Um dos momentos que mais me agradam ao viajar de carro é a possibilidade de ver o mundo passar diante a janela, as arvores que parecem se repetir, o traçado que parece se fundir e as nuvens que parecem acompanhar o carro. Libertar a imaginação em momentos como esse é sem dúvida um dos meus pequenos prazeres.
Infelizmente me encontrava no banco de trás de um carro parado em meio a tantos outros, todos compartilhavam um mesmo objetivo de cruzar uma ponte qualquer. Uma estrutura velha e inacabada que parecia prestes a mergulhar com alguém para o fundo do rio.
O que mais incomodava era o barulho que aquele cenário carregava, motores murmurando reclamações abafadas e buzinas censurando palavras ofensivas.
Meu dia seguia da pior forma possível, sucumbindo lentamente ao calor, esperando a oportunidade de ir embora. Enquanto na parte de fora o barulho dominava, dentro do carro o silencio fazia questão de mostrar sua face.
O motorista que fora pago para me levar do ponto “A” até o ponto “B” não fazia questão de esconder sua má vontade.
E nesse cenário na qual meu tempo ia embora, em um carro ordinário, maltratado pelo tempo e maquiado de forma barata.
Ao meu lado direito um motorista parecia dormir ao volante, com um olhar perdido e sem vida em uma face deprimida. No banco de trás uma criança que tentava transformar o banco de trás em uma central de controle para seus naves de brinquedo.
Ao meu lado esquerdo duas mulheres que pareciam conversar sobre a vida enquanto se acomodavam de forma confortável no carro.
Todos ali sabiam que ia demorar até que o problema fosse resolvido.
Um problema que não fazia a mínima ideia do que era e que sinceramente não tinha nenhuma vontade de descobrir. A única coisa que queria era achar uma forma de sair dali, nem que seja andando no meio do nada.
- Que dia quente em.
Tentei quebrar o silencio com uma fala extremamente genérica e sem vontade.
- É...
Uma resposta nada estimulante me mostrou que não conseguiria manter uma linha de diálogo sequer com aquele indivíduo. Até o entendo, ninguém tem a obrigação de conversar com ninguém.
- Tu tá por aqui faz muito tempo? Tá na cara que não daqui.
Até me surpreendi ao receber uma pergunta em troca. Certamente ele também ficou cansado de conviver com o silêncio.
- Não. Só tô de passagem, pulando entre alguns lugares pra dar uma relaxa.
- Tá certo...
Enquanto pensava na minha resposta me senti tentando encontrar o meio maior ordinário de continuar a conversa. Não queria falar sobre minha vida para um desconhecido.
Eu estava perdido, vagando por lugares sem saber o motivo. Foi um ano difícil e tudo que eu queria era me afastar dos problemas, não pensar em nada por alguns instantes.
A conversa parecia ter morrido na medida que os minutos se condensavam em horas. Me sentia preso a aquele carro e já não aguentava mais ficar naquele ambiente.
Uma ideia idiota pairou em minha mente, uma que fazia parte daquelas ideias de vem no momento e conseguem superar qualquer barreira de juízo, atingindo a mente como um tapa que fazia questão de não ir embora. A vontade de pegar minhas coisas e apenas ir andando parecia muito boa e não tinha resposta melhor do que abraçar aquela oportunidade.
- Ei, acha que falta muito?
- Não, rapidinho a gente chega, é só sair dessa merda e seguir reto.
- Ótimo! Mas e se você terminasse a corrida aqui?
- Tu tá falando em voltar?
- Não. Tô falando de eu seguir andando.
- Que?
- Tô cansado que ficar aqui morrendo nesse calor. Então bora fazer o seguinte, você termina a corrida aqui, eu te pago o combinado e cada um segue seu rumo;
- Não sei bem se isso é uma boa ideia... Mas você é quem sabe.
O carro parou como combinado. Ao sair senti uma leve brisa fria abraçar meu corpo. Peguei minhas coisas, uma simples mochila com tudo que acha importante. Paguei pela corrida e segui meu rumo.
Agora poderia finalmente sair daquele cenário deprimente e olhar um pouco aquela paisagem que certamente tinha mais vegetação do que estava acostumado.
Coloquei minha mochila nas costas, respirei fundo e comecei a andar, tendo como companhia meus pensamentos.
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