lara-one Lara One

Scully é convidada para expor seus estudos sobre a morte numa conferência internacional, mas Mulder não parece muito animado em ficar em segundo plano, tampouco em ter que disputar a atenção dela com outros cientistas. Mulder está completamente fora do seu território. Até descobrir um Arquivo-X. E pode pagar caro por isso. Fic escrita em parceria: One & Hanna Vitorino


Fanfiction Series/Doramas/Soap Operas For over 18 only.

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S04#26 - FENOMENAL


"Tenho que confessar, por dolorosa que seja a confissão, que nunca, nos dias de fé ingênua da minha mocidade, me fizeram tremer as descrições, por truculentas que fossem, das torturas do inferno, e senti sempre ser o nada mais aterrador do que ele."

Don Miguel de Unamuno

"Del Sentimento Trágico de la Vida (meditatio mortis)"

Madrid, 1971



INTRODUÇÃO AO EPISÓDIO:

Centro de Convenções Internacionais do Glory Hotel – Toronto, Canadá

2° Congresso Científico Mundial em Medicina Forense

9:27 A.M.

Câmera de aproximação pela porta de entrada. Auditório cheio, repleto de pessoas. No palco, quatro palestrantes.

Corta para o palco. Scully fala ao microfone, usando óculos.

SCULLY: - É difícil precisar o exato momento da morte porque ela não é um fato instantâneo, e sim uma sequência de fenômenos gradativamente processados nos vários órgãos e sistemas de manutenção da vida. Hoje, com os novos meios semiológicos e instrumentais disponíveis, pode-se determiná-la mais precocemente. Seria indispensável também que essa nova definição de morte, baseada no coma irreversível e identificada pela ausência de reflexos, pela falta de estímulos e respostas intensas, pela cessação da respiração natural e por um 'silêncio' eletroencefalográfico por mais de 24 horas, não fosse confundida com uma forma apressada de retirar órgãos para transplantes. Mas que representasse uma decisão consciente e capaz de garantir que alguém esteja verdadeiramente morto.

Corta para a primeira fila. Mulder, sentado ao lado de um senhor, observa Scully com admiração, como um fã.

SCULLY: - Os fundamentos éticos de um conceito rigoroso de morte nos levam a respeitar um determinado espaço de tempo, dentro de uma criteriosa margem de segurança. Reconhecemos que os meios médico-legais mais tradicionais para um pronto diagnóstico de morte contribuem muito pouco, devido à evolução lenta dos fenômenos abióticos consecutivos, que trazem, inevitavelmente, lesões irreversíveis aos órgãos e tecidos. Todavia, não podemos esquecer as palavras de Vega Diaz: 'Um segundo pode ser a unidade de tempo que faz de um sujeito vivo um cadáver, mas também pode fazer da morte um homicídio.'

Mulder continua a admirá-la. Ela fala com convicção. Larga o papel sobre a mesa. Olha pra platéia.

SCULLY: - Atualmente, a tendência é dar-se privilégio à avaliação da atividade cerebral e ao estado de descerebração ultrapassada como indicativo de morte real. Será que basta apenas a observação do traçado isoelétrico do cérebro para se concluir o estado de morte? Acredito que não. A morte, como elemento definidor do fim da pessoa, não pode ser explicada pela parada ou falência de um único órgão, por mais hierarquizado e indispensável que ele seja. É na extinção do complexo pessoal, representado por um conjunto, que não era constituído só de estruturas e funções, mas de uma representação inteira. O que morre é o conjunto que se associava para a integração de uma personalidade. Daí a necessidade de não se admitir em um único sistema o plano definidor da morte.

Mulder dá um sorriso. O senhor ao lado dele cochicha.

IVES: - (ADMIRADO) Ela é fantástica! Seu estudo sobre 'Características post-mortem de indivíduos expostos a traumas fatais de origem inexplicável', foi uma sensação nos meios científicos.

MULDER: - Com certeza.

IVES: - Ela abriu as portas para que muitos médicos, como eu mesmo, tivessem a coragem de admitir que nem sempre as evidências são como parecem ser. Já necropsiou um corpo para o qual você acaba dando um diagnóstico mais plausível por ter medo de rirem de você?

MULDER: - (SORRI) Não, sou psicólogo.

IVES: - Mas o que o traz realmente aqui?

Mulder olha pra Scully, cheio de orgulho.

MULDER: - Ela é minha esposa.

IVES: - (SORRINDO) É uma mulher muito competente. Uma profissional talentosa. Deve ter orgulho dela.

Mulder continua olhando pra ela, em completa admiração.

MULDER: - Eu tenho.

IVES: - Ah, me desculpe. Sou Ives Pietromont.

MULDER: - Fox Mulder.

Os dois trocam um aperto de mão. Repentinamente o nariz de Mulder começa a sangrar. Ele retira um lenço do bolso.

IVES: - (PREOCUPADO) Precisa de ajuda?

MULDER: - Não, isso é um probleminha constante.

Mulder levanta-se e deixa o auditório. Scully o acompanha com os olhos, preocupada, enquanto fala.

Corta pra Mulder passando em frente a uma sala.

VOZ DE UM JOVEM (OFF): - Me ajuda!!! Ele está aqui!!!

Mulder para. Tonto, confuso. Apoia-se na parede. Um médico sai da sala. Mulder põe a mão na testa. O médico o segura.

MÉDICO: - Entre aqui e sente-se, você pode desmaiar.

Eles entram.

Geral da sala. Há vários cadáveres em mesas, cobertos por lençóis. Mulder os observa. Fecha os olhos.

VOZ DE UM JOVEM (OFF): - Me ajuda!!! Ele está aqui!!!

MULDER: - O que disse?

MÉDICO: - Eu não disse nada.

Mulder procura com os olhos e não vê nada. O médico olha pra ele.

MÉDICO: - Está bem?

VOZ DE UM JOVEM (OFF): - Me ajuda!!! Ele está aqui!!!

Mulder sente vertigem e desmaia.

VINHETA DE ABERTURA:THE OTHER SIDE OF THE LIFE



BLOCO 1:

Scully entra na sala a passos largos, nervosa. Mulder, já consciente, está sentado numa cadeira, com a cabeça erguida pra cima. O médico encontra-se ao lado dele.

SCULLY: - Como ele está?

MÉDICO: - Melhor.

MULDER: - Estou bem, Scully. Não deveria ter saído de lá...

SCULLY: - Estamos num intervalo. Mulder, estou ficando preocupada.

MULDER: - Não se preocupe.

SCULLY: - (INCRÉDULA) Como assim? Acha que não vou me preocupar com você?

MULDER: - ...

SCULLY: - Não vai escapar desta vez, Mulder. Vai fazer exames.

MULDER: - Eu não quero exames!

Mulder levanta-se. Scully fica falando com o médico. Mulder anda lentamente por entre as mesas, observando os cadáveres cobertos pelos lençóis. Para. Fecha os olhos. Scully olha pra ele.

SCULLY: - Não é mesmo, Mulder?

MULDER: - ...

SCULLY: - Mulder?

Mulder sai do transe. Olha pro corpo coberto à sua direita. Descobre o lençol, percebendo um jovem de uns 16 anos. O peito cheio de pontos, pois já fora necropsiado. Scully aproxima-se dele.

SCULLY: - Mulder, sente-se realmente melhor?

MULDER: - Sim... Já vou pra lá.

SCULLY: - O que está procurando?

MULDER: - Nada em especial.

Scully sai da sala, mostrando preocupação. Mulder observa o rapaz. Olha pro médico.

MULDER: - Do que ele morreu?

O médico aproxima-se.

MÉDICO: - Coração estraçalhado, como se tivesse sido comprimido. O corpo, quando foi encontrado, já estava sem ar há mais de 8 horas.

Mulder observa o peito do rapaz.

MULDER: - Não há sinais de hematomas. Causa mortis?

MÉDICO: - Não encontramos nada. Não obtivemos respostas concretas, então a polícia liberou o corpo. A família autorizou a doação pra estudos. São espiritualistas, não valorizam a matéria.

MULDER: - Posso ler os registros da necropsia?

MÉDICO: - Claro, sem problemas.


Auditório – 11:56 A.M.

Scully continua falando. Mulder, sentado na primeira fila, lê atentamente os relatórios da necropsia. Algumas vezes ela lhe dirige o olhar, incomodada por ele não estar prestando atenção.

SCULLY: - A Associação Médica Mundial, já em 1968, preocupada com o assunto, estabeleceu na Declaração de Sidney: 'A dificuldade é que a morte cerebral é um processo gradual de nível celular, já que a capacidade dos tecidos de suportar a falta de oxigênio é variável. Sem dúvida, o interesse clínico não reside no estado de conservação dos tecidos isolados, e sim, no interesse da pessoa. Esta conclusão tem que se basear no juízo clínico, complementado por instrumentos auxiliares, dentre os quais é o eletrencefalógrafo o mais útil. Em geral, nenhuma prova instrumental isolada é inteiramente satisfatória no estado atual da Medicina, nem nenhum método técnico pode substituir o juízo global do médico'.

Mulder continua lendo o relatório. Ela olha pra ele enquanto fala.

SCULLY: - Os parâmetros clínicos para a avaliação da morte encefálica estão indicados na valorização da apneia e do coma aperceptivo com ausência de atividade motora supra-espinhal. Os exames complementares indicados para essa confirmação devem estar representados pela ausência da atividade elétrica cerebral, pela ausência da atividade metabólica cerebral ou pela ausência de perfusão sanguínea cerebral. Um indivíduo com privação irreversível da consciência, mas que mantém a espontaneidade da integração das funções vitais – respiração e circulação – é uma pessoa viva. Tal afirmativa, no entanto, não é o mesmo que manter tecnologicamente um simulacro de vida, prolongar artificialmente um sofrimento ou insistir no medicalismo obstinado da Medicina fútil.


12:47 P.M.

Mulder e Scully deixam o salão de conferências, dirigindo-se ao refeitório. Mulder carrega o laptop e a maleta de Scully, que por sua vez segura uma pasta contendo a programação e o livro e resumos do congresso.

