Fausto e Cecília ainda recuperavam do grande choque que fora a morte súbita do seu amigo, colega de trabalho e mentor Francisco Azevedo. Estavam a elaborar uma sequência de entrevistas de recrutamento, que fora uma das últimas atividades programadas que o amigo deixara.
Há cerca de dez anos que ambos haviam sido recrutados pelo amigo comum para integrarem um enorme e secreto projeto científico financiado pelo estado. A empatia que existiu entre eles desde o primeiro momento, logo desde a entrevista de recrutamento, criou laços inquebráveis e que tornavam agora a ausência ainda mais difícil.
O projeto tinha como objetivo, nada mais nada menos, que a possibilidade de viajar no tempo. Francisco já chefiava uma equipa de cerca de sete cientistas quando contratou os dois. Era impossível desanimar com os retrocessos, porque as conquistas, por ínfimas que fossem, eram festejadas e elogiadas como se se tivesse descoberto o segredo da vida eterna. Assegurava aos companheiros que tinha absoluta certeza de que havia por aí muitas provas vivas das viagens no tempo, só que nós não as reconhecíamos. Muitas vezes, feliz com ele próprio e como ele só, dizia em altas vozes: “Nasci em Montalegre, a terra mais bonita do país, formei-me no Porto, a cidade mais bonita de Portugal e trabalho naquilo que gosto, rodeado dos melhores cientistas do mundo!” Quem poderia resistir a dar tudo por aquele homem?
Ele tinha a certeza de que o objetivo era possível e prometia-lhes que estaria lá com eles para ver o resultado, mas era óbvia para todos a degradação de saúde rápida que o afligia, apesar de ter apenas cinquenta e oito anos. Ausentava-se vários dias para exames médicos e tratamentos no IPO de onde regressava mais macilento e cansado.
Na noite anterior à sua partida, resolveram relaxar um pouco e foram os três para um bar onde Francisco os fez prometer que nunca desistiriam do projeto, acontecesse o que acontecesse. Ele tinha a certeza de que os dois amigos eram cruciais para atingirem o objetivo, que estava muito próximo. Conseguira novo financiamento e iam admitir mais três cientistas para a investigação. Naquela altura, ninguém imaginava que iriam perder aquele homem extraordinário tão depressa e ninguém queria acreditar quando souberam que a empregada doméstica o encontrara sem vida no escritório de sua casa na manhã seguinte.
Organizado e previdente como era, Francisco deixara todo um conjunto de determinações e planos que lhes permitiu facilmente continuar a investigação. Indicou Cecília como investigadora sénior, logo seguida de Fausto, para tomarem o rumo e gerirem o projeto após a sua morte. Não podia evitar, porém, que o desânimo se instalasse e o ritmo de trabalho decrescesse, falho do ânimo e orientação do falecido.
E foi assim que chegaram ao momento atual, os dois cientistas a executar uma das últimas atividades completamente organizada pelo saudoso amigo: as entrevistas para a contratação dos novos investigadores entre os recém-formados das universidades. As candidaturas a entrevistar já estavam escolhidas e tudo. Francisco fizera-os prometer que seriam eles nesta atividade, acontecesse o que acontecesse e que a não confiariam a ninguém.
Fausto estava aborrecido, depois de entrevistarem mais de uma dezena de jovens que variaram entre o petulante e o inseguro, mas todos, claro, sem experiência no campo pretendido. Foi Cecília quem demonstrou mais paciência e confortou o colega, fazendo-o aguentar até ao fim, alegando que tinham uma promessa a cumprir. Até poderiam não escolher nenhum dos candidatos e abrir novo concurso, se necessário, não havia indicações de quem deveriam escolher, nem se deveria ser alguém daquele concurso especificamente.
Chegaram finalmente ao último candidato, não havia mais pastas com processos, mas sabiam que havia mais um jovem na sala de espera. Nesse momento entrou uma das secretárias da empresa que acompanhava o processo e entregou-lhes um envelope A4, fechado, onde estava escrito o nome deles. A funcionária explicou, antes de sair novamente, que foram dadas instruções para que só lhes fosse dada essa pasta quando fosse a última entrevista.
Abriram o envelope, que continha uma capa de processo igual às dos outros entrevistados, mas, ao abri-la, ambos ficaram um pouco confundidos ao ver uma foto do falecido amigo, muito jovem à cabeça do processo.
Simultaneamente, a porta do gabinete abriu-se e um autêntico clone do cientista desaparecido, embora mais novo uns bons anos, apresentou-se:
— Chamo-me Francisco Azevedo, tenho vinte e sete anos, natural de Montalegre e sou formado em Física pela Faculdade de Ciências da Universidade do Porto.
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