sahsoonya sahsoonya

Contentando-se em vislumbrar a felicidade através de suas telas, Dália segue sua vida monocromática de esposa infeliz, devotando seus esforços a desfrutar de outras formas de amor, que não as do casamento, da paixão e do romance. Entretanto um certo encontro do destino com um charmoso Merchant, lhe traz novas perspectivas de vida, mostrando-lhe que a vida pode ter muito mais cor, principalmente para uma mulher perdidamente apaixonada.


Romance Romance jeune adulte Interdit aux moins de 18 ans.

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Capítulo 1

Minha mãe costumava dizer que o caminho de uma mulher está fadado a ser doloroso. Por muito tempo tive de concordar com ela, mas recentemente tive uma chance rara de ao menos vislumbrar a chance de um futuro menos angustiante.


Creio que devo começar do início... Sou uma mulher casada, ou melhor, fui uma mulher casada, ah nem sei o que sou. Não faz mais diferença se casada ou não. De qualquer forma, fui uma mulher casada miserável. Espero que todos, ou pelo menos alguns, entendam porque fiz tudo que fiz. Não sou uma mulher de algum país remoto que por alguma conveniência ou regra teve que se casar. Muito pelo contrário, me casei por vontade própria. Eu deveria ter notado os sinais desde o início.


Muita gente diz que mulheres veem sinais invisíveis em cada movimento de um homem, mas no meu caso, a ingenuidade foi maior que a intuição feminina. Conheci meu marido numa época da minha vida em que eu era apenas uma mocinha insegura e insignificante. Meu pai era sócio de uma empresa, e por acaso me apresentou a esse rapaz que era também um sócio. Na época fiquei fascinada por ele, mesmo sendo um sócio júnior, era muito importante na empresa. Benjamin era um homem muito sério, por isso atraía muitas garotas dispostas a ser aquela que o faria cair de quatro. Acho que a maioria das mulheres quer ser um marco na vida de um homem, por isso, mesmo quando os homens agem de forma errada com elas, ainda dão chance a eles, pois acreditam que poderão muda-los.


Quando começou a frequentar minha casa, achei que estivesse interessado em minha irmã mais velha, Cassandra. Ela era a personificação do glamour e sempre foi muito independente e decidida. Minha irmã era considerada a mulher mais bonita de nossa cidade e eu não era nem glamorosa nem independente, muito menos de beleza tão notável. Eu era uma garota qualquer, sem muita inteligência ou sonhos. Também era muito tímida, e jamais ousava levantar a cabeça na presença de estranhos. Durante os jantares em família em que Benjamin aparecia com a mãe e o pai, eu sequer dirigia a palavra a ele. Ele permanecia horas sentado a meu lado sem que eu pronunciasse mais que algumas sílabas. Acho que, porque sempre o considerei superior a mim.


Certa vez, enquanto servia o café, tive a chance de trocar um olhar com ele e não achei que me fitaria de volta, mas ele me olhava fixamente. Corei violentamente, não por nenhum interesse secreto, mas por ser a primeira vez que um rapaz olhara pra mim daquele jeito. Por um momento, pareceu realmente interessado em mim. Depois eu voltei a mim e lembrei que um homem como aquele jamais se interessaria por uma garota sem sal de dezessete anos.


Porém, após mais uma semana, durante um dos jantares ele pediu a mim que o mostrasse o jardim, e com a aprovação da minha mãe, segui com ele até o pequeno jardim que minha mãe mantinha, com a cabeça baixa e em silêncio. No início ele não parecia disposto a falar, contudo após dois minutos de silêncio constrangedor, disse:


- Por que você nunca conversa com ninguém, Dália?


Levantei os olhos por um momento e vi que estava sorrindo.


- Eu sou muito tímida. Não saberia o que dizer.


Voltei a fitar o chão, quando ele se aproximou.

- Você me agrada. Sabe disso, não é?


Olhei pra ele totalmente em choque. Não podia ser verdade, um rapaz tão elegante, bem apessoado e importante, interessado em mim?


- Está brincando.


- Não estou não. Você é o tipo de mulher que eu gosto.


Ele então pegou minha mão. A dele estava suando.

- Vê isso? Estou ansioso por que você faz meu coração bater mais rápido.