MULDER: - (IRRITADO) Finalmente conseguimos sair de lá, achei que nem iríamos almoçar hoje!

SCULLY: - Mulder, deixa de ser encrenqueiro! Para o cientista, que passa a maior parte do tempo em concentração absoluta diante de suas pesquisas, às vezes tendo que abrir mão até mesmo do convívio familiar, esse reconhecimento é muito importante. Os colegas se aproximando para dar os parabéns pela pesquisa, levantando questionamentos, fazendo sugestões... Esse é o verdadeiro pagamento por tanta dedicação. Já pensou por esse ângulo?

MULDER: - (PÂNICO) O que... Você quer dizer com... 'Abrir mão do convívio familiar'? (PIDÃO) Scully... Scullyzinha... Você não está pensando em me trocar pelas suas pesquisas... Ou está? Se não pensa em mim, pelo menos pense naquele pulguento folgado do Cookie... Ele vai morrer de saudades de você, vai ficar uivando pra lua durante a noite toda, como um condenado que só espera mesmo a chegada do inevitável... Porque sua 'vida' o trocou pelas pesquisas... Já não quer mais saber dele...

SCULLY: - (SORRI/ APAIXONADA) É, Mulder... Acho que definitivamente o cachorro daquela casa não é o Cookie... (MALICIOSA) Uivar pra lua? Será que sou tão inesquecível assim?

MULDER: - (DEBOCHADO) Não tenho qualquer dúvida, Scully. É sim! Quem vai acalmar o meu vulcão interior naquela cama, hein? Sem a sua presença 'refrescante', corro o sério risco de incendiar o apartamento inteiro!

SCULLY: - (DEBOCHADA) Nossa, Mulder! Depois dessa, nunca mais você poderá reclamar dos meus pés frios debaixo do edredom...

Os dois caminham lentamente enquanto conversam. Por onde passa, Scully atrai olhares admirados dos pesquisadores presentes, sejam alunos, professores ou técnicos. Mulder repara em tudo à sua volta, e não deixa de dirigir expressões nada simpáticas aos admiradores dela.

MULDER: - (PREOCUPADO) Scully, não sei por que os organizadores do evento não prepararam os resumos em CD-rom, ou pelo menos em disquete... Vou te contar, a praticidade não é uma qualidade por aqui. Deixa que eu carrego a sua pasta do congresso também, esse livro de resumos está muito pesado pra você levar.

SCULLY: - (IRRITADA) Ora, Mulder, eu não sou uma inválida! E não quero te ver abarrotado até o pescoço com as minhas coisas, posso muito bem levar essa pasta.

MULDER: - É que... Scully... Bom, deixa pra lá. Você sabe o que faz.

SCULLY: - (APAZIGUADORA) Sei, Mulder. Pode ter certeza disso. E relaxa, está tudo bem.

Ele sorri, mais tranquilo, após encará-la e ver a seriedade e a determinação estampadas nos belos olhos azuis. Entram no refeitório, que está praticamente lotado, e procuram uma mesa onde possam se sentar para comer. Assim que o administrador do hotel vê Scully, estala os dedos e manda um dos garçons preparar uma mesa no melhor local, uma pequena sacada com vista para o jardim.

ADMINISTRADOR: - (CHEIO DE GENTILEZAS) Senhorita Scully, mas que satisfação recebê-la em nosso refeitório!

MULDER: - (INDIGNADO) Senhora Mulder, por favor.

ADMINISTRADOR: - (SURPRESO) Senhora Mulder? (OLHA PRA SCULLY) Então a senhorit... A senhora é casada?

SCULLY: - (ORGULHOSA) Sim. Este é meu marido, Fox Mulder.

Scully se abraça em Mulder enquanto o apresenta, para a completa felicidade dele.

ADMINISTRADOR: - (TENTANDO SE RETRATAR) Senhor Mulder, é um grande prazer ter o marido de uma pessoa tão especial em nosso estabelecimento. Seja bem vindo, espero que esteja tudo ao seu gosto.

MULDER: - (CONVENCIDO) É, eu também espero. Só não se empolgue muito com esse negócio de prazer... Você definitivamente não faz o meu tipo.

O garçom os encaminha para a mesa, deixando o rapaz atônito, tentando entender o sentido das palavras de Mulder. Scully ri.


Refeitório – 1:35 P.M.

Scully toma seu tradicional café com creme e sem açúcar, enquanto observa Mulder estirado na cadeira à sua frente.

MULDER: - (MANHOSO) Ai... Essa comida estava tão boa, e eu estava com tanta fome, que comi demais...

SCULLY: - Mulder, seu menino malvado... Quando vai aprender a controlar seus impulsos?

MULDER: - (DEBOCHADO) Nem vem, Scully... Estou certo de que, se eu aprender a me controlar, você vai ficar muito frustrada. Imagina... Um cara que já 'não é nada criativo' e ainda perde a sua impulsividade? O mundo acaba!

SCULLY: - Sua pretensão corresponde ao seu tamanho, Mulder. Olha, se você está tão mal assim, pode ir tirar um cochilo no quarto. Eu quero assistir uma palestra que começa dentro de alguns minutos.

MULDER: - (AJEITANDO-SE NA CADEIRA, SÉRIO) Impressão minha ou você tá querendo me colocar pra escanteio e deixar o caminho livre pra esses caras te paparicarem? Aviso, Scully: o único homem que pode te paparicar sou eu, e nem em sonho vou te deixar sozinha, entregue nas mãos desses abutres puxa-sacos e mal intencionados... (PROVOCANDO) E mais, vou reclamar com a organização deste congresso. Parece que só existem homens por aqui! Falando sério, de mulher, até agora, só vi você... E também tenho direito a ser paparicado, você não acha? Que 'mulher da Ciência' resistiria aos meus atributos?

Scully ensaia um beiço de indignação, quando um senhor alto, gordo, ostentando um cavanhaque e aparentemente muito distinto se aproxima da mesa, acompanhado por um jovem de corpo atlético e traços orientais.

McCORMICK: - Dra. Scully? Com licença. Meu nome é Richard McCormick, sou professor de Anatomia na Universidade do Arizona. Este é Peter Hamaguchi, meu estagiário (APONTA PARA O RAPAZ). Gostaria de lhe falar, para discutirmos alguns aspectos interessantíssimos que me chamaram a atenção em sua maravilhosa palestra. Teria um tempinho agora?

SCULLY: - (EMPOLGADA) Dr. McCormick? O famoso biólogo que participou recentemente da reclassificação de alguns termos aplicados na Anatomia? É uma honra para mim conhecê-lo.

Ela se levanta da cadeira e deixa Mulder sentado, observando a conversa dos dois. Peter permanece de pé, ao lado dele, fitando-o com certa curiosidade.

McCORMICK: - Mas o que é isso... A honra é toda minha! Sua palestra esteve sublime, nunca presenciei explanações tão claras a respeito das discussões que cercam a definição de 'morte'. Acima disso, não sabe o quanto me fascina o seu trabalho com os cadáveres que são mandados para Quântico. Especialmente as deformidades de origem desconhecida que detecta! Como deve ser maravilhoso hipotetizar sobre a real causa desses eventos inexplicáveis... Um verdadeiro exercício de aperfeiçoamento profissional, eu diria!

SCULLY: - O senhor está certo, doutor. A cada nova necropsia, sinto-me desafiada a encontrar explicações cientificamente válidas. Mas como eu disse na palestra, isso é realmente complicado. Muitas vezes, hipóteses alternativas, ou 'não convencionais', como preferir, são levantadas como prováveis causadoras das deformidades.

Eles se afastam, sob o olhar totalmente inquisidor de Mulder.

MULDER: - (PERPLEXO, FALANDO PARA SI MESMO) Cientistas... Até parece que 'participar da reclassificação de termos anatômicos' tem algo de realmente interessante... Grande coisa... Trocar 'digestivo' por 'digestório'... 'Nervoso' por 'neural'... Isso qualquer um pode fazer, até com maior originalidade, aliás...

PETER: - E o senhor, quem é? Qual a sua área de pesquisas?

MULDER: - (DEBOCHADO) Pode desistir, rapaz. Eu não pertenço à mesma 'raça' que vocês, os 'donos da verdade'. Ainda estou em processo lento e gradual de evolução.

PETER: - (CURIOSO) Você não é um cientista? Então o que está fazendo aqui no congresso, ainda mais acompanhando a ilustríssima doutora Scully?

MULDER: - (IRRITADO) Para um simples estagiário, você está querendo saber demais.

PETER: - (JOGANDO VERDE) Não me diga que... Ela é sua namorada?

MULDER: - (ORGULHOSO) Namorada não... Esposa. Somos casados. Muito bem casados.

PETER: - (DIVAGANDO) Ah... Eu sabia que tinha alguma coisa errada por aqui... Nem a Dra. Scully poderia ser tão perfeita... Mas eu podia jurar que não vi nenhuma aliança no dedo dela... Inclusive olhei várias vezes e...

MULDER: - (CORTANTE) Ei, o que você quer dizer com isso?

PETER: - (INOCENTE) Eu? Nada... Só estava pensando em voz alta...

MULDER: - (AMEAÇADOR, DEFENDENDO SEU TERRITÓRIO) Escuta aqui, ô 'projeto anabolizado de Albert Einstein'... Pode ir tirando essas idéias da cabeça, porque se eu souber que você chegou perto da minha mulher, seu cérebro vai ser reduzido ao tamanho de uma azeitona! SE ele for maior do que isso, porque eu estou duvidando seriamente.

Mulder pega as coisas de Scully de cima da cadeira. Emburrado, olha pra ela, que conversa animadamente com o Dr. McCormick.

MULDER: - (IRRITADO/IRÔNICO) Quando 'tiver um tempinho', eu gostaria muito, 'ilustríssima doutora Scully', que fizesse uma necropsia pra mim.

Mulder se retira, estampando uma fisionomia de indignação.

Dirige-se ao quarto, abre a porta, entra no hall, bate a porta, coloca os objetos que carregava em cima da mesa de canto, entra no dormitório e se joga na cama, contrariado. Adormece, abraçado no travesseiro.



