Notas Iniciais:
Songfic inspirada na música Drops of Jupiter, originalmente da banda Train, mas a versão que me inspirou a escrever é a da banda Boyce Avenue.
Foi escrita para um desafio lançado no Spirit, cujo tema é "A música da minha vida."
Essa songfic se passa no mesmo universo da fic "Meu Crush Literário" e tem spoilers dela. Se não se importam com spoilers, podem chegar junto :-)
Apesar da relação com a longfic, esta aqui pode ser lida como algo independente também.
Boa leitura ♥
***
Quantos caras se apaixonam pela melhor amiga? Com certeza, muitos pelo mundo.
Quantos não se declaram porque sentem medo de assustar a garota, perder a amizade no processo e simplesmente estragar tudo? Um monte deles.
Quantos deles acordam num belo dia de sol, pensam “É hoje!", decidem chutar o pau da barraca e enfim se arriscar? Uma boa parte dos caras, aposto.
E quantos encontram a garota dos seus sonhos com outro cara bem no dia que pretendiam abrir o coração? Os azarados, pelo visto.
O que me lembra que, em matéria de romance, eu nunca tive muita sorte mesmo.
Agora, quantos caras têm como rival um personagem literário? Um maldito almofadinha do século XIX? Um cara que não deveria existir de verdade, mas que, milagrosamente ou por efeito de alguma macumba misteriosa, saiu da saga de livros direto para o mundo real?
Com quantos caras essa insanidade acontece, hum? Esse tipo de coisa só podia acontecer comigo, claro! Felipe, o Cara Mais Azarado do Universo!
Não, vocês não leram errado, é isso mesmo. A garota que eu gosto — que eu amo perdidamente, na verdade — tem um crush literário que ganhou vida do dia para a noite.
Desde então, os dois não se desgrudam. Fora de órbita, a Maitê fica suspirando a cada frase enfadonha que o infeliz declama com palavras que nem se usam mais hoje em dia. Um tédio! E uma maluquice, convenhamos.
Sim, eu estou com ciúme da Maitê. Me mordendo de ciúme, coração partido, dor de cotovelo, chamem do que quiser. É tudo uma grande merda com a qual não estou sabendo lidar.
Estou com raiva, magoado e, ao mesmo tempo, também estou preocupado com ela. Porque se o personagem ganhou vida num piscar de olhos, ele pode evaporar num piscar de olhos também, certo?
O problema é que a Maitê parece cada vez mais envolvida pelo tal Mr. James Campbell, mais apaixonada por essa ilusão, por uma estrela-cadente que pode desaparecer no horizonte a qualquer momento.
Tenho medo que ela sofra se isso acontecer, que se machuque no final das contas, que fique de coração partido como eu.
Minhas tentativas de abrir os olhos daquela teimosa foram todas em vão. Só geraram estresse, celeumas e acabamos brigando feio da última vez. Meio que rompemos relações, acho.
Não a procurei mais desde aquele dia. Não posso, simplesmente não dá.
Em parte, porque dói pra caramba ver aquele cara sem graça perto dela. E em parte, porque sei que preciso me conformar. Se a Maitê quer namorar uma ilusão, a escolha é dela, não minha. Não tenho o direito de interferir.
Por mais que seja complicado assistir à garota que eu amo embarcando numa possível furada, sinto que ela precisa disso. Precisa viver essa situação surreal até as últimas consequências, se arriscar com esse cara que não existia até ontem mas que deve estar ao lado dela bem nesse momento. Precisa ficar fora de órbita mesmo e desvendar aonde essa paixão maluca pode levá-la.
Só fico me perguntando se a Maitê, mesmo com o crush literário a tiracolo e a atenção focada no sortudo, pensou em mim em algum momento desde que eu fui embora do prédio dela. Desde que brigamos, quando o que eu deveria ter feito era confessar como me sinto.
Será que ela ainda está com raiva de mim? Será que anda sentindo minha falta tanto quanto eu sinto dela?
Acho melhor não ter ilusões. Tenho que esquecê-la, isso sim. Ou pelo menos tentar.
Decidi tocar essa noite para arejar a cabeça. Tenho uma banda que faz alguns covers num barzinho perto da faculdade.
