Acordei sentindo uma forte dor de cabeça. Me revirei na cama algumas vezes. Estou em casa. Era sempre tão rápido, mas eu já estava acostumado.
Me enrolei no lençol e senti aquele cheiro doce do seu perfume e sono. Cheiro de sono.
Bocejei fechando os olhos preparado para voltar a dormir. Então senti, gelidamente aquelas mãos me envolverem a cintura. Era um alívio gigante as senti ali novamente todos os dias.
Me virei para ver o seu rosto mais uma vez. Ele estava de olhos fechados, mas sorria delicadamente, daquela forma tão bela que só ele conseguia. Piscou lentamente até abrir os olhos por completo e me fitar deixando seu sorriso maior.
Meu coração acelerada todos os dias nesse momento. Era como se fosse a primeira vez que ele sorria para mim. Era lindo apreciar isso uma última vez.
Ele entrelaçou nossos dedos e nossas pernas nos tornando mais próximos.
- Eu te amo. - ele disse com a voz rouca de sono outra vez. Eu ri. Era tão engraçado a forma como isso soava todos os dias.
- Eu sei. - respondi deslizando a palma pelo seu rosto macio. Seus lábios em forma de coração. Já estava ansioso para vê-lo de novo.
Então, aquele despertador infernal tocou novamente. Com aquele apito alto anunciando o fim da minha felicidade. Ele berrava e entrava pelos meus ouvidos rasgando.
Ele se curvou para trás para desligar o aparelho e suspirar.
- Tenho que ir. - disse e meu coração voltou a se agitar. Por que?
- Não quer ficar em casa? - perguntava todos os dias esperando que a sua resposta mudasse, mas era sempre a mesma.
- Eu preciso ir. - riu se sentando. - Na volta eu venho lhe buscar para tomar-mos sorvete. - prometeu. Porém, ele nunca cumpri. Nunca.
Rolei na cama tentava afagar meu desespero crescente. Não vá hoje... não vá.
- Se você ficar... - chamei sua atenção que estava escovando os dentes na porta do banheiro me encarando fazer manha. - eu faço o que você quiser... até mesmo... aquilo.- ele riu e voltou para o banheiro para cuspir a pasta e lavar a boca. Então veio na minha direção e beijou meu rosto.
- Pode ser na volta?
- Não... - entrelacei seu pescoço. - Agora.
- Yoongi... - repreendeu baixinho. - Eu preciso ir. Não faça manha.
- Eu faço qualquer coisa. - implorei. Ele suspirou sorrindo.
- Você está muito carente hoje... - se separou do meu abraço e voltou a se arrumar. Meu coração não parava de se agitar. - O que houve? Você nunca foi assim...
Começou a se vestir. Colocou aquela camiseta branca maldita que sempre que a olhava sentia meu coração saltar e na minha mente tudo começava a se colorir instantaneamente enquanto ele a deslizava pelo seu corpo. Tão branca...
- Não quer pegar um táxi? - perguntei sentando na cama vendo ele terminar de vestir o resto da roupa manchada.
- Não tem necessidade. Eu estou bem na hora.
- Eu pago. - ele me fitou novamente com a sobrancelha arqueada. Então voltou e me beijou. Senti que choraria, mas segurei. Por que beijá-lo é malditamente bom?
- Você se preocupa de mais. Vai dar tudo certo, ok? - sorriu e começou a calçar os sapatos. Não... não ok.
Cada segundo passou arrastando e de certa forma isso me deixava feliz. Ele tomou seu café de todos os dias na sua xícara preferida e me deu um longo beijo. Sussurrou coisas no meu ouvido que me arrepiaram por completo e me fez pensar que como eu queria que ele voltasse pra casa logo e cumprisse tudo isso.
- Podemos fazer isso agora. - sorri. Ele riu negando com a cabeça.
- A espera deixa tudo mais gostoso. - respondeu mordendo meu lábios e enfim saindo de casa. E foi como se me levasse com ele.
Sentei no sofá e esperei. Não quis ligar a TV dessa vez. Estava cansado dessas notícias que eram sempre as mesmas e as falas dos desenhos que eu já havia decorado.
