howudare HOWYOUDARE .

Jeon Jungkook é um gay medroso que, inegavelmente, é a pior pessoa para carregar o fardo de ser um mediador: uma espécie poderosa de médium, que não só é capaz de ver os desencarnados, como pode ouvi-los e tocá-los, exatamente como uma pessoa de carne e osso. Só que descobrir que o fantasma assombrando a velha casa de sua avó é um tremendo gostoso não estava em seus planos; menos ainda perceber que o fantasma de rostinho angelical parece muito disposto a ser sua mais nova companhia - ainda que Jeon a recuse sempre. Como se não bastasse, o falecido Park Jimin tem o costume de balançar portas e janelas, fazer luzes piscarem e todo o tipo de coisa que uma assombração é suposta a fazer quando fica irritadinha; e Jungkook tende a irritá-lo com bastante frequência...



Fanfiction Celebridades No para niños menores de 13. © Direitos Reservados

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ESPERO QUE NÃO SEJA UM FANTASMA!

Eu estava com medo. Definitivamente com medo.

E esse era aquele tipo de medo que faria qualquer cara machão de um metro e oitenta de altura, músculos definidos e barba cheia, gritar que nem um pivetinho de 5 anos.

E eu realmente sou um cara de um metro e oitenta e músculos definidos, ainda que não cultive um monte de pelos na cara, porque sou um nenê, sabe? Não sabe, mas vai saber. E vai saber também, que eu nego ser um bebê, até a morte. E que eu sou confuso e vivo me contradizendo.

Mas veja bem, eu não gritei como um pivetinho... ainda.

O impulso de berrar até minhas cordas vocais se rasgarem, foi restrito pelo enorme pavor que se apossou de meu corpo quando senti o colchão pesar e afundar ao meu lado, exatamente daquele jeitinho de quando alguém se senta na cama em que você está deitado.

Meu sangue gelou.

Minha mãe não estava em casa, isso era certo. Ela trabalha muito e por isso quase não fica por aqui. Meu pai é um juiz em Seul, enquanto ela é Juíza em Busan. Eles estão juntos desde o ensino médio, e é a coisa mais fofa.

Por conta de seus trabalhos, meus pais vivem um relacionamento à distância no momento, e não é incomum eu encontrar os dois conversando por vídeo-chamadas e fazendo voz de bebê um pro outro. Só que presenciar tais cenas é quase tão assustador quanto a provável criatura das trevas se sentando em meu colchão naquele momento.

"Por favor, seja um bandido!" pensei.

Porque se for um fantasma, minha nossa, eu vou rezar o pai nosso em 37 línguas diferentes, Deus que me perdoe.

Veja bem, eu não sou um cara exatamente medroso. Pego aranhas, baratas e outros insetos nas mãos, sem o menor problema. Uma vez, no zoológico, peguei uma cobra no colo. Botei ela enrolada em volta do meu pescoço — e olha que ela era bem feiosa e amarela. Meu primo, Jung Hoseok, só faltou ter uma síncope e desmaiar. Eu morri de vergonha, porque os gritos dele não eram nada másculos. Mas cá entre nós, eu também não posso ser considerado muito másculo, ainda que eu tenha um corpinho malhado de academia e seja destemido com animais assustadores. Isso porque, eu já disse, sou um nenê... Mas só eu posso falar isso, mais ninguém, me respeita.

O negócio é que tenho muito, mas muito medo de fantasmas. Por algum motivo, desde criança, tenho uma tendência a ver vultos aleatórios em momentos inesperados. Uma vez, por exemplo, eu estava tomando um banhozinho relaxante, depois de tocar uma punheta mais relaxante ainda — teve comeback do Bigbang, e o G-Dragon tava muito gostoso, meu pai amado, fiquei muito excitado. — Mas então, quando sai do chuveiro e passei a mão no espelho pra tirar aquela coisa embaçada do vapor, soltei o berro da pantera asiática, que pôde ser ouvido à três quarteirões daqui. Porque exatamente como nos malditos filmes de terror, tinha alguma coisa parada atrás de mim. E quando digo alguma coisa, é porque não era algo passível de identificação.

Veja bem, nunca vi nada com clareza. São apenas vultos, ou coisas meio translúcidas e fora de foco, que desaparecem num milésimo de segundo — mas não antes de me fazer quase sujar as calças e ficar branco feito um papel.

Mas a questão é que já fui a diversos centros religiosos em busca de respostas. Desde religiões de cristianismo, até as pagãs. Numa viagem de férias ao Brasil, até mesmo visitei alguns centros de religiões de matriz africanas, que trabalham muito com espiritualidade. Mas com isso, aparentemente fiquei mais "aberto" a enxergar coisas inexplicáveis.

Nas religiões de cristianismo, os padres e pastores disseram que isso era trabalho do maligno — o que me deixou ainda mais cagado. No espiritismo, alguns disseram que eu era uma espécie de médium — e que talvez pudesse convidar os espíritos a me possuir para que eu transcrevesse suas cartas, e assim servir como um porta-voz dos desencarnados. Mas a ideia me pareceu assustadora demais. Eu não estava preparado pra deixar meu corpo ser possuído por coisa nenhuma. Nadinha. Olha só, eu tô todo cagado.

No budismo, que é a religião mais comum aqui no continente, os caras queriam me ensinar uma espécie de meditação, onde eu entraria num estado de concentração intensa e então, talvez, visse algo com mais clareza. Mas a verdade é que eu não queria ver nada...

Nadinha.

Néca de pitibiriba.

Capische?

Eu sei que vocês capische.

No fim das contas, eu acabo acreditando em todo o tipo de religião, porque tenho certeza que o mundo espiritual existe, de alguma forma, seja ele bom ou ruim. Chamam as pessoas sem religião de 'agnósticas', as que não acreditam em Deus de 'ateístas', os que acreditam em vários deuses de 'politeístas', e por aí vai. Não sei bem se existe um termo pra pessoas como eu, que acreditam em tudo, mas acho que é 'cagonista' — do verbo 'estou todo cagado'.

Então o que mais eu poderia fazer pra me livrar dessas coisas estranhas e poder dormir a noite tranquilamente, sem ter que tomar dois comprimidos de Rivotril? Bem, eu apelei para a Medicina.

O caminho parece inverso, certo? Geralmente pessoas com esse tipo de problema primeiro procuram médicos e depois religiões para encontrarem respostas. Mas no fundo eu sempre soube que esse não era um problema ao alcance da medicina. É tipo um sexto sentido, ou como você queira chamar. E certamente tenho um cagaço fodido de acabar numa camisa de força, pode acreditar.

Então me diagnosticaram com uma coisa chamada Palinopsia — você pode procurar sobre ela no Google. Mas é basicamente considerado um desequilíbrio transitório do cérebro, capaz de afetar a informação espacial e visual de maneira consistente, que geralmente acomete pessoas que sofreram de pancadas fortes na cabeça, durante o uso de remédios antidepressivos e todos os tipos de tarja preta que você vê por aí. Também pode acontecer com usuários de marijuana, ou pessoas com algum tipo de tumor no cérebro — assistam Grey's Anatomy.