Aliás, a Maitê não veio à aula hoje. Coloquei o nome dela na lista de presença de qualquer jeito. Não consegui resistir. Ela faltou muito nos últimos dias, mas no que depender de mim, não vai perder o semestre por falta.
Nem por nota. Talvez eu tenha colocado o nome dela em alguns trabalhos também, me julguem. Sou meio coração mole quando o assunto é ela.
[...]
No instante em que coloquei os olhos no repertório da noite, soube que meu plano de esquecer a Maitê estava fadado a fracassar. A primeira música é Drops of Jupiter.
Adivinhem qual música estava tocando baixinho na livraria onde e quando eu conheci a garota dos meus sonhos? Isso mesmo.
Adivinhem qual música sempre me faz pensar nela? Digo, pensar ainda mais nela? Acertaram de novo.
E qual música não sai da minha cabeça desde que falei com a Maitê pela última vez? Desde que brigamos porque a flagrei beijando aquele cara e a cena acabou comigo? Desde que nos afastamos por causa de um personagem de livro que ela idolatra? Desde que eu percebi o quanto demorei para me declarar e que era tarde demais? Pois é.
Eu devia pular para a próxima canção da lista, mas querem saber? Talvez eu seja um pouco sadomasoquista.
Drops of Jupiter é uma das músicas favoritas da Maitê e o plano de esquecê-la pelo menos por uma noite acaba de ser abortado. Que se dane. O que adiantaria tirá-la da cabeça — tentar, na verdade —, sendo que ela persiste no meu coração feito uma rainha dona de tudo?
Cantar essa música parece uma boa forma de me sentir perto dela de novo, já que não posso estar ao seu lado de verdade. O lugar e a tremenda sorte pertencem a outro.
Mesmo tão distante dela, mesmo sentindo que a Maitê está em outro planeta, explorando a Via Láctea, as constelações por aí, viajando para cada vez mais longe de mim, essa música vai me dar esperança. Ou uma ilusão para não sofrer tanto.
Quem sabe ela esteja sentindo a minha falta enquanto explora o universo ao lado de outro alguém? Quem sabe ela descubra que o sujeito nem é tudo isso? Quem sabe um dia ela volte à atmosfera e coloque os pés no chão? E caminhe até mim com aquele sorriso que amo tanto e sempre me deixa nas nuvens? Quem sabe ela ainda faça parte do meu mundo no final?
Na pior das hipóteses, cantar vai me ajudar a pôr os sentimentos para fora, pelo menos. Sentimentos que eu demorei tempo demais para confessar e agora perdi a chance.
Enquanto meus amigos e colegas da banda se preparam no pequeno palco, sento no banquinho posicionado no centro e afino as cordas do violão apoiado em minha perna.
Tomo um gole de água e solto a respiração devagar com um sopro que é captado pelo microfone na minha frente. O sistema de som espalha o ruído pelo bar abarrotado de mesinhas e estranhos. Nenhum rosto é aquele que eu queria ver agora.
É por isso que começo a cantar com os olhos fechados mesmo, imaginando que ela está aqui, bem na minha frente.
Coloco meu coração em versos que não são meus, mas que, nesse momento, caem como uma luva no que estou sentindo. Versos que não foram escritos para a Maitê, mas que transformo numa declaração muito pessoal e ofereço a ela com todo o meu amor platônico.
Para minha surpresa, o peso no meu peito diminui conforme a música ganha forma e melodia. Parece que sadomasoquismo deixa a gente mais leve, afinal.
Mais à vontade, abro os olhos ao chegar à segunda parte da música. E me surpreendo ao reconhecer um rosto em meio à multidão. Um rosto que me atrai feito um ímã. Impossível resistir ao efeito devastador que Maitê exerce em mim.
Ela veio!
Um leve sorriso me vence quando chego ao refrão pela segunda vez. O coração disparado. As mãos suando enquanto espalho os acordes do violão pelo ar.
Não consigo parar de olhar para ela. Minha melhor amiga. A garota dos meus sonhos. A mulher por quem me apaixonei sem perceber e amo a cada dia mais.
E juro por Deus que Maitê não parece indiferente a mim agora. Juro por Deus que nunca ficou tão emocionada e envolvida ao me ver cantar antes. Juro que vejo uma luz diferente no seu olhar cravado no meu. Juro que a sinto mais perto de mim.
