nilo_nobre Nilo Nobre

Um grupo de soldados parte em missão para investigar uma ilha isolada até que começam a ser atacados por criaturas desconhecidas.


Short Story Not for children under 13.

#ação #videogames #mistério #suspense #sobrevivência
Short tale
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A ilha

Chegamos à ilha durante a noite, com faróis iluminando apenas o entorno imediato e aportamos em uma praia no setor sudeste. Achamos estranho não haver nenhuma luz no local. Onde estariam as instalações que apresentavam a anomalia? Isso não me cheirava bem. Teríamos que vasculhar tudo para encontrar o lugar antes de averiguar o problema.

Não havia sinal de que alguém tivesse passado por ali. Encontramos uma trilha que parecia seguir para o centro da ilha. Adentramos. Eu só queria cumprir a missão rápido e voltar para minha noiva, mas parecia que levaria mais tempo.

No percurso, estranhei o silêncio da floresta. Já treinamos em todo tipo de ambiente e nunca encontramos uma mata assim. Não havia um único grilo ou cigarra que fizesse aquele lugar parecer normal.

Avançamos com calma. Por garantia, ativamos as lanternas e os óculos de visão térmica. Ouvi um barulho próximo e dei o comando para o esquadrão parar. Ficamos de prontidão. Ouvíamos passos espaçados e pesados, mas não conseguíamos ver nada. Assumimos formação de defesa costa-a-costa.

O barulho à nossa volta, vindo do interior da mata, foi se intensificando por toda parte. Seja lá o que fosse, não era só um. Estávamos cercados. Até que não conseguíamos mais ouvi-los. Não parecia que tinham ido embora. Ficaram parados, muito próximos. Esperando.

Nós também ficamos quietos. Apenas as armas e lanternas se moviam. Eu quase podia ouvir meu coração batendo. Dei um passo para averiguar atrás de uma moita, vi um arbusto se mover. Destravei a arma. Naquele silêncio, o click pareceu estrondoso.

A moita se moveu e alguma coisa pulou do mato sobre Júlio. Meu soldado foi puxado para fora da trilha. Não consegui ver o que o atacou. Só o burburinho e a exclamação dos outros. Ouvimos outros passos na direção em que ele fora arrastado. Atiramos para tentar acertar as criaturas, sem sucesso. Júlio gritava, sua voz se distanciando. Seguimos mata a dentro, fora da trilha. Nunca deixei nenhum homem para trás.

O silêncio caiu sobre nós mais uma vez. Conseguíamos ver o sangue de Júlio em algumas folhas. Ainda quente, destacava-se na visão térmica. O que era também um complicador. Com tantos vestígios espalhados, era impossível saber para onde o levaram.

Caminhamos poucos metros até que Pedro tropeçou em algo.

— Sargento! Veja isso.

Voltei. Era um braço. No pedaço de uniforme que ainda estava visível, a insígnia da divisão de comunicação e a identificação de Júlio. Estávamos agora em um ambiente hostil, sem reforço, sem comunicações e sem ideia do que diabos nos espreitava. Lembrei de Mônica. Justo agora que estávamos perto de casar.

Não podia me perder em pensamentos. Tinha que manter a cabeça no jogo para garantir que ia mantê-la onde está. Dei o comando para voltarmos para a trilha. Armas destravadas. Seguiríamos adiante até encontrar as instalações, talvez fossem mais seguras do que a selva.

Continuamos a nos mover com cautela. Encontramos o que parecia um velho galpão abandonado, o portão estava travado, mas Jorge conseguiu fazê-lo funcionar.

Logo que ele o levantou, talvez pelo barulho, ouvimos os malditos passos vindo em nossa direção de novo. Corremos para dentro e puxamos o portão para baixo o mais rápido que pudemos. A engrenagem travou. O som dos passos ficou mais intenso e mais próximo. Fizemos força. Não baixava. Jorge percebeu que algo lá fora estava impedindo a descida. Ele passou para o outro lado e viu que era uma corrente. Quando ele a soltou, a porta desceu de uma vez, prendendo-o lá. Ouvimos seus tiros e seus gritos.

Menos dois homens, mas não havia tempo para lamentar. Vasculhamos o galpão para evitar novas surpresas. Havia apenas um grande maquinário, interconectado por uma infinidade de cabos. Sem energia.