Mas o negócio é que além de não ter tumor cerebral algum, eu também não tomo nenhum tipo de tarja preta além de Rivotril, nem fumo o famoso baseado — o que não significa que nunca fumei. Também não costumo comer bolinhos especiais feitos de maconha, embora meus amigos consumam sempre e ainda e me ofereçam um bocado.

Então após recorrer à todo tipo de ajuda possível atrás de uma explicação, resolvi ligar um grande e belo foda-se. Porque foi a partir daí, que passei a me medicar com remédios controlados pra ter uma boa noite de sono, mas não comecei a fumar umas coisinhas alucinógenas, porque, você sabe, dizem que afeta sua memória e outras coisinhas que eu que esqueci. E já não sou de lembrar lá muita coisa. Estava sofrendo de um mal causado aos usuários da droga, mesmo sem usá-la. De modo que pensei "Pro inferno com isso!" e foi basicamente assim. Na verdade essa é só uma desculpa que uso pra explicar os costumes destrutivos que tenho. Mas não iremos entrar nesse mérito agora. Já devaneei o bastante.

O que eu estava dizendo, era que, se você tivesse a minha experiência de vida, em meu lugar pensaria o mesmo. Que um bandido invadindo sua casa, se sentando ao seu lado na cama, pra fazer, talvez, eu sei lá, um cafuné nos seus cabelos, fosse uma opção melhor do que uma alma penada te assombrando.

E então eu realmente senti uma presença ali.

"É um bandido!" decidi.

Como se eu fosse capaz de decidir alguma coisa e torná-la realidade, né? Mas dizem que existe um tal poder da atração e que você atrai o que pensa, de modo que, veja bem, se eu pensasse ser um fantasma, talvez o sujeito realmente se transformasse em um, certo? E não é isso que nós queremos. Bem, pelo menos não é isso que eu quero, porque, sai pra lá.

Então, por alguns longos segundos, fingi que estava dormindo serenamente, de forma a enganar o bandido. Sendo um cara faixa preta em judô, preparei meu golpe, contei até três e dei um salto espetacular, digno de filmes do Jack Chan, pronto pra dar uma chave de perna no pescoço desse sujeito. Só que quando girei no ar, tudo o que encontrei foi o chão.

De olhos arregalados e com a adrenalina correndo em meu cérebro, sacudi os braços à minha volta, no escuro, procurando algum corpo diferente do meu. Estiquei as pernas e fui tateando o chão, mas era tudo um grande vazio. A não ser no momento em que meu dedinho encontrou a madeira da cama, e no mesmo segundo uma lágrima de dor escapuliu de meus olhos, ao passo em que um gemido morreu em minha garganta. Eu queria me deitar no chão em posição fetal e choramingar de dor — você sabe como uma topada no dedo mindinho pode ser dolorosa —, mas eu ainda estava com um medo tenebroso. Então me levantei mancando, que nem um Saci do folclore brasileiro, e fui com dificuldades até o interruptor do quarto acender a luz.

Pisquei os olhos inúmeras vezes, até conseguir readaptá-los a claridade, reconhecendo as três paredes brancas e uma preta em meu quarto — quando eu tinha 16 anos, era um rockeiro trevoso de cabelos vermelhos, não me julguem pelas paredes pretas; Agora, com 20 anos, além cabelos negros sedosos, combinados a um estilo bem descolado e um visual que chamam de boyfriend material, eu também havia aberto meu leque de opções musicais. Então além das músicas de rock oitentistas e noventistas, também escuto muita música pop, americana e coreana. Aliás, amém Linkin Park. Eu sou um cara eclético, bonito, cheiroso e normal. Juro.

Os móveis do quarto passaram a tomar forma e então enxerguei tudo certinho. E para minha surpresa — bem, não exatamente surpresa — não havia ninguém ali além de mim. O pânico já familiar me alcançou, de modo que sai correndo do quarto, sem nem mesmo calçar meus chinelos — quem liga pra um possível resfriado, quando se tem um fantasma perseguindo você?

Eu definitivamente não seria aquelas mocinhas burras de filmes de terror, que de tão teimosas e céticas, acabam morrendo. Eu não sou cético, não. Eu acredito em muita coisa, tá legal? De modo que desci as escadas correndo, peguei minhas chaves e disparei em direção à porta da frente, vestindo apenas uma calça moletom e nenhuma camisa.

E quando abri a porta, me deparei com uma criatura horrenda na varanda sombria: um monstro grotesco, todo molhado de chuva, com uma pele grossa e escura. Definitivamente era um demônio, um demônio grande. Um demônio que carregava um monte de coisas em suas garras, parecendo um caranguejo gigante. Eu só pude gritar. Gritar e berrar. Minhas pernas sequer se moveram, então continuei parado no portal, gritando feito um louco.

Só que então o monstro demoníaco começou a gritar pra mim de volta. Ele gritava, eu gritava, ele gritava, eu gritava. Até o demônio estranho me acertar com tapa na cabeça.

— Jungkook! Qual o seu problema, garoto? — a criatura disse com a voz fina.

Então aquela coisa me empurrou e foi entrando na minha sala de estar, jogando suas garras — que na verdade eram sacolas — no chão. A pele grotesca, na verdade era uma capa de chuva, e o monstro em questão era a minha própria mãe, pude ver quando ela acendeu a luz, para aí respirar aliviado.

— Mãe! — resmunguei, choroso, correndo em sua direção e a abraçando.

— Sai, sai, sai, eu tô molhada, garoto! — ela fala me empurrando e andando pela sala. — O que houve, hein? Por que você se assustou e gritou daquele jeito? Pensou que eu era o que?

— Um demônio do inferno! — disse, prontamente.

— Ora, seu... — Minha mãe sibila entredentes, levantando a destra para me dar um sopapo, mas se detendo no meio do caminho, quando me encolho e fecho os olhos em reflexo. — Me respeita! Sinceramente Jungkook, ainda não sei onde errei com você. Seu pai definitivamente precisa voltar para esta casa — ela diz exasperada, e pega metade das sacolas molhadas no chão, partindo em direção à cozinha. Eu pego a outra metade e sigo atrás dela.

— Mas mãe! Eu realmente achei que fosse algum monstro! Eu estava com medo! — digo, aumentando a voz em uma oitava.

— Jungkook... — ela rebate, bufando. — Você não acha que já está velho demais pra ficar cismando que existem fantasmas e coisas de outro mundo por aí, uh? Você não é mais criança. Aliás, você já está tão velho, que nem mesmo posso te botar de castigo.

— Eu não estou velho! — exclamo, indignado.

— Oh, querido — ela rebate, com um olhar falsamente amável. — Se você quiser, pode usar meus cremes de rosto que estão na pia do banheiro, sim?

— Eu não estou velho! — repito, fazendo bico e cruzando os braços, ao deixar as sacolas em cima da bancada.

Oh, o que é isto na sua cabeça? É um cabelo branco?¹ — ela pergunta séria.

— O quê? — grito e saio correndo com a mão na cabeça, indo até o espelho do corredor, procurando o tal cabelo branco.

