Notas iniciais: Olá, pessoal!
Essa é uma shot que eu escrevi com muito carinho para a Nina (ou JP Style). A shot faz parte de um desafio de imagens no qual ela postou uma imagem que me inspirou a escrever essa história. Enfim, espero muito mesmo que você goste, Nina. <3
Para todos os outros que lerão, espero que tambem gostem!
Boa leitura!
Obs: Eis a imagem que me inspirou.
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Era mais um dia da trégua entre os guerreiros celestiais e as tropas demoníacas.
Apesar da guerra durar milênios, pequenos períodos de algumas centenas de anos de trégua eram comuns. No céu, o Arcanjo Yuuri comandava o maior batalhão que juntava todos os anjos com as melhores habilidades de batalha. Era o esquadrão "Lumini" que fazia as principais investidas em favor da ordem e dos princípios na humanidade. Já no submundo, o Príncipe demônio Otabek era conhecido como o general das Trevas. Sua tropa era composta dos mais caóticos demônios que lutavam para que os humanos conhecessem a liberdade e o caos. Eles eram conhecidos como "Inpius" por sua brutalidade e força.
O Arcanjo Yuuri, preocupado com o estado de trégua, se reuniu com seus conselheiros para discutir os próximos passos do Lumini. Após longos momentos de discussão, o conselho de guerra foi encerrado e finalmente, o anjo mensageiro Yurio foi chamado.
- Yurio, sua missão de hoje vai ser muito importante.
- O que desejas que eu faça, senhor?
Disse o anjo loiro com a voz harmoniosa e reverente.
- Você será o emissário celestial no submundo.
- Como assim, senhor?
- Seu trabalho será sondar os planos de batalha do inimigo e enviá-los para nós.
- Poderei falar livremente? Quanto tempo a missão vai durar?
- Ainda não sabemos, mas suas ordens são para permanecer no submundo até sinalizarmos o seu retorno.
- Farei como me disserem.
- Ótimo. Faça suas oferendas antes de partir. Mandaremos uma comitiva te acompanhar até os portões daquele lugar. Depois disso, você está sozinho. Nos garantiram que sua estadia seria segura, então, é uma oportunidade para descobrir os pontos fracos deles.
- Sim, senhor.
O mensageiro foi até seus aposentos, pavimentado com ouro e adornado com todos os tipos de pedras preciosas. Um luxo que somente era permitido ao céu, pelo que diziam. Mas Yuri não era apegado àquilo. Ele era um servo leal dos desígnios do seu senhor. As vontades divinas eram mais importantes e ele tinha certeza de que estaria protegido em sua incursão ao local maldito.
O anjo fez suas oferendas. Queimou a gordura dos cordeiros mais vistosos na Terra e tinha certeza de que a entidade maior teria recebido seu sacrifício e que lhe daria a força necessária para a jornada. Quando se sentiu pronto, convocou a comitiva que incluía seus dois melhores amigos, Mila e Georgi. Dois serafins que sempre estavam ao seu lado fazendo sua proteção em missões de alta periculosidade.
- Sabe que uma vez que adentrar aqueles portões, não podemos mais garantir sua segurança, não é?
Disse Georgi de forma séria.
- Eu estou bem ciente disso. Ordens são ordens, e o Lorde Arcanjo jamais me colocaria em uma situação que eu não fosse capaz de lidar.
- Eu não queria que você ficasse tão longe. Fico nervosa quando não posso te proteger.
- Também fico, mas uma vez lá, você terá que fazer o seu melhor. Não vai ser fácil manter seu corpo humano e não se corromper.
- Sim. Vamos, Georgi. Temos que levar o Yurio.
A comitiva partiu. A sorte do pequeno anjo mensageiro estava lançada.
Ao chegarem na frente dos portões da barreira de enxofre, Georgi advertiu o amigo:
- Eu sei que não conhecemos os costumes de dentro da barreira, mas já ouvi falar que os demônios andam vestidos dentro de seu território. Acho que você também deveria colocar uma roupa.
- Tudo bem, irei com meu manto branco. Entretanto acho difícil que os demônios desejem algo com um anjo, afinal, somos tão asquerosos para eles, quanto eles são para nós.
- Vai ter que tomar um sexo, enquanto mestiço.
- Vou como um homem, embora não me importe com os rótulos humanos.
Yuri evocou os poderes atemporais concedidos pelo Gran-Mestre e seu corpo, feito da mais pura matéria, tomou o corpo de um humano, para que os demônios pudessem compreender sua existência naquele local.
Um corpo esguio e perfeito deu lugar ao seu éter corporal anterior. Era porém uma carne fria, pois não conhecia os desejos humanos. Manteve os cabelos loiros e olhos verdes, as características mais valorizadas dentre todos os presentes que a divindade lhe concedeu. As asas se desatrofiaram de suas costas exibindo a penugem de um mensageiro, com pequenos diamantes cravejados, que reluziam na iluminação local.
- Acho melhor guardar suas asas. Elas são chamariz de luxúria para aqueles demônios nojentos.
Disse Mila com um ar preocupado.
- Já disse que os demônios não vão desejar nada de mim. Cumprirei minha missão como foi dito.
Todo o resto da comitiva já havia conversado com os porteiros do local, restavam apenas os adeus dos amigos.
- Que a divindade lhe proteja e que nenhum mal lhe toque.
Georgi lhe tocou a cabeça, transferindo sua bênção.
- Que você volte para nós, são e salvo. E que nenhum mal lhe toque.
Mila abraçou o amigo colocando o fogo celestial dos serafins em suas mãos.
Enquanto isso, na grande arena, as incontáveis hordas do submundo se reuniam à espera do emissário celestial. Aquele anjo que seria tratado como príncipe dentro dos muros infernais, cuja visita era intrigante até mesmo para os grandes generais. Mas não para o Príncipe das Trevas. Ele sabia exatamente o motivo da visita.
Quando a grande porta se abriu, o silêncio tomou o espaço. Passos de pés descalços no mármore preto. Yuri, agora sozinho, caminhava pelo longo salão, que para sua surpresa, era requintado de forma simples e bruta, nada como a extravagância dos céus, mas sóbrio e limpo. Além do grande número de espectadores esperando por sua chegada, o que mais lhe impressionou foi uma figura ao longe, no topo de uma escadaria, em um trono impecavelmente branco, que contrastava com suas vestes humanas de cor preta.