Resolvi que passaríamos a noite ali e retomaríamos o reconhecimento durante o dia, com melhor visibilidade. Ainda ouvíamos os passos lá fora. Aquelas coisas sabiam que estávamos ali. Pedro resolveu abrir um buraco no portão com um tiro. Um pequeno olho mágico para espiar o que estava nos perseguindo.

— Não faça isso! O estampido pode entregar nossa posição para mais coisas.

— Se ainda há alguém na ilha, talvez possam nos ajudar.

— Veja o que aconteceu com soldados treinados! Você acha mesmo que há alguém aqui que possa fazer algo por nós?

— Acho que vale a pena tentar.

Disparou, antes que eu pudesse dar a ordem para que não o fizesse. Quando o zumbido do disparo reduziu a intensidade nos meus ouvidos, ouvi os passos se afastando rápido. Pedro olhava pelo buraco. Por um tempo, ficou parado. Encostado na porta metálica.

Eu ainda estava com as mãos nas orelhas quando perguntei:

— O que foi? O que você tá vendo?

— Eu devo estar louco. Ou acabo de ver um monstro de livro infantil.

— Como assim monstro? Um pé grande?

— Um dinossauro.

— O que? Mas essas coisas não existem. Pelo menos não mais.

Passamos boa parte da noite discutindo sobre aquilo. Não tínhamos recebido nenhuma informação sobre as instalações da ilha ou sobre o que estavam fazendo aqui antes das tais anomalias elétricas. Que tipo de experimento estariam fazendo? Seriam recriações genéticas? Androides customizados? De todas as formas, tinha saído do controle e estávamos sós. Teríamos que achar uma forma de sobreviver.

Depois que o Pedro dormiu, peguei a foto da Mônica que sempre carrego comigo. Aquele sorriso sempre me acalmava. Comecei a temer pelo desfecho daquela missão. E se não conseguíssemos voltar? Merda. Eu nunca tinha perdido nenhum homem antes, e agora tinha pedido dois em uma única noite. Todos meus amigos de infância e de alistamento. O que ia dizer para as famílias deles? Dei mais uma olhada para o sorriso na foto. Faria de tudo para voltar para ela. Lidaria com as consequências depois.

Na manhã seguinte, Pedro olhou pelo buraco para ver se era seguro sair. Tudo parecia livre, abrimos o portão. Pedaços do Jorge estavam por toda parte. Um pouco mais adiante, vimos que ele nos deixou um presente. Conseguiu atingir um dos malditos, a coisa jazia morta na beira da mata.

Não era nada cibernético. Não faço ideia de como fizeram aquilo, mas era tudo carne e osso. Igualzinho a esses que a gente vê em filmes, mas cheio de penas coloridas.

Isso facilitou muito a nossa vida. Não foi difícil perceber que as penas tinham alguma função de camuflagem. Mas por mais difícil que seja ver uma onça ou uma jibóia, aqueles padrões coloridos nos chamavam a atenção muito mais do que nos confundiam. Malditos répteis de sangue frio, por isso não os víamos nos visores térmicos. Mas na luz do dia com aquelas penas espalhafatosas? Aí era outra história. Avançamos para o interior da ilha abatendo dezenas desses infelizes. Quando ouvíamos ruídos se aproximando na mata, as penas vermelhas apareciam no meio do mato, quase como um alvo gritando: atire aqui.

Chegamos em outro local. Parecia uma fazenda abandonada. Talvez estivesse funcionando quando o evento ocorreu. Já tínhamos ideia do que poderia ter acontecido com os moradores.

Avançamos com cautela pelo pátio da casa. Não havia movimento lá dentro, mesmo assim, não sabíamos o que poderíamos encontrar. A porta principal estava aberta. Entramos. Um cheiro de mofo e podridão dominava o ambiente. Vasculhamos os cômodos. Encontramos os esqueletos dos moradores.

— Sargento, tem algo errado.

— O que foi?

— Esses corpos estão diferentes dos outros. Eles não foram estraçalhados como nossos colegas. Não há marcas de lacerações nos ossos, mas há marcas de liquefação nas diáfises.

— O que isso significa?

— É como se a carne tivesse sido dissolvida por algum tipo de ácido.

— Agora temos dinossauros que sabem química?

— Acredita-se que alguns desses bichos conseguiam secretar substâncias corrosivas. Parece que é possível.

— Ótimo. Mais essa agora para complicar nossa vida.