Aquilo era como um sonho. Ele era o homem dos meus sonhos. Naquele tempo, minha autoestima era tão baixa, que cheguei a dizer a ele que escolhesse Cassandra, porque ela seria uma namorada melhor.


Sempre que eu dizia isso, ele ficava irritado e dizia que pra ele só existia eu, e assim me iludiu até o dia do casamento. Acredito que Benjamin era cético ao amor e casamento, e só precisava de uma esposa para dizer que tinha uma. Mas jamais se casaria com uma mulher que contestasse algo que ele dissesse. Nesse caso, eu era a escolha perfeita. Uma garota jovem e inexperiente sobre o mundo, facilmente manipulável, que jamais discordaria dele. O trabalho de meu marido sempre foi desgastante, e ele não queria ter que perder tempo com brigas e coisas do tipo com uma mulher exigente demais.


Como um homem do porte dele se apaixonar por mim em condições normais seria inacreditável, acreditei que era muito sortuda, e o namorei por um ano, até que fiz dezoito anos e pude casar. Nesse meio tempo, jamais tivemos relações sexuais ou beijos. Na época achei que se devia ao fato de ele ser um cavalheiro e querer me respeitar, mas depois vim a descobrir que na verdade, ele não tinha interesse em mim, sexualmente falando. Como disse, ele era muito sério, mas sobretudo, era frio. Lembro bem, que nossos passeios eram sempre durante o dia, e ele pouco conversava sobre si mesmo, reservando seus esforços em saber mais sobre mim, mesmo que de forma artificial. Agora que reflito sobre, dou-me conta que ele sempre foi distante, só eu que não via isso.


Até o dia do casamento, confesso que jamais notei nada estranho nele. Sua conduta e ações eram notáveis, e sempre me tratou com muita atenção e carinho, embora nunca me tocasse, e como eu não sabia nada sobre namoros achei que fosse uma atitude normal, a distância gélida dele. Mas, na noite do meu enlace, comecei a perceber sua falta de emoção. Ele não parecia nada radiante na frente da igreja, o que de acordo com filmes e novelas, era incomum. Seus votos pareciam ter sido escritos por outra pessoa, sem o menor sentimento.


Pra ser sincera, eu também não sabia muito bem o que sentia por ele. Pra mim parecia certo casar, era assim que as coisas eram para as mulheres. Casar e ter filhos. Naquele tempo, eu achava que estava apaixonada, hoje que paro para pensar melhor, acho que estava só fazendo o que parecia comum fazer quando tivesse idade. Estava deslumbrada pela ideia do amor, jovem demais para saber reconhecer a diferença. Nunca fui vaidosa também, então nunca esperei muito do meu casamento. Pelo que via dos meus pais, eles discutiam de vez em quando, apesar de todo dia após o jantar, se sentarem de mãos dadas para ver um programa de tv. Iam aos lugares sempre juntos, e andavam de braços dados na rua. Eu queria algo assim. Queria que, como meu pai, Benjamin secasse a louça enquanto eu lavava, e me levasse para jantar no meu aniversário, e que fôssemos dormir abraçados.


Contudo minhas fantasias acabaram no dia do meu casamento. Não tivemos uma lua de mel, pois Benjamin estava com um negócio muito importante para fechar e não podia se ausentar. Não me importei. Nem quando ele me contou no dia do casamento que na verdade, iríamos morar com os pais dele, ao invés de termos nossa própria casa, ele me convenceu afirmando que o trabalho dele o fazia se ausentar por muito tempo, e que estar com seus pais me faria menos solitária. De fato, aceitei tudo que ele me propôs. Eu estava tão feliz que seria uma mulher casada, com um marido que cuidaria de mim e me amaria.


Na minha noite de núpcias, meu marido me deu meu primeiro beijo. Não foi como eu esperava. Eu via muitas novelas em que o galã dava beijos amorosos e ardentes na mocinha, mas aquele pareceu um beijo no mínimo desinteressado, como se fosse só mais uma coisa que ele tinha que fazer, como reciclar lixo, algo que não quer fazer, mas faz porque é sua responsabilidade como ser humano. Aquela parecia sua responsabilidade como homem. Ele cumpriu todas as suas responsabilidades naquela noite com uma frieza impressionante. Não dormiu abraçado comigo depois, simplesmente se virou e dormiu sem ao menos me dizer boa noite. Fiquei tão frustrada que fui dormir chorando silenciosamente. Me questionei se o amor era assim mesmo. Nunca tinha me deitado com um homem, mas algo me dizia que eu não deveria estar me sentindo tão infeliz daquele jeito.