Minha mãe me segue, se encosta na parede e ri como uma hiena parindo. Ela acha graça em fazer essas brincadeiras comigo, porque sempre caio. É impressionante como ela consegue ser malvada — e em como eu consigo ser bobo, diga-se de passagem.

Notando que tinha sido tapeado, bufo e volto para a cozinha, irritado. Ela vem atrás de mim novamente, ainda se sacudindo pela risada e secando o cantinho dos olhos, quando começa a tirar as compras da sacola e guardá-las nos armários.

— Afinal, pra onde você estava indo assim? — pergunta, se virando para me olhar, com o cenho franzido. — Tá a maior chuva lá fora e você ia sair descalço, sem camisa, usando só essa calça de moletom? — ela cruza os braços e me olha de cima à baixo, risonha. — Você por acaso estava indo atrás de alguma garota? Ia fazer uma cena de dorama, tocando a campainha dela, no meio da noite, todo molhado, e AÍ puxá-la pra fora da casa e aí beijá-la na chuva? Oh, minha nossa! — dramatiza levando uma das mãos ao peito. — Você é tão romântico, bebê!

— Aish, não é nada disso... — respondo, constrangido. Não que a cena em si fosse algo que eu não faria. Mas definitivamente, não seria com uma menina.

Me chateava que minha sexualidade fosse algo sobre o qual eu não pudesse contar à minha mãe, nem ao meu pai. No máximo quem sabe é meu irmão mais velho, SeokJin, que costuma ser um cara super de boa e sem preconceitos. Não que eu tivesse contado ou confirmado nada, mas sei que ele sabe. Contudo, nossa sociedade é extremamente preconceituosa, e embora nossa família seja composta por pessoas de personalidades peculiares — principalmente minha avó — ainda assim não seria nenhum piquenique revelar uma coisa dessas, você sabe.

De modo que preferi manter essa informação oculta. Não é como se eu tivesse extrema necessidade de contar algo agora, de qualquer modo. Não estou em um relacionamento com alguém, na verdade, a última vez que namorei foi quando conheci um sujeito na faculdade, assim que entrei no curso de cinema — O que era uma certa decepção para meus pais juízes, que eu não tivesse seguido o mesmo caminho que eles, numa profissão mais formal. Mas qual é, eu sou bom no que faço. Fotografo bem, edito bem, filmo e edito vídeos com maestria... Tenho talento na coisa. Talvez, no futuro, eu me torne um grande diretor de doramas na KBS. Ou um bom diretor de mv's de grupos de kpop, quem sabe.

Na verdade, eu nunca mais quis um relacionamento com alguém, depois desse último. Tinha sido um pouco traumatizante descobrir que o cara com quem me relacionei por um ano, namorava comigo e com uma garota ao mesmo tempo.

E veja só, depois que terminei com ele, o maldito teve a audácia de casar com a menina.

E depois de casar, ele queria que eu voltasse pra ele. Porque, de acordo com sua defesa, ele tinha sido obrigado a se casar, num contrato de fusão da empresa da família dele, com a empresa da família da garota.

Olha, não tenho paciência pra ser mocinho sofredor de dorama, não. Até porque, eu nem amava esse cara tanto assim. Não era aquele tipo de amor de tirar o ar ou coisa parecida. Na verdade eu nunca, nunquinha, jamais havia sentido algo forte como os relatado nos livros e filmes. Mas imaginava que se algum dia sentisse algo assim por alguém, ficaria piradinho. Porque, sabe como é, o amor pira a cabecinha de qualquer cara. Sobretudo, de um cara romântico como eu, que idealiza sua alma gêmea, desde criança.

— Jungkook... — minha mãe repetiu, estalando os dedos em frente a meu rosto. Sacudi a cabeça e a olhei, soltando um sonoro: "Han?" — Você tá fazendo de novo. Já conversamos sobre essa sua mania estranha. Você precisa parar de viajar na maionese e ficar encarando o nada, enquanto as pessoas falam com você. Larga de ser estranho, aish! — disse massageando as têmporas com os dedos, como se estivesse mentalmente cansada. — Será mesmo que eles não trocaram você na maternidade? — resmungou.

Engraçadinha ela, né?

— Mãe, eu estava realmente assustado... Eu acho que... Acho que tem um fantasma assombrando meu quarto — declaro seriamente.

— Ah, não, de novo não... — ela devolve impaciente. — Você às vezes parece mais filho da sua avó, do que eu. Por que você foi herdar a loucura dela, uh?

— Não fale da vovó assim — rebato, emburrado. — Mas é sério, mãe, não tô brincando. Eu 'tava sozinho em casa, dormindo numa boa, até que senti alguém sentando no meu colchão. Juro por Deus, tinha alguém sentando na minha cama, enquanto eu dormia! Foi muito real, pensei que algum bandido pudesse ter invadido a casa, entrado por alguma janela, ou descido pela chaminé da lareira, tipo no no filme "Esqueceram de mim", mas não tinha ninguém no quarto. Mãe, foi assustador!

— Foi por isso que você abriu a porta e gritou que nem um bebêzinho, quando me viu no escuro? — perguntou apertando os olhinhos, desconfiada.

— Sim — grunhi. — E não me chama de bebê... — resmunguei.

— Hunf... — ela suspira. — Filho, talvez você devesse voltar a se consultar com o Doutor Jang...

Doutor Jang é o psiquiatra que minha mãe me obrigou a visitar por anos, e que inclusive chegou a me diagnosticar como "esquizofrênico".

— Por que é tão difícil assim acreditar em mim? Eu reclamo dessas coisas que vejo e dessas sensações arrepiantes que tenho, desde criança!

— Ora, e é por isso mesmo que isso pode ser algo sério, Jungkook. Veja só a sua vó. Ela vivia vendo coisas, vultos, e por conta disso era bem religiosa, você sabe. Depois que meu avô morreu, mamãe enlouqueceu. Ela costumava sair de casa de madrugada, e voltar toda suja de terra, descabelada, cheia de hematomas e ainda falava sozinha, acendia incensos pela casa e dizia que era a missão dela ajudar os mortos. Você imagina como foi ser criada por uma pessoa assim e se manter sã? Sua avó era tão linda... Ela um dia foi a Miss Coréia. E veja só como ela está agora...

— Vovó Park não é louca, ela tem esquizofrenia, é totalmente diferente — digo.

Sandara Park é uma mulher incompreendida, principalmente pela família, que a taxa de louca por conta da série de coisas citadas por minha mãe.

— Sim, Jungkook, mas minha mãe era como você... Começou assim. E agora ela precisa de uma enfermeira 24h cuidando dela. Você sabe que essas doenças mentais são hereditárias. Eu nunca apresentei sinais de qualquer anormalidade, já você... Bebê, não quero que você tenha seus neurônios entrando em degeneração.

— Tudo bem — respondo, cansado. Não era como se eu pudesse convencê-la a acreditar em mim.

Como uma boa juíza, minha mãe apenas acredita em fatos, em coisas tangíveis, que possam ser comprovadas por meios de provas. Se em 20 anos ela nunca acreditou nas coisas que eu dizia, com certeza ela não passaria a acreditar em mim agora. A menos que mamãe visse algum fantasma com os próprios olhos, ela continuaria a a negar isso até a morte.