BLOCO 2:

6:19 P.M.

Scully caminha pelo corredor que dá acesso ao quarto que divide com Mulder no hotel. Segura o livro de resumos do congresso na mão esquerda e, com uma caneta destaca-texto, vem marcando os trabalhos que deseja observar logo mais à noite, durante a exposição de painéis no espaço cultural.

Ela abre a porta com seu cartão magnético, acende a luz do pequeno hall de entrada e vê suas coisas dispostas em cima da mesinha de canto. Fecha a porta com cuidado. Vai até o dormitório escuro e sorri ao ver Mulder adormecido, abraçado ao travesseiro, com uma mecha de cabelos da franja caindo pela face. Scully senta-se ao lado dele na cama, e com carinho ajeita seus cabelos. Abaixa-se, e o beija levemente no rosto. Ele desperta.

MULDER: - (SONOLENTO) Que horas são?

SCULLY: - Está quase na hora do jantar. Você dormiu bastante.

MULDER: - (ESFREGANDO OS OLHOS) Puxa, dormi mesmo... Não sei, estava tão cansado que nem vi quando adormeci. Você chegou agora?

SCULLY: - Sim, acabo de voltar de uma palestra fabulosa sobre as várias abordagens que a morte assume nas mais diversas culturas espalhadas pelo mundo. Só perdi o começo, porque acabei me empolgando enquanto conversava com o Dr. McCormick...

MULDER: - (IRÔNICO) Ah, o 'Dr. Barbicha'? Estou comprovando cientificamente que você sente uma irresistível atração pelos papos-cabeça de homens 'estranhos', Scully...

Os dois riem.

MULDER: - (SÉRIO) Vai fazer a necropsia que eu te pedi?

SCULLY: - Ai, Mulder... Não sei. Depois do jantar quero visitar a exposição de painéis, e deve terminar tarde, tenho vários trabalhos para ver... Vou pensar no assunto, tá?

MULDER: - Tudo bem, Scully. Não quero de forma alguma que você se canse muito. Congressos assim são extremamente desgastantes, ainda mais quando se é a 'estrela cintilante da festa', não é mesmo? Mas se não fizer hoje, poderia fazer amanhã, bem cedinho? Eu realmente preciso saber...

SCULLY: - Por que você quer tanto que eu faça essa necropsia, Mulder? Aliás, quem morreu? Não fiquei sabendo de nenhuma morte por aqui, apesar do tema deste congresso ser a própria morte...

MULDER: - Depois te explico direito, com todos os detalhes. O importante é que já tenho a autorização necessária para você agir.

SCULLY: - Tá certo, Mulder... (MEIGA) E você? Está melhor?

MULDER: - Acho que sim... Meu corpo dói um pouco, mas estou me sentindo bem.

SCULLY: - Mulder, quando voltarmos para Washington, vamos imediatamente ao médico. Eu estou preocupada com você, e não adianta se negar a ir. Sabe que é preciso, não podemos facilitar.

MULDER: - (DESCONVERSANDO) Scully, quer dizer que está quase na hora do jantar? Então é melhor eu tomar um banho e trocar de roupa.

Ele sai da cama, pega algumas roupas no armário e dirige-se ao banheiro. Scully suspira e vai atrás dele.

SCULLY: - (MALICIOSA) Ô, Mulder, como você é egoísta... Vai tomar seu banho quente sozinho? E eu, como fico?

MULDER: - (ENCOSTA-SE NA PORTA DO BANHEIRO, SAFADO) O que é isso, Scully? Acha que eu seria doido de deixar a melhor parte do meu banho quente de fora? Eu já ia te buscar, só estava 'preparando o terreno' por aqui...

SCULLY: - (PROVOCANDO, ENQUANTO TIRA SUAS ROUPAS) Que bom pra você, Mulder. Sabe que eu me viro muito bem sozinha no banho, mas você... Quem iria lavar suas orelhas?

MULDER: - (TARADO, OBSERVANDO AS CURVAS DO CORPO DELA) Realmente, Scully... Um homem que não lava suas orelhas não é nada, não tem nenhuma moral. E eu sou um felizardo, afinal tenho alguém que faz isso para mim, muito melhor do que eu mesmo faria! O bom nisso tudo é que você faz muito mais do que simplesmente lavar minhas orelhas...

Ele a envolve nos braços fortes, beijando-a sensualmente e encostando-a contra a pia. Ela se entrega aos carinhos dele. Mulder segura o rosto dela em suas mãos e a fita com intensidade.

MULDER: - Eu te amo.

Ela sorri. Ele retribui o sorriso, abraçando-a com força. Ela o abraça também. Ele fecha os olhos e beija o rosto dela.

MULDER: - (SUSSURRA) Eu te amo demais...


10:32 P.M.

Mulder e Scully percorrem uma das plataformas do gigantesco espaço cultural do hotel, segurando pequenas taças de vinho branco nas mãos. Predomina, no ar que os circunda, uma certa aura de 'magia'. Ela parece flutuar sobre uma nuvem imaginária. Atenta, observa todos os painéis expostos pelos pesquisadores, que em sua maioria ainda são acadêmicos. Mulder não consegue disfarçar um sorrisinho de alegria misteriosa, que ilumina seu rosto.

MULDER: - (OLHANDO PRO RELÓGIO) Scully, ainda tem muita coisa aqui que você quer ver?

SCULLY: - Segundo a minha seleção, ainda faltam uns 5 ou 6 painéis... Por que pergunta, Mulder?

MULDER: - Você está muito cansada?

SCULLY: - Até que não... Esses trabalhos são de tal forma interessantes que nem sequer me lembrei de ficar cansada. (TOMA UM GOLE DE VINHO) E esse vinho que estão servindo realmente torna tudo ainda mais interessante...

MULDER: - Nem preciso pedir pra você moderar na bebida, né, Scully?

SCULLY: - Pode deixar, Mulder. Eu já disse que está tudo bem por aqui. Confie em mim. (IRÔNICA) E antes de me recriminar, olhe pro seu próprio umbigo, essa deve ser a décima taça de vinho que você toma! Acha que eu consigo carregar você pro nosso quarto quando estiver caído num canto qualquer, incapaz até mesmo de andar?

Ela para em frente a um painel. Começa a ler as informações contidas no pôster que apresenta o trabalho. Mulder está parado também, ao lado dela, acariciando levemente seu ombro. Em frente ao estande seguinte, há três homens que comentam sobre o mesmo trabalho que Scully analisa. Atentos a qualquer observação que a 'ilustríssima doutora Scully' possa fazer, eles escutam a conversa dos dois.

MULDER: - (RECEOSO) Você... Vai fazer aquela necropsia ainda hoje?

SCULLY: - (IRRITADA) E eu tenho outra alternativa? Se não fizer é capaz de você nem me deixar dormir, vai ficar falando nisso a noite inteira!

MULDER: - É que... Bem, não se trata exatamente de uma necropsia, sabe? Na verdade, seria uma 'necropsia da necropsia".

SCULLY: - Como assim, Mulder?

MULDER: - Lembra quando meu nariz começou a sangrar nesta manhã, e você foi me encontrar numa sala onde havia alguns corpos cobertos, dispostos sobre mesas?

SCULLY: - Lembro sim.

MULDER: - Pois então, eu... (RELUTANTE) Eu ouvi a voz desesperada de um jovem... Um jovem cujo cadáver está naquela sala.

SCULLY: - (INCRÉDULA) Mulder, prestou atenção no absurdo que está me dizendo? Como você iria 'ouvir a voz de um cadáver'?

MULDER: - (PIDÃO) Scully, sei que parece loucura, mas eu tenho certeza de que era ele. E sua voz denotava tamanho medo, tamanho desespero, que fiquei muito intrigado. Há algo de errado nessa história, e preciso descobrir o que é.

SCULLY: - Ai, meu Deus... Era o que me faltava... (SUSPIRA) Tudo bem, Mulder. Se for pra tirar essa sua cisma, eu faço. Mas por que você me disse que seria uma 'necropsia da necropsia'?

MULDER: - Na realidade, o jovem já foi necropsiado. Os legistas descobriram que seu coração foi estraçalhado, como se tivesse sido comprimido. O corpo, quando encontrado, já estava sem ar há mais de 8 horas. Por falta de respostas conclusivas, a polícia liberou o cadáver, que foi doado pela família espiritualista para estudos. Eu quero que você me dê o seu diagnóstico, que poderá corroborar ou não com um Arquivo X do qual tomei conhecimento há certo tempo, e assim explicar de vez aquela voz que ouvi.

SCULLY: - E qual era o caso?

MULDER: - Em 1997, alguns adolescentes que viajavam sozinhos pela primeira vez resolveram fazer a 'brincadeira do copo'. Tudo dava certo, o consenso geral era de que quem movia o copo era um dos rapazes do grupo, só que o copo quebrou. Todos estranharam, mas logo esqueceram. Esse rapaz foi o primeiro a ir dormir naquela noite. Seus amigos foram aprontar com ele e tiraram uma foto. No dia seguinte, ele não acordou. Todos tentaram despertá-lo, mas foi em vão. Ao perceberem o que aconteceu, levaram-no para o hospital, mas já era tarde. A necropsia acusou que o rapaz estava sem ar no corpo há mais de 8 horas, além de ter tido o coração completamente estraçalhado, como se tivesse sido comprimido. Isso não soa familiar? Bem, algumas semanas depois, quando as fotos foram reveladas, podia-se notar claramente a presença de um 'fantasma', o chamado 'espírito do copo', projetando-se a partir do corpo do rapaz adormecido. Segundo os dados que li, os principais reflexos fisiológicos e comportamentais associados à observação da estranha fotografia foram: calafrios, pânico, vontade de chorar e angústia. Muitos afirmaram ver a imagem se distorcendo quando a olhavam; alguns ainda conseguiam escutar os gritos do rapaz ou os zunidos do fantasma; uns poucos tentaram suicídio após olharem muito tempo para ela; os demais ficaram loucos.

SCULLY: - Então você acredita que esse... Esse... 'Espírito do copo', ou seja lá o que for essa 'coisa' aterradora, invocada durante a brincadeira, levou o garoto à morte enquanto dormia?

