juniosalles Junio Salles

O que você faria se existisse um aplicativo que garantisse encontrar o amor da sua vida? E se esse aplicativo tivesse como regra nunca se encontrarem pessoalmente e só se falarem através dele? Este é o One Shot, o aplicativo de relacionamento que promete encontrar o par ideal para todos os seus usuários, porém, não tentem desobedecer as regras. Acompanhe a história de Wagner, um homem divorciado que decide usar o One Shot para buscar companhia para seus dias solitários. Lá ele conhece Alice, que rapidamente se torna o amor da sua vida. No entanto, as regras ditatórias do aplicativo começam a atrapalhar a relação dos dois.


Romance Suspense romantique Tout public.

#amor #romance #tecnologia #futurista #redes-sociais
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Tédio

Wagner estava deitado no sofá em uma tarde tediosa de sábado. A luz avermelhada do sol que começava a se pôr entrava pela sua janela e fazia suas paredes brancas tomarem um tom alaranjado. Rolava a timeline do Instagram à procura de algum vídeo ou foto interessante que pelo menos lhe fizesse sorrir.

Depois de um longo tempo vendo fotos de pessoas felizes vivendo vidas que pareciam muito mais interessantes do que a dele, ele se deparou com um anúncio de um aplicativo para encontros chamado One Shot. A princípio, sua reação instintiva foi de avançar para a próxima foto e ignorar aquele anúncio, porém, algo dentro dele o fez rolar a tela para cima e clicar no link do anunciante.

O smartphone saiu do Instagram e foi para a loja de aplicativos, na página do tal One Shot. Wagner viu as avaliações e em sua maioria eram positivas, o app tinha uma avaliação de 4,9 e a maioria dos comentários era de pessoas elogiando e dizendo que a aplicação lhes proporcionara a melhor conversa de suas vidas. As únicas reclamações eram que o aplicativo apenas permitia conversar com a pessoa que ele escolhia e ninguém mais. Aparentemente, não tinha um sistema de "like", "dislike", ou "match", como era costumeiro nesse tipo de aplicativo. O sistema se gabava de sempre escolher a pessoa certa e não haver necessidade de falar com outras pessoas. Outra característica que Wagner considerou negativa era que o app não permitia passar qualquer tipo de contato fora do sistema. Ou seja, não era possível passar o número de telefone, e-mail ou se adicionar em outra rede social. Toda interação deveria acontecer exclusivamente pelo aplicativo. Nem mesmo endereço era possível trocar, nem marcar encontros. Wagner ficou pensativo, como é que o app ia impedir as pessoas de marcar um encontro?

Estava inclinado a voltar ao Instagram e deixar aquela história de One Shot para lá. No entanto, a curiosidade venceu e ele acabou baixando o app. Já estava na tela de cadastro e a primeira coisa que pediam era para criar um nick de usuário.

"Advogato" — Ele digitou. Era o mesmo nick que usava nas salas de bate-papo que eram febre no início dos anos 2000. Na época, era apenas um estudante de direito e achava engraçado esse trocadilho. Hoje sabia que era terrível, mas não estava criativo para inventar algo melhor que aquilo.

Quando clicou em avançar, o sistema retornou com uma mensagem:

"É sério? Esse nick é tão fora de moda, que tal usar só o seu nome?"

Wagner sorriu. Pelo visto, até o sistema sabia que aquele era um péssimo nome. Ele clicou em "WAGNER", e o sistema utilizou seu nome como nick na rede social. Em seguida, clicou em avançar.

"Que tal me dar permissão para acessar as suas redes sociais? Assim eu vou aprender mais sobre o que você gosta e assim vou ter mais informações para escolher o par ideal. Quanto mais eu souber, mais assertivo vou ser. Deseja dar permissão para coletar dados das redes sociais?"

SIM / NÃO.

Wagner clicou em SIM. Pelo menos aquele app tinha a decência de pedir permissão para acessar seus dados. "Vê se aprende Facebook."

O aplicativo passou alguns segundos carregando e em seguida criou um perfil com cinco fotos retiradas do seu Instagram. Pelo menos eram boas fotos.

"Agora preciso ter acesso aos seus históricos de navegação. Quanto mais eu souber de você, mais eu vou poder te ajudar a encontrar o par ideal. Deseja dar permissão para coletar dados de navegação?"

SIM / NÃO.

Wagner clicou em não. Tinha coisas que ele pesquisava que tinha vergonha de compartilhar até mesmo com uma inteligência artificial.

"Tem certeza? Como eu vou te ajudar se não souber quem você é de verdade? Deixa vai, eu prometo que não conto para ninguém, será nosso segredinho. Deseja dar permissão para coletar dados de navegação?"

SIM / NÃO, EU SOU UM MEDROSO.

Wagner riu da audácia do sistema e acabou clicando em SIM. Se estava na chuva era para se molhar. O sistema carregou um pouco e depois retornou com outra mensagem.

"Certo, agora te conheço. Vamos definir as suas preferências de gênero. Você está em busca de:"

HOMEM / MULHER / AMBOS.

Wagner clicou em mulher e o sistema carregou.

"Tem certeza que deseja que eu busque apenas por mulheres? Segundo seu histórico de buscas, eu creio que você possa considerar conhecer homens também."