Se aquilo me deixava para baixo, o que se seguiu só me fazia afundar cada vez mais. Meu marido era tão distante quanto antes. Não saía comigo, e quase não o via. Eu passava o dia todo com a mãe dele, que sempre foi muito boa comigo. Quando ele chegava tarde da noite, jamais me dava satisfações do porquê, mal conversava comigo e cumpria com suas obrigações de marido muito raramente. Durante o jantar, estava sempre calado, e só respondia ás perguntas dos pais. Eu não ousava falar uma palavra sobre nosso relacionamento para sua mãe, mesmo que ela perguntasse. Ás vezes, a mãe dele me levava para visitar minha mãe durante o dia. Quando ela ou meu pai perguntavam como estavam as coisas, eu sempre afirmava que tudo estava ótimo.


- Deve ser bom ter um marido tão bom, não é querida?


- É sim mamãe.


- Dália é uma moça ótima, senhora Vilas, a criou muito bem. Sempre gentil e prestativa. – disse a mãe de Benjamin.


Sorri. Minha mãe estava radiante. Mal ela sabia como meu marido era glacial. Disse que iria dar uma olhada no jardim, e depois de alguns minutos Cassandra surgiu, fumando um cigarro.


- Desde quando você fuma?


Ela sorriu sarcasticamente e tornou:

- E você? Desde quando mente assim?


Fitei-a em busca de uma explicação.


- Ora, não sou a mamãe, Dália, sei que está mentindo sobre seu casamento... Vejo no seu rosto como está triste. Pode me contar o que está acontecendo.


Olhei bem para ela. Minha irmã tinha vinte anos, mas era divorciada. Pegou um executivo bonito com quem se casou com minha idade, traindo-a e praticamente deixou a amante do ex-marido careca. Eu sempre quis ser destemida como ela, mas não tinha coragem de tomar controle da minha vida.


- Ele... É muito frio.


Ela sacudiu o cigarro, suspirou e proferiu:

- Entendo, eu já esperava algo assim. O que te faz pensar dessa forma?


- Benjamin nunca me diz que me ama ou sai comigo. Não gosta de dormir perto nem conversar. Ele só me beija perto de outras pessoas.


Ela parecia estar com muita pena de mim.


- Ah, Dália, sinto muito. Homens de negócios são assim. Frios como icebergs, mas eles nunca são violentos. Ele pode mudar com o tempo, se tornar mais carinhoso, talvez após a vinda de um filho. Se de tudo, ele não mudar, faça suas coisas de seu jeito, crie um mundo só seu, arrume coisas de que gosta, e viva sem se preocupar com ele.


- Eu achei que seria diferente quando me casasse.


- Eu sei querida... – disse me abraçando. – Todas acham, acredite, daqui alguns anos isso não fará diferença. Seja uma boa esposa e viva feliz com suas coisas.


Aquele conselho era muito bom. Eu o segui enquanto pude. Então após um ano de casamento e indiferença por parte do meu marido, chegou meu aniversário. A mãe dele me preparou um jantar com um bolo lindo e enorme. Fiquei tão feliz, pois Benjamin havia prometido que viria para celebrar comigo. Mesmo desapontada com meu marido por sua ausência, sempre me dediquei a ele diligentemente, cuidei de seus interesses e me portei como ele queria que eu me portasse. Naquele ano, ele havia sido promovido a uma posição semelhante à de meu pai. Por isso, ele ia a muitos jantares e reuniões sociais. Naturalmente ele passou a me levar para tais jantares, mas em nenhuma vez pareceu disposto a me ter como acompanhante. Quase sempre eu andava a seu lado como uma sombra em silêncio, e era apresentada sem interesse para seus colegas ou sócios, e permanecia em silêncio a seu lado enquanto as outras esposas conversavam alegremente em outra mesa. Quando chegávamos em casa, era como se eu fosse uma estranha a ele. Ele se trocava e ia dormir em silêncio. Todavia, naquele dia seria diferente. Ele iria notar meu vestido feito à mão para a ocasião. Prendi meu cabelo num coque para impressioná-lo. Me maquiei para ficar bonita para ele.