MULDER: - Para mim parece muito claro, Scully. Mas preciso de um suporte cientificamente válido, você sabe.

Enquanto os dois conversam, os pesquisadores que até então estavam atentos às suas palavras se olham, incrédulos. Um deles, Rick Voloch, não aguenta e começa a rir, zombando de Mulder.

RICK: - (DEBOCHADO) É incrível o que a fantasia não faz na mente das pessoas... Imaginem só, o 'espírito do copo' foi invocado numa brincadeira inocente e acabou levando um dos garotos, só pra não perder a viagem... Haja criatividade! (DIRIGE-SE A MULDER) Meu caro, você deveria mudar de profissão, deixando a investigação científica de lado – se é que você é mesmo um cientista – e passando a escrever livros de terror! Ficaria rico!

Mulder olha pra ele com uma cara de poucos amigos. Segura na mão de Scully e faz menção de puxá-la para que deixem o local.

MULDER: - (IRRITADO) Scully, é melhor sairmos daqui, pois 'privacidade' é um conceito desconhecido pra essas pessoas.

RICK: - Dra. Scully, desculpe-me pela observação, mas não pude ficar calado. Fico surpreso em saber que costuma dar crédito a esse tipo de colocação, digamos... 'Excessivamente criativa'...

Scully fica sem graça diante dos homens, que riem sem parar. Mas resolve defender Mulder. Acima de tudo, ela sabe que por mais inacreditáveis ou fantasiosas que sejam as hipóteses dele, muitas têm fundamento.

SCULLY: - (SEGURA DE SI) A experiência me mostrou que todas as hipóteses, absurdas ou não, merecem consideração. Com licença, mas precisamos nos retirar.

Ela se adianta a Mulder, puxando-o pela mão.

MULDER: - (FELIZ) Uau, Scully! Você me defendeu como uma leoa protege sua prole... O que deu em você?

SCULLY: - Mulder, fiz apenas o que achava certo. Não admito que zombem de você na minha presença, ainda mais cientistas mesquinhos como esses que acabaram de nos abordar. Pode apostar que a mente deles é tão restrita, mas tão restrita, que não há espaço ali dentro nem mesmo pra um mero raciocínio, apenas para os preconceitos impostos por ciências ultrapassadas.

Rick passa pelos dois, conversando com seus amigos.

RICK: - (IRÔNICO, FALANDO EM VOZ ALTA PRA SE FAZER OUVIR) Nada como um joguinho pra relaxar... Nesta noite estaremos nos reunindo nas mesas do saguão do hotel pra invocarmos o 'espírito do copo'... Buuuuu... Quem será que essa 'coisa' vai levar?

Eles continuam andando e rindo.

MULDER: - Será que esses idiotas estão falando sério? Isso é perigoso, eles não devem...

SCULLY: - Ora, Mulder. Eles só falaram isso pra te provocar, esqueça essa história. Eu vou fazer a necropsia, não vou? Aliás, vamos indo, está ficando tarde e não quero perder mais tempo, preciso de uma boa noite de sono.

MULDER: - (DIVAGANDO) É, pode ser um blefe... Mas prefiro verificar. (OLHA PRA ELA) Não vai terminar de ver os painéis?

SCULLY: - Perdi completamente o interesse neles, Mulder. Vamos, quero acabar logo com isso.

Os dois se dirigem à sala de necropsias.


Sala de necropsias – 11:27 P.M.

Mulder, escorado numa escrivaninha, come sementes de girassol. Scully descobre o corpo do rapaz, ao mesmo tempo olhando pra Mulder com um ar de 'Se isto é necessário...' Ela coloca as luvas, fazendo um estalo do material emborrachado na pele.

SCULLY: - Ok, Mulder. Vamos ver o que temos por aqui.

Ela coloca os óculos. Pega o bisturi. Mulder vira-se pra janela, enquanto leva uma semente de girassol à boca.

MULDER: - Sabe o que me impressiona realmente nas pessoas?

Ela observa o cadáver.

SCULLY: - O quê?

MULDER: - Dentro das diversidades de crenças, ninguém percebe que todas são iguais. E o que me irrita é o deboche em cima do que não temos conhecimento. Já reparou, Scully, como as pessoas se auto-defendem de seus medos interiores fazendo críticas e observações nada fundamentadas e irônicas?

SCULLY: - Do que está falando, Mulder?

MULDER: - Estou me lembrando dos seus colegas. E de um sujeito que veio que me questionar sobre religião. Ele não aceitava teoria alguma que eu lhe desse, porque ele dizia ser evangélico e tinha a concepção evangélica. O engraçado é que eu aceitei a teoria evangélica e a anexei às outras religiões. De certa forma, eu entendia o que ele falava, mas ele, dentro de apenas uma visão, não podia enxergar outras verdades.

Ela para. Olha pra ele. Ele continua de costas.

MULDER: - Isso não te diz que a verdade é uma mentira?

SCULLY: - ...

MULDER: - Mentira porque não há uma verdade. Há várias verdades. E me pergunto se a sua verdade é a minha verdade... Por que as pessoas não podem aceitar que não têm as respostas pra tudo? Por que desconsideram, riem e criticam daquilo que não conhecem?

SCULLY: - Tudo é impossível até que alguém duvide e prove o contrário.

Ele se vira pra ela. Dá um sorriso.

MULDER: - Einstein.

SCULLY: - Exatamente. Albert Einstein, o maior cientista que já pisou neste planeta... Hum... Einstein poderia ser um alienígena infiltrado?

Mulder sorri.

MULDER: - Quem sabe? Ou uma outra experiência que deu certo?

Scully sorri pra ele. Abaixa a cabeça e começa seu trabalho, cortando os pontos da necropsia anterior. Parece estar fazendo aquilo com relutância. Mulder escora-se na escrivaninha. Olha pro nada. Scully ergue a pele do rapaz. Um calafrio toma conta dela rapidamente. Ela olha pra seu braço.

SCULLY: - Credo! Bateu um arrepio de frio.

MULDER: - Minha mãe costumava dizer que quando isso acontece é a morte que passou pela gente. Então se diz: 'Vai-te morte que ainda estou forte.'

Ela sorri debochada.

SCULLY: - Isso não é científico, Mulder. A morte me desconhece.

Ele sorri. Continua olhando pro nada. Mas alguma coisa chama sua atenção. Ele volta seus olhos para o cadáver.

Corta para o cadáver. Scully, necropsiando, ao mesmo tempo em que a mão magra, de dedos longos e pele escura enrijecida, projeta-se de dentro pra fora do corpo do rapaz, apalpando a beirada do corte da autópsia, como que procurando apoio para sair.

Mulder arregala os olhos, catatônico. Olha pra Scully, abrindo a boca. Scully continua trabalhando, parece que não vê nada. Mulder não sabe se fala ou se fica quieto.

Repentinamente surge uma cabeça, desfigurada, com a pele e músculos enrijecidos, boca também desfigurada. A coisa vira-se pra Mulder e estende apenas o dedo indicador, fazendo um sinal pra ele, chamando-o.

MULDER: - S-Scully...

Mulder se dá conta de que ela não vê. Mas Scully, instintivamente, começa a sentir-se tonta. Apoia-se na mesa, dando um grito, colocando a mão na barriga. Parece que vai vomitar, sentindo a presença maligna.

MULDER: - (TENSO) Sai daí.

Ela olha pra ele.

MULDER: - (GRITA NERVOSO) Scully, sai daí!

Ela se afasta do cadáver, sem entender nada. Escora-se tonta contra a parede. Mulder olha pro cadáver. A coisa volta pra dentro do rapaz, escondendo-se. Mulder puxa Scully pelo braço.

SCULLY: - (SEM ENTENDER NADA) Mulder, o que aconteceu?

MULDER: - Vamos sair daqui.

SCULLY: - Mas...

MULDER: - Vamos, Scully, não tem nada de bom aqui.

Os dois saem. Mulder fecha a porta. Escora-se nela de costas, respirando nervosamente, bastante assustado. Ela põe a mão na testa, ainda tonta.

MULDER: - Você está bem?

SCULLY: - Estou. Sei lá, me senti estranha... Parecia que tinha mais alguém naquela sala...

MULDER: - (ASSUSTADO) ...

SCULLY: - Mulder?

MULDER: - ... (FECHA OS OLHOS)

SCULLY: - Viu alguma coisa?

MULDER: - Não quero descrever o que vi. Não há palavras pra descrever. Não sei o nome daquilo e nem o pronunciaria se soubesse.

Ele sai nervosamente pelo corredor, começando a derrubar sangue pelo nariz. Scully o acompanha com os olhos. Vai atrás dele.


12:03 A.M.

Scully sentada na cama. Mulder deitado com a cabeça no colo dela. Olhos fechados. Ela afaga seus cabelos.

SCULLY: - Dói muito?

MULDER: - Dói.

Ela afaga os cabelos dele, com carinho, tentando confortá-lo.

MULDER: - Os zumbidos... Esses zumbidos me deixam louco.

Ela afaga o rosto dele.

SCULLY: - Tenta fazer aquilo de novo. Precisa aprender.

Ele olha pra ela e sorri. Fecha os olhos.

MULDER: - Me ajuda?

SCULLY: - Hum...

Ela fala enquanto afaga os cabelos dele, suavemente, num gesto contínuo de empurrar sua franja por sobre a cabeça.

SCULLY: - Um lago... Um campo... Céu azul...

MULDER: - ...

SCULLY: - Flores... Pássaros...

MULDER: - Não. O lago funciona melhor.

SCULLY: - Então um lago.

MULDER: - ...

SCULLY: - Água.

MULDER: - ...

SCULLY: - Líquido.

MULDER: - ...

SCULLY: - Transparente...

MULDER: - ...

SCULLY: - Mergulho.

MULDER: - ...

SCULLY: - Funcionou?

MULDER: - ...

SCULLY: - Mulder?

Ela percebe que ele dormiu. Sorri. Puxa o lençol por sobre ele e fica ali, afagando-o com toda a ternura.



