Era manhã de segunda-feira e Analu não estava nenhum pouco animada para iniciar mais uma semana. Tudo tinha acontecido muito rápido, ela perdera o emprego e o namorado, ambos em uma tacada só. Murphy deveria estar rindo horrores de onde quer que estivesse, apenas por constatar que suas leis de fato estavam corretíssimas.
Era o que Analu pensava, ao levantar-se da cama para entregar currículo. Isso mesmo, uma segunda batendo perna de agência em agência, para deixar uma coisa que quase ninguém lia. "Currículo, para que isso? Eles nem olham mesmo, sei que vai tudo para o lixo!", resmungou e terminou de se arrumar. A manhã prometia ser uma bela bosta, com cinco reais no bolso e o bilhete único. Analu não nutria muitas esperanças de ser surpreendida naquele dia.
Resignada, ela saiu de casa, encarando o Sol que já se posicionava alto no céu, disposto a aquecer as pessoas que apreciavam esse tipo de clima. Não era o caso de Analu. Ela preferia mil vezes um dia nublado ou até chuvoso, o clima assim combinava mais com sua personalidade e hoje um céu nublado cairia como uma luva.
Mas claro, o Sol não deixaria de brilhar, apenas porque Analu queria mais nuvens no céu.
Ela afastou o pensamento e conformou-se em andar debaixo do Sol, ciente de que, muito provavelmente, voltaria feito um pimentão maduro para casa, mesmo abusando do protetor solar.
"Droga, eu tinha que ter essa cor desbotada, nem posso dar alguns passos embaixo do Sol que já pareço um tomate seco.", disse baixinho consigo mesma. Porém, ao longe, ressoou uma voz rouca e um tanto grave:
— Algodão doce, venham e tragam suas crianças!
"Ah, deve ser alguma loja inaugurando, para variar, oferecer algodão doce grátis, que previsível.", pensou.
Analu continuou caminhando, ignorando o incômodo no tornozelo, por estar usando um sapato dois números menores. Pois havia pego emprestado com uma amiga — já que não dispunha de dinheiro para comprar um novo — e logo aproximou-se da tal loja de onde vinha o anúncio do algodão doce. Enquanto isso, muitas crianças se acotovelavam e se amontoavam em torno do carrinho, loucas para receberem o doce de graça.
Analu tentou desviar um pouco, evitando a bagunça; no entanto, a rua estava movimentada demais e ela corria sério risco de ser atropelada, caso saísse da calçada.
Respirou fundo e fez novamente esforço para vencer a montoeira de crianças que aguardavam, até que ouviu:
— Moça bonita não paga, mas também não leva.
Instintivamente olhou em direção a quem dissera aquilo, notando ser o mesmo que anunciava o algodão doce de grátis.
Ela corou ao notar que ele a olhava sorrindo, e desviou os olhos, visando continuar seu caminho. O que as crianças faziam questão de tornar praticamente impossível. Devido a não se moverem um milímetro se quer, mesmo que Analu tentasse a todo custo transpassar aquela barreira, abrindo espaço com delicadeza.
— Ei, moça. Não quer um algodão doce para adoçar sua vida? — o estranho insistiu, vendo o sofrimento dela em conseguir seguir seu caminho.
— Não, obrigada. — Analu respondeu, mantendo o nível de educação, mesmo não estando nenhum pouco disposta a isso.
— Então dê a volta por aqui, será mais fácil passar — ponderou prestativo. — Acho que por aí vai ser meio complicado, crianças adoram algodão doce. — e coçou a nuca sorrindo.
Analu o fitou novamente; inclusive, dessa vez, analisou seus traços de um jeito mais profundo, tanto que retribuiu o sorriso.
Ele era muito bonito.
Bonito do tipo que te fazia virar o pescoço para olhar, mesmo com pessoas ao redor. Bonito ao ponto de te arrancar um sorriso espontâneo, mesmo sem intenção, apenas para vê-lo sorrindo de volta. Bonito ao ponto de fazer suas pernas tremerem e você esquecer-se de que precisava entregar currículo por toda uma manhã.
Analu hesitou, tentando reordenar os pensamentos. Enquanto as crianças continuavam o fuzuê entre elas, já o desconhecido largou o posto e deu a volta, estendendo a mão para Analu. Que prontamente aceitou e seguiu com ele, por trás da barraquinha de algodão doce.
— Obrigada. — ela disse, agradecida por ele ajudá-la a se safar do amontoado de crianças.
— Que isso, sempre que precisar desobstruir alguma passagem, pode me chamar. — e piscou para Analu.
Que sentiu as bochechas ainda mais quentes, devido ao olhar fixo do estranho.
— Vou me lembrar disso. — finalmente respondeu, desviando o olhar.
— Posso saber seu nome? — ele indagou, ignorando às várias crianças que aguardavam o algodão doce.
— Ana Luíza e o seu?
— Daniel — ele respondeu, sorrindo.
Analu quase desmaiou ali mesmo, Daniel carregava um charme próprio, ele tinha cara de bom moço, daqueles que te prometia às estrelas e, de alguma forma, conseguia cumprir a promessa. Contrariando todas as possibilidades.
— Prazer, Daniel. Agora eu preciso ir. — Analu quebrou a atmosfera que se formava, mesmo querendo ficar ali, ao lado daquele desconhecido tão bonito.
— Dani, olha esse tanto de criança esperando o algodão doce! — uma mulher, que parecia ser a gerente da loja, o repreendeu e olhou Analu dos pés a cabeça.
— Foi mal dona Raquel. Só quis ajudar a moça a passar pelas crianças. — Daniel desconversou envergonhado.
— Então libera essas crianças! — ele rapidamente assentiu e voltou a entregar o algodão doce para os pequenos que a cada minuto aumentavam em quantidade na frente do carrinho.
— Tchau. — Analu já ia afastando-se.
— Você realmente precisa ir agora? — retrucou, enquanto tentava dar conta da quantidade de crianças que não parava de crescer. — Pelo menos leva um algodão doce, tenho certeza de que adoçará o seu dia!
Analu suspirou, sentindo o coração ficar bem quentinho ao ouvi-lo.
— Talvez eu não precise ir tão rápido. — refletiu sorrindo e Daniel sorriu de volta, um sorriso grande e genuíno, ostentando duas covinhas charmosas nas bochechas. — Precisa de ajuda?
Daniel a olhou confuso.
— Você pode ficar?
— Eu não tenho nada melhor pra fazer! — e se posicionou ao lado dele no carrinho.
Daniel agradeceu aos céus pela sorte que tivera naquela manhã e sorrindo uma vez mais para Analu, decidiu pegar o telefone dela assim que terminasse aquele trabalho. Afinal, não era todo o dia que uma garota linda caia de paraquedas em sua vida.
— Analu, você realmente pode ficar? — voltou a indagar, ainda sem conseguir acreditar que ela de fato estava ali, ao seu lado.
— Posso, mas só se você me der um algodão doce — afirmou e tornou a sorrir, não era difícil sorrir ao lado dele.
E, ao vislumbrá-lo abrir um sorriso ainda maior em resposta. Teve certeza, sua segunda-feira não seria tão ruim quanto imaginava...
— Te dou todos os algodões doces que você quiser, se ficar comigo não só hoje, Analu. — Daniel arriscou, convencido de que valia a pena não deixá-la escapar.
Ele não a conhecia, nunca a tinha visto, mas algo em seu interior lhe dizia, que se a deixasse escapar, se arrependeria para o resto da vida. Contudo, a resposta de Analu o surpreendeu gostosamente:
— Eu nunca tive medo de diabete.
FIM.
Gracias por leer!
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