Esperando o anjo, estava o Príncipe das Trevas em seu trono. De pernas cruzadas bebendo do vinho dos ímpios. Era um demônio de tamanho impressionante, quase 2 metros de altura, mostrando toda sua imponência e glória. Por baixo da pele morena com tons de dourado, havia todas as sortes de pecados possíveis.
Yuri subiu a escada, se sentindo confiante mesmo no meio de tantos demônios. Ao chegar na frente do Príncipe, arrepiou-se como um gato quando o mesmo lhe estendeu a mão e se apresentou:
- Olá, emissário. Meu nome é Otabek, sou o comandante supremo das tropas infernais. É um prazer tê-lo aqui.
- Ponha-se no seu lugar, demônio. Nunca faria amizade com um ser tão vil.
- Já está na defensiva, Yuri? Não há motivos para isso. Você está aqui por ordens de seu Arcanjo e gozará de toda a liberdade e cortesia. No submundo, somos todos amigos.
O anjo engoliu as palavras que estavam prestes a sair de sua boca. Não podia deixar aquelas provocações bagunçarem seu intelecto.
- Vamos!
Otabek tomou sua mão, percebendo o contraste de temperatura entre os corpos.
- Nossa, acho que você é um anjo morto. Está mais gelado que as almas enviadas para cá.
- Não deboche de mim. Não serei motivo das suas risadas.
- Tenho certeza que não será... Mas enfim, isso parece divertido, e como estamos em trégua, vou eu mesmo te acompanhar pelo submundo. Vai ser no mímino interessante.
- Tsc!
Otabek deu o braço para Yuri e o anjo teve que corresponder. Quando no submundo, se jogava pelas regras de lá. Todos os convidados para a festa de recepção bateram palmas e começaram a bradar hinos em exaltação ao Príncipe, que agora descia as escadarias de seu trono com o anjo ao seu lado. Para qualquer um presente ali, era como um troféu sendo carregado, e Yuri detestava aquela situação.
Ao saírem do grande salão, enviezaram para um dos corredores. Quando a porta do corredor foi fechada, Yuri não pode mais se conter. Puxou o braço de volta para si e encarou o Príncipe.
- Já disse que não somos inimigos, Yuri.
O demônio aproximou-se de seu ouvido.
- Não há nada a temer aqui. Talvez você até goste...
- Não me dou à coisas pecaminosas, demônio.
- Eu tenho um nome. É melhor que comece a chamar por ele, ou vou achar que você não tem respeito pelo seu anfitrião.
Yuri nunca pensou que uma voz que não fosse do coro divino pudesse ser tão agradável. Era diferente de tudo o que ele havia ouvido antes. Era grave, macia, quente. O anjo sentiu-se corar pela primeira vez. E da mesma forma, a raiva correu por seu recente sistema sanguíneo.
- Hm... É impressão minha ou você parece um pouco mais vivo agora?
- Calado!
O mais alto sorriu de canto de boca.
- Vem, vou te levar aos seus aposentos.
Ambos seguiram pelo corredor. Yuri admirava a beleza estranha daquele lugar. Ao invés de um chiqueiro imundo para porcos, tudo era sóbrio, com cores pouco chamativas. Aquele lugar era tão civilizado quanto o céu. Já Otabek, observava as reações de seu convidado, não conseguindo deixar de notar sua beleza celestial, especialmente nos olhos verdes e nos cabelos loiros.
- O que é aquilo?
- O jardim?
- Não sabia que demônios cultivavam flores...
- Existem muitas coisas que os seres celestiais não sabem sobre nós.
- Eu gostaria de pedir algo.
- Não negaria nada ao emissário dos anjos.
- Preciso de um local tranquilo para minhas meditações e gostaria de utilizar o jardim.
- Tudo bem, mas por que não o seu quarto? Ninguém irá incomodá-lo.
- É mais fácil me conectar com o divino quando estou próximo da natureza.
Disse Yuri de forma dura.
- Certo.
- Tem mais uma coisa... Não podem me observar enquanto eu estiver meditando.
- É algum fetiche de anjo, por acaso?
- É algo muito pessoal. Você gostaria que alguém te observasse em seus momentos pessoais?
- Eu nunca me incomodo com isso. Aqui, todos os seres são livres. O jardim é meu. Ninguém vem aqui, senão eu. Porém, não lhe incomodarei. Com uma condição...
- Eu sabia que não seria de graça...
- Me chame pelo meu nome. Quero que me trate no mesmo nível.
- Tudo bem. Na sua casa jogo com as suas regras, Otabek...
Disse Yuri enfatizando o nome do Príncipe.
Seguiram o caminho e chegaram ao quarto de Yuri. Ele era como o resto do palácio, simples e bonito. O anjo sentiu que finalmente poderia relaxar e ficar sozinho, sem a espreita dos demônios.
- Se precisar de algo, meu quarto é logo na frente. Não quero que meus servos lhe importunem, pois não estão acostumados a ter luxúria com outros seres que não os humanos ou seus próprios irmãos.
- Vocês são bem nojentos. Como podem desejar os humanos?
- Acho que você não conhece muito sobre os demônios, não é mesmo?
- Não me interesso por saber.
- Enfim... O banquete está disponível em todos os momentos. Mas cuidado ao andar pelo palácio, de dia ou noite há maldades por todos os cantos e a todos os momentos, não recomendo que entre em locais desconhecidos, pois você pode acabar se arrependendo.
Yuri achou que era algum tipo de ameaça. Mal sabia o anjo que era um aviso.
Após algumas horas em seu quarto, Yuri sentiu que necessitava meditar. Aquele lugar cheio de pecados fazia seu corpo carnal tentar sucumbir. Especialmente na presença de Otabek. Ele era tudo, menos o que o loiro imaginava ser de um Príncipe demônio. Uma aparência digna dos mais belos humanos, educado, e de certa forma, divertido... Yuri chacoalhou a cabeça, sabia que qualquer descuido naquele lugar poderia sair muito caro para a sua missão.
Saiu de seu quarto pisando duro. E deu de cara com um demônio de cabelos loiros curtos.
- Deseja alguma coisa, fofo?
- Não se dirija a mim dessa forma. Sou um emissário dos anjos.
- Claro, lindinho! Só toma cuidado por aí... Sou o servente pessoal do Príncipe e se eu fosse você, evitaria sair dessa ala do palácio.
- Seu chefe já me avisou. Aonde ele está?