Ouvimos um barulho na cozinha. Apontamos as armas. Decidi que não iríamos para o combate direto. Se pudéssemos, passaríamos sem sermos percebidos. Sinalizei as ordens com as mãos e nos movemos em direção à saída.

Ao chegarmos à porta, vimos um bando do que pareciam perus, mas com grandes garras curvadas nas patas. No instante que os vimos, eles também nos viram. Corremos para evitar seja lá o que fosse que cuspia ácido. Se fosse para enfrentar algo, tentaríamos a sorte com as galinhas assassinas.

Tão logo começamos a correr, os bichos nos perseguiram. E como eram rápidos. Entramos na mata para tentar reduzir a velocidade deles, mas foi pior. As criaturas conseguiam pular facilmente entre galhos e árvores. Nós é que estávamos em terreno desfavorável. Logo nos alcançaram, mas não seríamos um lanche fácil. Já estávamos afastados da fazenda e começamos a revidar.

Consegui abater alguns. Pedro aniquilou vários, mas eram muito mais do que a gente tinha visto. Quanto mais matávamos, mais deles apareciam. Minha munição acabou. Enquanto trocava o carregador, um maldito peru pulou sobre meu braço com aquela garra gigante. Fez um corte horrível, que sangrava sem parar. O doutor tirou o bicho de cima de mim e o exterminou. Matou mais alguns à nossa volta enquanto eu estava no chão tentando parar o sangramento. Veio o silêncio.

Parecia que tínhamos eliminado todos, ou, pelo menos, afugentado eles. Pedro se apressou para me ajudar. Pegou seu kit, me deu uns analgésicos e suturou ali mesmo. Disse que se demorasse mais, eu perderia o braço. Por muito pouco, o corte não atingiu o tendão, o braço ainda funcionava o bastante para usar a arma. Teria que funcionar.

Ele estava terminando de guardar os medicamentos quando vi uma grande boca se abrindo às suas costas. Não deu tempo de avisar. Não sei de onde aquilo veio. Não ouvimos nada. Era um bicho enorme para ser silencioso daquele jeito. Possuía duas cristas na cabeça e era grande como um crocodilo. Talvez ele estivesse de tocaia ali, como esses animais fazem. Pobre Pedro, não teve chance nem de reagir. Nem mesmo de gritar. Peguei a arma dele e a minha, corri. Devíamos ter continuado correndo em vez de enfrentar aqueles bichos. Agora estava só. Minhas chances de voltar para Mônica eram cada vez menores.

Achei uma trilha e a segui, indo o mais rápido que podia. O braço latejava. Eu sabia que não conseguiria atirar direito com ele e, para completar, me sentia um pouco tonto devido ao sangue que perdi. Adiante, na trilha, encontrei um prédio. Parecia ser uma das instalações que tínhamos que averiguar. Consegui entrar, mas travas eletrônicas não estavam funcionando. Escorei as portas com uma mesa para que nada entrasse.

Lá dentro, uma grande quantidade de computadores, mais máquinas e uma infinidade de cabos. Tudo parecia desligado, exceto por um pequeno monitor que brilhava na escuridão. Tentei acessá-lo. Parecia que estava conectado a algum servidor reserva, me pedia para registrar meu relatório. Fiz um inventário de acontecimentos e baixas e cliquei em salvar. Esperava que aquele documento chegasse em alguém que pudesse me ajudar.

Continuei a vasculhar o prédio. Não havia nada útil. No andar superior, consegui ver as construções principais da ilha. Não estavam longe. Poderia chegar lá em pouco tempo se conseguisse correr. Pensei um pouco na direção que deveria tomar quando saísse. Desci as escadas e me dirigi para a porta. Ouvi passos lá fora. Tudo que eu precisava era de mais daqueles infelizes. Sozinho, tonto e com o braço machucado. Esperei.

Quando o barulho parou, removi a mesa da porta e saí. Não vi nenhuma pena vermelha. Avancei para o prédio principal. Corri até o meio do caminho, me senti zonzo e reduzi o ritmo. Ouvi passos pesados, muito diferentes daqueles do dia anterior. Parei. Enquanto observava a trilha, percebi o lagarto gigante com duas cristas na cabeça. O desgraçado voltou para mais.