BLOCO 3:

Residência dos McCauley – 9:23 A.M.

Mulder dirige-se à porta da casa. Bate. A mulher de fisionomia cansada atende, olhando pra ele.

PHOEBE: - Sim?

Mulder puxa a credencial.

MULDER: - Agente Mulder, FBI. É a senhora McCauley?

PHOEBE: - Sou.

MULDER: - Poderia lhe falar um momento?

Ela abre a porta.

PHOEBE: - Entre.

Mulder entra. Ela fecha a porta. Estende a mão em direção à sala, convidando-o.

PHOEBE: - Por favor...

Mulder entra na sala. Ela o segue. O homem gordo, sentado no sofá, em frente à TV, brinca com o controle remoto sem prestar muita atenção na tela. Fisionomia de cansaço e perda.

PHOEBE: - Norman?

O homem olha pra ela, então percebe Mulder. Levanta-se.

PHOEBE: - Este é o agente Mulder, do FBI.

Os dois trocam um cumprimento.

MULDER: - Eu gostaria de saber sobre a morte do seu filho, Brian McCauley.

O casal troca um olhar, esboçando um sorriso aliviado.

NORMAN: - Finalmente o FBI entrou na história. Sente-se, meu amigo, por favor. Fique à vontade.

Mulder senta-se.

PHOEBE: - Eu vou preparar um cafezinho pro senhor...

MULDER: - Não se incomode...

Ela sai rapidamente pra cozinha, com a fisionomia mais aliviada. Mulder olha pro homem.

MULDER: - Eu... Eu li que não encontraram nada na necropsia, certo?

NORMAN: - ... Certo.

MULDER: - Senhor McCauley, gostaria de dizer que não estou aqui oficialmente. Me deparei com o caso e não tenho informações adicionais porque não há um pedido oficial para haver envolvimento do FBI.

NORMAN: - Entendo. Mas pode nos ajudar?

MULDER: - Eu quero saber como seu filho morreu. Com certeza eu farei todo o possível pra ajudar vocês.

NORMAN: - Sabe a dor de perder um filho?

MULDER: - Eu sei bem o que é não saber o que aconteceu com o seu filho e ficar se perguntando todos os dias onde estava o homem que você diz ser, na hora que deveria ser infalível e protegê-lo.

Norman suspira, num olhar distante.

NORMAN: - É. Você sabe mesmo.

MULDER: - ...

NORMAN: - Meu filho estava com 16 anos. Tinha sua turma de amigos. Garotos bacanas. Vinham aqui em casa, jogavam até cartas comigo e com a minha esposa.

MULDER: - Ele era seu único filho?

NORMAN: - Não, tenho uma filha que estuda em Nova York.

MULDER: - ...

NORMAN: - Resolveram ir pra casa de campo dos pais de um dos amigos, que é nosso vizinho. Deixamos os garotos, porque afinal de contas, eles são bons meninos. Na tarde seguinte um deles me ligou dizendo que Brian tinha morrido.

MULDER: - ...

NORMAN: - A polícia achou o corpo sem ar há mais de 8 horas. Os garotos disseram que estavam jogando e Brian ficou com sono. Foi dormir e não acordou.

MULDER: - O que eles jogavam, senhor Norman?

NORMAN: - Paciência, sei lá.

MULDER: - O senhor é espírita, não é?

NORMAN: - Sou, mas não espalhe isso pra ninguém.

MULDER: - (SORRI) Kardecista?

NORMAN: - Sim.

MULDER: - Seu filho também?

NORMAN: - Também.

A mulher entra na sala com uma bandeja. Serve um café e entrega pra Mulder.

MULDER: - Obrigado.

PHOEBE: - Espero que não esteja muito fraco.

MULDER: - Não, está ótimo.

NORMAN: - Por que me perguntou se sou espírita?

MULDER: - Apenas curiosidade. Acho que o senhor deve...

[Som da voz do garoto gritando em agonia]

Mulder fecha os olhos.

NORMAN: - O senhor está bem?

MULDER: - Sim.

Mulder levanta-se.

MULDER: - Eu agradeço a gentileza de vocês.

PHOEBE: - Vai descobrir o que houve com nosso filho?

MULDER: - Com certeza, Sra. McCauley. Eu... Eu só gostaria de ter o endereço ou o telefone dos amigos que estavam com ele. Apenas rotina.


Centro de Convenções Internacionais do Glory Hotel – 11:46 A.M.

Mulder aproxima-se e senta-se ao lado de Scully, que assiste uma palestra. Ele começa a cochichar.

MULDER: - Não vai acreditar.

SCULLY: - (COCHICHA) O que descobriu?

MULDER: - Pressionei um bando de garotos para confirmarem minha hipótese.

Um homem vira-se pra eles, soltando um 'shiiiiii', pedindo silêncio.

MULDER: - (COCHICHA) Pode me dar um minuto?

Ela assente com a cabeça. Os dois saem do auditório. Caminham pelo corredor.

SCULLY: - O que os garotos falaram?

MULDER: - Estavam passando um final de semana na casa de campo de um deles. Resolveram passar o tempo fazendo uma brincadeira que todo adolescente faz sem ter conhecimento dos riscos que implica.

SCULLY: - O jogo do copo?

MULDER: - Exatamente. Brian...

SCULLY: - Quem é Brian?

MULDER: - A vítima. Brian, por ser espírita, ficou com medo e disse que ia dormir. Eles relataram que, depois de algum tempo, o copo voou de cima da mesa e caiu no chão, quebrando-se. O resto você sabe.

SCULLY: - Mas, Mulder...

Ela se detém. Olha incrédula pra ele.

SCULLY: - O que têm a ver espíritos com copos?

MULDER: - Sentem-se atraídos por objetos materiais. Assim como canetas, tábuas ouija. Certos materiais funcionam como catalisadores de energia... (RI) Besteira, Scully. Na verdade, eu acredito que o copo funciona como símbolo. O que atrai essas almas desencaminhadas da luz é a energia presente as invocando. Se o copo se quebra, ele fica ali. E foi o que aconteceu. Ele ficou no local, entrando no corpo do garoto. Acho que está aprisionando a alma do menino.

SCULLY: - ... Mulder? Pela primeira vez estamos concordando sob a visão científica?

MULDER: - ???

SCULLY: - O jogo do copo não atrai nada. É apenas um fenômeno chamado Paracinesia. São eventos inconscientes inevitáveis e involuntários. O copo não se mexe e sim os dedos!

MULDER: - Eu não disse isso. Eu disse que há forças sobrenaturais que são atraídas pela energia dos invocadores.

SCULLY: - Mulder, está me dizendo que vivos atraem mortos?

MULDER: - Não mortos, Scully. Porque temos um espírito, ninguém morre... Hum... (DEBOCHADO) Será por isso que o safado disse que ninguém morre em Arquivo X?

SCULLY: - Terei que contestar sua teoria, Mulder. A crença de que a personalidade humana sobrevive à morte e pode se comunicar com os vivos através de um médium sensitivo... Isso é absurdo! O movimento espiritista começou em 1848 no estado de Nova York com as irmãs Fox. Coincidência, não?... Afirmavam que os espíritos se comunicavam com elas batendo em mesas. Quando as irmãs admitiram a fraude, trinta anos mais tarde, havia milhares de médiuns fazendo sessões em que os espíritos entretinham as pessoas produzindo sons, materializando objetos, fazendo luzes brilharem, levitando pessoas e objetos, dentre outras mágicas. Os médiuns demonstraram toda a panóplia de poderes psíquicos desde clarividência e clariaudiência, a telecinética e telepatia. Acusações repetidas de fraude pouco fizeram para parar o movimento espiritista até os anos vinte, quando mágicos como Houdini expuseram as técnicas e métodos de engano usados pelos médiuns para enganar o mais esperto e santo dos homens.

MULDER: - E fantasmas, Scully? Acredita neles? O que acha que são?

SCULLY: - ... Mulder, me dê um fato nesse caso. Um fato coerente, ok? E então eu posso validar sua teoria. Isso não significa que eu não creia em fantasmas, porque seria ridículo negar depois de todas as coisas sem explicação que vi!

Ele sorri.

MULDER: - E isso não significa que eu não creia em Paracinesia, Scully. Seria ridículo eu negar a Ciência!

Ela sorri amavelmente pra ele.

MULDER: - O fato coerente que posso te dar, é que os pais querem uma explicação para a morte do garoto. Eles estão inconformados com a perda do filho.

SCULLY: - ... Mulder.

MULDER: - Fala.

SCULLY: - O que podemos fazer?

MULDER: - Eu não sei. Vou tentar conversar com um amigo pra saber se há uma maneira de expulsar essa coisa de volta pro lugar de onde veio. Precisamos ajudar essa gente, Scully. Os pais estão sofrendo, o garoto também.

SCULLY: - ...

MULDER: - Tá, vai assistir sua palestra. Te vejo no almoço.

Ele segue andando pelo corredor. Ela o observa com um sorriso orgulhoso, apaixonado.

SCULLY: - Primeiro os outros, depois você...

Ela volta pro auditório, já esboçando uma fisionomia de quem preferia estar investigando com ele.


Refeitório – 8:21 P.M.

Mulder, com o laptop sobre a mesa onde está sentado, lê alguma coisa na tela enquanto toma café. Fisionomia de tristeza. Ele se sente na pele do pai que perdeu o filho e quer ajudar aquela família.

O grupo de cientistas que caçoou dele na exposição entra. Sentam-se numa das mesas. Rick Voloch, ao ver Mulder, abre um sorriso sarcástico. Cutuca o colega ao lado.

RICK: - Ei, Carl. O maluco está aqui.

Carl ergue a cabeça.

CARL: - Deixe-o em paz, Rick. Os loucos são inofensivos.

O terceiro cientista, Frank McGinty, dá um sorriso, chamando o garçom. Mulder não os percebe, está concentrado em suas tarefas. O garçom aproxima-se. Eles fazem um pedido e o garçom se afasta. Frank olha pra Rick, rindo debochadamente.

Corta pra Mulder, concentrado em sua atividade.