- Em seu quarto.
- Avise-o que eu vou meditar e que não entre no jardim.
- Como quiser, fofo.
Yuri saiu em direção ao extenso jardim.
Enquanto isso, Christopher, o servente do Príncipe foi ao seu encontro para relatar a situação, assim como tinha sido instruído. Bateu na porta de seu senhor e esperou pela resposta.
- Pode entrar.
O loiro ouviu do outro lado da porta.
Chris adentrou os aposentos de seu mestre e o viu aprontando-se mais do que o de costume. Era difícil para o servo se concentrar na presença do Príncipe, que elevava seu nível de luxúria a outro patamar. Porém, sabia que somente poderia tocá-lo quando fosse diretamente ordenado e sofria com os pensamentos sobre seu senhor.
- Haverá festa hoje, alteza?
- Sim. Preciso me divertir.
- Tenho um aviso, senhor.
- Fale.
- O anjo avisou que foi meditar.
- Agora é a hora, Chris. Sinto que isso tem a ver com o sumiço em turnos dos anjos no meio do campo de batalha.
- Excelente ideia, alteza.
- Fique aqui e não saia até que eu volte.
O servo assentiu e Otabek foi em direção ao jardim. Havia uma luz muito intensa atravessando as folhagens, o que muito intrigou o demônio. Ele adentrou pela pequena trilha até a fonte tentando não fazer nenhum barulho, seguindo os raios de luz, porém, não estava preparado para o que veria.
Seus olhos demoníacos viram o anjo, dessa vez, sem roupas, sentado dentro da fonte de costas para onde estava. A água que batia em seu corpo lançava um milhão de arco-íris na luz emitida pelo ser. Sua auréola luminosa era visível pela primeira vez. O Príncipe já havia visto todos os tipos de anjos, mas nunca um deles havia parecido tão maravilhosamente belo. Sentiu seu corpo estremecer com a luz, desejando pela primeira vez, depois de tantos milênios, voltar ao seu corpo original, sua consciência dizia que necessitava tocá-lo e descobrir os segredos por trás daquela cena. Estava quase tocando no anjo, com suas mãos de ossos proeminentes...
De repente, viu protuberâncias saindo de suas costas, e como o mais magnífico espetáculo, asas feitas de penas na cor branco-gelo se abriram em sua frente, asas essas cravejadas de diamantes, espalhavam ainda mais a luz emitida, fazendo com que aquela a imagem que já parecia surreal, se tornasse sua única necessidade. A mão finalmente encostou seu primeiro dedo no anjo, fazendo com que toda a luz imediatamente cessasse suas asas se retraíssem. O pequeno corpo do anjo caiu desacordado imediatamente dentro da fonte.
Dias depois, Yuri acordou em um cama confortável. No caso, era sua cama no inferno, e para sua surpresa, Otabek estava sentado do outro lado do quarto em uma poltrona que anteriormente não estava lá.
- O que você está fazendo aqui?
- Hm... Vamos dizer que eu fiz merda e estou tentando cuidar de um anjo que só me causou problemas durante essa última semana.
- O que aconteceu? Eu só lembro de estar meditando e depois, sentir um calor estranho nas minhas costas...
- Bom, essa foi a merda. Você estava meditando e tal, nessa coisa de anjo que vocês fazem, e eu acidentalmente toquei em você...
- Acidentalmente tocou em mim? Mesmo eu tendo dito para ficar sozinho?!
- Olha, me desculpe. Eu sou Príncipe, não devia ter quebrado minha promessa.
O outro, porém, não conseguia responder coisa alguma. Ele agora tentava compreender o motivo daquela sensação estranha. Seu corpo parecial mais real, mais carnal. Seria pelo toque demoníaco? Mas toques entre anjos e demônios aconteciam o tempo inteiro nos campos de batalha, por que ele sentia que aquilo fora diferente?
- Você... Viu minhas asas?
Otabek suspirou e lhe respondeu:
- Vi.
Yuri sabia que ele nunca compreenderia a gravidade da situação. O anjo fora visto em seu momento de maior vulnerabilidade, buscando contato com sua força vital. Ao mesmo tempo, o demônio não quis admitir que o havia feito por ter se sentido atraído pela sua luz.
- E pensar que eu não pude participar da minha própria festa para cuidar de você...
- A culpa de eu ter ficado fraco foi sua, para começo de conversa.
- Não tiro sua razão, mas você poderia ter me explicado o motivo.
- Se fosse você, teria me explicado?
- Sinceramente, não sei. Anjos não são dados a mentiras, e quando eles omitem algo, devem ter uma razão muito forte. Eu entendo o motivo.
- Só... Me deixa sozinho um tempo. Isso já está sendo difícil para mim, e suas conversas me deixam com dor na cabeça.
Otabek soltou uma risada grave.
- Bom, não quero ser o motivo das suas dores de cabeça... Eu tenho uma festa para ir. Se você quiser participar, será mais do que bem-vindo. Se bem que não acho que faz seu estilo...
- Acha que eu não sou capaz de participar de uma festa infernal?
- Te espero, então.
Ele saiu do quarto deixando Yuri sentado na cama. O anjo se sentia pessoalmente desafiado a participar da festa. Era puro capricho, ele sabia, mas queria provar ao Príncipe que tinha todas as condições para permanecer entre os demônios, sem se contaminar.
Foi pela primeira vez ao banheiro desde que fora criado. Tudo era novo naquele lugar. O banheiro era grande e, novamente, de cores neutras. A banheira já cheia de água quente, lançava vapores refrescantes e doces. Entrou na banheira e permitiu-se relaxar. Sentiu o calor invadindo abrindo seus poros e os odores adentrando sua pele.
Ter um corpo parecido com o dos humanos era certamente um desafio. A cada segundo havia sensações novas e intrigantes. Como quando Otabek tomou seu braço no meio da multidão de demônios, ou quando falou em seu ouvido e definitivamente quando tocou em suas asas.
Yuri sentiu seu corpo entorpecido dentro da banheira pela mera lembrança da sensação do toque. Anjos não tem sexo, mas em um corpo humano, obviamente poderia ser tomado por desejos carnais. Sacodiu a cabeça em negação, não se deixaria levar por meros devaneios de humanos e demônios. Ele sabia que sua única chance de aprender algo sobre aquele lugar, era permanecendo com seus pensamentos fixos nas alturas.