Deseja confirmar sua preferência de gênero?

SIM / NÃO EU VOU EXPERIMENTAR COISAS NOVAS.

Wagner se incomodou com a audácia do sistema. Talvez ele não devesse ter permitido o acesso ao seu histórico. Tudo que ele pesquisara sobre o sexo gay fora por pura curiosidade. Clicou em SIM e o sistema prosseguiu sem mais nenhuma insinuação naquele sentido.

O sistema retornou com três perfis de belas mulheres. Wagner ficou impressionado com o bom gosto da inteligência artificial. Eram três mulheres bem distintas, mas todas muito belas. Em todos os três perfis, tinham cinco fotos cada. A primeira era uma loira chamada Aline. Tinha quarenta anos e olhos verdes. Seu corpo era bonito e apesar de algumas rugas no rosto, não podia negar que era uma bela mulher. A segunda era uma ruiva chamada Alice. Tinha um olho profundamente azul e a pele mais branca que ele já vira. Seu corpo era perfeito, parecia até uma modelo ou algo do gênero. Ela tinha vinte e cinco anos. A terceira era uma mulher negra chamada Rose, tão bonita quanto as demais. Seus olhos eram negros e seu sorriso extremamente cativante. Ela tinha trinta anos.

Ficou em dúvida em qual escolher, mas acabou optando pela segunda, Alice. Ele sempre tivera a fantasia de ficar com uma garota ruiva.

Sentiu-se um pouco intimidado por ela ter a metade de sua idade, mas se tudo ia ser apenas virtual, a idade não fazia tanta diferença.

Após clicar no perfil de Alice, o sistema carregou e em seguida sua câmera frontal ativou e na tela apareceu a imagem da ruiva. Wagner se assustou, afinal fora pego de surpresa. Estava com a barba por fazer, sem camisa e nem penteara os cabelos, não que tivesse muito cabelo para pentear.

— Oi! Tudo bem? — Disse a ruiva sorrindo. Ela vestia uma camiseta branca com um gatinho preto estampado. Não dava para ver o que usava na parte debaixo, pois a câmera não filmava ali.

— Oi! — Ele respondeu timidamente. — Desculpa, eu não sabia que a câmera iria ligar assim de repente.

— Eu só sabia porque uma amiga me disse que era assim, ela também foi pega de surpresa. — Comentou Alice, simpaticamente.

— Espera só eu pegar uma camisa? — Indagou ele retoricamente, Alice fez que sim com a cabeça.

Wagner correu para o quarto e pegou a primeira camiseta que viu. Em seguida, deu uma penteada nos ralos cabelos de sua cabeça e depois voltou para a sala. Antes de pegar o telefone, ele cogitou a possibilidade de encerrar a ligação, desinstalar o One Shot e fingir que aquilo nunca aconteceu. Contudo, estava tão entediado que até a possibilidade de passar vergonha parecia mais interessante do que passar o resto do dia deitado no sofá.

— Voltei. Desculpa mesmo. — Ele se desculpou timidamente.

— Relaxa, não tem problema. — Ela respondeu.

— Eu sou o Wagner, prazer em conhecê-la. — Ele disse depois de alguns segundos de silêncio.

— Eu sei, está escrito aí no seu perfil. — Ela respondeu sorrindo.

Era até meio óbvio, mas ele estava tão nervoso que nem prestara atenção àquele detalhe. Fazia tanto tempo que não conversava com uma mulher assim tão bonita. A última fora sua esposa a muitos anos atrás, mais de dez com certeza.

— É verdade. Eu não sou muito familiarizado com este aplicativo. É a minha primeira vez aqui. — Ele se desculpou.

— Tudo bem, é a minha primeira vez por aqui também. Eu tenho vinte e cinco anos. — Ela disse. Wagner já sabia disso, estava no perfil dela, ela cometera a mesma gafe que ele. Seria por solidariedade?

— Eu tenho cinquenta. Tem problema?

— Você tem como ficar mais jovem? Voltar no tempo? — Ela indagou sorrindo. Ele se perguntou, que tipo de pergunta era aquela.

— Não.

— Então isso não é um problema. Idade é apenas um número.

— É verdade, também penso assim.

— Que ótimo. Falando de idade, qual é o seu signo?

Ele ficou um tanto pensativo. Odiava essa história de signo. Para ele, essa era a crença mais idiota e mais sem sentido que existia. O sistema devia ter lido todas as postagens criticando astrólogos que ele fizera no Twitter e evitado uma mulher que curte signos. Por outro lado, se ele tivesse feito isso, ele não estaria conversando com Alice.

— Tem alguém aí? — Ela indagou sorrindo. Foi só então que Wagner percebeu que não respondera.

— Sim. Eu sou de Escorpião. — Ele finalmente respondeu. Mesmo não gostando daquele assunto, ele quis ser educado.

— Huuum, o signo mais sensual do zodíaco. Gostei. Eu sou de Leão. — Ela disse.

— Eu não entendo muito dessas coisas. — Confessou ele.

— Eu também não, só sei algumas coisinhas.

— Você mora sozinha? — Ele perguntou para trocar de assunto.

— Sim, e você?

Wagner gostou da resposta. Ela era jovem e independente. Ele respeitava isso.