Acho que passei muito tempo decidindo o que fazer. Ouvi um barulho atrás de mim. Olhei em volta e vi várias daquelas penas. Estava cercado. O caminho de volta estava bloqueado por aquelas coisas, só poderia ir em frente, tentar a sorte com o lagartão. Essa ideia era absurda. Como já sabia que poderia abater os penados, resolvi abrir caminho de volta para não enfrentar o monstrengo cabeçudo.

Disparei nos que estavam mais próximos, os outros partiram para o ataque. Meu braço machucado dificultava a mira. Desperdicei muitos tiros, mas consegui derrubar os que estavam no caminho. Com um pouco de sorte, talvez, conseguisse passar. Ouvi os passos pesados vindo na minha direção. Os tiros o alertaram da minha presença. Corri de volta.

Percebi que estava sendo flanqueado. As penas vermelhas me acompanhavam em ambos os lados da trilha. Segurei a arma de Pedro na outra mão e atirei para os dois lados. O corte no braço latejava e a tontura me dava vertigens. Precisava pelo menos afastá-los. Era impossível atirar com precisão e eu estava muito próximo de desmaiar. Lembrei de Mônica. Eu não ia desistir. Continuei. Cada vez mais, chegavam perto de mim. Acertei alguns tiros, eles pararam de me perseguir. Só restava o crocodilo. Olhei para trás para avaliar a situação, vi que ele ainda estava longe. Teria tempo para chegar em segurança no prédio.

Quer saber? Resolvi aproveitar a distância. Recarreguei cada arma. Fiz mira com o outro braço e disparei um pente todo contra o monstrengo. A cabeça rodava, devo ter errado vários tiros, mas percebi que ele sentiu alguns. Estava machucado, mas acelerou em minha direção. Quando esvaziei o pente do meu fuzil, peguei o de Pedro. Apontei de novo. Tentei me acalmar. Continuei atirando. A tontura estava um pouco melhor, consegui acertar mais vezes. Ele cambaleava, mas continuava vindo. Por que ele não morria de uma vez? Os dois fuzis estavam vazios. Me virei para voltar ao prédio. Quando olhei para frente, vi as duas cristas e a boca gigante aberta de um segundo lagartão que me aguardava. Senti um gosto amargo que não sei se era arrependimento por não conseguir voltar para Mônica ou se era meu próprio sangue. Então ficou tudo escuro. Aquela foi a primeira vez que morri.

Acordei atordoado me debatendo para retirar o monstro de mim, mas não havia nada além de uma sala escura. Estava na frente do pequeno computador onde registrei meu relatório, dentro do prédio. Não sei o que aconteceu, mas aproveitei a segunda chance e avancei de novo, dessa vez por outro caminho. Muitas outras vezes voltei para os locais onde enviava relatórios, mas consegui chegar ao prédio principal e enviar um S.O.S. Junto do meu resgate, veio um ataque aéreo que reduziu tudo na ilha a pó. Nem mesmo soube o que estava acontecendo nem porque tinha dinossauros ali. Eu só queria estourar aqueles putos e me mandar.

Quando retornei, dei as más notícias para todos os familiares dos meus soldados, meus amigos. Foi horrível. Na cerimônia de sepultamento, todos foram condecorados com medalhas de bravura. Mônica e eu nos casamos. Apesar de tudo, eu tinha muita sorte, pois veria aquele sorriso por toda a minha vida. Então apareceram letras gigantes no céu: game over.

***

Chegamos à ilha durante a noite, nos aproximamos com faróis iluminando apenas o entorno imediato e aportamos em uma praia no setor sudeste. Achamos estranho não haver nenhuma iluminação no local. Onde estariam as instalações que apresentavam a anomalia? Isso não me cheirava bem. Teríamos que vasculhar tudo para encontrar o lugar antes de podermos averiguar o problema. Além disso, algo me incomodava. Se era apenas uma missão de reconhecimento, por que o QG enviou um lança mísseis com tanta munição?

Dec. 12, 2022, 9:22 p.m. 2 Report Embed Follow story
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The End

Meet the author

Nilo Nobre Historiador, arqueólogo, escritor e quadrinista. É sempre bom aprender coisas novas.

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del rite del rite
Eu esperava TUDO menos esse final. Amei! E você escreve muitooo bem!!
December 13, 2022, 23:55

  • Nilo Nobre Nilo Nobre
    Brigadão. Que bom que gostou. Eu tinha feito ele para participar um edital com o tema "primeira vez". December 14, 2022, 00:02
~

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