Saiu do banho rapidamente e rumou ao quarto, lá chegando, viu que havia uma roupa estendida em sua cama. Não era uma roupa qualquer, era um vestido, branco e imaculado, cheia de pedras furta-cor, como opalas. Era aquilo que Otabek queria que usasse na festa. A curiosidade cada vez mais incomodava o loiro.
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Yuri agora se encontrava na frente da porta misteriosa. Nenhum som saía de dentro, o que o intrigou pois festas supostamente eram muito barulhentas, lembrando das festas no céu. Respirou fundo e tomou coragem para girar a maçaneta. Assim que entrou na sala, soube que de fato, havia muito que não sabia sobre demônios.
Era um salão gigantesco com centenas de demônios movendo seus corpos no ritmo dos sons tecnológicos que pareciam bater dentro de seus próprios corpos. Yuri estava mesmerizado com aquela reunião de anjos caídos, compartilhando aquele momento como se fosse uma espécie de transe coletivo.
Não ficou espantado, entretanto, quando viu o trono branco ocupado por ninguém menos do que o próprio príncipe das trevas. Dessa vez, era realmente impossível não reparar em sua beleza e imponência. Ao mesmo tempo, os olhos de Otabek pousaram em Yuri, o único a usar branco na festa. Seu olhar parecia perfurar as vestes angelicais e atravessar a pele de Yuri, iniciando uma disparada em seus batimentos cardíacos, o que era incompreensível para o mesmo.
De repente, a batida tecno se transformou em sons de cordas. Violoncelos e Violinos se uniam ao som do órgão em uma melodia conhecida. Era um dos mais belos hinos da orquestra celestial. Yuri fechou seus olhos se deixou levar pela harmonia e as notas em tom menor. Era como um clamor. Sentiu seu corpo ficando leve e perdendo a noção de espaço e não ousou abrir os olhos. Sentia arrepios. Seu seu fluxo sanguíneo corria de forma desesperada e sua respiração era impossível de controlar. Era como em um encontro com o Criador, exceto pelo fato de que ele não estava meditando e nem buscando sua presença.
Em um instante seguinte a batida foi lançada e seus olhos se abriram de forma entorpecida. Seu corpo agora tentava encaixar seus movimentos com o ritmo da batida, enquanto todos os outros pulavam e se sacudiam. Alguns demônios se agarravam como se tentassem algum tipo de fusão de corpos, alguns simplesmente pareciam não estar ali, mas nada importava ao anjo. Ele só precisava daquilo.
Ao fechar fechar seus olhos e se entregar à melodia novamente, Yuri sentiu uma presença próxima a si. Não eram os milhares de demônios que o rodeavam. Era uma aura que exalava calor e um brilho avermelhado. A sensação de ter aquele corpo tão perto de suas costas seu criava um invólucro no qual apenas havia o anjo e Otabek.
- Yuri...
Sussurrou o demônio em seu ouvido.
O loiro se virou e encontrou os olhos do ser de aura vermelha.
- O que fez com o hino celestial?
Perguntou quase sem voz, devido a ter seus sentidos entorpecidos pela música e por Otabek.
- Eu dei a ele o toque que faltava. Fiz como presente para me desculpar por ter tocado em suas asas.
- É você quem controla as emoções de todos esses demônios?
- Sim. Eles vem até a mim em busca de prazer, e eu os concedo.
O príncipe se aproximou ainda mais de seu rosto. Levou uma de suas mãos aos cabelos do anjo para provar de sua maciez.
- Olhe para todos eles. Dançam, cantam, beijam, gemem. Tudo porque eu posso lhes dar isso.
- Você me controlou também?
Sua voz saiu em um fio.
- Não, Yuri. Apenas o observei. Seu rosto estava banhado em prazer, mas eu não fiz nada. Foi sua própria íntimo que assim o desejou.
Yuri já não registrava muito. O calor daquele corpo próximo ao seu o impedia de pensar direito. Agora, porém, um outro calor lhe acometia. Estava espalhado por seu ventre, o fazendo acreditar que enlouqueceria completamente.
- Eu vou tocar, Yuri. Me mostre como se sente, pois será a primeira vez que eu terei uma opinião sincera.
O príncipe dedilhou sobre teclas invisíveis e os sons de corda e órgão se fizeram presentes novamente, fazendo com que fosse claro para o anjo que não se tratava mais de um hino celeste, e sim de uma melodia que evocava os desejos mais carnais que haviam sido enterrados sob seu corpo humano.
- É apenas uma... Ah! Música!
- Achei que anjos não mentissem...
- Eu... Não...
Otabek observou o anjo um pouco mais de longe e pode ver o volume que se formava debaixo de seu vestido. Ficou encantado com o fato de anjos serem tão suscetíveis à música. A mão de Yuri foi involuntariamente até seu membro esfregando-a sobre o tecido fino tentando aliviar o fluxo sanguíneo que insistia em se concentrar ali. Ela se movimentava cada vez mais rápido e de forma descontrolada.
- Agora sim você está sendo sincero.
Seu rosto estava vermelho, seus olhos cerrados e sua boca entreaberta. Otabek sabia do que se tratava, o anjo não. Era como um presente para o demônio ver o ser celeste entregue às suas próprias emoções. Ele queria tocá-lo. Queria ser também a fonte de seu prazer. Entretanto, nunca faria qualquer coisa a Yuri que não lhe fosse permitido, principalmente após o toque na fonte.
- O que... É?
Perguntou Yuri caindo sobre seus joelhos.
O príncipe sequer conseguia falar. A imagem do loiro se tocando fazia seu coração bater de uma forma inesperada. Mesmo tendo dado a todos os demônios ali presentes o prazer que desejavam, nada se comparava à luxúria que via crescer no coração e no corpo de Yuri.
- Você vai descobrir.
Não muito tempo depois uma mancha apareceu nas vestes brancas no mesmo local no qual suas mãos havia esfregado incessantemente. O anjo parecia cansado e confuso. O demônio lhe ofereceu a mão e não podendo recusar suas mãos trêmulas tocaram de forma suave as de Otabek, que o ajudou a se levantar e levou-o para fora daquele lugar.
Assim que saíram, o loiro perguntou:
- Podemos ir até o jardim?
- Quer que eu te carregue?
- Não é necessário. Estou melhor agora.
Ambos foram caminhando de forma silenciosa até o jardim que era próximo de onde estavam. Entraram no local e sentaram-se lado a lado na fonte.