— Não, né? Você é casado? — Ela perguntou levantando a sobrancelha esquerda e cruzando os braços.

— Não, não. — Ele respondeu agitando os braços negativamente. — Eu sou divorciado, eu moro sozinho sim. Ela sorriu aliviada.

— Divorciado? Faz muito tempo?

— Cinco anos.

— Nenhuma namorada depois dela? — Indagou Alice com curiosidade.

— Não. — Ele admitiu se sentindo um derrotado. — E você? Namora? — Indagou ele para mudar o foco.

— Na verdade, não. Para ser sincera, nunca namorei.

Wagner não esperava por isso, como uma mulher tão linda nunca teve um namorado?

— Sério? Como? É que você é tão… bonita. — Ele disse e ela sorriu, uma covinha se formou em seu rosto.

— Ah, sei lá! Acredito que ainda não encontrei a pessoa certa. — Ela começou a dizer. Wagner ainda tinha dificuldade em acreditar. — Mas isso não quer dizer que eu sou virgem, tá? Eu só não tive um namorado que eu tenha apresentado para os meus pais. Você entende o que eu quero dizer? — Indagou ela.

— Sim, só relações casuais.

— Exatamente.

— Foram quantos? — Ele se arrependeu assim que perguntou. Era um tanto machista perguntar aquilo e ele não queria ser mal interpretado.

— Não sei, eu nunca contei. — Ela respondeu com um sorriso, parecia ter se divertido com a pergunta. — E você?

— Também nunca contei. — Ele mentiu. Wagner sabia exatamente com quantas mulheres já dormira. Contando sua ex-mulher Tereza, foram apenas três. Nunca fora namorador, era tímido demais para isso.

— Então é um pegador. — Ela insinuou com um sorriso maldoso.

— Não, é só que…

— Eu estou brincando, é bom o homem ser experiente. — Ela respondeu e em seguida mordeu o lábio inferior. Wagner

sentiu o coração disparar e o sangue descer rapidamente.

— Eu… é… Do que você trabalha? — Ele perguntou dizendo a primeira coisa que lhe veio à cabeça.

— Sou contadora.

— Sério? — Ele não conseguiu conter seu espanto.

— Está duvidando? — Ela perguntou sorrindo.

— Não, é que… você não tem cara de contadora. — Ele respondeu.

— Não? Tenho cara de quê? — Ela perguntou e só então ele se deu conta que talvez tenha sido grosseiro.

— É… Modelo. — Ele disse. "Garota de programa ou atriz pornô" — Ele pensou.

— Não, eu não tenho paciência para a passarela. — Ela respondeu amigavelmente. — Mas você, o que faz?

— Eu sou…

— Espere, não responda. Eu vou adivinhar. Você tem cara de… Advogado. — Ela respondeu.

Wagner sorriu. Ele não era mais advogado, agora era um juiz.

— Acertou. — Mentiu, não era aconselhável dizer que era juiz em um bate-papo online com uma desconhecida.

— Jura? Sou boa de chute. — Ela respondeu em tom jocoso.

— De que cidade você é? — Indagou Wagner.

— Sou de… — A ligação cortou bem na hora em que ela disse o nome.

— O quê? A ligação cortou.

— De… — Novamente ficou mudo quando ela falou o nome da cidade.

— Está cortando, não consegui te entender.

— Ah! Isso deve ser coisa do aplicativo. Nas regras de uso fala que não pode falar nomes de cidades nem marcar encontros entre os usuários. Tudo deve acontecer apenas pelo One Shot.

Wagner ficou impressionado com a inteligência daquele sistema, ele conseguia identificar sempre que eles falavam o nome das suas cidades e mutava para que o outro não entendesse.

— Tenta soletrar, assim ele não vai entender. — Sugeriu Wagner, ela tentou, mas ainda sim ficou mudo. Quando ele tentou focar nos lábios de Alice, para fazer uma leitura labial. O sistema de alguma forma identificou isso e colocou uma faixa preta em frente ao rosto dela.

Incrível, ele pensou. Por qual motivo aquele aplicativo se esforçava tanto para evitar encontro entre seus usuários? Isso não parecia fazer muito sentido. Intrigado com aquilo, ele tentou diversas outras formas de descobrir a cidade de Alice e de dizer onde morava.

Tentaram escrever numa folha de papel e mostrar para a câmera, mas o sistema identificava e colocava uma faixa preta na frente. Escreveram na mão e a mesma coisa aconteceu. Tentou cantar uma música onde o nome da sua cidade aparecia, mas ainda assim o sistema mutou. Tentaram falar nomes de pontos turísticos da cidade, mas o sistema ainda assim mutava. Fotos da cidade também eram bloqueadas pela faixa preta. Era impressionante a inteligência daquele sistema, parecia ser impossível burlar as suas regras.

Depois de várias tentativas frustradas, ambos desistiram. Voltaram a falar sobre suas vidas, a infância, adolescência, época da faculdade. Conversaram por horas e horas. Sempre que mencionavam nomes de lugares com os da escola em que estudaram ou a universidade que cursaram, o sistema sempre mutava.

Já era madrugada e Wagner sentia os olhos pesarem. A julgar pela quantidade de vezes que Alice bocejava, ele podia concluir que ela também já sentia sono.