Alguns minutos depois, o garçom serve um copo de suco para Carl e cafés com creme aos outros dois. Rick pega o seu e levanta-se. Aproxima-se da mesa de Mulder.

RICK: - Olá!

Mulder ergue a cabeça.

RICK: - Eu gostaria de conhecer melhor sua teoria sobre aquele assunto. É sério.

MULDER: - Acredita nisto ou veio só pra me chatear?

RICK: - Na verdade, eu vim pra perguntar como vai o seu amigo, o Sr. Espírito do Copo. É verdade que você o vê depois de uns três copos de uísque? Por isso a relação 'espírito com copo'?

Os cientistas riem. Rick se acha o máximo ridicularizando Mulder, que olha pra ele como um menino que não compreende o porquê daquela brincadeira estúpida. Rick aproxima-se, tentando olhar pra tela do computador, fingindo interesse.

RICK: - O que está fazendo?

Rick vira propositalmente o café por cima de Mulder. Este se levanta rapidamente da cadeira, com a camisa e as calças sujas. Os cientistas lá atrás têm um ataque de riso. Outras pessoas no local começam a rir também. Rick cinicamente olha pra Mulder.

RICK: - Oh, me desculpe... O que foi que eu fiz?

Rick pega a ponta da gravata de Mulder e tenta limpar o creme da camisa dele. Para.

RICK: - Shi... Acho que não foi uma boa ideia. Sujei sua gravata também.

Os cientistas lá atrás se matam de rir. Rick começa a rir da cara de Mulder. Mulder está sério, tentando limpar a roupa com um guardanapo de papel.

RICK: - Foi mal, me desculpe.

Rick dá as costas, rindo. Volta pra sua mesa. Mulder lança um olhar de incompreensão pra eles, completamente magoado. Senta-se novamente. O garçom aproxima-se com um pano, tentando ajudar Mulder a limpar a bagunça. Os cientistas continuam rindo. Carl termina o suco. Rick pega o copo e vira-o de boca pra baixo. Coloca o dedo indicador tocando o fundo, sem pressioná-lo. Começa a movê-lo sobre a mesa.

RICK: - Alguém está aí?

Mulder olha pra ele, com um olhar de desaprovação. Rick continua rindo e debochando.

RICK: - Ok, espírito do copo. Eu invoco você e todas as almas do inferno... (RINDO/ DEBOCHADO) Agora é sério... Você é gay, espírito do copo?

Eles riem. Mulder fecha o laptop, indignado, juntando suas coisas.

RICK: - Além de gay é surdo, porque o copo não mexeu.

Eles continuam rindo.

RICK: - Tem alguém aí? Se tem aparece logo, porque tenho uma palestra em meia hora.

Eles riem. Mulder acena a cabeça negativamente. O copo começa a vibrar sobre a mesa. Carl e Frank riem.

FRANK: - Você é demais mesmo!

RICK: - Eu não fiz isso.

CARL: - (RINDO) Ah, sem essa!

RICK: - O que quer de nós?

O copo se mexe sozinho, mas eles, no meio da palhaçada, não percebem. Mulder arregala os olhos.

FRANK: - Pergunta de uma vez quem ele vai levar essa noite!!!!

RICK: - (RINDO) Então, espírito do copo? Quem você vai levar esta noite? Qual será a sua vítima?

Os três começam a rir. Mulder, cabisbaixo, pega seus papéis e o laptop. Ergue a cabeça e olha pra eles, indignado, mas sua fisionomia muda, quando percebe, ao lado dos três, a mesma criatura que ele vira na sala de necropsias. Mulder fica estático. Os cientistas não a vêem. A criatura coloca uma das mãos sobre o ombro de Rick. Estende a outra e chama Mulder com o dedo indicador. Mulder pega suas coisas e sai, de costas, assustado, olhando pra criatura. Os cientistas olham pra ele, rindo.

FRANK: - Acho que você assustou o cara!

O copo voa pra longe da mesa, estilhaçando-se contra a parede. Rick fica sério. Os outros começam a rir.

CARL: - Como fez isso?

RICK: - Não fiz.

CARL: - (RINDO) Querendo nos pegar também, é?

FRANK: - Você é um péssimo amigo.

RICK: - Juro que não fiz!

FRANK: - Bom, então comprovamos a teoria da Paracinesia.

Eles continuam rindo.



BLOCO 4:

Quarto de Mulder e Scully – 2:18 A.M.

Mulder e Scully deitados na cama, na penumbra do quarto. Ela, usando apenas um conjunto de sutiã e calcinha cor de creme, está acomodada por sobre o peito dele, que veste uma boxer de seda azul marinho. Scully brinca com os pelos do tórax de Mulder com as pontas dos dedos, fazendo-lhe carinhos suaves e sincronizados. Os olhos fechados, um sorriso carregado de paz e tranquilidade estampado na face. Ele acaricia os cabelos dela com a mão que leva a aliança. Olhos semicerrados, fixos e ao mesmo tempo perdidos num ponto qualquer do ambiente. A aliança brilha ao receber a incidência indireta de feixes de luz que vêm dos letreiros luminosos situados na rua, contrastando com a pele do agente.

MULDER: - Aqueles malucos céticos...

SCULLY: - ... Deixe-os, Mulder.

MULDER: - ...

SCULLY: - (MURMURA, COMO SE DESPERTASSE DE UM SONHO) Você tem ideia do quanto eu te amo? Do quanto é maravilhoso para mim estar aqui, agora, abraçadinha com você, sentindo suas carícias, o seu calor, o seu cheiro de homem...?

MULDER: - (SORRI, APAIXONADO) Tenho... Tenho sim... Porque eu te amo tanto quanto você me ama. Infinitamente. Eternamente.

SCULLY: - (DIVERTIDA) Como pode ter tanta certeza de que te amo 'infinitamente' e 'eternamente'?

MULDER: - (DEBOCHADO) Por acaso você se esqueceu de que andei 'lendo mentes' por um tempo, Scully? Quem te garante que ainda não possa fazer isso, hein?

SCULLY: - (SORRI, AINDA DE OLHOS FECHADOS) Você pode até conseguir ler mentes, Mulder... Mas consegue ouvir os corações das pessoas também?

MULDER: - O seu coração eu consigo. Porque ele está perfeitamente sintonizado com o meu. Ambos se encontram numa harmonia completa.

SCULLY: - (BEIJA-LHE LEVEMENTE O PESCOÇO) É verdade, Mulder. Pra variar, você está certo. Meu Mulder... Meu parceiro, meu amigo, meu homem... Minha vida.

MULDER: - (DIVAGANDO) Eu... Nunca tinha parado pra pensar seriamente no significado da expressão 'almas gêmeas', sabe? Porque jamais encontrei alguém nessa vida que me levasse a isso, que me deixasse tão à vontade quando estava ao meu lado, cujo carinho desinteressado, sincero, fizesse com que eu me sentisse 'em casa'... (OLHA PRA ELA) Certa vez, você deve estar lembrada, tentaram me convencer de que eu tinha uma alma gêmea, que estaria junto de mim em todas as vidas que eu tivesse... Só que, por mais que tenham falado... Ainda que tenham tentado me convencer de que aquela mulher significava algo para mim, eu...

SCULLY: - O que está tentando me dizer, Mulder?

MULDER: - Acredita em almas gêmeas, Scully? Acha que nós dois somos almas gêmeas? Porque se isso é real, se é verídico como muitos afirmam, só existe uma pessoa neste mundo que pode ser minha alma gêmea, que me torna um homem plenamente realizado, em todos os sentidos. Definitivamente não há espaço para outra pessoa em meu coração.

SCULLY: - Eu acredito no amor, Mulder. Isso me basta, já é suficiente para mostrar que encontrei o homem da minha vida, com quem quero dividir minha existência por todo o sempre. E se foi assim antes, se será assim no futuro, sim, eu acredito em almas gêmeas. (SÉRIA) Por você, sou capaz de estender minhas crenças e concepções a campos inimagináveis.

MULDER: - Desde que nos 'casamos' na beira daquele lago no Maine, tenho pensado no que significou para mim essa mudança em nosso relacionamento. Começamos como parceiros, depois ficamos amigos... Tão amigos que só podíamos confiar um no outro. Mas sempre existiram segredos, dúvidas, o que é normal entre duas pessoas que têm uma convivência profissional, e não pessoal. Depois que ficamos juntos, romanticamente falando, que finalmente conseguimos nos declarar abertamente, nos permitindo viver esse amor que preenche nossa vida, passamos a nos conhecer ainda mais. E tenho que dizer, Scully: se antes eu te admirava pelo seu profissionalismo, por seus conhecimentos, pelo seu raciocínio associativo, hoje me curvo completamente aos seus pés. Você é uma mulher incrível. Não só no que diz respeito ao nosso trabalho, que para muitas mulheres seria uma barra pesada demais, mas no que diz respeito à nossa vida a dois. A cada dia, a cada noite, tenho uma nova surpresa com você. A palavra 'rotina' simplesmente não existe mais no meu dicionário. Sinto que uma força emana de você, essa força tão grande que muitas vezes me reergueu quando eu pensava que nada mais me tiraria da lama... Você ama tão intensamente, e luta de tal maneira por seu amor, que me comove. Me estimula a tentar ser melhor. Scully... (ELE OLHA DENTRO DOS OLHOS DELA) Eu te amo. E sei que esse amor independe dos conceitos conhecidos de tempo ou de espaço. Por mais coisas que ainda possam acontecer, sejam alegres ou tristes... Essa é a única certeza que tenho na minha vida.

Scully derruba algumas lágrimas, emocionada com as palavras que ele pronunciou com tanta espontaneidade, palavras que ela sabe que vieram do fundo da alma. Mulder a abraça mais forte, e beija levemente seus cabelos. Ela então se ajeita de modo a encostar seu ouvido no lado esquerdo do peito dele, para acompanhar as batidas aceleradas do seu coração.