- Quanto tempo faz, Dália? – perguntou o pai do meu marido, com a cabeça encostada na bancada da cozinha.


- Duas horas e meia. Estamos esperando há duas horas e meia.


A mãe dele suspirou olhando para a faixa enorme que tinha pendurado na parede da sala de estar, onde se lia “Parabéns, Dália, te amamos”.


Estávamos exaustos e famintos.


- Será que não é melhor comermos, mãe? – disse meu sogro.


A mãe de Benjamin olhou pela janela e disse sem graça:

- Pegue os talheres, pai. Dália, querida, vamos jantar, mas esperaremos para cortar o bolo, está bem?


- Tudo bem, mamãe.


Quando ela pegou o primeiro prato, meu marido chegou, entrou com uma expressão irritada e atravessou a sala sem olhar para ninguém. Quando ia subir o primeiro degrau da escada, minha sogra disse:


- Benjamin, onde vai? Estivemos esperando por tanto tempo, quase jantamos sem você...


- Já jantei. – sibilou ele.


Todos se entreolharam. Minha sogra tentou esconder o embaraço e disse:

- Então vamos cortar o bolo.


- Não estou com humor para isso.


Todos o fitaram boquiabertos. Uma lágrima ameaçava escorrer dos meus olhos. Vendo isso, o pai dele disse:


- Benjamin! Você prometeu que comemoraria o aniversário da Dália. Ela se arrumou e o esteve esperando por horas.


Meu marido olhou pra mim, abriu um meio sorriso sarcástico e disse:


- Será que não percebem que estou cansado demais? Além disso, quem se importa se é aniversário dela ou não?


Pus-me a chorar. Não pude me controlar. Minha sogra me abraçou e disse:

- Filho, como pode dizer uma coisa dessas para sua esposa?


- Peça desculpas agora, menino! – gritou o pai dele.


Ele virou as costas e disse:

- Vou dormir. Boa noite.


E subiu as escadas. Ele jamais mudaria, não importa o quanto eu tentasse, ele não mudaria e não mudou.


Naquela noite, decidi não mais me importar. Me fechei no meu próprio mundo. Nunca mais usei maquiagem, nem o forcei a comemorar meu aniversário. Comecei uns hobbies, como pintura e cuidar de um jardim, e fiz muitos cursos de culinária, informática e idiomas. Entrei em ONGs e me tornei uma mulher muito calma e serena. Aprendi a ser bondosa e agradecer o que eu tinha, afinal, tinha uma boa família, fora meu marido. Não me esforcei para amá-lo, mas me forcei a respeitá-lo. Suas obrigações de marido foram diminuindo gradativamente ao passar dos anos e quando me dei conta, ele tinha um caso, e eu estava casada por doze anos, com um estranho.


Quase não o via mas ia aos eventos da empresa com ele. Não sabia quem era a mulher com quem tinha um caso há dois anos, mas pouco me importava. Ele não sabia que eu tinha conhecimento da amante, e mantive em segredo, já que não me incomodava. Eu era feliz como vivia. E ele não me tocava desde que tinha começado seu caso. O que era bom, pois eu não suportaria ser comparada a outra, ou ter de dormir com ele sabendo que se deitava com várias. Preferiria morrer. O seu caso veio a meu conhecimento, pois ele esqueceu o celular na escrivaninha certo dia, e quando fui pega-lo de modo a tentar devolver, uma mensagem daquela que estava com o contato salvo como “ela”, chegou, despertando-me da mentira que vivia.


Depois que a mãe dele assumiu a diretoria de uma escola primária, eu passei a exercer minhas atividades sozinha. Com o carro que ganhei de meu marido ia e vinha por toda a cidade, cuidando de meus interesses, e até fiz muito dinheiro com minha arte.


Minha vida mudou no mês em que ia fazer trinta anos.


Fui levar uma de minhas pinturas novas a uma galeria de uma amiga, eu as expunha com meu nome de solteira, por isso poucas pessoas sabiam que eu era casada. Eu usava a aliança num colar, e o escondia dentro da roupa. Se Benjamin soubesse que eu vendia meus quadros, me faria parar. Ele se orgulhava de prover tudo para mim, e não suportava a ideia de me ver trabalhando, por isso só permitia trabalhos voluntários.