E por falar em Vovó Park, lembrei que faz cerca um mês que não a visito. Com todas as provas do semestre, eu tinha ficado imerso em estudos e trabalhos fotográficos, filmagens e pesquisas, de modo que não tive tempo sequer para respirar. Mas eu sabia que a saúde de Vovó Park estava em muito debilitada, e se não aproveitasse meu tempo com ela, talvez daqui a pouco fosse tarde demais. E eu amo minha avó, mais que qualquer pessoa nesse mundo. Mais até que minha própria mãe. Sim, porque Vovó Park é a única que não me acha louco. Desde criança, quando algo me assustava, era pro colo dela que eu corria. Talvez, pela fama de louca, Vovó Park fosse mais mente aberta.

De todas as vezes em que vi vultos e coisas estranhas no escuro do quarto ou no final do corredor, quando acordava de madrugada para ir ao banheiro, vovó era a única que me entendia. Ela fazia carinho em meus cabelos, e me deixava dormir ao seu lado, dizendo que um dia, quando ela não mais estivesse aqui, eu "entenderia tudo", fosse lá o que isso quisesse dizer. Dizia também, coisas como:"Irei te observar do outro lado". Não sei que lado era esse que ela vivia falando, mas não me soava como algo divertido.

Então resolvi que passaria o final de semana na casa dela. Sim, vou juntar meus paninhos de bunda em minha mochilinha e passar uns dias com minha vovózinha. Note que isso soa muito como a história da Chapéuzinho Vermelho, mas não se preocupe: se um lobo mau se aproximar, eu dou um soco bem no meio do fucinho dele. Aqui são 65kg de puro músculo distribuídos em um metro e oitenta, eu tô em forma, veja bem. Sou bem macho alfa, coisa e tal.

Não gosto muito de deixar minha mãe abandonada, já que ela se sente muito sozinha com meu irmão fazendo mestrado no Japão e nosso pai trabalhando em Seul. Isso e também por motivos de: Eu não gosto nada de ir à casa da vovó. Aquele lugar me dá arrepios. Juro por Deus que a casa dela faz meus pelos arrepiarem. Fora o visual assustador daquele lugar. É como aqueles mausoléus de filmes de terror e ela não faz questão nenhuma de realizar algumas reformas ou coisa parecida. Sandara Park não se incomoda, e não há ninguém que possa fazer sua cabeça. Nem mesmo eu. Vovó é durona. Ela pode estar um pouco — muito — debilitada, mas continua dura na queda.

Subi as escadas até meu quarto, coloquei algumas mudas de roupas na mochila, me troquei e penteei os cabelos. Por último, coloquei o celular, câmeras, notebooks e carregadores na bolsa. Eu aproveitaria para tirar muitas fotos de vovó e guardá-las de recordação. Sabia que nós não tínhamos muito tempo. Além de seus problemas de saúde, vovó já tinha passado dos oitenta anos de idade. Então, isso era algo um pouco óbvio.

Antes de descer as escadas, lembrei que deveria avisar minha mãe. Já estava um pouco tarde da noite, mas eu havia perdido o sono depois de tudo aquilo. Além do mais, visitar a casa aparentemente assombrada de vovó Park, era algo que requeria coragem. Mas meu amor pela velhinha era maior do que meu medo.

Caminhei até a porta do quarto da senhora Jeon-Kim Yoona, e por obra do maligno, esqueci de bater. Ouvi vozes, como se ela conversasse com alguém, o que já imaginei ser meu pai. Só que a cena que vi, queimou meus olhos e fez-me ter vontade de arrancá-los, para que jamais fosse capaz de ver algo assim novamente:

Minha mãe gritou, eu também gritei, e meu pai gritou pelo celular. Era a segunda vez no mesmo dia, em que nós trocávamos gritos. Os vizinhos certamente devem pensar que somos malucos. Porque quando abri a porta — e repito, foi obra do maligno eu esquecer de bater —, mamãe estava vestindo nada além de uma lingerie vermelha — que era supostamente sexy, mas no caso, era minha mãe vestindo aquele negócio, então era óbvio que eu acharia uma coisa nojenta — enquanto se filmava em frente ao enorme espelho de seu quarto, em uma vídeo-chamada quente com o marido. Eu havia atrapalhado um momento íntimo do casal e, acreditem, preferia morrer do que ver aquilo. Eu não gostava nem de imaginar aqueles dois fornicando, minha nossa, que coisa nojenta!

Depois de nossos berros, tudo o que pude fazer foi descer as escadas correndo em disparada, de olhos arregalados, tentando, sem sucesso, apagar a imagem tenebrosa em meu cérebro.

— Jungkook! — a voz de minha mãe soou no topo da escada, ofegante, com o corpo enrolado em um de seus robes vermelhos (Assim como a tal lingerie. Oh, minha nossa, aquilo só piorava mais e mais.) — Você é doido? Quantas vezes já disse pra bater antes de entrar, seu moleque?

— Como eu ia adivinhar, uh? — respondo, exasperado. — Vocês não deveriam estar fazendo essas indecências! Vocês... Vocês não tem mais nem idade pra isso, mocinha!

— Whoa! Como assim não temos mais idade pra isso, Jeon Jungkook? — ela rebate irritada, cruzando os braços na frente do peito. — Você tá pensando que te fiz com o dedo? Você saiu desse forninho aqui! — disse, apontando pra própria barriga. — E seu pai foi quem colocou o pãozinho nesse forno!

Oh, minha nossa, que coisa horripilante. Alguém, em nome de jesus, arranque meus olhos e tire minha audição, estou implorando!

— Jeon Yoona! Pare de dizer essas coisas, minha nossa, você não tem escrúpulos, mulher louca! — grito.

— Jungkook... — ela começa a repreender outra vez, mas antes que eu escute algo mais absurdo ainda, tampo os ouvidos com as duas mãos e começo a cantarolar, como uma criança.

— Larararará... Não estou ouvindo.... Lararará... — Minha mãe revira os olhos e suspira, massageando as têmporas como na ocasião mais cedo. Ela desce as escadas e puxa minhas mãos para baixo à força.

— Não vou dizer mais nada. Só me diz pra onde você está indo, garoto.

— Era isso que eu estava tentando dizer quando fui no quarto — resmungo, fazendo careta. — Não vou conseguir dormir agora, então vou para a casa da vovó.

— Mas você odeia ir na casa dela. O que você está aprontando? Vai dormir na casa de alguma namoradinha e está usando sua vovó como álibi? Não precisa mentir para sua mãe, você tem 20 anos e pode fazer o que bem entende...

— Mãe, já disse que não tem namorada alguma, tá legal? — falo com a voz esganiçada. — Eu só me lembrei que não a vejo há semanas, estou com saudades da vovó. Você sabe como ela anda debilitada, e ela é muito velhinha. Nós temos pouco tempo restante — finalizo em voz baixa. Yoona parece pensar por um segundo, abaixando a cabeça e mordendo os lábios, entendendo.