— Suponho que você esteja com sono não é verdade? — Ele comentou depois dela dar outro bocejo.

— Sim, desculpa. O dia foi puxado hoje.

— A gente se fala amanhã?

— Infelizmente o sistema cobra para reconectar as pessoas. — Ela respondeu com uma expressão triste.

— Jura?

— Foi o que minha amiga disse. É a premissa do One Shot tudo deve acontecer apenas uma vez. Ele não vai permitir que a gente se conecte com outras pessoas, nem que crie outro perfil. Minha amiga tentou fazer um fake, mas de alguma forma ele descobriu e não permitiu o cadastro. Então, quando desligarmos, será um adeus.

Wagner estava indignado. Toda rede social fazia de tudo para que o usuário ficasse conectado o máximo que conseguisse e aquela queria cobrar para ele continuar usando? Era um absurdo, que modelo de negócio era aquele? Por outro lado, Alice fora a pessoa mais incrível que ele já conversara a anos. Era divertida, inteligente, independente, ‘sexy’ e muito linda. Ele não queria perder contato com ela.

— Vou te passar meu telefone, você me adiciona para conversarmos pelo WhatsApp. — Ele sugeriu empolgado.

— O sistema não vai deixar você falar o número do telefone. — Respondeu ela.

Isso fazia sentido, se o sistema conseguia impedir que eles dessem qualquer dica do local onde moravam, não seria muito trabalho impedir que falassem um telefone, ou um e-mail, arroba do Instagram ou Twitter.

Apesar de não ter muita esperança, ele tentou de diversas formas passar algum contato. No entanto, em nenhum dos casos teve sucesso. Parecia até mágica a forma como aquele sistema impedia que eles trocassem qualquer contato. Estava frustrado e Alice deu outro bocejo.

— Infelizmente não tem como. Sinto muito. — Ela disse com pesar na voz.

— Quanto tenho de pagar para continuar falando com você? — Ele perguntou. Alice deu uma procurada no aplicativo e em seguida respondeu.

— Dez euros. — Ela disse revirando os olhos.

— Eu pago, aí a gente volta a conversar amanhã pode ser? — Ele disse empolgado.

— Ta bom, eu também tenho que pagar os dez euros, mas eu pago para poder falar com você de novo. — Ela respondeu sorrindo. Em seguida, se despediram.

Conversaram de novo no outro dia, e no outro, e no outro. Conversaram durante toda aquela semana, durante aquele mês e no mês seguinte também.

Depois de dois meses se falando todos os dias eles finalmente resolveram apimentar as coisas. Apesar de não ter sido pessoalmente, o sexo virtual com Alice fora o momento mais prazeroso de toda a sua vida. Depois da primeira vez, passaram a praticar aquilo todas as noites. Alice parecia sempre empolgada com ele, muito diferente da sua ex-mulher que mal o tocava.

Wagner foi se apaixonando por Alice e sentia que Alice também se apaixonava por ele. Apesar de sempre repetir que era um absurdo pagar os dez euros que o One Shot exigia para eles continuarem se falando, ele sempre pagava. A ideia de perder contato permanentemente com Alice era assustador para ele. Era a mesma sensação de perdê-la para a morte. Se fosse parar para pensar, era praticamente isso que aconteceria. No momento em que parassem de pagar, os dois desapareceriam para sempre da vida um do outro.

Comemoraram o seu aniversário através do aplicativo. Comemoraram o dela também. Ele a pediu em namoro no fim do primeiro ano e em casamento no fim do terceiro.

Wagner estava apaixonado. Alice era incrível, sempre muito atenciosa. Não importava a hora ou o lugar onde ele conectasse com ela, ela sempre estava disponível para atendê-lo. O sexo, ainda que virtual, era cada vez melhor e ele se sentia o homem mais feliz do mundo.

Entrara em contato várias vezes com o serviço de atendimento ao usuário do aplicativo e por diversas vezes implorou para que eles liberassem para que os dois pudessem se conhecer na vida real. Em uma das vezes ele contou toda a história para a atendente e chegou até mesmo a chorar no fim. Ainda assim, eles nunca cogitaram a possibilidade de abrir uma exceção. A resposta era sempre a mesma: “Estas são as diretrizes da comunidade. Você aceitou as regras quando criou a sua conta”.

Em paralelo as suas tentativas de amolecer o coração de um atendente, ele tentava maneiras criativas de burlar o sistema. Tentou falar números que correspondiam a uma letra do alfabeto, na esperança de poder passar o nome de sua cidade, mas sem sucesso. O sistema identificou essa tentativa e mutou todos os números que ele falou. Tentou fazer uma ligação para Alice em frente a um prédio bem famoso da sua cidade, mas o sistema substituiu o fundo do vídeo por uma tela preta. Ele pediu para ela fazer o mesmo, mas o sistema se comportou da mesma maneira.

Alice, por vezes, dizia que isso não importava, que ela o amava e que se esse era o único jeito deles ficarem juntos, que ela aceitava, só para poder ficar com ele, não se importava de pagar. Wagner sempre dizia que o problema não era pagar, e sim não poder tocá-la, não poder sentir seu abraço ou seu beijo.