- Eu não... Não entendo. Não entendo por que me descontrolei e não entendo por que meu corpo reagiu daquela forma.
- É assim que um corpo reage quando está excitado, Yuri. O prazer é real. Os humanos tem essas sensações o tempo todo. É por isso que eles fazem todas as sortes de coisas para tê-lo. Não foi bom para você?
Yuri virou seu rosto em vergonha pela veracidade das palavras de Otabek. Aquela experiência fora melhor do que qualquer uma que tivera antes. Mas não era como se pudesse contar ao príncipe.
- Sei que é tudo novo para você, mas parece que os anjos não dão a mínima para os sentimentos dos humanos.
- Você sabe que isso não é verdade. Tudo o que os anjos desejam e batalham por é pela ordem. Para que os humanos tenham uma vida regrada e feliz sem exageros de corpo ou mente.
- Acho que nunca vou conseguir entender a necessidade de tanta ordem assim. O Grande Ser Celestial fez os humanos capazes de pensar por si mesmos. E é por isso que estamos aqui no submundo. Bom, mas isso você já deve saber bem...
Yuri de fato não sabia. Que conversa era aquela? Os demônios foram expulsos por causa dos humanos?
- Eu não estou entendendo do que você está falando. Tudo o que eu sei, e é o que todos os outros anjos sabem é que os demônios foram expulsos por desejarem ser como criador.
- É essa a mentira contada para vocês?
- Que mentira? Me explica isso agora!
- Não fomos expulsos por desejarmos ser como o criador. Fomos expulsos por desejarmos ser como os humanos. Ter a liberdade de escolher o que fazer, como agir, como sentir. Não éramos livres, Yuri. Assim como nenhum anjo é.
- Você está dizendo que a casta dos arcanjos está mentindo para todos os outros anjos, tentando fazer os demônios parecerem os inimigos da humanidade?
- Eu não estou fazendo suposições quaisquer sobre os anjos ou o que eles acham certo ou errado. Estou apenas lhe contando o que de fato aconteceu.
- Isso não faz o mínimo sentido! Você está mentindo! Está tentando me confundir! É isso! Por qual outro motivo você estaria me contando essas coisas?
- Por qual motivo eu mentiria sobre isso? O que eu ganharia? Nada! Eu sei que pode ser difícil para você, mas essa é a realidade. O que você acabou de sentir é puramente humano. É bom! É saudável! Por que o criador não deu aos anjos os mesmos sentimentos? Nós temos corpos como os deles, mas não estamos vivos. Aceite a realidade, Yuri. Não fomos criados para sentir, mas é o que todos querem. Os que ainda estão nas alturas negaram esse desejo, nós o abraçamos.
O anjo estava visivelmente transtornado. Depois de todos os acontecimentos daquele dia, seu corpo exausto somente desejava paz e tranquilidade. Ele subitamente saiu em direção aos seus aposentos. Ao ver o estado no qual Yuri se encontrava, Otabek levantou-se no intuito de tentar dizer qualquer coisa que o outro não gostaria de ouvir naquele momento.
- Yuri, eu não quis...
- Não fale mais nada e não me siga.
Ele seguiu seu caminho enquanto o outro pôde apenas observar.
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Já haviam se passado 3 dias. Não houveram mais festas naquele meio-tempo. Otabek se encontrava em seu trono, no meio de uma reunião de guerra, porém, seus pensamentos estavam distantes.
- ...E é por isso que devemos traçar um plano de ataque agora mesmo!
Toda a sala dirigiu o olhar para o príncipe, esperando uma palavra de ordem. Ainda assim, ele parecia não perceber.
- Senhor? Senhor?
Acordando do transe pelo chamado de seus companheiros, o demônio levantou-se de seu trono e saiu andando, deixando todos os participantes da reunião boquiabertos, e decidiu que iria acabar com aquele sentimento dentro de si.
Caminhou rapidamente pelos corredores do palácio até sua ala privativa. No trajeto, encontrou seu servo pessoal, Chris, que tratou de lhe inteirar da situação.
- Alteza, eu não me preocupo de fato com o anjo e realmente não ligo se sua essência retornar para o criador, mas tenho que lhe avisar que ele saiu do quarto completamente nu e está no jardim, no qual não entrei devido ao seu decreto. Já são passadas mais de 5 horas desde que ele entrou.
- Obrigado por me avisar.
- Senhor, por favor, não... Não se envolva demais com isso.
- O que eu faço ou deixo de fazer é minha inteira responsabilidade. Preocupe-se com suas próprias responsabilidades.
- Sim, senhor...
Otabek continuou seu caminho até o jardim. Havia prometido que não invadiria mais seu momento de meditação, mas aquela situação era diferente. Ele estava por algum motivo preocupado com o mensageiro. Preocupado com o peso de suas palavras.
Tentou então ficar de olhos fechados enquanto percorria os caminhos cobertos por paredes de vegetação e lindas flores, pensando assim que não estaria vendo algo que fizesse o outro desconfortável.
Ao ouvir o som de água da fonte, o demônio chamou pelo anjo.
- Yuri?
Nenhum som vinha como resposta.
- Yuri? Se estiver aí, me responda. Eu... Nós precisamos conversar. Eu vou ficar de olhos fechados. Não quero invadir sua privacidade, eu só estou preocup...
O silêncio foi preenchido por sons de choro que se aproximavam cada vez mais rápido. Repentinamente, o príncipe sentiu o calor de um corpo abraçando-o. Seus olhos se abriram e viram o pequeno anjo com os braços ao seu redor.
- Yuri? O que aconteceu? Você está machucado?
- Eu não consigo mais! Não consigo mais falar com ele! Não consigo mais sentir sua presença!
As palavras vinham como uma torrente trazendo os sentimentos à tona. Sem reação, tudo o que Otabek fez foi abraça-lo de volta e confortá-lo, ainda que julgasse não ser bom nessas coisas.
- Por favor, tente ficar calmo. Vamos sentar e você pode me explicar o que está acontecendo.
O mais alto o conduziu até a beirada da fonte, na qual sentaram. O príncipe ainda estava incerto sobre aquilo. Supostamente não deveria se importar com os sentimentos de seu inimigo, mas aquela situação o incomodava demais.
- Agora respire e tente me contar de forma calma o que aconteceu.