— Hmn... Realmente. Cuide dela hoje e dispense a enfermeira Kwan, tudo bem? A mulher deve estar cansada, sua avó é teimosa feito uma mula, e dá muito trabalho. Deixe a coitada descansar. Amanhã irei até lá com seu pai e nós todos almoçaremos juntos em família, tudo bem? — pergunta sorrindo docemente, enquanto acaricia minha bochecha esquerda.

— Oh. Papai estará aqui? — pergunto, surpreso. — Então por quê diabos vocês dois estavam naquela safadeza por vídeo-chamada, se vocês vão se ver amanhã, hein?

— Aigoo, garoto, isso não é da sua conta! — ela retruca me dando um tapa estalado no braço, o qual respondo com uma careta fingida de dor. — Ele vai pegar o avião amanhã cedo e tem uma enorme novidade pra contar. Nós iremos anunciar amanhã, no almoço. O seu irmão já foi avisado, já que ele não vai estar aqui.

— Vocês não estão esperando um bebê, certo? — questiono, apertando os olhinhos para ela.

— Eu não posso mais ter filhos, não seja idiota. Apenas vá, vá — fala me enxotando e fecha a porta bem na minha cara.

Tudo bem, acabo de ser expulso de meu próprio lar. Mulherzinha malvada.


[...]

— Oh! Jungkook! — a enfermeira Kwan exclama surpresa quando abre a porta da casa de vovó. — Você por aqui? — cumprimenta sorridente.

Oh, é que vim lhe trazer este humilde presente¹ — respondo rindo.

Ela fica me encarando confusa, varre os olhos por mim e se detém em minhas mãos vazias, em busca do suposto presente.

— Que presente? — pergunta, franzindo o cenho.

— Nenhum, era uma piada — respondo, rindo mais. Ela só continua me encarando, confusa e provavelmente me julgando internamente. A enfermeira então se move, chegando o corpo para o lado e me dá espaço para entrar. Enquanto tiro meus sapatos e os deixo na estante da entrada, continuo a conversa: — Na verdade eu tenho um presente sim. Vou passar o final de semana aqui com a vovó, então Yoona disse pra que eu te desse uma folga. Pode ir pra casa, se quiser — falo sorrindo.

— Oh, caramba! De verdade? — ela pergunta de olhos arregalados.

— Sim, você tem uma alforria temporária por dois dias — respondo risonho e vou andando em direção à sala, onde minha avó assiste a um programa policial na tevê, esparramada no sofá, o andador de ferro parado próximo à ela.

Me sento no encosto do estofado e a abraço de lado, contente em sentir seu cheirinho de shampoo Jhonson & Jhonson's, já que a enfermeira Kwan cuida dela tão bem quanto se cuida de um bebê.

— Vózinha! Seu netinho favorito veio passar um final de semana com você! Isso não é mágico? — pergunto animado, enquanto ela me observa com os olhinhos apertados, desconfiada. Aquele olhar minha mãe aprendeu com ela.

— Você não fala comigo há um mês, Jeon Jungkook. Um mês, seu ingrato cara de pau! — resmungou.

— Vovó, não seja assim, uh? Eu estava muito atarefado com todas as provas e trabalhos da faculdade, e tô fazendo um trabalho de filmagem pro fim de semestre, que tem que ser tipo um documentário de tevê, e aí... — Só que ela me interrompe, fazendo um sonoro "Pfff..." com a língua entre os lábios, antes de grunhir:

— Balela!

— Sandara Park! — exclamo, fingindo falsa indignação.

— Me desculpe, não falo com traidores — ela responde revirando os olhos e voltando sua atenção para a tevê, enquanto a enfermeira Kwan tenta segurar um risinho, sem sucesso, encostada na parede da sala.

— Jungkook, tem certeza de que você pode lidar com sua avó por um final de semana inteiro? — Kwan pergunta.

— Ué e por que não conseguiria? Olhe só esse biscoitinho de vovó! Coisa mais linda do Kookinho — brinco apertando suas bochechas. — Veja bem que gracinha, essas bochechinhas murchas — zombo. Mas logo meu sorriso é cortado, pela dor de um beliscão bem lá naquele localzinho sagrado que eu usava para fazer amor.

É, minha avó tinha beliscado o meu saco.

— Sandara Park! — grito mais uma vez, me afastando de suas mãos que mais pareciam pinças de siri. — Você é realmente como sua filha — resmungo.

— Foi isso que eu quis dizer — a enfermeira diz, gargalhando. — Além do mais, você sabe que precisa limpar a bunda dela, né?

— O quê? — pergunto, chocado. — Ela não parece estar tão debilitada assim, a ponto de não conseguir se limpar sozinha, está vózinha? — pergunto temeroso, intercalando meu olhar entre ela e Kwan.

— Tenho certeza de que não está, mas você sabe como sua avó consegue ser sacana às vezes... — a enfermeira responde suspirando. Observo vovó pelo canto dos olhos e ela continua fingindo encarar a tevê, embora um sorrisinho cínico dance no canto de seus lábios enrugados.

— Aish! Não tem problema Kwan noona, vá em paz. Deixe que eu ponho a senhora Park na linha.

— Você sabe que vai sair daqui pedindo arrego. Mas tudo bem, o funeral é seu — a enfermeira responde risonha, indo em direção a seu quarto, no segundo andar da casa. — Vou arrumar minha mochila e já saio. Ela já jantou... Não permita que ela lhe convença a deixá-la comer biscoitos. Ela já teve sua cota de hoje. — Ela vai dizendo enquanto caminha, e minha vó responde com outro "Pfff" com a língua.

Dou a volta e me jogo ao seu lado no estofado, agarrando o controle de suas mãos gordinhas para aumentar o volume da tevê.

— O que estamos assistindo? — pergunto à ela.

— CSI.

— Oh. Não sabia que a senhora gostava de seriados policiais americanos.

— Você não sabe muita coisa, já que nunca vem me visitar, moleque — ela responde ácida.

— Ora, eu sei que você costumava ser muito patriota. Já foi até representante da beleza coreana e tudo — devolvo risonho, sabendo que ela se irritaria e me daria um cascudo, o que ela imediatamente fez.

— Saia da minha casa — ela diz.

— Não quero. Você não me manda — respondo a abraçando, enquanto aperto suas dobrinhas. Ela se contorce, rindo como uma criança.

— Jungkook! — enfermeira Kwan fala, parada com sua mochila nas costas, e já tendo trocado suas roupas brancas, parada atrás do encosto do sofá em que estávamos sentados. — Não faça cócegas na sua avó, os ossos dela são frágeis. Qualquer movimento brusco e ela pode quebrar um osso. — Minha vó levanta o dedo do meio para Kwan, sem nem mesmo se virar para observar a cara horrorizada da enfermeira, enquanto eu caio na gargalhada, segurando a barriga. — Aish! — a mulher se vira irritada, mas não de verdade, e sai pela porta da sala.

— Vó... — chamo cuidadoso. — Aconteceu um negócio daqueles hoje, que eu queria te contar...

Percebo o corpo de Sandara retesar, e ela lentamente virar o pescoço pra mim.

