É implosão. Não... seu crescimento é gradativo, sinto isso. Latente, à espera do momento certo de se revelar. Ninguém percebe, e em dias fantasiados de alegria, nem mesmo eu percebo. Não são personagens que escrevem por mim, são meus dedos, peças integrantes de um podre maior. É piscina, mas não do gênesis, e sim do nêmesis, porque sinto um fim, seja no que sou ou que tenho. Há uma tempestade chegando, isso eu sempre dizia, mas ignorei desde então. Torrencial; me encharcará com minhas escolhas.

Está dentro de mim. Os órgãos queimam. O abdômen se contrai. Os músculos se enrijecem. A dor física vem como única alternativa de fazer parar. Os pulmões esquecem de respirar. A garganta se fecha, mas nenhuma lágrima sai. Os olhos são janelas cansadas, com persianas por fechar. Mas o corpo fica de pé; ele está vivo, acordado e a mil. Ele tá pensando, tá pulsando - eletrizado. É combustão por dentro, queimando o que não pode queimar, apenas para permanecer acordado contra minha vontade.

Uma cidade fantasma, quem é que sente algo? O problema das músicas tristes é que elas são cantadas para alguém, e não há nenhum morador por perto; o mesmo acontece com as felizes, pois felicidade se é compartilhada, mas não há nenhum morador por perto. Dizem que o espírito pioneiro é o melhor, mas encontrei tudo construído, contudo, nenhum morador havia por perto. O problema da união é que não há como andar de mãos dadas consigo mesmo, beber, rir ou fumar sem que uma lágrima desça em seguida.

Queria escrever, mas nada mais passava em sua cabeça além de paixão. Sentia-se vivo, mais vivo que tudo, mais verde que a jovem muda, mais cheiroso que as flores do jardim por ter estado tanto tempo com seu corpo. Sentia-se mais sedento pelo amor do que abelhas por pólen. Ele resistiu, não queria pensar muito enquanto longe dela, isso seria autodestruição; ademais, sentia tanto medo em dar corda para esse sentimento, que parecia jardineiro orgulhoso temendo a chegada duma peste.

A noite há muito caiu. Espalhou todas suas autorias sobre a existência abaixo da lua. Primeiro aquele chiar icônico de ouvidos agitados, depois o cântico riscado dos insetos sob chuvisco imaturo. Mas havia outro som, o piar de um pássaro, tão distante que parecia estar em lugar algum; tagarelava feito espectro, cuja existência era duvidosa. Escutando-o, parecia estar interligado o dia doutro mundo com a madrugada deste. É atraente pensar que possa haver outro lugar para fugir que não a morte.

Foi noite passada que Hakka se debateu. O choro convulsionou seus músculos, saiu em soluços engasgados por entre uma respiração dificultosa; havia tanta mágoa, que tornou-se necessidade despeja-la toda, mais ainda do que respirar. O corpo se arqueou forçadamente, implorando para os responsáveis livrarem-no da prisão feita em lágrimas, em coisas horrendas e maravilhosas que era seu sentir. Mas logo aquietou-se, torto sobre a cama, sedado feito louco. Era um remédio forte esse tal do silêncio.

São gases cobertos por mares que refletem lua e sol, carregados com a ânsia de eruptir de forma impossível e amainados apenas com duras respirações de pulmões solitários. Nesse vazio, absortos em vontade e desejo cegos, os corpos estão próximos uns dos outros, mas suas almas tão pra lá, que as próprias estrelas caçoam do amante que as promete. São como águas cristalinas em copos pretos. Pêsames àqueles que os sentem, essa podridão que é enxergar um mundo distante.

[+18] Eu sou apenas um homem. Como, cago, durmo. Eu cuspo. Sou amigo e inimigo. Tenho sonhos e dúvidas. Me apaixono fácil e penso em sexo. Quero amar e foder; fazer amor. Porra, eu xingo, bebo e fumo. Eu não quero estar entre deuses, muito menos entre demônios. Sou apenas um homem que quer parar de sentir tudo que representam.

Você já parou para pensar que talvez possamos ser que nem bolas de bilhar? Não? Pensa bem, rolamos para lá e pra cá, algumas vêm e nos batem, então caímos em buracos, e lá esperamos no escuro até que decidam jogar novamente conosco. A branca é a vida.

O sangue floresceu e escorreu pelo dedo. Um sorriso despontou. Marilu gostava de facas, e não era nenhuma combatente. As tinha guardadas aos montes em uma parte de seu quarto. Não era incomum as manusear enquanto pensava ou executava algo. Algumas eram da cor do próprio metal, nuas por assim dizer, outras, camufladas. Tinha para si que facas eram simples; elas podiam sorrir com seus lados cegos, ou rosnar um rosnado sóbrio com suas pontas e lâminas.

Há plantas, e um gato, e dois cachorros. Há um teclado, jogos, cerveja. Dias chove, dias não. Dias bêbado, dias sóbrio. Meditação inconstante, e alimentação, e humor. Mas tudo parece estar bem. Entretanto, tudo parece estar indo por água abaixo. Houve um tempo em que existia um amor, depois, a caça desse amor. Agora, a ânsia de saber se ainda é preciso dele para viver, não sobreviver.

O som que se seguiu quando sua munição acabou foi ensurdecedor pela ausência; mas logo pôde discernir as pegadas em marcha pesada, os rosnados e gritos desorientados daqueles que corriam selvagemente para terminar o que já haviam começado. O fuzil foi jogado no chão, os olhos percorreram os corpos mortos de seu esquadrão, a respiração foi neutralizada em meditação calma, e então a espada zuniu da bainha. Havia saída, mas a ignorou. Morreria junto com seus homens numa cova só.

Não há como definir aquele suspiro. Tava mais para acidente; um suspiro descarrilado. Lorenzo deixou seu corpo cair de bunda no colchão, coçou a barba, e então as suas costelas encontraram as coxas - a jaqueta pesada farfalhava pelos movimentos - e as botas foram arrancadas dos pés. O quarto silencioso enalteceu todos esses sons, mas, para ele, o batuque arrependido de seu coração estava sendo bem mais alto. Algumas cervejas horas antes e uma garota cujo nome desconhecia; mais um suspiro.

Há vezes que Iori senta e olha para nada em especial. Não há importância no que passa aos seus olhos; o conteúdo está no seu pensamento, que faz pulsar veneno do coração para todas as partes do corpo. Seu desejo é simples: ter poder para submeter indistintamente tudo aquilo que possa machuca-lo. Se não um colosso, ou uma criatura milenar, tornar-se alguém com acesso ao botão vermelho; ver a maré de fogo se estender o deixaria mais excitado do que a segunda foda da vida.

Um por todos e todos por um. Ogden realmente acreditava que, não importava o valor da unidade, ela sempre poderia se engrandecer com a devida atenção de um grupo formidável. Um por todos e todos por um... ela amava a união, amava tanto que odiava aqueles que não conseguiam amar tanto quanto ela. Ao mesmo tempo, ela sabia que pensar assim era mais uma das armadilhas que o ego pregava, para tornar o mundo no que ainda tem sido há tempos.