ayzu-saki Ayzu Saki

“- Pensei que faltaria ao nosso encontro. Como se fosse possível. A morte é sempre pontual. ” Quando alguém se apaixona pela morte, e consegue uma maneira de marcar os seus encontros nada casuais.


Thriller/Mystery For over 18 only.

#estranho-romance #original #Serial-Killers #A-Morte #violência #pensamentos-suicídas
Short tale
11
6.0k VIEWS
Completed
reading time
AA Share

A morte entra em um bar

Avisos: Violência, gore (breve), menções sobre estupro e pedofilia.


A morte entra em um bar.

Parece o começo de uma boa anedota.

Em uma noite quente de verão no centro da cidade, uma música triste toca no rádio. No balcão um homem conta sobre a última partida, outro bebe o último desencontro. Acima de suas cabeças, o relógio marca seu tempo, para mais, ou para menos.

O tempo, afinal, é mais precioso que tudo.

E ainda assim, o mais desperdiçado.

O fato é que a morte entra em um bar, e caminha até os fundos casualmente. Ninguém a percebe enquanto passa entre eles, embora todos irão a encontrar em algum momento, mais cedo ou mais tarde.

Não agora, agora a morte tem um encontro já marcado.

O ar frio da noite é penetrante, o cheiro de sangue fresco e sexo mais ainda vindo da escuridão. A porta se fecha, abafando o som alto de dentro, tornando audível a respiração forçada de alguém em seus últimos momentos a cada passo que toma para o beco.

A cena seria grotesca a outros olhos, mas nada de novo sob o sol. Sangue escorrendo nas paredes imundas, uma mão na garganta tentando em vão parar o fluxo, os olhos arregalados, incrédulos com o que acontecia. Não é todo dia, afinal, que o caçador se torna a caça.

O pulsar está ali, assim como os últimos fios se quebrando. Uma alma a espera de ser ceifada. A cor escura de quem espalhou a desgraça durante a vida. Uma daquelas que vai lutar, espernear contra o inevitável.

Claro, eram sempre dessas quando a menina estava envolvida.

Os olhos escuros fitam por entre o sangue no beco escuro, um sorriso breve se desenha nos lábios, feliz, como alguém que revê um velho amigo.

- Pensei que faltaria ao nosso encontro.

Como se fosse possível.

A morte é sempre pontual.

......................................................................

A cada século ou por aí aparecia um desses. Alguém estranhamente conectado com a morte, a enxergando além do véu que cobre os olhos da humanidade tão bem. Nem mesmo as oferendas eram novidades, os humanos são seres complexos, com seus complexos rituais.

E ainda assim, aquela situação era completamente diferente das demais.

O primeiro encontro entre a menina e a morte se deu nos seus primeiros momentos de vida: Quando ela tomou sua primeira respiração, sua mãe deu a última. Uma vida abençoada com a morte, em uma estranha poesia macabra que ocorre de maneira estranha tantas vezes.

Assim como foi estranho os olhos se abrirem naquele momento, e notarem a figura à espreita.

A primeira coisa que ela viu na vida, foi a morte.

E a partir daí ela podia a ver claramente.

No leito do seu pai os dois conversaram sobre a necessidade de um começo e o fim em tudo.

Em um quarto escuro de uma casa velha no fim da rua, o corpo de seu primeiro predador em forma de guardião ainda quente no chão da cozinha, ela lhe perguntou sobre o significado das coisas.

Em meio aos escombros de um prédio, presa depois de um ataque terrorista, ela questionou sobre sua própria existência, e o fez se perguntar o mesmo.

E os encontros continuaram ao longo dos anos. Na falha em haver um encontro casual, em algum momento ela aprendera a fazer suas próprias oportunidades.

A morte não sabia como ela os escolhia, mas ela sempre conseguia marcar um encontro, ávida pela companhia da morte, mas do que da vida.

-Dizem, que sempre que você toma a direita ao invés da esquerda, outra versão de você que tomou a esquerda cria uma realidade completamente diferente.

O corpo pendurado nas grades da ponte, um cigarro nos lábios enquanto contava suas teorias sobre o universo. O rosto limpo do sangue, os cabelos ainda úmidos, ela brincava na beirada do abismo, mesmo os dois sabendo que ela não iria cair.

Todos têm seu tempo, a sua hora. Todos têm seu relógio marcando sua contagem regressiva. Alguns mal experimentam o sopro da vida e já caem em seus braços. Jeanne Calment esperou 112 e 164 dias muito bem vividos até vir docemente ao seu encontro.

É assim que funciona, a morte é sempre pontual.

-Deve existir outra de mim por aí, com uma vida completamente diferente da minha.

Ela suspira para a noite, olhos escuros atentos ao céu, murmurando uma música já tão familiar.

-Então, quando vem me buscar, meu amor? – O questionamento casual também já lhe é comum. Olhos escuros ávidos, a mão tocando seu rosto em um gesto íntimo. Uma alma sofrida que procura os braços da morte como consolo, mas nunca pronta para um beijo.