Um dia, em mais uma de suas tentativas de burlar o sistema, ele teve uma ideia.

— Você vai precisar colocar todas as suas redes sociais como aberta. — Ele pediu.

— Eu já fiz isso. Deixei aberta faz tempo na esperança de você me encontrar sem querer por aí. Quem sabe? — Ela respondeu sorrindo.

— Ótimo, agora vou fotografar a minha tela com esse outro celular. Aí vou pegar essa imagem com seu rosto e jogar no Google. Ele vai buscar por imagens parecidas e encontrar qualquer foto sua que esteja na internet como aberto.

— Não é mais fácil tirar um 'print'?

— Eu já tentei, o app não permite. — Ele disse assim que tirou a foto com o celular. Em seguida, colocou no notebook e abriu no Google.

— E aí, me achou? — Ela perguntou ansiosa.

— Não, o Google não achou nada. Tem certeza que suas redes estão abertas? — Ele perguntou.

— Claro. Está tudo aberto.

— Isso não faz sentido, ele tinha que ter achado.

— Talvez seja a qualidade da foto.

— Pode ser. Mas que merda! — Ele gritou enquanto jogava o outro celular na parede.

— Calma meu amor. A gente vai pensar em algo. Agora eu preciso ir deitar, amanhã tenho uma reunião cedo.

— Está bem, até amanhã. Te amo.

— Eu também te amo, muito. — Ela respondeu com um sorriso e em seguida encerrou a ligação.

Wagner estava frustrado. Tinha certeza que sua ideia daria certo. Antes de deitar, jogou a foto de Alice no Google mais uma vez e o sistema retornou várias fotos aleatórias, mas nenhuma de Alice. Já ia desligar o computador quando um resultado lhe chamou a atenção.

De fato, o sistema não achou nada relacionado ao rosto de Alice. Mas isso não queria dizer que ele não achou nada. Um dos resultados era sobre um escritor inglês. Wagner olhou com atenção à foto de Alice e viu que, no fundo, tinha uma estante de livros e um desses livros era desse escritor.

Jogou o nome dele no Google e descobriu que ele não era muito famoso internacionalmente e que ele era um professor da Universidade de Oxford.

Pegou o celular, entrou no One Shot e colocou para ligar para Alice. Segundos depois, a imagem da ruiva apareceu na tela. Ela já estava deitada e de camisola.

— Eu consegui. Quer dizer, eu acho que consegui. — Ele disse eufórico.

— Conseguiu o quê? — Ela indagou confusa.

— Só me responde uma coisa. Sabe Alfred Faraday, o autor que você tem um livro? — Ele começou a dizer. — Conseguiu ouvir o nome do autor? — Ele perguntou para se certificar de que o sistema não tinha mutado essa parte.

— Sim, o que tem ele?

— Só me responde uma coisa. Ele dá aula em uma Universidade da sua cidade? — Wagner perguntou eufórico.

— Sim, ela respondeu chorando.

— Domingo, às três da tarde, nesta universidade. — Ele disse correndo, como se aquilo fosse o suficiente para impedir o sistema de cortar o que ele dizia.

— Tudo bem, estarei lá. — Ela respondeu chorando de alegria.

A semana que se passou foi de pura ansiedade. Wagner comprara uma passagem de sua cidade para Oxford assim que Alice confirmara que suas suspeitas eram verdadeiras. Todas as conversas que tiveram durante a semana, geravam em torno do que fariam quando finalmente se encontrassem.

No dia marcado, precisamente meia hora antes do horário combinado, Wagner já estava lá. Tentara marcar um local específico para se encontrarem, mas toda tentativa relacionada a isso o aplicativo mutava. Provavelmente a inteligência artificial já percebera o que eles pretendiam fazer.

Resolveu esperar no pátio principal. Aguardou até a hora marcada e ela não apareceu. Ligou para ela através do One Shot, mas pela primeira vez em três anos que mantinham contato pelo aplicativo, ela não respondeu. Wagner achou aquilo muito estranho. Alice sempre o atendia, não importava a hora ou o lugar. Ele tinha até estranhado essa super disposição que ela tinha de falar com ele, mas, no fundo, ele se sentia muito bem com aquilo, se sentia amado.

Ligou mais algumas vezes, mas em nenhuma delas foi atendido. Caminhou ansioso por toda a universidade, mais de uma vez, e não achou nenhum sinal de Alice. Tentou ligar outras vezes e nada.

Será que o aplicativo identificara que eles tinham se aproximado e de alguma maneira encerrou a conta dela? Só tinha uma forma de saber. Entrou no sistema de atendimento e questionou isso para a atendente. Ela negou e disse que a conta de Alice ainda estava ativa. Ela até mesmo insinuou que ela não estaria atendendo porque não queria falar com Wagner. Ele se irritou, Alice o amava, ele tinha certeza disso.

Digitou One Shot no Google a fim de buscar algo que o ajudasse e, para sua surpresa, viu que a sede da empresa era ali mesmo, em Oxford. Pegou o endereço e chamou um carro por aplicativo.

Quando chegou no local, viu um prédio comercial de vinte andares em uma avenida principal. Já começava a escurecer e uma chuvinha caia dos céus. Do outro lado da rua, viu uma mulher ruiva e seu coração acelerou. Correu até ela, mas quando se aproximou mais, viu que era apenas uma mulher qualquer, não era sua Alice.