— Desembucha.

— É que... sabe essas coisas de ver vultos e tudo o mais? — começo incerto. Ela apenas assente com um movimento de cabeça, me esperando continuar. — Hoje resolvi dormir mais cedo, porque não tinha dormido bem noite passada, estudando pra última prova da semana de avaliações... E aí, eu juro por Deus, que senti alguém se sentar na minha cama. Foi muito assustador! Eu estava deitado de lado, então senti com muita clareza, um peso como de uma pessoa se sentando atrás de mim no colchão.

— Que mais? — ela pergunta, com uma expressão indecifrável.

— Pensei que fosse um ladrão, já que eu estava sozinho em casa. Então reuni toda a minha coragem, que não é muita você sabe... — falo fazendo graça, mas minha avó não sorri. Ela continua me olhando estranho. — Humn... Err... Bem, então eu girei na cama e tentei dar uma chave de perna no sujeito, mas só encontrei o chão. Não tinha ninguém no quarto comigo e estava chovendo lá fora. Ainda por cima bati meu dedinho na perna da cama — dramatizo pra dar mais veracidade ao relato. — E daí eu sai correndo escada abaixo, bem rapidinho, de tanto medo. Só que aí minha mãe chegou, contei tudo pra ela, mas como sempre, ela sugeriu que eu fosse visitar aquele psiquiatra outra vez — termino revirando os olhos.

Um minuto inteiro de silêncio se passa, sem que nenhum de nós dois diga nada. Vovó apenas me encara de um jeito tão estranho, que realmente não consigo realmente ler sua expressão. Apenas os barulhos de tiros do programa policial enchiam o ambiente. De repente, ela puxa o andador de ferro, estacionado um pouco mais à frente, e se levanta com dificuldade. Eu imediatamente a ajudo.

— Aonde você vai? — pergunto.

— Ao banheiro.

— Oh... Você realmente precisa de ajuda pra... Você sabe...? — indago tenso. Mas ela apenas me ignora.

— Fique de olho na televisão, quero saber tudo o que acontecer. Acho que o assassino é o tal de "Temol".

— Quem? — indago, franzindo o cenho.

— Temol! Está surdo, menino? Depois a velha sou eu — ela resmunga andando lentamente. Olho para a tevê e vejo um cara loiro chamando um cara ruivo de "Damon."

Oh... então foi isso que ela tentou dizer.

Minha avó é fofa. Todo mundo diz que ela é doida, mas só consigo enxergar um ser humaninho engraçado demais, com bochechas de pele macia, boas de apertar.

Me esparramo no sofá e uns bons minutos se passam, até que o episódio acaba. Estava tão entretido assistindo o seriado, que não percebi o quanto minha avó demorava no banheiro. Será que ela precisa de ajuda? Será que escorregou? Será que... Precisa de ajuda pra limpar a bunda? Argh! Me levanto do sofá, fazendo careta, e abaixo um pouco o volume da tevê.

Então escuto sussurros vindos da cozinha, no final do corredor. Eram duas vozes. Será que a doida tinha ligado a tevê da cozinha e me abandonado na sala sozinho? Ahhh, eu ia ficar muito bravo se fosse isso.

Comecei a caminhar cuidadosamente pelo corredor, para pegá-la com a boca na botija. Mas pude identificar que não se tratavam de vozes vindas da tevê, mas sim da voz de minha avó, conversando com um outro alguém desconhecido.

A segunda voz era grave. Não parecia ser uma voz realmente grossa, mas sim que a pessoa em questão estava falando de forma séria e tensa. Era uma voz masculina. Quem estaria aqui dentro? Um bandido teria rendido minha vó? Oh, minha nossa! Eu já estava traumatizado com essa coisa.

Quando fui chegando mais perto da cozinha, pude começar a distinguir o que as vozes diziam:

— Ele está começando a sentir tudo mais fisicamente... Ele sentiu a presença e o peso do corpo ao lado dele... — Minha avó sussurrava.

— Dara, você precisa dizer logo a ele... Não temos mais muito tempo... — a voz do homem dizia.

— Mas ele não vai acreditar nisso, Jimin. Claro que ele não vai zombar de mim, como a cética da Yoona, mas... o garoto se borra de medo toda vez que vê um vulto. Imagine só se ele visse tudo claramente.

— Dara, nós já conversamos muitas vezes sobre isso. Se o garoto, além dos vultos, está começando a sentir as presenças... Isso quer dizer que o dom dele está aflorando. E se o dom está aflorando...

— Sim, eu sei. Quer dizer que eu estou cada vez mais perto de partir... — ela sussurra.

De que diabos eles estavam falando?

Caminho mais rápido e me ponho pra dentro da cozinha, ansioso pra ver a cara do sujeito com quem vovó conversava. Mas para minha surpresa, não havia absolutamente ninguém na cozinha com ela.

Mas que porra..?

— Vó? — digo olhando para todos os lados, girando os olhos como uma barata tonta. — Cadê o homem que estava aqui?

— Homem? Que homem? — ela devolve, sorrindo falsamente. — Não tenho mais idade pra ficar escondendo amantes embaixo da cama... Nem no armário da dispensa.

Eu caio na armadilha e abro a porta da dispensa, mas só encontro enlatados, biscoitos e rámens. Bem, não era como se fosse caber algum cara ali. A não ser que fosse um sujeito muito pequeno. Me viro bruscamente, como a menina do exorcista, e aperto os olhos para minha avó, que gargalhava olhando pra algum ponto ao seu lado, como se risse pra alguém.

— Quem é Jimin, Sandara Park? E por que ele te chamou pelo seu apelido, uh? — pergunto, cruzando os braços na frente do peito.

Vejo a expressão de minha avó murchar e ela arregalar os olhos, tentando disfarçadamente — o mais disfarçadamente que ela poderia conseguir, estando bem na minha frente — tentar olhar para o lado, sem que eu notasse. Mas como eu disse, ela estava bem na minha frente, então nem tinha como.

— Por que você olha tanto pro nada, hein? Quem diabos é Jimin? E por que vocês dois estavam falando de mim? Aliás, o que exatamente vocês estavam falando? Eu não entendi o contexto — a bombardeio de perguntas, e ela arregala ainda mais os olhos.

— Você está confuso, Jungook-ah.

— Uma ova! — devolvo irritadinho.

— Yah! Me respeite, seu moleque! Quer tomar outro cascudo?

— Quero que você pare de me tratar como um imbecil ou como uma criança. Tinha um sujeito aqui nessa cozinha conversando com a senhora. Ele te chamou de Dara e você o chamou de Jimin, vocês estavam comentando sobre algo que deveriam me contar, que tinha a ver com as presenças que venho sentindo... Vovó, você precisa me explicar o que está havendo! Eu não aguento mais esse monte de mistério e coisas sem sentido que você fala! — termino, exasperado. Ela apenas me observa e então olha pesadamente, para o grande nada ao lado dela, o que me faz sentir muito cagaço. Quero dizer, era como se ela estivesse enxergando alguém ali, e isso era assustador pra porra.

— Você ouviu a voz dele? — ela pergunta em tom de voz fraco.

