Hoje o dia permaneceu cinzento, frio e chuvoso, o clima estava péssimo. Consegui sentir as energias negativas que tomavam conta do ambiente, olhei para o céu, senti a chuva cair em minha pele e ao mesmo tempo o vazio emocional dentro de mim. Já não havia mais dor, felicidade, brigas, ódio e muito menos amor. Tudo isso havia morrido naquele dia, junto a todo o resto e inclusive eu mesmo.
Caminhei pelos escombros apenas observando as ruínas de cidades, de locais que ainda estavam em perfeito estado e um dia foram habitadas por pessoas cheias de vida, sonhos, esperança e amor. Conforme fui andando nem mesmo o sentimento de culpa que eu sentia ao agredir alguém em uma imensa raiva veio fazer-me companhia. Se eu conseguisse sentir alguma coisa nesse momento, diria que sentiria algo como uma espécie de abandono. Todas as pessoas que um dia conheci, que eu poderia vir a conhecer e junto a elas, todos os sentimentos que eu possuía anteriormente acabaram deixando-me para trás. Estou sozinho em um mundo moribundo e sem esperança de vida.
Eu não consigo sentir culpa. Por que eu não sinto culpa? Eu deveria sentir-me culpado, não é? Qualquer pessoa em sã consciência se sentiria culpado por algo assim. Por que eu não me sinto? Aliás, por que a falta das emoções que eu supostamente deveria sentir é algo que me incomoda tanto? Eu deveria ser capaz de sentir algo quanto a tudo o que eu acabei de fazer. Ou será que fiz a algum tempo? Eu mesmo não sei dizer...
O que aconteceu? As vezes me pergunto isso, embora eu mesmo saiba a resposta lá no fundo. Acho que tudo começou por uma mistura de coisas tenha resultado em uma grande catástrofe. Uma briga familiar, um amor que não deu certo, quebra de uma ou várias amizades, o mundo que nunca aparentou que teria algum dia seria melhor e a minha própria existência quebrada. Eu tinha o poder para mudar tudo e também possuía a determinação necessária para isso. Tinha decidido que era hora de mudar o mundo e comecei causando grandes impactos, o que apenas resultou em mais ódio só que direcionados a mim. As pessoas estavam com medo da minha existência e começaram a fazer de tudo para se proteger. Até mesmo aqueles que um dia considerei serem meus familiares e amigos estavam contra mim, o que me causou um tipo de sentimento amargo.
Então, em meio a toda a fúria e solidão que senti por simplesmente não achar alguém que me entendesse, eu decidi que forçaria todos a verem o meu ponto de vista e pensei que estivesse certo em seguir com o rumo que eu desejava. Era o melhor para humanidade. Apesar disso tive vários momentos de incerteza, mas logo voltava a ser certeza quando eu sentia a dor de cada golpe, a falta de fôlego e o calor de meu corpo, junto todo aquele suor que me recordo de incomodar bastante.
De alguma forma toda aquele amontoado de sensações se tornaram o farol que eu precisava para seguir com o meu objetivo e isso me trouxe alguma certeza, que no final das contas talvez eu estivesse errado. As vezes me pergunto onde foi que eu errei? Não consigo chegar a uma conclusão.
Certa vez eu tive um sonho bem estranho onde não havia mais ninguém no mundo, com exceção de mim. Todo o lugar por qual eu passava só existia destruição e morte. Já não há mais vida para perpetuar o caos ou a ordem, por isso tudo estava quieto. Eu realmente pensei que aquilo fosse um sonho. Na noite anterior a este sonho me recordo que em agonia em meio a toda solidão que sentia eu fui dormir chorando pela última vez. Em meu sonho me vi várias vezes matando todos que eram importantes pra mim um após um e em seguida me virei contra o mundo esmagando todos que entravam em meu caminho, ignorando completamente os gritos que imploravam por misericórdia. A cada vida que eu tirava, menos me fazia diferença.
Era só um sonho, então não precisava me preocupar com isso, certo? Errado. De alguma forma sem perceber, a minha noite de sono acabou levando dias até que eu retornasse a mim e percebesse que tudo o que eu conhecia, sabia e até mesmo sentia, tinha acabado de matar. Quando finalmente tinha caído de joelhos e estava pronto para chorar por achar que seria pego por um sentimento enorme de remorso, eu tive então uma grande surpresa: Eu simplesmente não consegui sentir nada.
Não sentia que havia feito o certo, mas também não sentia que havia feito o errado. Eu havia acabado de matar um mundo inteiro com minhas próprias mãos e me sentia completamente indiferente com o meu ato. Caminhei por dias ou talvez anos observando os meus próprios feitos e tive a sorte de achar corpos esmagados e alguns inteiros porém sem vida. Mas era não havia nada além disso por lá. A única coisa que escapou das minhas garras aparentemente havia sido a natureza em si já que os animais e as plantas estavam quase que intactos. Será que no momento em que eu estava sem consciência acabei escolhendo de forma tão seletiva? Queria poder lembrar para saber disso.
Sem resposta, é? Que diabos. Por que será que ainda estou vivo? Gostaria de ao menos conseguir entender isso.
Um ser caminha em minha direção e estende sua mão. Eu agarro sua mão e fito seus olhos frios, até me identifico, pois se tratava de alguém que também não tinha vida. Apenas o ouvi dizer que eu não teria o descanso eterno e que receberia um trabalho para ser feito pela eternidade.
Quem eu fui? Isso não importa. Quem sou eu? Eu sou aquele que todo ser vivo eventualmente irá encontrar e posso estar em todos os lugares como ao mesmo tempo posso não estar. Estou mais para um aspecto e não um indivíduo. Eu sou aquele que eventualmente leva todos ao descanso eterno.
Merci pour la lecture!
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