SCULLY: - (OLHOS FECHADOS) Mulder, eu fico profundamente feliz, sinto-me uma mulher totalmente realizada, ao perceber que seu coração se acelera, que esses olhinhos puxados que Deus fez questão de te atribuir, só pra me enlouquecer, brilham, cintilam, quando você fala do seu amor por mim, por nós dois, por tudo que construímos juntos... (SORRI) Pelo que ainda está por vir... Tenho consciência de que te ajudei a sair daquele mundo de sombras onde você vivia, que tive participação decisiva na superação dos seus traumas, e sei que tudo aquilo que eu faço, de alguma forma, interfere no modo como você enxerga a si mesmo... Não é pretensão minha, é uma questão de consciência mesmo, entende? Nossa relação evoluiu para um estágio tão complexo, e ao mesmo tempo tão pleno, que se torna difícil para eu tentar pensar em explicações racionais. O que me permito fazer é sentir isso, me entregar a essa emoção da forma mais abrangente possível. Eu vivo você, respiro você, e sinceramente, não saberia continuar minha caminhada sem tê-lo ao meu lado. (ABRE OS OLHOS/OLHAR PERDIDO) Você fala da minha força interior, declara-se admirado diante dessa resistência que insisto aparentar... Mas quando eles o levaram, quando estive a ponto de te perder, confesso que foi quase impossível insistir na minha luta... (RESPIRA FUNDO, DERRUBANDO LÁGRIMAS) Naquele momento, se não fosse por nosso bebê, que estava dentro de mim, não haveria futuro para nós. Porque eu teria me entregado. É por isso que sei que nosso filho não veio por acaso. Ele veio a este mundo para me salvar, para salvar você.

Eles choram, emocionados. Scully, tentando melhorar as coisas, tomada por uma onda de desejo, aconchega-se no corpo de Mulder, colocando sua perna por sobre as pernas dele. Começa a beijar seu peito, e desce para seu abdômen, distribuindo ali algumas mordidas leves e esporádicas. Mulder ainda pode sentir as lágrimas quentes que escorrem do rosto dela.

SCULLY: - Você é tão lindo, tão doce... Tão grande, forte, e ao mesmo tempo tão frágil e carente... Meu menino... (SAFADA) Olho pra esse corpo ao meu lado e tenho que me conter pra não te devorar todinho...

MULDER: - (SURPRESO/TÍMIDO) Você me surpreende mesmo, sabia? Quando eu iria imaginar que a 'comportada e puritana agente Scully' ficasse reparando nos meus humildes dotes físicos...

SCULLY: - Ora, Mulder, eu sou uma mulher... E como todas as mulheres gosto de admirar o que é belo. Seu corpo másculo e definido, esses braços fortes, suas mãos grandes, essa boca chamativa com lábios tão generosos... Tudo em você me enlouquece!

MULDER: - (DEBOCHADO) Olha quem fala... Eu já te disse o quanto você é perfeita, Scully? Só de observar esse seu corpinho que exala sensualidade por todos os poros, só de sentir seu perfume, acariciar essa pele macia, eu... Perco completamente a pouca razão que me resta, você sabe muito bem disso...

SCULLY: - (DEBOCHADA) Sei sim, Mulder. E como sei... Já senti na pele, muitas e muitas vezes, que o seu comportamento entre quatro paredes é tudo, menos 'racional'.

MULDER: - (INOCENTE) E eu nem estou com essa bola toda, nem estou tão em forma assim... Costumava nadar ou correr nos finais de tarde, nos fins de semana, mas... (MALICIOSO) Nos últimos tempos, só tenho praticado religiosamente um único esporte: abdominais!

SCULLY: - De tanto praticar abdominais, você já deve ser o recordista mundial nesse esporte, Mulder. E eu sou testemunha da sua aplicação, da qualidade da sua performance.

MULDER: - (CONVENCIDO) Hummmm... É muito bom para o meu 'ego mulderiano' saber que estou agradando a 'plateia'. Aliás, vou aproveitar a deixa e praticar mais um pouco com o meu 'sparring' favorito...

Ele se vira por sobre ela, procurando os lábios de Scully com os seus. Eles trocam um beijo apaixonado. Aos poucos, as carícias se intensificam e eles vão devorando os lábios um do outro. O desejo acumulado ao longo da conversa vai sendo liberado.


7:29 A.M.

Scully acorda-se. Senta-se na cama. Olha pra Mulder que está dormindo. Ela sorri. Levanta-se e vai pro banheiro.


7:46 A.M.

Scully termina de se vestir. Ajeita os cabelos molhados. Olha pra Mulder. Senta-se na cama, afagando-lhe os cabelos.

SCULLY: - Mulder... Ô, sua toupeirinha? Quer sair da toca?

MULDER: - ...

SCULLY: - Hum? Que tal eu e você tomarmos um gostoso café da manhã, juntinhos? Depois você pode ir interrogar o resto dos garotos pra ver se os depoimentos deles não se contradizem...

MULDER: - ...

SCULLY: - Mulder?

MULDER: - ...

Scully fecha os olhos. Ela treme por dentro. Num esforço físico e emocional intenso, estende a mão e segura o pulso dele. Solta-o rapidamente, colocando a mão sobre os lábios, derrubando lágrimas.

Fade in.


Fade out.

[Som: Avemano – Era]

Mulder está parado na beira de um pântano. Sério. Observa ao longe a canoa que se aproxima. Mulder olha pra todos os lados, sem entender onde está. É um lugar lúgubre, pouco iluminado, a não ser pela luz que brilha no meio do pântano. Aos poucos, uma canoa se revela, aproximando-se.

Close da canoa batendo contra a terra e da velha lanterna movida a óleo.

Close da incredulidade que se estampa no rosto de Mulder.

Corta para a figura mórbida que ele viu na sala de necropsias, chamando-o com o dedo para entrar no barco. Desta vez Mulder vê sua forma. É o Caronte, com um longo manto e um capuz que lhe cobre o rosto de pele enrijecida e morta.

MULDER: - Quero que liberte a alma do garoto.

O Caronte nada fala. Apenas o convida a entrar.

MULDER: - Quer me mostrar alguma coisa?

O Caronte permanece calado. Continua chamando-o. Mulder fecha os olhos. Abre-os sem acreditar. Entra no barco e senta-se. O Caronte começa a empurrar o barco pela água suja e espessa, de onde sobressaem ossos e crânios. Mulder parece mais calmo e sem medo. Olha pro nada.


8:11 A.M.

Tumulto na porta do necrotério, entre cientistas e médicos. Scully sai do recinto, aos prantos, sendo levada por dois médicos. Ela reluta, tenta voltar pra dentro. Eles a seguram. Ela grita, tomada por uma dor profunda que vem da alma. Rick olha pra Frank.

RICK: - Acho que exageramos no susto... O cara morreu.

Corte.


[Som: Avemano – Era]

O barco bate contra a terra, do outro lado da margem. Mulder levanta-se. Vira-se e percebe o portal, com um imenso jardim florido. Mulder olha para o Caronte. Ele apenas estende o braço e o longo dedo sinistro apontando para a terra. Mulder desce. O Caronte parte.

Mulder atravessa o portal do jardim. Ao cruzar o portal, a paisagem muda. De um jardim florido passa a ser uma paisagem sombria, escura e lúgubre, lamacenta. Mulder olha pra trás, mas o barqueiro dos mortos sumiu. Mulder fica incrédulo, olhando perdido pra paisagem, cheia de árvores cujas raízes que se sobressaem no chão lamacento. A atenção dele é desviada para uma lápide plantada no meio da lama. Mulder aproxima-se. Agacha-se para ler a inscrição coberta de lama. Ele a limpa com a mão.

Close na lápide: Fox Mulder – 1961-2001.

Mulder coloca as mãos no rosto.

MULDER: - (GRITA EM DESESPERO) Nãoooooooooooooo!!!!!!!!!!!!!!!!!


8:16 A.M.

Scully é levada pelos dois médicos por um corredor que dá acesso aos elevadores do hotel. No caminho, eles se encontram com o Dr. McCormick que, sensibilizado com a dor dela, se oferece para levá-la de volta ao quarto e consolá-la. Ela está incrédula, catatônica, parece ter se isolado do mundo à sua volta.

O mensageiro abre a porta do quarto com a chave suporte da recepção, e McCormick ajuda Scully a entrar, encaminhando-a até o pequeno sofá do hall.

McCORMICK: - Dra. Scully, eu sinto muito. Recentemente perdi minha esposa, e acredite, sei o que está passando.

Ela ergue os olhos úmidos na direção dele, que a fita com um carinho quase paternal.

SCULLY: - Agradeço por tentar me ajudar, mas o senhor não poderia entender nunca o que se passa aqui dentro de mim, doutor... Não há palavras que possam descrever meu relacionamento com o Mulder, muito menos o que sentimos um pelo outro... Ele já resistiu a tantas coisas, a tantas adversidades... E é por isso que eu digo, ele não pode estar morto! (REVOLTADA) Não faz o menor sentido! Como ele poderia ter sofrido uma parada cardíaca enquanto dormia? Um homem ainda jovem, saudável, bem humorado, sem histórico de doenças cardiovasculares na família... A situação é absurda! Aqueles médicos estão loucos!

McCORMICK: - O destino nos prega peças, doutora. Como médica, deve saber que assim como se está vivo hoje, amanhã pode-se não estar mais... E raramente as explicações para a interrupção abrupta de uma vida são lógicas, infelizmente.

SCULLY: - Doutor, eu não posso simplesmente acatar isso! Vou retornar ao necrotério, o Mulder precisa ser levado a um hospital, quero fazer exames nele, quero verificar todos os seus sinais vitais, com detalhes, quero...

McCORMICK: - Por favor, seu marido foi examinado por alguns dos maiores especialistas em Patologia Legal do mundo, o diagnóstico está certo... O que você pode fazer agora é tentar se acalmar, deixe que eu cuido dos procedimentos para transladar o corpo até Washington.

SCULLY: - (CHORANDO, INCONFORMADA) Mulder não está morto! Não vou aceitar isso enquanto não forem realizados todos os exames de rotina! Embora ele não esteja apresentando os sinais vitais mais evidentes, isso não significa necessariamente que tenha morrido!

McCORMICK: - Seu marido era do tipo que se impressionava facilmente, doutora?