Quando estava entrando na galeria, três homens se aproximaram, como quem vai pedir informações, e um deles agarrou meu braço.


- Fica quieta! Se fizer algum movimento, esfaqueamos você. – Gesticulou com uma das mãos no bolso da jaqueta, ameaçando.


Eu estava apavorada. Os três me cercaram e eu mal podia ver em volta, de tanto medo que sentia.


- Agora, passa a bolsa. Aquele é seu carro?


Acenei que sim engolindo em seco. O carro e o que tinha na bolsa não importavam. Eu não queria morrer daquele jeito. Queria ter a chance de confrontar meu marido algum dia. Olhei para a galeria. Não havia ninguém, aparentemente. A rua estava praticamente deserta. Eu não sabia se eles tinham mesmo facas ou não, mas quando fui dar a bolsa, lembrei que lá dentro havia um medalhão que minha mãe me deu quando criança. Era uma joia de família, e o bem mais precioso que eu possuía. Recolhi a bolsa de novo e um deles gritou:

- Passa essa bolsa!


- Espere, tem algo que eu preciso...


Ele me jogou no chão, na queda ralei a mão e tentei em vão me arrastar para longe.


Quando um deles veio para cima de mim com os punhos fechados, pronto a me agredir um homem surgiu e segurou o braço dele.


- Deixem a moça em paz!


Eles começaram uma pseudo briga, e o rapaz desferiu alguns golpes nos três. Os garotos saíram em disparada pela rua e sumiram.


O rapaz correu até mim e disse me levantando:

- Você está bem, senhorita?


Olhei pra ele em choque. Não pude acreditar que estava viva. Ele olhava pra mim em busca de uma resposta, mas eu não podia me mover. Estava paralisada.


- Venha para dentro. – disse segurando-me pelos cotovelos enquanto entrávamos na galeria. Fitei estupefata as mãos dele guiando-me e me sentei numa cadeira.


- Traga um copo de água com açúcar, Larissa.


A funcionária da galeria se foi, e ele pôs-se a sacudir as mãos à minha frente.

- Ei, eles levaram alguma coisa? Quer que eu chame a polícia?


Observei-o enquanto falava. Era um homem muito bonito. Do tipo que só se vê em filmes. O semblante dele enquanto falava parecia iluminar o lugar todo. Desviei meu olhar.


- Não, não tiveram chance. Olha, muito obrigada, se não fosse você, eu poderia estar morta agora.


Ele coçou a cabeça e sorriu.

- De nada.


Olhei em volta. A galeria estava um pouco diferente do que eu me lembrava.


- Onde está a Laura? – perguntei baixinho, já que não costumava falar com homens.


- Ah! – ele pegou a água e me deu. – A Laura não é mais a dona, por que? A conhece?


Confirmei.


- Eu exponho quadros aqui.


Ele estava usando uma jaqueta dessas de motoqueiro e a tirou. Um perfume me envolveu. Ele estava incrivelmente cheiroso. Levei um sobressalto e desviei de novo o olhar.


- Então é artista? Que bom. Sabe, eu sou o novo proprietário. Sinto muito, Laura viajou para o exterior, por isso não teve tempo de avisar a todos os artistas.


Apenas consenti em silêncio. Parece que teria que procurar outra galeria.


Ele captou meu olhar e disse sorrindo:

- Mas sabe... se quiser me mostrar suas pinturas, ficarei feliz em escolher algumas para a exposição que farei.


Aquilo era formidável. Fui ao carro pegar um dos quadros.


- Ah, meu pulso. – falei, vendo a mão ralada.


Voltei para dentro com o quadro e lhe entreguei.


Ele o observou maravilhado. A forma como seus orbes se demoraram nos traços daquela aquarela, demonstrava grande percepção artística. Ele deu uma boa olhada no quadro por cerca de um minuto, até que se abriu um belo sorriso em seus lábios e ele proferiu:


- Ele... é perfeito! Você tem um talento incrível, senhorita?


- Ah, hum, é Dália. Obrigada.


Nesse momento, ele viu minha mão. E com uma expressão preocupada a pegou. Meus olhos se arregalaram e corei violentamente gritando:

- O que está fazendo?


Ele me puxou para mais perto e disse:

- Isso está feio, quer que a leve ao hospital?


- Não, não... – disse, livrando meu pulso dele – Não é necessário.