- Eu... Eu tentei de várias formas o contactar. O Grande Ser Celestial. Ele não me responde. Minhas asas... Elas estão escurecendo.
- O que houve de diferente nesses 3 dias?
- Eu fiquei naquele quarto pensando sobre tudo o que você me disse. Parte de mim diz que eu não deveria acreditar em nenhuma palavra do que você me diz.
- E a outra parte?
- A outra me diz que não tem motivos para que você minta para mim. Eu estou… Confuso. Minhas asas estão escurecendo, não consigo mais sentir o criador.
- Não foi minha intenção deixar você confuso, mas essa é a verdade. Preciso te levar em um lugar para que entenda outras coisas também.
Otabek levantou-se ofereceu-lhe a mão. O anjo não recusou.
- Mas primeiro, preciso que coloque uma roupa. Você é... Bonito demais. Os outros demônios vão te cobiçar, embora saibam que não são permitidos a tocar-lhe.
- E como você é diferente dos outros demônios?
- Não sou. Mas você aceitou o meu toque.
Yuri não pôde contra argumentar.
Depois de devidamente vestido, Otabek levou o mensageiro até o Precipício da Amargura. Era um local imenso no qual incontáveis almas vagavam em um vale que mais parecia um rio de almas correntes.
O coração do anjo pesou ao sentir o sofrimento e arrependimento naquele local.
- Eu sei que é difícil olhar para o vale. Mas também faz parte do nosso castigo.
- Achei que tivessem prazer em atormentar as almas enviadas para cá.
- Nós amamos os humanos. Tudo o que nós desejamos é ser como eles. Por que iríamos querer ver seu sofrimento?
- Então por que as almas corrompidas descem ao submundo?
- O criador nos fez responsáveis pelos humanos corrompidos como parte de nosso castigo. Nós não maltratamos os mortos, eles simplesmente vagam aqui relembrando todos os seus atos malignos. Sua consciência pós-mortem é o seu pior castigo. E um dia, eles serão destruídos pelo criador e deixarão de existir. Assim como todos os demônios.
O anjo sabia do destino dos demônios há milênios, mas agora, pela primeira vez se sentia incomodado com aquele fato.
- Qual o seu objetivo em me mostrar tudo isso?
- Estou te oferecendo a verdade, Yuri. Não sei o que aconteceu no céu para que os arcanjos mentissem, mas lhe garanto que tudo o que eu estou dizendo é a verdade.
- Eu não estou me sentindo bem. Quero voltar para os meus aposentos
Talvez seu coração tenha falhado por um instante quando sentiu um dos braços do demônio se colocar ao seu redor.
- Venha Yuri, eu sei como se sente.
Ambos foram até o quarto do anjo. Lá chegando, Otabek, em um sinal de respeito, beijou a mão do mais baixo, e Yuri pôde perceber que não era deboche, pena, ou qualquer sorte de sentimentos baixos. Ele percebeu que o príncipe parecia querer dizer “estou aqui”.
- Se você precisar, estarei na sala de guerra por toda a noite.
- Não quero incomodá-lo. Sei que tem seus assuntos a tratar e já dedicou muito de seu tempo a mim.
- Se eu estou lhe oferecendo minha ajuda, não hesite em aceitá-la. Pense como mais uma das regras do submundo.
Um sorriso leve surgiu no rosto de ambos.
- Tudo bem, Otabek.
Yuri entrou no quarto enquanto via Otabek se afastando pela fresta da porta. Mais uma vez eram abordados por aqueles sentimentos contraditórios dos últimos 3 dias.
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Em algum momento da madrugada, o demônio não soube precisar qual, o vento gélido parecia cortar seu rosto. Os planos de guerra encontravam-se estendidos na mesa gigante, as representações sangrentas do campo de batalha de alguma forma combinavam com as pinturas na abóbada da sala.
Olhar, pensar, refletir, planejar. Tudo era muito trivial para o maior estrategista do inferno. Entretanto, sua mente, sua maior arma, estava repleta de pensamentos sobre o ser celestial que estava a algumas salas de distância dali.
“Como pode ser tão ingênuo? Como pode ser tão belo? Como pode ser tão forte?”
Mas acima de tudo, sentia seu coração palpitar ao perceber que Yuri parecia começar a compartilhar um pouco do amor que sentia pelos humanos, ou ao menos, um pouco do desejo de liberdade. Em tantos milênios, ele havia encontrado com tantos anjos… Muitos vinham para negociar ou para trazer ou levar ordens e notícias de guerra, mas nenhum deles havia passado tanto tempo no submundo, ou sequer se aproximado do príncipe ou de outros demônios.
Yuri era especial. De uma forma estranha, seu jeito afobado e irritadiço junto ao seu rosto, que Otabek somente sabia classificar como “interessante”, faziam com que o príncipe às vezes esquecesse que ele era anjo. Especialmente após ele ter se deixado gozar ao ouvir a música que Otabek o deu como presente. Tudo aquilo era diferente. Definitivamente especial.
Sua mão voluntariamente foi até seu membro.
“Será meu pior castigo me tocar para um anjo?”, pensou. Entretanto não conseguia parar. Os movimentos eram precisos e causavam ondas de prazer percorrerem o corpo do demônio. A imagem de Yuri dominava sua mente. Suas asas, seu corpo nu, sua expressão de prazer na festa, sua língua afiada e seu senso de questionamento. Ele não tinha noção de o quanto era afrodisíaco.
- Yuri… Yuri… Yuri…
O demônio chamava pelo anjo.
- Eu vim te procurar, mas acho que você já estava me chamando…
Pela primeira vez desde sua criação, Otabek corou e sentiu vergonha de algum ato seu. Seus movimentos cessaram no mesmo instante.
“Por que raios ele está sem roupa?”
- Yuri?! O que você está fazendo aqui?
- Você disse que eu podia vir conversar a qualquer momento.
- Tem razão. Me desculpe por me encontrar nesse estado…
- Estava fazendo o mesmo que eu fiz na sua festa.
- Sim.
- Por quê?
- Você não vai querer saber.
- Quer apostar?
- Você já sabe que eu sinto luxúria quando te vejo.
- Você sabe que eu sou um anjo e que isso é errado.
- Será que é errado de fato? Ou será que te disseram isso para que você não experimentasse?
- Não sou tolo como os humanos. A serpente lançou a mesma dúvida para Eva, e veja como terminou…
Otabek levantou-se de sua poltrona e foi até o anjo, parando de frente a ele a uma distância quase insuportavelmente próxima.