— Em alto e bom som — respondo tentando parecer corajoso, mas minhas calças estavam toda borradas, você sabe.

Ela então olha para o lado, novamente e suspira.

— Busque minha câmera Polaroid, dentro do armário em meu quarto, lá em cima.

— Vó..?

— Faça o que eu digo, garoto. Eu agora durmo aqui no andar de baixo, mas a câmera está no meu armário do meu antigo quarto. Suba e vá buscar, depressa.

— Mas eu trouxe as minhas, e...

— Vá buscar a bendita Polaroid, garoto!

— Aish, já vou... — resmungo.

— E você não se atreva a sair daqui! — ela diz.

— Uh? É pra ficar ou pra subir? — pergunto, mais perdido que cego em tiroteio.

— Não estou falando com você — ela responde.

Okay, então tudo dava a entender que havia uma terceira pessoa no recinto. Muito provavelmente um fantasma. Minha nossa, eu tô' todo borrado. Enquanto subo as escadas, percebo que há muito o andar de cima estava desabitado. Com a saúde frágil e locomoção debilitada, vovó havia se transferido para os aposentos do primeiro andar. Algumas coisas estavam empoeiradas, mas não tanto. Acendi todas as luzes possíveis, cantando: "Derrama senhor, derrama senhor, derrama sobre nós o seu amor..." Porque né, vai que assim o satanás vai de retro? A gente precisa tentar.

Nunca na vida eu havia mexido no armário da minha avó. Primeiro, porque eu tinha o maior medo de ir naquela casa. Segundo, porque não era como se me arriscasse a ficar sozinho por ali, para fuxicar qualquer coisa. Preferia ficar sempre rodeado de pessoas, pensando que assim seria mais difícil de um espírito me levar, você sabe.

Então fiquei um pouco chocado com as coisas que tinham ali no armário. Spray de pimenta, corda, um canivete, caixa de palitos de fósforos, um vidro de álcool comum, outro menor de álcool 70°, luvas pretas, toucas pretas e um monte de outras bugigangas que pareciam aparatos de um agente secreto. Oh, será que era isso? Vovó era uma agente do serviço secreto, com traumas da profissão? Não, talvez eu esteja jogando muito vídeo-game.

Encontrei finalmente a Polaraid prateada e pesada. Eu adorava aquela câmera, era um clássico antigo. Hoje em dia, uma daquelas custava uma fortuna, e eu ainda não tinha conseguido um emprego decente para comprar uma igual. Todas as câmeras que eu tinha, meus pais haviam me presenteado, uma vez que eram um material necessário para os meus estudos. Mas em compensação, eu não ganhava nem uma cueca além disso. Porque, como minha própria mãe dizia, "Eu sou rica, você não. Vá trabalhar!". Mas não é como se ela fosse mesquinha ou algo do gênero. Na verdade, ela nem é tão rica assim, meus pais só tem uma condição financeira bem confortável. Jeon-Kim Yoona apenas queria me ensinar o valor do dinheiro e o quanto ela e papai tiveram que estudar para chegar ao cargo em que estão hoje.

Antes de me retirar do quarto, verifiquei se o compartimento de bateria e de filme estavam cheios e confirmei que sim. Desci com a câmera nas mãos, e quando entrei na cozinha, vi que a senhora Park conversava com alguém, novamente. Mas não fui capaz de ouvir a outra voz dessa vez.

— Aqui está — digo lhe estendendo a câmera prateada, totalmente cabreiro.

— Tire um foto minha e de um pouco do espaço vazio a meu lado esquerdo — ela ordena, decidida.

— Vovó... Devo me preocupar com o que vai sair nesta foto? — Não era novidade pra mim, que câmeras Polaroids eram pioneiras em fazer coisas e formas estranhas aparecerem na imagem revelada instantaneamente. O que me deixava cada vez mais vacilante.

— Não exatamente... — ela responde. — Bom, digamos que essa coisa em específico não é nada assustadora. Na verdade, esse rostinho é o mais bonito que já vi. Tirando o seu, é claro.

A encaro, ainda mais confuso. Ela estava dizendo que esse tal fantasma — se é que era um fantasma mesmo — era bonito? Olha, essa velha deve ser realmente doida, está na hora de concordar.

Ainda assim, posicionei a câmera em frente ao meu rosto, fechando o olho esquerdo, e espiando pelo visor ocular. Ainda não via ninguém ali além de minha avó, mas apertei o botão mesmo assim. De imediato o filme começou a ser vomitado pela fresta do compartimento, onde puxei a Polaroid e a repousei em cima da mesa. Comecei a ficar ainda mais tenso, passando mais tempo do que o necessário para espiar a foto, o que não passou despercebido pelo olhar afiado de minha avó.

— Largue de ser medroso, Jungkook! — disse, demonstrando-se um pouco irritada. — Não é como se você já não desconfiasse das coisas que vê. Eu evitei abrir o jogo com você todo esse tempo, por ser algo desnecessário até então. Você só deveria receber seu dom depois que eu morresse. Você não deveria estar sentindo as presenças dos espíritos tão nitidamente ou escutando suas vozes, se ainda estou viva. Isso está acontecendo porque estou morrendo. E Jimin está certo em dizer que nós não temos tempo a perder. Você precisa estar preparado para quando eu partir, porque você estará sozinho — declara sombriamente.

— Vó... — chamei com os olhos marejados. Eu não sabia exatamente o que ela queria dizer com aquilo, porque como sempre, ela dizia as coisas pela metade e em metáforas, mas eu sabia perfeitamente que não era coisa boa.

— Jungkook, querido, vire a Polaroid — ela ordena docemente, parando a meu lado. — Vamos, não tenha medo. A vovó está aqui com você, sim?

Minhas mãos tremiam. Aos poucos, numa lentidão quase torturante, fui virando a foto instantânea, encontrando a imagem da cozinha ali. Ao lado de minha vó, havia uma mancha branca. Aquelas típicas das famosas fotos assombradas. Eu arfei, tenso.

— Agora olhe bem, querido... — ela fala suavemente, num sussurro.

E quando forço a vista na mancha branca, percebo ser possível definir os contornos de um rosto, muito levemente, na extremidade da imagem branca enevoada. Dois olhos, um nariz e um sorriso. Uma porra de um sorriso. Fantasmas sorriem? Ou aquele ali apenas estava rindo da minha cara?

— O que isso quer dizer? — pergunto, num fio de voz.

— Isso quer dizer que fantasmas existem, Jungkook-ah. Todos nós temos uma alma, e quando morremos, vamos direto para o além. Eu não sei exatamente o que tem dO Outro Lado, se há um julgamento final, ou uma terra dos espíritos bons e outra das sombras. O que sei é que alguns espíritos permanecem neste plano, errantes, quando na verdade deveriam estar seguindo adiante.

Eu olho para ela, assustado, tremendo por inteiro. Ela percebe e passa a afagar minhas costas, enquanto continua a falar.

— Alguns de nós nascem com um dom. Nós podemos nos comunicar com esses espíritos, vê-los, tocá-los, exatamente como se eles fossem um corpo humano vivo ao nosso lado. E por conta disso, nós somos os únicos capazes de ajudá-los a resolver as pendências deles neste plano, entende?