- Que absurdo, ferindo a ferramenta de trabalho dessa grande artista. Espere aqui, tenho um kit de primeiros socorros...


- Não! Obrigada! Eu já vou indo...


Ele virou e disse com o dedo levantado:

- Deixe disso. Não ouse sair daí, mocinha!


E saiu correndo. Eu não sabia o que fazer. Estava constrangida demais, e se alguém me visse ali, seria meu fim.


Era a primeira vez que falava com um homem além de meu sogro em meses, e esse homem era muito atraente. Eu só queria sair dali desesperadamente.


Ele voltou, e vendo minha timidez, disse:

- Posso fazer um curativo em sua mão?


Olhei para a mão depois para ele, e ele falou rindo:

- Eu não mordo, Dália...


O jeito que ele pronunciou meu nome me fez sentir um arrepio. Ninguém jamais me chamou com tanta energia. Corei. Minhas bochechas estavam em chamas. Mesmo sendo uma mulher de trinta anos, nunca tive mais contato do que o necessário com homens. Ele parecia muito gentil, e por isso permiti que fizesse o curativo.


Estendi a mão, que ele pegou com cuidado, e enquanto fazia o curativo, disse:

- Dália é o nome de uma flor muito bonita, sabia?


Não respondi, estava constrangida demais. Ele pareceu gostar da minha timidez.


- Me pergunto como uma mulher que pinta um quadro tão expressivo desses pode ser tão reclusa.


O fitei e não respondi.


- Gostei muito do seu quadro, senhorita, será que vai me permitir expô-lo na minha galeria?


Olhei para o chão e consenti.


- Como é mesmo seu nome? Completo?


Olhei para o lado e disse:

- Dália Vilas – falei meu nome de solteira. Ele sorriu.


- Um nome incomum para uma brasileira.


Permaneci em silêncio. Ele tocou a ferida e me movi em desconforto. Ele se assustou com o movimento e disse:

- Ah, desculpe, te machuquei? Farei com mais cuidado.


Olhei para ele. Meu marido jamais me perguntou se como me tratava me machucava. Jamais me pediu desculpas. Como era contrastante o comportamento desse rapaz. Meneei a cabeça, sinalizando que não doeu.


- A propósito, sou Miguel Sanches. Prazer.


Permaneci calada. Ele aplicou uma pomada e pôs-se a assoprar minha mão. Fiquei tão constrangida que tive que levantar.


Ele sorriu.


- Tudo bem, deixe-me só enfaixar e vai estar livre de mim, moça tímida.


Me sentei novamente e o deixei terminar. Ele sorria sem parar. Me perguntava o que poderia ser tão bom para que sorrisse tanto. Eu nunca tive motivos para sorrir desde que me casei.


Ao terminar, ele me deu o cartão.


- Me ligue quando quiser trazer outro quadro, e combinaremos. Se aparecer algum comprador, e tenho certeza de que aparecerá, te ligarei.


Ficamos nos encarando por um momento, e ele dando de ombros, disse sorrindo:

- Não vai me dar seu telefone?


Sobressaltei-me. Um homem ia ter meu número? Não era uma boa ideia. Porém, se quisesse vender meus quadros, o jeito era aquele. Escrevi meu número num papel, e o entreguei.


- Não tem um cartão?


Disse que não.


- Pois devia. Você deveria ser uma artista profissional. Possui muito talento.


Corei de novo. Era raro ouvir qualquer elogio.


- Obrigada, de verdade, por tudo.


Ele sorriu.


- Não há de quê.


Me despedi e entrei no carro. Ele ainda acenava lá de dentro. Eu nunca tinha sido tratada tão bem por um homem antes. Meu coração estava batendo tão alto que nem sei se o moço o tinha ouvido. Olhei para o cartão, e o pus em minha bolsa. Dirigi distraída até em casa. Quando entrei, Benjamin estava na sala vendo tv. Temi que reclamasse do horário, mas ele sequer dirigiu os olhos a mim. Preferi assim, pois ele nem notaria a mão enfaixada.


Fui para o quarto, tomei um banho e fui dormir, mesmo ainda sendo sete da noite. Porém, não pude pregar o olho a noite toda, não sei por que, mas a imagem daquele homem não me saía da cabeça.



3 Octobre 2020 04:29 0 Rapport Incorporer Suivre l’histoire
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