- Mas você já experimentou. Já provou como é bom…
Yuri sentia novamente aqueles desejos. Estavam impregnados nele desde aquela maldita festa. “Não… Desde que tocou minhas asas”. Seus olhos se fecharam e sua mente se concentrou em sentir o calor que emanava de Otabek.
- Eu sei, Yuri. Sei como é bom. Sei que seu corpo está quente. Sei que ele deseja ser tocado.
O anjo agora respirava de forma curta e pesada.
- Sei também que você consegue sentir, lá embaixo, no seu íntimo, que quando eu chego perto de você, não há mais certo ou errado.
Otabek ouviu um pequeno gemido saindo da garganta de Yuri. Ele até poderia considerar que estava no comando da situação, mas não era como se ele mesmo tivesse algum controle sobre si, quando se tratava daquele anjo.
- Você quer que eu te toque, Yuri?
- Sim…
Sua voz saiu em um sussurro.
O príncipe olhou novamente para Yuri. Era a mais bela forma que já havia encontrado entre humanos, anjos ou demônios.
- Você realmente não deveria sair desnudo por aí…
Otabek realizou seu desejo de tocá-lo, finalmente, com sua permissão. Seus dedos longos passearam por mechas dos cabelos loiros e macios. Eram mais macio do que qualquer nuvem. Sua mão tocou com ousadia o rosto, enquanto o anjo corava.
“Ele é forte, ousado, verdadeiro”. Yuri tinha noção do erro que estava cometendo, porém, não havia como aquelas sensações serem erradas.
- Vou te mostrar algo bem humano. Tenho sua permissão?
Yuri abriu seus olhos verdes e intensos e Otabek teve novamente certeza de que ele era certamente uma das obras primas do criador.
- Faça com que eu me sinta humano.
O príncipe tomou o corpo de Yuri em seus braços, selando seus lábios, fazendo com que ambos perdessem contato com a realidade. O beijo era macio, morno. A boca do anjo se abriu involuntariamente, como em um pedido silencioso por mais. O demônio foi inserindo sua língua cuidadosamente na cavidade do outro, explorando cada pequeno espaço, textura e sabor.
Os corpos agora grudados um ao outro, derramavam calor e aquela aura vermelha por todo o local. Otabek segurou no traseiro de Yuri, levantando-o e o deixando sentado na mesa de guerra. Suas intimidades se encostaram e buscaram mais daquela fricção deliciosa entre eles.
- Deixe-me ver suas asas…
- Ela estão cinza. Não são mais dignas de admiração.
- Eu as admiraria ainda mais se fossem pretas.
Não conseguindo recusar o pedido do demônio, Yuri deixou suas asas se libertarem. Elas estavam na cor cinza, mas isso de forma alguma impediu Otabek de admirá-las. Dessa vez, foi Yuri quem beijou o demônio, utilizando de toda sua ousadia para satisfazer o desejo de seu coração.
Subitamente, Yuri sentiu uma dor tão insuportável em seu corpo, que transcendia qualquer situação vivida em campo de batalha. Ele se afastou instintivamente não podendo suportar a dor excruciante.
- O que… É essa dor?!
O corpo do anjo foi se tornando etéreo novamente bem em frente aos olhos do príncipe, e em um clarão de luz, não havia mais Yuri.
Otabek caiu sobre os joelhos tentando entender o que acabara de acontecer. Yuri desaparecera em um instante e ele nada pôde fazer.
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- O que aconteceu, Yuri?!
Gritou uma Mila desesperada.
- Tivemos que pedir ao Arcanjo para te trazer de volta! Achamos que ia morrer!
Georgi transpirava preocupação.
- E-Eu estou bem, mas… Por que me chamaram de volta?
- O fogo que eu te dei antes de ir para o submundo era além de uma bênção, uma forma de te monitorar. Se sua chama angelical se extinguisse, ou diminuísse, saberíamos que estava morto, ou em perigo.
- E por que não me falaram nada sobre isso? É por acaso mais um segredo ou mentira que vocês contam para “o bem maior dos anjos”?
- Do que você está falando, Yuri? Fizemos isso pela sua proteção! Não podíamos lhe contar pois aqueles cães do Grande Inimigo poderiam lhe torturar ou algo do tipo. Tínhamos que ter a certeza de que você estava bem.
- Seu fogo estava errado. Eu estou perfeitamente bem. Não corri nenhum perigo de deixar de existir. Pelo contrário. Me senti mais vivo do que nunca.
- Você está estranho, Yuri. Agressivo, descontrolado. Até seu olhar parece mais humano.
Disse Georgi.
- Talvez seja isso o que acontece quando você é abandonado pelos seus amigos no submundo e forçado a conviver com demônios. Eles passam a ser como pessoas. Talvez não sejam tão ruins…
- Calado, Yuri! Não sei o que deu em você, mas tenho certeza que é influência dos demônios.
- O que está acontecendo aqui?
Perguntou o Arcanjo Yuuri que chegara sem que tivessem percebido.
- S-Senhor? Nós estamos apenas conversando… Yuri está cansado e passou por muitos traumas no submundo. Ele só precisa descansar.
Respondeu Mila de forma apressada.
- Tudo bem. Yuri! Preciso do seu relatório sobre a estadia no submundo assim que possível. A partir dele, montaremos nossa próxima estratégia de batalha.
Yuri mal conseguia se controlar de tanta raiva, porém, precisava de mais provas sobre a história contada pelo príncipe.
- Sim senhor.
O loiro se retirou daquele local. Tinha muito a pensar e a descobrir.
*Alguns dias depois*
Yuri estava cada vez mais engajado em encontrar informações sobre a verdadeira história de como os demônios foram expulsos do paraíso. Foi até a grande biblioteca diversas vezes, entretanto, não havia qualquer informação diferente do que sabia há milênios. Então, por qual motivo Otabek o contara daquilo? Ao menos sabia que os demônios de fato não atormentavam os humanos após a morte. Ele vira.
“Talvez no palácio do Arcanjo Yuuri?”, ele se questionava. Afinal, Yuuri era o primeiro em comando. Mas como entraria em seu palácio sem chamar atenção? A ideia lhe atingiu como um raio. Toda a leitura que fizera na biblioteca valeu a pena, ao menos por isso.