Ela mal pisca. Assim como eu.
Estamos conectados de algum jeito especial. Ligados um no outro feito mágica. Por um momento, é como se apenas nós dois estivéssemos aqui. Eu sinto.
Será que estou imaginando tudo isso? Sonhando acordado?
Infelizmente, não demora muito e noto uma presença ao lado de Maitê. O palhaço dos livros. O tal crush literário. O fruto de alguma macumba que o tornou um homem de carne e osso para atrapalhar o meu meio de campo com ela. A estrela-cadente pela qual Maitê se apaixonou. Um homem que não existe, idealizado, um galã perfeito.
Mr. Campbell é um lembrete entre nós. Um lembrete a mim. Um lembrete de que Maitê não está aqui por minha causa. Não voltou para o seu melhor amigo. O melhor amigo que costumava dizer que ela sempre tinha razão, mesmo sabendo quando estava completamente errada.
Um sujeito com medo de se jogar, voar, se arriscar, sempre preferindo manter os pés no chão. Alguém que esperou por tempo demais e agora só pode esperar sozinho. Sentado. Tão apaixonado que não sabe o que fazer com o sentimento não correspondido agora.
Porque enquanto eu canto para ela, Maitê segue apaixonada pelo outro cara. Em busca de si mesma ao lado de outra pessoa. Orbitando o mundo do sortudo. Continua lá fora, inalcançável no espaço distante.
E eu continuo aqui. Torcendo que um dia ela volte à atmosfera com gotas de Júpiter no cabelo.
[...]
Imaginem a minha surpresa quando o celular toca na manhã seguinte e a foto de quem aparece na tela? Dela mesma, Maitê.
Eu devia ignorá-la, me afastar de vez para curar as feridas, mas quem disse que sou capaz disso?
Atendo no primeiro toque porque esse sou eu.
— Está tudo bem?
Também não consigo evitar o tom preocupado em minha voz.
Ouço a respiração entrecortada do outro lado e, de repente, minha melhor amiga despeja na velocidade da luz:
— Lembra quando a Rachel descobre a paixão do Ross, percebe que ele não é de se jogar fora e se apaixona também?
Por que essa maluca me ligou para falar de Friends?
Tão logo absorvo suas palavras, percebo que Maitê está insinuando uma comparação. Ontem à noite, eu não imaginei o seu olhar emocionado na minha direção. Era mais que emoção, era...
Jesus Cristo! Eu sou o Ross, Maitê é a Rachel!
Pego de surpresa e ainda descrente pra caramba, deixo o celular cair no chão sem querer. Atrapalhado, abaixo-me para resgatá-lo e colo o aparelho contra a orelha às pressas.
— Onde você está?
Com a voz mais doce e enigmática do mundo, Maitê responde:
— Onde a gente se conheceu.
[...]
Não me perguntem como eu cheguei à livraria tão rápido, mas sem dúvida o Flash ficaria para trás numa competição.
Foi aqui, nesse lugar, há seis anos, que esbarrei numa garota linda. Com o impacto, minha pilha de HQs foi ao chão e o livro que Maitê segurava também. Nunca vou esquecer do sorriso dela aquele dia.
Um sorriso parecido brinca no seu rosto hoje.
Maitê é como o verão, iluminando meu dia, minha vida, aquecendo meu peito. E caminha feito a chuva, andando suavemente na minha direção ao me ver na entrada da loja.
Apresso o passo, movido por uma onda de ansiedade. Chega de esperar. Ela está aqui e também me ama! Não acredito, mas é verdade! Maitê se apaixonou por mim! E parece ter feito essa descoberta ontem enquanto ouvia Drops of Jupiter na minha voz.
Bem na minha frente, o sorriso dela se alarga e uma pergunta é dirigida a mim num tom levemente provocativo:
— Por que demorou tanto?
A única resposta que me vem à cabeça é terminar com a nossa distância, envolver seu rosto entre as mãos e silenciá-la com um beijo apaixonado que tira nós dois do chão. Maitê se agarra ao meu pescoço, mergulha na minha boca e nos leva às alturas.
Cada vez mais distantes do planeta Terra, somos lançados rumo ao espaço. Juntos, agora estamos prontos para explorar o universo inteiro.
Thank you for reading!
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