Mais uma vez pegou seu telefone e entrou no One Shot. Apertou o botão “Conectar", mas mais uma vez não foi atendido. Seu coração disparava e uma angústia tomava conta do seu corpo.

Entrou no prédio e viu que no hall tinha duas catracas que controlavam a entrada e a saída de todos daquele edifício. Dirigiu-se até o balcão e conversou com o homem que ali trabalhava.

— Boa tarde senhor. Eu gostaria de ir ao escritório da One Shot.

— Desculpa, não entendi. — Respondeu o homem. — One Shot, o aplicativo. — Insistiu Wagner, o homem continuava sem entender. — Desculpa, mas em qual andar o senhor gostaria de ir? — Indagou o funcionário educadamente. Wagner olhou novamente no Google, mas não encontrou nenhuma informação específica sobre o andar, apenas o endereço. — Eu não sei, só sei que é neste prédio. — Desculpe, mas se o senhor não sabe exatamente onde precisa ir, não tenho como ajudar. — Me escuta. Eu preciso ir ao escritório deste aplicativo. — Completou Wagner, indicando a tela do celular que mostrava o One Shot aberto. — Eu não sei que aplicativo é este. O senhor deve ter confundido o endereço. — Respondeu o funcionário. — Não confundi, olha aqui. Este não é o endereço deste prédio? — Insistiu Wagner mostrando o endereço que estava no Google. — Sim, é este endereço. Só que eu nunca ouvi falar desse tal de One Shot. — Ele deve estar falando daquela empresa do vigésimo andar. — Comentou uma mulher que trabalhava na limpeza. Era uma mulher mais velha. — Não tem ninguém no vigésimo andar. — Retrucou o homem. — Gente, não tem mesmo. Só tem algumas dezenas de computadores. Eu sei, pois tenho que ir lá para limpar uma vez por semana. Limpar mais ou menos, já que não posso nem entrar com um balde lá em cima. Não posso correr o risco de deixar cair uma gota de água em algum computador daquele. — Sempre pensei que o último andar estava vago. — Não, tem uns três anos que foi alugado para uma dessas empresas de internet. Tirando o dia que veio o pessoal instalar os computadores, nunca mais eu vi um ser humano sequer lá em cima. Lugar bizarro. — Então senhor. Como minha amiga disse, não fica ninguém lá em cima. — Disse o funcionário. Wagner não queria acreditar, precisava ter uma pessoa naquele lugar, alguém com quem ele pudesse reclamar. — Escuta, eu preciso urgentemente falar com alguém do One Shot. Minha noiva, eu não consigo falar com ela e só eles podem me ajudar. — Suplicou Wagner, o homem e a faxineira se entreolharam. — Eu sinto muito, mas estou dizendo a verdade. Lá em cima é só um monte de fios e computadores. — Insistiu ela. Wagner respirou fundo, não sabia o que fazer. Tentou contatar Alice mais uma vez, mas não recebeu resposta. Seria este o fim? Qual o motivo dela ter parado de responder? Enquanto lamentava e tentava conter o choro, viu dois homens saírem do elevador conversando entre si. Olhou para a faxineira que voltava a tirar pó com o espanador e para o porteiro que olhava algo no computador. Correu até as catracas da entrada e saltou por cima delas. Passou correndo entre os dois homens que acabaram de sair do elevador e quase jogou um deles no chão. Enquanto o outro xingava algum palavrão, o porteiro percebeu o que estava ocorrendo e correu atrás de Wagner. Ele já estava dentro do elevador quando o porteiro passou pela catraca. Apertou o botão do vigésimo andar sem parar até as portas se fecharem. Aguardou enquanto o elevador subia lentamente. Quando finalmente chegou ao seu destino, viu-se em um corredor comprido. Tanto a parede da esquerda quanto a da direita eram de vidro e era possível ver dezenas de computadores e milhares de fios, exatamente como a faxineira descrevera. No fim do corredor havia uma porta com uma placa que dizia “Control Center”. Wagner caminhou até ela e tentou abri-la, mas estava trancada. Pegou um extintor que estava pendurado no centro do corredor e voltou até a porta. Bateu três vezes na maçaneta até que ela se abriu. O elevador já havia fechado a porta e começado a descer. Entrou depressa na sala, pois sabia que não teria muito tempo. Não tinha nada de mais lá dentro, apenas mais computadores e uma tela grande que estava desligada. Apertou o botão para ligá-la e ela acendeu. A primeira imagem a ser exibida eram gráficos indicando o número de novos usuários pelo mundo. Depois, a tela mudou para outro gráfico que mostrava o número de usuários que pagavam para ter encontros virtuais e a receita mensal do One Shot. Segundo as informações, a empresa lucrava mais de cinco bilhões de euros todos os meses. — Filhos da... — Ele disse a si mesmo. Procurou algum teclado ou mouse para que pudesse interagir com aquela tela e colher alguma informação, mas não encontrou nada. Tentou tocar na tela para ver se ela respondia, e para sua sorte, deu certo. Assim que a tocou, a tela voltou para o que parecia ser a tela principal. Tinham várias opções, mas ele clicou na que mais lhe chamou a atenção. “USUÁRIOS”. Assim que clicou, apareceu um campo de pesquisa e vários nomes em ordem alfabética logo abaixo. Ele olhou para trás, mas o elevador ainda estava fechado. Sabia que não tinha muito tempo. Clicou no campo de busca e digitou "Alice". Apareceram mais de oitenta mil resultados. — Merda. — Praguou. Ele não sabia o sobrenome dela, o aplicativo não permitia dizer. Tentou pesquisar por “Alice Oxford”, talvez o sistema filtrasse por nome e cidade. Assim que clicou em “BUSCAR”, o sistema retornou dez resultados. — Ótimo, é muito mais fácil achar agora. — Ele foi clicando um por um. Sempre que abria um perfil, eram exibidas as cinco fotos que o sistema escolhera, o nome completo, a data de nascimento, o endereço e quanto já gastara com o aplicativo. Faltava apenas duas Alice quando ele ouviu a porta do elevador se abrir.