— Então nós somos tipo justiceiros? Se um sujeito é, eu sei lá, assassinado, então eu tenho que encontrar o assassino e... — passo o dedo no pescoço, como se simulando uma faca cortando a jugular. Vovó Sandara arregala os olhos e dá uma risadinha nervosa.

— É claro que não, meu anjo, nós não somos vingadores, somos apenas Mediadores, entende? Nós mediamos os fantasmas, entre este plano e o outro. Se uma pessoa morre e não deixa nenhum tipo de assunto inacabado por aqui, ela parte para o seu destino final, para o outro plano. Mas se ela tiver assuntos que a atormentem, ela vai ficar por aqui. É aí que um Mediador entra. Às vezes o assunto inacabado é algum tipo de herança deixada pelo falecido, que está sendo entregue à pessoa errada. Ou então, um animal de estimação do falecido, é abandonado na rua pelos familiares vivos. Muitas vezes são fantasmas revoltados com sua morte, que não aceitam partir. Com estes nós precisamos ter cuidado, eles podem ser perigosos e raivosos. Podem mover coisas e machucar pessoas...

— Então é por isso que você tem aquele monte de coisas estranhas no seu armário? Tipo álcool, corda, fósforos, canivetes...? É para proteção?

— Oh, você viu isso? — ela solta uma risada. — Sim, às vezes são para proteção. Outras para facilitar sua entrada nos lugares. Você a viu chave inglesa? — eu balanço a cabeça em negativa. — Bem, mas ela está lá. Digamos que muitas vezes você terá que invadir propriedades privadas. — Eu franzo o cenho para ela. — Mas não se preocupe, meu bem, é tudo por uma boa causa, sim? Você descobrirá sozinho com o tempo.

Mais confuso, impossível. Eu tô todo cagado.

— Então quer dizer que vou ver essas coisas brancas e vultos com mais frequência?

— Na verdade, você não vai mais ver vultos... Você... Bem, digamos que você os verá exatamente como humanos de carne e osso, eu te disse. Você verá as coisas de maneira clara. Você só ainda não vê, porque seus dons ainda não despertaram por completo — ela explica.

— E por que não? Quando isso vai acontecer? Já está acontecendo, não é? Eu não deveria ter escutado a voz desse tal Jimin... Quero dizer, eu escutei naquela hora, mas depois que trouxe a câmera, enquanto vocês conversavam de novo, não consegui mais ouvir a voz dele, mas pelo modo como você falava, parecia que ele estava respondendo...

— Isso é porque esse dom é de família, mas ele pula uma geração. Eu sou uma Mediadora, sua mãe não. Você é um Mediador, e seu filho não será, mas seu neto, sim. Você tem as faíscas desse dom aparecendo, mas ele só desperta realmente, quando o possuidor do poder falece, deixando de ser um Mediador vivo, para se tornar um fantasma.

— Você quer dizer que...

— Sim, Jungkook, querido. Quero dizer que eu, sua vovó, estou morrendo. E quanto mais perto chego do fim, mais os seus poderes se revelam. E quando eu partir, você poderá ver todos os fantasmas com clareza. Você será o novo Mediador.

Okay. Tudo acaba de ficar estranho pra caralho.

Preciso dizer que eu tô todo cagado?


28 de Mayo de 2021 a las 22:12 20 Reporte Insertar Seguir historia
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Continuará… Nuevo capítulo Todas las semanas.

Conoce al autor

HOWYOUDARE . @HowUdare do wattpad, e ex HOWYOUDARE do spirit; Apaixonada por Ji+kook, erostimo, bdsm e yaoi <3 99% flex!squad (mas aquele 1% é jk!bottom). Me indiquem boas jikook pra ler, não sei mexer aqui ainda :p

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n nayara
Tinha salvado essa fic pra ler na outra plataforma porém foi excluída antes mesmo de eu começar:( Ainda bem que achei aqui :3 tô adorando, simplesmente perfeita ♡
October 21, 2021, 09:20
e elisama
Vai continuar postando?
September 30, 2021, 03:51
Alex Evans Alex Evans
LEITORES UNIDOS, JAMAIS SERÃO VENCIDOOOOOSSS
September 22, 2021, 02:59
Nath Oliveira Nath Oliveira
essa fic e meu xuxu :(
September 17, 2021, 22:58
Nath Oliveira Nath Oliveira
EU AMO ESSA FANFIC MDS NÃO ACREDITO QUE ACHEI AQUI 😭😭😭😭 Posta o resto por favor, não vou poder comprar o livro /desmaia
September 17, 2021, 22:57
Nah Carvalho Nah Carvalho
Você também vai postar A Besta: 666? Eu mal terminei de ler e quando vi foi excluída, queria mesmo que você reporta-se mas se não quiser eu não posso fazer nada né.
June 24, 2021, 18:37
n nayara
Tô adorando🥰
June 24, 2021, 01:22
Akeimi 🌵 Akeimi 🌵
MDSSS EU VOU PODER RELER ASSOMBRADO AINDA BEM WUR TÁ AQUI SURTOS }¢{€{€]€]`}~]¢]€
June 23, 2021, 23:30
Xurumela Larissa Xurumela Larissa
Achei uma história bem escrita finalmente
June 23, 2021, 14:19

  • thny sg thny sg
    essa estória é impecável em todos os requisitos June 24, 2021, 22:31
b biiiia
Voou ler por aki, que bom q n desistiu das fics amg ❤❤❤
June 22, 2021, 14:33
Dayane Yhasmim Dayane Yhasmim
Cheguei 🤧 essa história é tão boa, mas tão boa, que eu já comprei os livros e só estou esperando eles chegarem. Pois faltou eu ler endiabrado. Aquela plataforma 'tá tirando as melhores histórias🤧 sacoo, viu. Acho que vou desmaiar quando pegar eles na mão, a ansiedade 'tá tamanha, que acho que vou ter um ataque de emoção, choro e felicidade🤣🤣😍😍😍
June 20, 2021, 08:37
saturno; saturno;
Ela não voltará pro wattpad, autora? Posso ler aqui sem problemas, é só uma dúvida mesmo
June 09, 2021, 00:12
nani ca nani ca
COMO Q VAI P PROCIM CAPKKKKKKKKKK, TO NO PC
May 30, 2021, 23:53

  • nani ca nani ca
    ATA NAO TEM May 30, 2021, 23:55
  • sanni sanni
    KKKKK burr June 20, 2021, 18:35
  • L B LALA BEL
    Essa fui eu nesse exato momento skskksk June 27, 2021, 15:07
nani ca nani ca
jjesus adorei
May 30, 2021, 23:51
a_yumi Marielli a_yumi Marielli
Gente, eu nem sabia que tinha esse app
May 30, 2021, 01:28
𝗺𝗶𝗻𝗶𝗲♡ 𝗺𝗶𝗻𝗶𝗲♡
ESSA FOI A MELHOR NOTIFICAÇÃO QUE EU RECEBI NA MINHA VIDA
May 28, 2021, 22:31
~

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