Na mesma noite, o mensageiro foi até o palácio de Yuuri, batalhões de anjos guerreiros se encontravam ali. Teria que mentir.
- Boa noite, mensageiro. O que deseja?
- Preciso falar com o Arcanjo. Tenho informações importantes sobre o submundo.
- Tem um horário marcado com ele?
- São informações urgentes, não pude marcar horário com antecedência.
- Você é o emissário que ficou no submundo, correto?
- Sim!
- Pode entrar. Mas por favor, anuncie-se primeiro. O Arcanjo não gosta de visitas inesperadas.
- Obrigado.
A primeira etapa fora concluída. Os anjos guerreiros não eram conhecidos por sua inteligência, o que deu a Yuri a oportunidade de entrar no palácio.
Andando pelos longos corredores cobertos por pedras preciosas e os mais finos tecidos, ele procurou pela sala de guerra. Era o único lugar que conhecia dentro do palácio. Ao chegar lá, encontrou o Arcanjo sentado em sua poltrona. Todo aquele lugar era envolto de um luxo sem par.
- Senhor…
- O que faz aqui, Plisetsky?
- Tenho mais um informação sobre o submundo que não lembrava antes.
- Então diga.
- Os demônios tem uma forma de descansar no campo de batalha. Mas não precisam sair de fato para isso. O comandante canta uma canção que deixa os seus corpos leves e recarregados, e eu a aprendi.
- Cante para mim, Yuri! Podemos criar uma vantagem muito grande em relação a eles.
Ele desejava de todo o coração que seu plano desse certo. Se o criador havia cantado para o sono temporário dos anjos, Yuri agora cantaria o mesmo para que pudesse descobrir a verdade.
“Eu o fiz para mim
Lhe dei todo o amor que tinha
Sua luta não cessa
Seu amor é constante
E agora distante
Pela paz que desejas
Ordeno que descanse”
O mensageiro observou enquanto calmamente o Arcanjo fechava seus olhos e entrava em repouso. Não tinha ideia de quanto tempo o sono duraria, mas era aquele o único momento para buscar informações.
Procurou por toda a sala de guerra. Se perdeu até encontrar a biblioteca, na qual novamente não viu nenhum livro fora do comum. A última esperança seria procurar nos aposentos do Arcanjo. Depois de muita procura, encontrou o lugar. Não havia anjos de guarda, teoricamente, não havia maldade no céu.
Adentrou o espaço que era tão ou até mais luxuoso do que o resto do palácio. Novamente, procurou em todos os cantos possíveis, e nada havia encontrado.
“E se Otabek mentiu para mim?”
“E se foi um plano para me fazer duvidar de meus superiores?”
Cansado de procurar, Yuri sentou-se na cama do Arcanjo e olhou para si no espelho em frente. Sua imagem estava de certa forma distorcida. Ele não compreendia. Era um espelho normal, ou ao menos deveria ser.
Sua curiosidade o levou até a frente do espelho. Quanto mais perto, mais distorcida a sua imagem. Ele se aproximou e tocou o espelho. Para sua surpresa, a superfície que deveria ser sólida estava maleável. Não podia ser um espelho normal.
“Será que…”
O seu braço foi forçando entrada através do espelho, indo cada vez mais longe, até que sua mão tocou algo sólido. Agarrou aquele objeto e o puxou para si, retirando-o de dentro do espelho. Era um livro com o título “Vere Absolutum”. “A verdade absoluta”, era isso que estava procurando.
Seus olhos engoliam cada linha. Era sim uma verdade absoluta. Muito, muito amarga, porém, agora ele tinha certeza. Otabek era um demônio, entretanto, ele lhe contara a verdade. A exposição da mentira nos céus. A corrupção dos Arcanjos. O castigo dos demônios. A verdade era tão nojenta quanto poderia ser.
Depois de ler tantas palavras, Yuri tinha apenas uma certeza.
Abriu suas asas cinza e desejou com todo o coração ser humano e poder escolher. Ter a liberdade que só experimentara no inferno. Sentir o que sentiu quando o príncipe o tocou. E como em um espetáculo pirotécnico, suas belas asas foram consumidas pelo fogo da verdade, queimando cada pena, cada nervo e deixando apenas o couro preto devido às queimaduras com os diamantes cravejados nele.
Yuri sabia. Agora era um demônio.
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O príncipe Otabek estava em seu trono. Sua expressão era sisuda e seus servos nunca havia presenciado um humor tão severo vindo dele. Os comentários que percorriam o submundo eram de que desde que o anjo se fora, o príncipe estava fora de si. Não havia mais festa, nem celebração.
No entanto, o príncipe não negava os rumores, exatamente por prometer a si mesmo que somente falaria a verdade. Ele sentia falta de Yuri. Não tinha ideia de o quão rápido havia se apegado ao anjo. Para ele, o único beijo com sentimentos que já tivera em sua vida, havia sido com ele.
Sim, ser anjo foi o que o atraiu a princípio, mas após conhecê-lo mais, sua personalidade foi o que o cativou de fato. Se ele não fosse proibido para si… Nem sequer tinha notícias sobre seu paradeiro.
- Senhor! Senhor! Tens uma visita em seus aposentos.
- Já avisei ao Chris que não quero companhia pelos próximos dias.
- Não parece nem um pouco com o Chris, senhor. Acho que ele já esteve aqui antes…
Otabek não respondeu. Saiu correndo em direção ao seu quarto. O coração palpitava novamente, como se tivesse lembrado de bater após um estado de sono. Ao chegar em seu quarto e abrir a porta, finalmente teve a visão que precisava.
- Não vai me dar as boas vindas, Otabek?
- As asas brancas eram realmente bonitas, mas o preto lhe cai melhor…
- O que houve com você?
- As explicações ficam para depois. Eu tenho um assunto muito urgente para tratar com o príncipe.
Falou Yuri enquanto deitava provocantemente na cama de lençóis escuros que contrastavam com sua pele clara.
- Você realmente deveria aprender a usar roupas…
Ambos sabiam que a partir daquele momento, até o momento que o criador os destruísse, seus sentimentos humanos estariam voltados um para o outro e gozariam de toda a liberdade que o amor poderia lhes proporcionar.
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Notas finais: E então? Gostaram? Espero que sim! Acabei escrevendo algo um pouco fora da minha zona de conforto, mas no final, gostei do resultado. Se gostaram, me deixem saber.
Beijos e até a próxima!
Gracias por leer!
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