Estranhamente, alguns acham a morte atrativa e a vida feia. Era uma daquelas coisas que aprendera a aceitar, embora nunca fosse entender por completo.

-Quando for seu tempo.

Ela sorri, os olhos escuros como a noite o fitando de forma melancólica.

-Então até o próximo encontro.

....................................................................

A morte caminha na rua escura, a caminho do seu próximo apontamento.

A morte fita a lista em suas mãos, e ao ver o nome da sua menina o apaga completamente, como se nunca estivesse surgido ali.

-Tudo tem seu tempo.

O relógio dela, afinal, havia travado em segundos há anos.

A morte também aprendera a apreciar esses encontros.

.................................................................

Notas finais

200 anos depois, surge o nome da menina na lista, a morte apaga novamente e finge que não apareceu, fazendo planos sobre o que conversar no próximo encontro.

O destino dá um grunhido exasperado.

Espero que tenham gostado, é curtinho, mas sempre tive isso na minha cabeça e tinha que tirar. Talvez faça uma continuação, ou talvez não. Acho que fica bom como parou também.

Algumas clarificações:

A menina se tornou uma espécie de vigilante, ela coloca como alvo principalmente predadores sexuais, pelas experiências que passou depois que perdeu o pai.

A morte ignora ela na lista, que devia ter morrido já há algum tempo, e por isso o relógio dela parou nos últimos segundos. A morte não quer perder seus encontros.

A menina pode ver os relógios também? Who knows! Mas se eu fizer uma continuação, vai ser focado nesses relógios-Cronômetros. 

Jeanne Calment, que a morte citou, foi a mulher mais velha a se ter conhecimento na história.

P.S: Coisas ruins acontecem com pessoas boas também, infelizmente. Se você sente que o único alivio pode vir do 'beijo da morte', saiba que não está sozinho, que ainda há muitos sabores de sorvete para experimentar na vida. E que minha caixa de mensagens sempre estará aberta para conversar. 

Você não está sozinho(a)


Nov. 26, 2018, 4 a.m. 7 Report Embed Follow story
8
The End

Meet the author

Ayzu Saki Detesto o tempo, sempre adianto meu relógio para nunca me atrasar, e ainda assim me atraso. Detesto o tempo, porque ele não cura as coisas, só passa. Queria domar o tempo mesmo, para viver todo o que quero viver e não pode caber na minha vida. Essa é a minha sina, e um monte de histórias não terminadas no fundo da gaveta.

Comment something

Post!
Inativo Inativo
Confesso que tenho um fraco por histórias que retratam um ponto de vista na personagem da Morte, mas são poucas que realmente me agradam. Essa foi uma dessas raras que eu gostei, tipo MUITO! Achei incrível você ter colocado a Morte como algo que é capaz de burlar normas, pois interpretei isso como uma "falha de caráter", já que é dever dela levar as pessoas embora, porém ela fez uma exceção com a sua menina. Acho que essa peculiaridade humanizou o personagem para aproximá-la do leitor. Achei realmente a história incrível!
April 28, 2019, 20:26
Zen Jacob Zen Jacob
Eu gostei bastante da ideia da história, a parte dos cronômetros que você falou sobre inserir em uma possível continuação me fez pensar em Death Note. Me interessou bastante pela forma como você descreveu de a morte ter poder em controlar o tempo das pessoas, não apenas ser a figura que carrega as almas por aí. Inclusive, isso me faz pensar: então a morte era conivente com os assassinatos que a garota cometia para vê-la? A garota conseguia selecionar pessoas que de alguma forma morreriam no período certo de tempo? Ou a menina realmente assassinava pessoas antes do tempo e isso poderia de alguma forma ferrar com o destino traçado previamente para o mundo? São tantas possibilidades que a história realmente ganha muito potencial. Concordo com a Solemn que as notas poderiam estar na história mesmo, mas deu pra entender que você estava organizando as ideias - espero que realmente seu conto tenha futuro, porque tem bastante coisa pra trabalhar aí. Ah, não sei se você se inspirou nisso, mas tem um teste para psicopatas que descreve exatamente essa situação que você colocou no conto, o que eu também achei interessante!
November 27, 2018, 00:19

  • Ayzu Saki Ayzu Saki
    Isso ainda dá pano para manga haha Mas realmente não sei ainda se vou continuá-la ou não, e por isso as notas finais também. Uma forma de esclarecer alguns pontos da estória que tenham ficado em aberto. Caso eu continue, é bom saber que não é tão louco omo imaginei que seria. Nunca ouvi falar desse teste, mas parece interessante. November 27, 2018, 14:52
Marianna Ramalho Marianna Ramalho
Eu achei a one o máximo! Adorei, não sei como você teve dúvidas sobre postar (mentira, sei sim, sempre passo por isso). Não tenho nem palavras pra dizeer o quanto foi bom.
November 26, 2018, 17:06

  • Ayzu Saki Ayzu Saki
    Obrigada! É bom ouvir isso, sei bem como se sente, tenho uma pasta de estória não postadas no computador hahaha Fico feliz que tenha gostado <3 November 26, 2018, 17:09
~