Agarrei meu joelhos e encarei o relógio. Ele voltaria para casa a tempo para o almoço. Suspirei. Eu havia feito um bolo, mas ele não comeu. Dessa vez eu não faria. Tudo estava no armário e é a onde ficaria.
Mudei de posição várias vezes e encarei o relógio.
Talvez se na próxima vez eu vá com ele...
Não, ele sempre negava que eu fosse junto.
Eu deveria amarra-lo na cama.
Ele ficaria bem bravo, mas e idai?
Me pergunto se eu conseguisse fazê-lo ficar em casa, o que aconteceria quando chegasse a hora?
O telefone tocou me fazendo saltar no sofá e de meus pensamentos.
Que droga!
Fui lentamente em sua direção enquanto seu som preenchia a casa. Parei na sua frente e percebi que minha mão não tremia mais como das outras vezes. Levei o aparelho ao ouvido e pude ouvir a respiração do outro lado.
- Sr. Min Yoongi? - aquela mulher perguntou novamente. Engoli seco.
- Sim. - respondi firme.
- O Sr. conheçe um homem chamado Jung Hoseok? Tem algum grau de parentesco?
- É meu namorado.
- Poderia se dirigir ao Hopital Público de Seul? Houve um acidente e o Sr. estava na chamada de emergência do celular da vítima.
- Estou a caminho.
Desliguei. Ela deve ter estranhado minha calma. Porém, eu não estava calmo. Apenas sabia que me descontrolar não ajudaria. Nada ajudaria.
Me vesti com a mesma roupa de sempre. Aquela calça jeans azul e a camiseta preta de Hoseok que foi a primeira que vi quando atendi o telefone pela primeira vez. Lembro de ter saído correndo desesperado e aos prantos.
No dia anterior eu estava febril, e como sempre tive facilidade para ficar doente, Hoseok achou melhor eu faltar a faculdade. Fariamos três anos de namoro hoje e por isso fiz um bolo. Me lembro de estar sentado a mesa de frente para o bolo esperando chateado por Hoseok estar demorando de mais. Ele só ia assistir as três primeiras aulas e voltaria para cuidar de mim.
No fim, eu pensei que ele havia esquecido e saído com os amigos dele. Ele fazia isso as vezes depois da aula e sempre foi distraído. Tentei ligar para ele, mas seu número deu fora de área, ele provavelmente havia esquecido de carregar, como sempre e levou sem checar a bateria. Eu suspirei emburrado e cortei uma fatia do bolo e comi em silêncio, até que o telefone tocou.
Agora eu estava descendo no elevador e passando pela portaria. O porteiro Jin estava organizando uns papeis em cima da mesa e sorriu acenando para mim. Eu retribui.
Na primeira vez, ele me viu aos soluços e me ajudou a chamar um táxi. A moça do telefone havia me dito o que Hoseok sofreu, pois eu havia perguntado. Dessa vez eu não o fiz.
Chamei um táxi e pedi para ele ir ao hospital. Eu sempre pegava o mesmo taxista e sempre dava o mesmo preço. Ele sempre me oferecia balinhas de açúcar e eu recusava. Sempre começava a chuviscar depois do segundo semáforo e o taxista sempre fazia comentários sobre o tempo estar estranho e que mais cedo houve um assalto em um ônibus, houve tiros e vítimas e todos já estavam comentando que a polícia não conseguiu prender o culpado. Ele sempre bufava e dizia que quase foi assaltado uma vez no táxi, um homem entrou e lhe apontou uma arma, ele nunca contava o resto da história e eu não perguntava, ele apenas finalizava dizendo "Foi Deus". Deus...
Paramos em frente ao hospital e eu o paguei, o preço exato, pois já saia com o dinheiro contado. Entrei e avisei na recepção que eu fui chamado para ver um paciente. Eles me levaram até Hoseok com um sorriso triste.
- Oh... você chegou. - a moça que me ligou disse. - Me acompanhe.
