Eu não sou boa com despedidas, penso, enquanto o ônibus passa por uma daquelas ruas esburacadas da cidade.
O que eu deveria dizer?
“Até logo”? “Te vejo por aí”? “Até mais”?
Definitivamente, sou péssima com despedidas.
O motorista faz uma parada brusca, e algumas senhoras reclamam ao fundo. A agitação da cidade faz meu coração pulsar à medida que penso no fim inevitável de todas as coisas, mas também acredito que nada tem essa duração eterna que nós tanto sonhamos.
Certa vez, após assistir a Brilho Eterno de uma Mente Sem Lembranças, pensei que haviam finalmente encontrado a solução: uma máquina que apaga as pessoas da sua mente. Simples assim. Você não precisava dizer adeus, bastava livrar-se de todas as memórias com aquela pessoa.
Pensei que aquela fosse a solução mais prática. Eu não precisaria me despedir de alguém que eu não conhecia. Mas valeria a pena?
Apagar memórias. Experiências. Esquecer.
Quem eu seria hoje se não tivesse vivido todas essas coisas?
Sou feita de memórias. Um pouco de cada ser humano que cruzou o meu caminho e dividiu sua própria existência comigo; uma figura que se fez a partir dos fragmentos de cada amor, cada paixão que não deu certo, e apesar das minhas rachaduras ainda muito palpáveis, me sinto mais inteira do que nunca.
Então, se me sinto completa, por que me apagar?
Uma pequena discussão se inicia à minha frente. A senhora reclama que o motorista não é cuidadoso, e ele a manda se danar. Deixo um sorrisinho tímido escapar.
Apagar alguém da memória é extremamente doloroso. Como Joel, eu sofreria com cada lembrança eliminada. Não sei lidar com despedidas, e apagar alguém é dizer adeus para sempre.
Costumo esquecer de coisas do cotidiano. Apagar a luz da cozinha, trancar a porta, desligar o ventilador. Às vezes, até esqueço de algumas pessoas. Quem é que não se esquece, na correria do dia a dia?
Mas essas pequenas recordações costumam reaparecer após longos períodos, e cada memória reacendida em um momento silencioso é como um punhal no peito. Me faz recordar de quem eu era. De quem eu não sou mais.
Eu não sou boa com despedidas. E não sei se consigo dizer adeus agora. Nem se quero.
Se pudesse, eu fugiria. Agarraria nossas lembranças e as levaria para longe; para algum lugar distante de tudo. Passaria dias, meses, anos as protegendo do fim. Construiria um universo só nosso, onde pudéssemos ser nós mesmos, sem medo. Mas sei que as coisas não funcionam desse jeito. O fim chegaria, de qualquer forma.
Puxo a cordinha do ônibus.
Tenho medo de que você me esqueça na próxima parada. Que eu me transforme em memória, até um dia não ser mais nada. E temo que você desapareça. Que o meu cérebro, de memória péssima, te apague.
Mas, se de alguma maneira, isso acontecer, eu peço:
Meet me in Montauk.
Merci pour la lecture!
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