SCULLY: - (NÃO ENTENDENDO O MOTIVO DA PERGUNTA/SECANDO AS LÁGRIMAS COM O BRAÇO) Como assim?

McCORMICK: - É que estão comentando por aí que na noite passada o senhor Mulder ficou muito impressionado com uma brincadeira de... (RELUTA) Invocação de espíritos... E... Bem... Se ele ficou tão nervoso quanto dizem, essa pode ter sido a causa da falência da musculatura cardíaca, em consequência do aumento excessivo dos níveis sanguíneos de adrenalina e...

SCULLY: - Olha, doutor, posso lhe assegurar que Mulder é o homem mais corajoso que já conheci. (IRÔNICA, QUASE FERINA) E cá entre nós, depois deste pequeno incidente de ontem, ele estava bastante tranquilo, o suficiente para se concentrar em outras coisas mais importantes do que provocações infantis daqueles pseudo-cientistas.

McCORMICK: - (UM POUCO SEM JEITO) Vou pedir que tragam um calmante pra você, para que possa descansar um pouco. Depois, certamente estará mais apta a enfrentar essa triste realidade.

SCULLY: - Doutor, mais uma vez agradeço sua preocupação, só que não vou me drogar nem fugir do problema. O que vou fazer agora é retornar àquela maldita sala de necropsias, e exigir que cuidem direito do Mulder, que utilizem os procedimentos corretos! Sei do que estou falando, ele não me abandonaria assim, dessa forma estúpida!

McCORMICK: - Não acho prudente que você apareça por lá agora, pois neste momento ele pode estar sendo necropsiado.

Scully arregala os olhos e sai pela porta do quarto, desesperada, a passos largos, praticamente correndo.

Corte.


Scully entra no necrotério, quase sem fôlego, e ao perceber uma aglomeração de médicos ao redor de Mulder, grita em pânico, dirigindo-se até ele.

SCULLY: - Deixem-no em paz! Saiam daí! Agora! Saiam!

Os homens, assustados com a atitude dela, se afastam do corpo de Mulder, que repousa inerte na plataforma metálica, coberto apenas por um lençol branco e ainda intacto, sem cortes. Scully o abraça fortemente, chorando.

SCULLY: - (COM OLHAR OBSTINADO) Não vou permitir que te tratem mal, que te machuquem, Mulder... Mas também não vou aceitar que você me deixe aqui, sozinha! Não! Não neste momento! Neste momento não... E nossos sonhos? Nossa vida? Nossos planos? E quanto ao nosso amor? Hein?! Fala, desgraçado! Fala comigo! Fala...

Percebendo que ele não reage aos seus pedidos desesperados, ela se vira na direção dos médicos e pede que a ajudem novamente a tentar reanimá-lo. Está disposta a tudo para não perdê-lo.

Corte.


Mulder está no pântano escuro e frio.

[Som: Avemano – Era]

Mulder sentado numa pedra, olha para a sepultura, derrubando lágrimas. Olhar perdido, vazio, de quem não acredita naquilo. Coloca as mãos no rosto, chorando inconformado.

CRIANÇA: - Papai?

Mulder tira as mãos do rosto. Procura com os olhos.

CRIANÇA: - Papai, não chora.

Ele sente a pequena mãozinha no seu ombro. Faz menção de se virar, mas é interrompido.

CRIANÇA: - Não. Não olhe pra mim, você não me conhece. Eu não sou o que você acredita que eu sou.

MULDER: - ... (DERRUBANDO MAIS LÁGRIMAS)

CRIANÇA: - Papai, por que está aqui?

Mulder ergue a mão, segurando a pequena e frágil mãozinha em seu ombro.

MULDER: - Amo você...

CRIANÇA: - Amo você também, papai. Mas não deveria estar aqui. Não é seu lugar. Você não aprende? Eu sempre tenho que tirar você de enrascadas?

MULDER: - (SORRI TRISTE) ... Achei que vinha buscar um rapaz. Mas me enganaram.

CRIANÇA: - Viu? Você fica acreditando nas pessoas. Isso não é racional.

Mulder começa a rir, ainda derrubando lágrimas.

CRIANÇA: - O moço já foi. Eu o levei pra bem longe daqui. Agora ele está bem.

MULDER: - Por que o levou?

CRIANÇA: - Pra que você não viesse.

MULDER: - Não queria me ver?

CRIANÇA: - Papai, eu te vejo todo dia, dentro do meu coração.

Mulder segura fortemente a mãozinha, chorando convulsivamente.

MULDER: - Me deixa olhar pra você.

CRIANÇA: - Não vai me ver como realmente sou. Vai me ver como acha que eu sou.

MULDER: - Não me importo. Eu só quero te abraçar.

O menino aproxima-se, parando na frente dele. Mulder o abraça, chorando, afagando seus cabelos. O menino se abraça nele, chorando.

MULDER: - Meu filho... Meu filhinho...

CRIANÇA: - Papai, tem que ir embora.

MULDER: - Eu não quero ir embora. Quero ficar com você.

CRIANÇA: - Mas papai, eu estou com você. Seu lugar não é aqui.

O menino se afasta dele. Mulder o admira, derrubando lágrimas. Ele olha pra Mulder e puxa seu nariz. Mulder sorri.

CRIANÇA: - Gosto de fazer isso.

Mulder levanta-se. Dá a mão pra ele.

MULDER: - Sabe como ir embora daqui?

CRIANÇA: - Sei. Vem comigo.

O menino o leva até a beira do pântano. Olha pra água turva, cheia de ossos. Aponta pra dentro da água.

CRIANÇA: - Pule.

MULDER: - Vem comigo.

CRIANÇA: - Não posso, papai.

Mulder agacha-se e o abraça fortemente.

MULDER: - Vem comigo e acaba com a minha dor. Sua mãe sofre todos os dias chorando por você. Volta pra nós. Nós te amamos.

CRIANÇA: - Eu sei, papai. Mas não posso voltar agora.

MULDER: - Por que não?

CRIANÇA: - Não entendeu ainda?

Mulder abaixa a cabeça e chora, recostado no peito do filho, que afaga seus cabelos.

CRIANÇA: - Papai, a gente sempre volta pra quem a gente ama. Nada vai embora.

Mulder olha pra ele.

MULDER: - Eu te amo.

CRIANÇA: - Vai, papai. Mamãe tá chorando. Não a deixe chorar.

MULDER: - Vai voltar mesmo?

CRIANÇA: - Vou, papai.

MULDER: - Mas se não te vejo como você é, como vou te reconhecer?

CRIANÇA: - Reconheça a si mesmo nos meus olhos. Eles têm metade da sua alma e metade da alma dela.

Mulder o abraça. Os dois olham-se nos olhos.

MULDER: - Eu amo você. Me perdoa por ter deixado eles te levarem.

CRIANÇA: - Não foi sua culpa, papai. Eu precisava ir.

Mulder levanta-se. O menino o puxa pela mão. Olha pra água.

CRIANÇA: - Pule.

MULDER: - Não pode voltar comigo?

CRIANÇA: - Não.

MULDER: - (CHORANDO) Mas do que me adianta estar vivo se não tenho você?

CRIANÇA: - E se você morrer, quem vai cuidar de mim quando eu voltar?

O menino tira a correntinha com o pingente em forma de cruz do pescoço. Toma a mão de Mulder e coloca a corrente na mão dele. Fecha-a.

CRIANÇA: - Entrega pra mamãe e diz pra ela guardar. Eu vou pegar de volta.

Mulder o abraça, chorando.

CRIANÇA: - Em breve, papai. E ninguém mais vai me tirar de perto de você e da mamãe.

Mulder olha pra correntinha em suas mãos. Olha pra água.

MULDER: - Não, eu não vou deixar você.

CRIANÇA: - Quer brincar comigo?

MULDER: - (SORRI) Brincar?

O menino o empurra na água. Sorri, derrubando lágrimas.

CRIANÇA: - Te verei em casa, papai.

Corte.


Na sala de necropsias Scully chora debruçada sobre Mulder. Os cientistas e médicos cochicham entre si.

De repente Mulder senta-se na mesa, respirando ofegante, tentando colocar ar pra dentro dos pulmões desesperadamente. Fisionomia de medo e incompreensão no rosto. Os cientistas e médicos saem correndo, desesperados e assustados.

Scully olha pra ele, incrédula, derrubando lágrimas. Mulder olha pra ela, sorrindo também em lágrimas. Os dois se abraçam, confusos, nervosos. Mulder abre a mão. Olha pra correntinha. Scully olha pra corrente e põe a mão sobre os lábios, segurando um choro que brotaria da alma. Mulder pega a mão dela, entregando-lhe a corrente.

MULDER: - (ASSUSTADO) Nosso filho me mandou entregar isto, pediu que você guardasse... Disse que logo virá buscar.

Scully aperta a correntinha nas mãos, chorando. Abraça-se em Mulder. Os dois ficam ali abraçados, chorando um nos braços do outro.


X


13/02/2001

Aug. 13, 2019, 11:51 a.m. 3 Report Embed Follow story
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The End

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Lara One As fanfics da L. One são escritas em forma de roteiro adaptado, em episódios e dispostas por temporadas, como uma série de verdade. Uma alternativa shipper à mitologia da série de televisão Arquivo X.

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Karimy Lubarino Karimy Lubarino
Olá, querida autora, peço que por gentileza que dê uma olhadinha nesta história (como as de ontem, está faltando o conteúdo). Também gostaria de sugerir que acrescentasse mais tags nas suas histórias, pois é através delas que muitos leitores encontram suas leituras. Você pode colocar coisas como os nomes dos personagens principais da história, acontecimentos importantes (e até pode colocar sinalização para pessoas que possuem sensibilidade a certos conteúdos, como "violência", etc.).
December 19, 2019, 14:42

  • Lara One Lara One
    Acho que vou checar as outras também. Obrigada pela dica das tags!!! É por isso que eu amo essa plataforma, só tem gente legal aqui e que se importa. Bjus!!! December 19, 2019, 16:32
  • Karimy Lubarino Karimy Lubarino
    ❤ Feliz em saber! 😍 December 19, 2019, 20:02
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