Ela não gostava de Halloween, mas, para evitar as irritantes travessuras, sempre preparava um estoque de doces para distribuir às crianças que lhe importunassem.
A campainha ressoou algumas vezes àquela noite. Ela teve que interromper a maratona de filmes de terror e abandonar a pipoca para atender a porta.
Jogou balas, pirulitos, chocolates e doces variados em baldes que os pequenos vampiros, fantasmas, esqueletos, múmias e bruxas empurraram em sua direção.
Em dado momento, as visitas inconvenientes cessaram. Assim ela pensou antes da campainha tornar a soar. Às três horas da madrugada.
Só percebeu que o estoque de guloseimas havia acabado, depois de abrir a porta para a única criança em pé ali.
Não soube dizer que tipo de fantasia era aquela que ele ou ela vestia. Roupas puídas e com manchas secas um tanto marrons por toda a parte. Um saco de pano na cabeça, revelando apenas uma escuridão perturbadora no lugar dos olhos.
Antes que ela engolisse o medo e explicasse que não tinha mais doces, ouviu um ranger de dentes animalesco.
— Eu não quero doces... Só travessuras.
A voz cortante lhe causou arrepios. As roupas que, contrariando qualquer lógica, despencaram subitamente na soleira, revelando-se vazias, desnortearam seus sentidos. Um odor pútrido de enxofre pairou no ar gélido e intensificou o pânico já instalado em seu íntimo.
Com o coração aos pulos, cambaleou para trás. Evitando espiar a fantasia abandonada na varanda, trancou-se às pressas.
Quando as luzes da casa se apagaram sem explicação aparente, ela ainda não entendia como a criança havia desaparecido dentro das próprias roupas. Tampouco para onde havia ido.
Foi então que voltou a ouvir o ranger de dentes. Bem atrás de si. E soube, da pior maneira, que aquilo nunca foi uma criança.
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