Os cabelos ruivos estavam encharcados tanto quanto o chapéu e o sobretudo que agora pesava sobre os ombros de Chuuya Nakahara. A pele ardia com o contato da água fria em seus arranhões, e o braço direito sangrava com um corte mais profundo; aquilo junto de sua blusa e calça com alguns rasgados. Tudo fruto de uma luta intensa contra uma gangue de mafiosos rivais que estava ganhando espaço. Como seu boss não gostava de ter concorrentes, a ordem dele foi clara para que matasse todos os rivais antes que criassem raízes. A missão foi um sucesso, não havia sequer um ser humano lá que ao menos se comparasse com o For The Tainted Sorrow. Mas nem por isso deixou de ser trabalhosa, afinal, mandar todo um lugar pelos ares, como gostaria, atrairia muita atenção e Mori-san com certeza não o parabenizaria por isso.
Como comandante da missão deveria de ter retornado junto de seu pessoal e a relatado, mas naquele fim de tarde não estava com paciência para essas formalidades. Ora, tiveram sucesso! Os inimigos aniquilados, sem ninguém para ameaçar o comando da Máfia do Porto, isso já estava de bom tamanho. Retornaria as formalidades amanhã, pois sua cabeça estava tão fodida de lembranças dele no momento, a visão borrada pelas lágrimas e a voz sufocada na garganta; as mãos tremiam e as pernas estavam bambas, andava apoiado nas paredes sujas do subúrbio para — com o pouco de orgulho que ainda lhe restava — não cair.
O estado de Chuuya era realmente deplorável, aquelas crises repentinas eram mais uma das coisas que ele acarretou. As boas coisas, os bons momentos, todos estavam em um passado distante, que lembrados faziam a ferida quase cicatrizada voltar a sangrar. Era por isso que nunca se encerrava aquele ciclo sem fim, entre idas e voltas que acabavam no mesmo lugar de partida: em Dazai Osamu; o ex parceiro, ex amante, ex amigo, ex tantas inúmeras outras colocações na vida de Nakahara, menos ex amor. Parecia ser um carma de uma vida passada que o seguiria independente de onde fosse; um castigo, pois, sentimentos não podem ser queimados, encaixotados, ou apenas apagados, muito menos algo em que o ruivo mafioso poderia socar até desaparecer. Fazia parte dele, estaria sempre lá querendo ou não.
"Now the day bleeds
Into nightfall
And you're not here
To get me through it all
I let my guard down
And then you pulled the rug
I was getting kinda used to being someone you loved"
No meio da chuva, mesmo atordoado, os ouvidos aguçados foram capazes de identificar uma voz entre outras duas que vinham de um beco um pouco mais a frente. Nakahara fechou os olhos e deixou que as lágrimas escorressem, levantou o rosto para o céu deixando propositalmente as gotas grossas lhe banharem totalmente a face. Depois veio a parte mais difícil: acalmar a si próprio. Respirou fundo várias vezes, tentou pensar em assuntos aleatórios e distrair-se. Mesmo que houvesse várias opções para fugir daquele encontro, o ruivo fingia não saber delas, como se não existissem possibilidades de desvio. Amava-o, e a dor do abandono não superava isso, a tortura psicológica iminente a qual se submeteria agora não tinha motivos concretos, talvez nem motivos reais tivesse; não queria admitir isso, simples assim.
Puxou a gola do sobretudo para cima, seu chapéu para o mais perto do rosto que conseguiu e seguiu em frente tentando manter seus passos firmes. As vozes eram cada vez mais audíveis junto do som de passos apressados sobre poças d'água, e completando o cenário tinha o coração de Nakahara que batia acelerado. Não demorou pouco menos que alguns minutos para que três detetives da Agência entrasse no campo de visão do ruivo: um loiro alto, um baixinho moreno de óculos e o traidor. Dazai — vulgo o traidor — parecia feliz junto de seus companheiros bonzinhos. Rindo alto e pelo que se notava, fazendo o homem loiro fechar a expressão numa carranca mal humorada. Simplesmente não queria acreditar no que via! Justo ele, que o trouxe para mais fundo no submundo do crime, que tinha sangue frio, uma mente diabólica que sempre previa e lia a todos; o mafioso perfeito, parecia, naquele momento debaixo da chuva com um sorriso largo nos lábios e uma áurea alegre, se encaixar perfeitamente no lado do bem. Pensar assim era quase uma piada cruel com si mesmo, rir da sua própria desgraça quem sabe? O fato é que mesmo não admitindo, Chuuya tinha esperanças de que um dia, Osamu voltasse para a organização, para seu lado, seus braços mais uma vez.
"For now the day bleeds
Into nightfall
And you're not here
To get me through it all
I let my guard down
And then you pulled the rug
I was getting kinda used to being someone you loved"
As mãos do ruivo se fecharam com força no instante em que passou pelo homem que, mesmo distante, afligia seus sentimentos e o deixava uma bagunça. Quis fazer muitas coisas naqueles milésimos de segundos, tais como: socar Dazai, beijá-lo, gritar para ele o quanto estava sofrendo naquele precipício de distância que havia entres eles ou quem sabe até o arrastar à força junto de si para o apartamento. Mas nada disso passou de breves pensamentos, desejos secretos, sonhos lúcidos. Assim como passou por ele sem o olhar, sentiu que o outro fizera o mesmo, o que fora o adiar de uma discussão, tal essa que, mesmo que fugindo e a evitando, viria uma hora. Dois amantes que tiveram uma vida juntos, separados sem ao menos um decente adeus, com tanta coisa guardada para dizer, se tornariam sim, instáveis ao poucos. Bom, pelo menos aquele era o estado do mafioso.
Continuou seguindo em frente, apressando os pés e respingando toda a roupa. Já não sentia mais dor ou ardência, o frio e a água gelada deixaram todo o corpo em um estado de dormência, menos o coração; esse que ainda não voltava ao seu ritmo normal e cobrava de Nakahara cada vez mais oxigênio. O caminho até estar em seu lar, para se trancar no quarto e beber até estar debilitado demais para ser coerente com os mínimos declínios de sua própria vida era longo para quem tinha pressa e uma grande decepção amorosa.
"I let my guard down
And then you pulled the rug
I was getting kinda used to being someone you loved"
Merci pour la lecture!
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