Entramos no quarto e ela levantou o pano me mostrando o rosto bonito de Hoseok. Os olhos fechados como se estivesse dormindo, pronto para acordar, se espreguiçar e dizer que me ama. A camiseta branca completamente manchada de vermelho.
- Eu sinto muito. - disse a moça. - Nós tentamos muito reanima-lo, mas ele foi baleado no peito e já chegou sem pulso.
- Tudo bem. - disse sem tirar os olhos do homem a minha frente. - Pode sair? - perguntei e ela saiu sem contestar.
Me aproximei e sentei em uma cadeira ali do lado. Toquei sua mão gelada e entrelacei nossos dedos, beijei a costa da sua mão e olhei seu rosto novamente. Havia um pouco de sangue na sua boca. Lembro de ter chorado por cima do seu corpo, gritado e implorado que ele voltasse. Quase destruí esse quarto e foi preciso dois seguranças para me afastar do seu corpo. Um médico conversou comigo durante um tempo e depois chamou um psicologo que eu mandei a merda. Eles me entregaram o celular de Hoseok que estava com pouca bateria, pois o hospital devia ter carregado para ver o contato de emergência. No papel de parede eu e ele estávamos abraçados deitados na cama e eu beijava o seu rosto enquanto ele sorria mordendo a língua. Minhas lágrimas pingaram na tela do celular e corri para o banheiro e vomitei bolo de aniversário de três anos de namoro.
Tudo passou pela minha cabeça naquele dia, como num filme... desde que nos conhecemos. Senti vontade de morrer também e pensei seriamente nisso. Então dei o contato dos pais de Hoseok para o hospital e disse que ia até em casa buscar algumas coisas. O psicologo falou comigo novamente e disse que eu devia ficar e chamar alguém pra ir me buscar, mas eu o ignorei. Apenas sai andando e chorei o caminho inteiro até em casa. Peguei a xícara favorita de Hoseok e a abracei chorando, a lavei com cuidado e guardei no armário. Deitei na cama e chorei mais um pouco sentindo o seu cheiro ainda fresco no lençol. Como Deus pode ser tão cruel?
Chutei tudo que vi no caminho e por fim abri a janela. Subi no parapeito e olhei lá para baixo. Estava no vigésimo segundo andar. Meu coração estava a mil e minha cabeça doía.
- Ho..seok.. - chorava dizendo seu nome. Olhei lá para baixo de novo e enxuguei as lágrimas. Dei mais um passo e fechei os olhos. Dizem que a morte é rápida e indolor.
Acho que não foi nem um pouco assim.
Quando abri os olhos, eu estava na cama e Hoseok estava acordando. Aquilo havia sido um pesadelo?
Não. Aquilo apenas repetia.
Era uma chance de eu salva-lo? Não importava o que eu fizesse ele sempre saia.
Na próxima eu vou definitivamente amarra-lo... ia para casa e me jogava da janela. O que se tornava mais fácil a cada vez.
Não... não pode ser isso.
Senti uma lágrima escorrer pelos meus olhos. Fazia dias que eu não chorava a morte de Hoseok. Não é pela morte.
- Acho que está na hora de deixar você ir. - disse começando a soluçar enquanto apertava fortemente a mão do maior. Algo estava errado. A cada dia Hoseok tinha a pele mais fria e a cada dia eu me dirigia como um robô em direção aquela janela.
- Eu te amo. - suspirei. Eu devia ter dito hoje.... - Foi a última vez, eu prometo. Você pode ir. - disse sentindo uma dor enorme crescer em mim e começar a querer explodir. Me levantei e corri para fora do quarto indo em direção ao banheiro. Eu vomitei bolo de aniversário.
Mas eu não fiz bolo...
Não importa mesmo que eu tente mudar. O final é o sempre o mesmo... nada vai apagar isso... não vai mudar...
Chorei com toda a minha força e o psicologo conversou comigo e disse para eu ligar para alguém.
Eu chamei Namjoon, meu melhor amigo e quem me apresentou Hoseok.
Ele chorou também e me abraçou.
- Nós vamos ficar bem. - disse para Namjoon que sorriu fraco. - Não é?
Gracias por leer!
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