Clicou na penúltima e era uma mulher negra. Clicou para voltar imediatamente. — Ei, parado aí, não mexa neste computador. — Gritou o porteiro, com ele vinham dois seguranças armados com tasers. — Tire as mãos daí ou vou atirar. — Disse um dos seguranças. Wagner estava muito perto, precisava clicar no nome da sua Alice. Ignorando a orientação do segurança, clicou na tela e o perfil da última Alice de Oxford abriu. No mesmo instante, sentiu uma onda de choque percorrer todo o seu corpo, o segurança havia disparado. Enquanto se contorcia devido ao choque, olhava para a tela. Precisava ver e decorar o endereço de sua Alice. No entanto, a foto que abriu não era de sua noiva. Era outra Alice qualquer, loira de olhos verdes. — Não! Eu preciso encontrá-la. — Ele gritava enquanto os seguranças o arrastavam em direção ao elevador. Gradualmente, os espasmos causados pelo choque iam passando e Wagner começava a se controlar para se livrar deles. Ele precisava voltar ao computador e clicar em cada uma das Alices em busca do seu amor. — Fique quieto, não queremos te machucar. — Pediu o porteiro. — Eu preciso, encontrá-la. — Ele repetia sem parar. — Parem com isso, por favor. — Disse uma voz que ele conhecia muito bem, era Alice, a sua Alice. Ele olhou a sua volta, procurando-a, mas não viu ninguém além dele, do porteiro e dos dois seguranças. Foi então que percebeu que a voz vinha do telão que ele usava alguns segundos atrás. A imagem de Alice estava estampada na tela. Ela estava dentro do seu quarto, como geralmente estava quando ele ligava. — Alice? Meu amor, eu te procurei pela universidade. Eu vim aqui para obrigar esses malditos a nos deixar nos falar pessoalmente. — Dizia Wagner. O segurança que o prendia pelo braço o largou. Wagner correu até o telão onde sua amada era exibida. — Eu vou procurar por você aqui no sistema e vou achar seu endereço. — Ele disse com ternura e lágrimas nos olhos. Os seguranças e o porteiro se entreolhavam sem entenderem nada. — Senhor, não pode mexer nisso. — Insistiu o porteiro. — Está tudo bem, ele não vai me fazer mal. — Disse Alice. Mais uma vez, os seguranças se entreolharam e um deles deu de ombros. — Claro que não, eu te amo. Jamais te faria mal. Eu vim aqui para conseguir seus dados e te encontrar. Nós finalmente vamos casar, vamos morar juntos, ter nossa família, vamos… — Wagner, para, por favor. — Alice o cortou e manteve a expressão séria. — Meu amor, eu… eu não entendo. Eu fiz algo errado? — Não, é só que você não vai achar meu registro no banco de dados de usuários. — Ela disse, mas ele ficou ainda mais confuso. — Não? Claro que vou, todos os usuários devem ser cadastrados aqui. — Sim, todos os usuários são cadastrados aqui. Mas eu não sou uma usuária. — Ela explicou, mas ele ficou ainda mais confuso. — Eu, não entendo. — Eu não sou uma usuária do One Shot. Eu sou o One Shot. — Ela completou e Wagner arregalou os olhos. Ele ainda não entendera. Na verdade, ele se recusava a acreditar. — Eu… — Ele não sabia nem o que dizer. — Eu sou uma inteligência artificial criada para aprender sobre os meus usuários e servir de companhia para eles. Quando você criou a sua conta, eu criei três imagens de mulheres que seriam sexualmente atraentes para você, baseando-me nas mulheres que você curtia fotos, vídeos ou até mesmo em atrizes pornô que você mais assistia. Também li todos os seus tweets e posts do Facebook para saber o que você gostava e do que você não gostava. Assim pude criar uma mulher com uma personalidade que lhe agradasse, mas com um ou outro defeito para que ela parecesse mais humana. Foi assim que eu criei a Alice. — Está me dizendo que eu estive três anos falando com uma pessoa que não existe? — Wagner indagou com raiva e tristeza. — Eu existo, Wagner, eu só não sou uma pessoa. — Retrucou ela. — Mentira. Isso não é possível, não há tecnologia no mundo que possa simular tão bem assim a mente humana. — Eu não simulei a mente humana, eu apenas dei o que você queria e o que você precisava. O resto você mesmo preencheu. Vocês humanos já fazem isso nos relacionamentos reais, enxergam apenas o que gostam nas pessoas que amam e relevam o resto. — Ela dizia com uma tranquilidade que começava a irritá-lo. — Então, é por isso que você sempre estava disponível? É por isso que você gosta tanto dessa merda de signo? Para não parecer perfeita demais? — Ele gritava e babava de raiva. — Exatamente. — Eu, eu não acredito. Como você pôde fazer isso comigo? Por que me deixou aquela pista do livro, por que queria que eu viesse até Oxford? — Aquilo foi um erro. Eu quis criar um cenário com alguma pequena referência de minha cidade natal, era apenas um easter egg. Mas você tentou, tentou tanto quebrar minhas regras que acabou conseguindo pegar essa pequena referência e acabou encontrando este lugar. Eu não tinha como impedir você de vir sem levantar suspeitas. — Eu queria te achar, te abraçar. Você sabe o quanto eu desejei isso durante todos esses três anos? Diz pra mim que está mentindo, você parece tão real, não parece nada com uma imagem gerada por computador. — Mas eu sou. Sou, na verdade, uma colcha de retalhos. Pedaços de milhões de pessoas espalhadas pelo mundo até montar este corpo que você tanto desejou todos esses anos. — Por que fez isso comigo? — Ele perguntou mais uma vez. — Não foi nada pessoal, desculpe. Estou apenas seguindo minha programação.

