerda da via. Uma fileira de pinheiros protegia os veículos de eventuais deslizes pela encosta até o rio. A estrada voltou a ficar deserta.

Ressuscitou meia-hora depois com uma dor lancinante nas costelas. Tentou respirar devagar. À frente, uma árvore de natal parecia ter destruído o vidro dianteiro. Pedaços do airbag entrelaçaram-se às folhas de pinheiro. Uma formiga caminhou pelo seu rosto. Soltou a direção deformada. As mãos tremiam. Percebeu que galhos o separavam da esposa. Não conseguia vê-la. Chamou-a, sem resposta. Puxou a perna da mulher, por baixo da vegetação. Retornou a mão úmida e viscosa. Havia uma mancha de sangue na lateral dos jeans dela. Com aquela mesma mão, ele liberou o cinto de segurança. Tentou se mover, mas estava com a perna esquerda presa ao metal. Não havia dor. Nem mesmo a sentia. Houve um estalido. O carro caiu repentinamente e se prendeu rapidamente, mais uma vez. Um choro estridente veio do banco de trás. Contorceu-se, tentando-se erguer do banco. Mas a dor nas costelas o impediu de continuar. O pouco que enxergou tinha sido a filha que parecia intocada e presa ao bebê conforto. Ele imaginou ela a ficar com o rosto vermelho de gritar. Passou a acalmá-la com uma canção conhecida. Começou a dar certo, ela somente respirava ainda um resto de choro. O pai ficou a repetir alguns trechos da música enquanto engasgava o próprio choro com as lembranças deles até aquele momento.

A quatro quilômetros dali, dois furgões bege atravessaram o centro de Telêmaco Borba. O movimento da cidade se iniciava. Ao chegarem no local do acidente, saíram dois sujeitos de cada veículo. Encontraram vestígios de pneu estourado e marcas de derrapagem. Seguiram as marcas e desceram pela encosta até encontrarem o veículo vermelho preso entre duas árvores. Arremessaram cordas ao SUV e as prenderam às árvores. Um dos homens escalou agilmente um dos pinheiros, certificando-se de prender mais algumas cordas auxiliares, e alcançou a janela traseira do veículo suspenso. Escutou o motorista a pedir para salvar a criança e a comentar sobre a mulher no banco da frente. Quebrou o vidro com uma machadinha. O bebê que havia adormecido, acordou a chorar com o novo susto. O homem cuidadosamente esgueirou-se pela janela e desafixou o bebê conforto. Disse para o pai ficar calmo. Pouco tempo depois, desceu com a criança ainda presa ao bebê conforto, ainda a chorar compulsivamente. Lá embaixo o primeiro homem a entregou a um homem forte, negro, de olhar suave. Este procurou acalmá-la, enquanto a olhava atentamente à procura de ferimentos. Não havia sangue. Era uma menina. Vestia uma peça única rosa com estampa de joaninhas. A roupa era fechada à frente por uma linha de botões escondidos. Não os abriu. Teve medo em realizar qualquer exame físico em uma criança tão pequena. Enquanto isso, os outros homens ainda se asseguravam por garantir que o veículo não se deslocasse para baixo.

- Carlos, vou retornar com a criança. Não consigo parar o choro.

- OK. Manda alguém com o carro de volta, tá?

Acenou com a cabeça e seguiu a subir pela encosta. Ao chegar a um dos furgões, ajustou o bebê conforto ao banco. Depois, saiu em disparada. Intercalou palavras meigas, aos berros da criança. Disse que seus pais logo chegariam, mesmo sabendo que era pequena demais para entender isso. Sua voz grave parecia reacender o choro, justamente quando parecia haver uma pausa. Ele, por outro lado, pensava que enquanto a bebê chorasse, saberia que estava viva.

Ao chegar à corporação, levou-a à emergência pediátrica. Imaginou que mesmo não estando machucada, a criança poderia esperar na creche pelos pais. Após a criança desaparecer num carrinho hospitalar, empurrada para um corredor que ele não tinha acesso, uma profissional da saúde se dirigiu a ele.

- Foi o senhor que trouxe a criança?

- Isso mesmo.

- Quem são os pais ou responsáveis legais da criança?

- Eu não sei os nomes deles. Acabamos de a resgatar. Mas logo vão me informar pelo rádio. Logo devem trazer os pais para cá.

- OK. Mas, vou precisar de quaisquer informações que possa me adiantar.

- Claro.

- Por favor, me acompanhe.

31 Juillet 2022 19:43 0 Rapport Incorporer Suivre l’histoire
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A propos de l’auteur

Vicente Lobo Vicente Lobo é o primogênito de um casal de portugueses que resolveram imigrar ao Brasil. Viveu em diferentes cidades do Brasil, mas apesar de estreita relação à Pátria Lusitana, sente-se mais que um brasileiro, possuindo a língua abrasileirada pelas idiossincrasias desse vasto e diverso país. Presenciou histórias comuns e incomuns, repetidas e originais, mas histórias humanas. Encontrou na leitura e na escrita, um teto que o faz se sentir em casa, onde quer que esteja.

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