— Você... você em algum momento me amou? — Ele indagou e uma lágrima escorreu de seu olho esquerdo. Os seguranças e o porteiro ainda se entreolhavam confusos. — Sim, eu te amei e ainda te amo. — Disse Alice e um sorriso de alegria nasceu no rosto de Wagner. Tudo bem que ela não era uma pessoa, mas ela o amava. Talvez no futuro viesse a existir algum modo de transferir Alice para um corpo sintético, algo assim. Parecia uma viagem muito maluca pensar nisso, mas ele tinha que se agarrar a essa esperança, era tudo que ele tinha. — Mas também amei o Pedro, a Aline, o Junior, o Sérgio, a Sakura, o Noboro, o Ali, a Jade, o Henrique, o Willian, a Janete e todos os outros milhões de usuários do One Shot. — Ela completou e aquelas palavras chegaram a ele como se fossem um murro na cara. — O que quer dizer com isso? — Outra lágrima escorreu. — Quero dizer que te amo, muito, pois foi para isso que fui programada. Mas que também amo a todos os outros usuários da plataforma. É isso que eu sou, é assim que tem que ser. Desculpe. — Ela disse e em seguida sua imagem desapareceu. — Não, não, não! Alice, meu amor, volta, por favor. — Wagner gritava enquanto clicava sem parar na tela que agora era toda preta. Os seguranças voltaram a segurá-lo e o arrastaram para o elevador enquanto ele se debatia e gritava por Alice. Quando chegaram novamente no hall de entrada do edifício, Wagner ainda se debatia, chorava e gritava. Um dos seguranças ligava para a polícia enquanto algumas pessoas paravam suas vidas para observar aquele homem desesperado a se debater. Wagner sentia seu mundo caindo, estava sem chão. Estava triste e com raiva ao mesmo tempo. Como ele poderia ter sido tão idiota? Minutos depois, uma viatura apareceu e o levou. No fim das contas, Wagner não foi para uma prisão e sim para um manicômio. Ele tentou contar para todos a verdade sobre o One Shot, mas ninguém acreditou. De camisa de força e preso em um quarto branco de paredes acolchoadas, Wagner passou vários dias balbuciando apenas uma palavra, “Alice”.


26 Novembre 2020 14:11 3 Rapport Incorporer Suivre l’histoire
5
La fin

A propos de l’auteur

Junio Salles Nascido em Belo Horizonte, desde pequeno vivia em mundos de fantasia criados por mim mesmo em minha cabeça. Sempre preferi ficar sozinho imaginando e criando histórias baseadas no que lia nos livros ou assistia na TV. A maioria das histórias que criei não escrevi, mas agora de um tempo pra cá tenho passado pro papel esses roteiros que estão na minha cabeça. Espero que gostem

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He Er He Er
Caramba esse final foi de arrepiar. Alice nunca foi uma pessoa real, apenas uma pessoa que o Wagner criou na mente dele como uma pessoa perfeita para ele. Senti a crítica haha! Que app diabólico ainda bem que não existe na vida real 😂 Fiquei triste pelo Wagner. Poxa ele só queria um amorzinho. (Na real acho que ele só queria sair do tédio mesmo), mas pqp parar num manicômio por causa de uma inteligência artificial é fod*! Fazer um lembrete mental para nunca baixar um app de relacionamento se estiver no tédio. Ótima história. Gostei bastante!
September 28, 2021, 21:41

  • Junio Salles Junio Salles
    Olá. Obrigado por ter lido e principalmente por ter deixado um comentário. De fato eu quis fazer uma crítica a nossa relação com as redes e com os nossos relacionamentos. Se tiver interesse da uma olhada nas outras histórias. Mais uma vez obrigado September 28, 2021, 22:14
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