yeallow jude .

Em notas musicais e partituras de caligrafia apressada, Jungkook transborda seus sentimentos mais profundos. E, conforme a ponta de seus dedos trêmulos pronuncia a suavidade musical para além das teclas do piano, os sonhos azuis do pianista ressonam para um vazio de incompreensão. Do outro lado do corredor empoeirado, em cores que escapam das cerdas gastas dos próprios pincéis, Jimin colore seus sonhos com um otimismo amarelo repleto de insegurança. No auge dos anos 80, entre o rock e a juventude intensa das festas de garagem, dois jovens artistas perseguem seus sonhos acompanhados pela solitude. Enfim, esta é uma história sobre dois sonhos entrelaçados em uma tela; um azul, outro amarelo. E, principalmente, sobre dois garotos cujos segredos dos próprios sentimentos tornam-se nítidos com o afastar das cortinas de uma apresentação.


Fanfiction Bands/Singers All public.

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Jimin nutria um fascínio por cores que beirava uma doce estupefação.

A paixão não se esgotava tão somente na ideia das cores exteriorizada em tubos de tinta nos quais ele mergulhava as cerdas de seus pincéis, mas originava, dentre tantas outras, a perspectiva de que ele mesmo era uma tela branca feita exclusivamente para ser colorida pelas nuances da vida.

Talvez aquela fosse a razão pela qual ele gostava tanto de todo tipo de arte. Um quadro, por exemplo, era foco de seu fascínio, porque nada o maravilhava na mesma proporção que a fusão de cores; a combustão de tons frios e quentes eternizada pelos dedos de alguém, saída diretamente da mente de tal, cores gravadas em uma tela que nada mais era que mero espaço branco antes de servir de apoio para o deslize suave de um pincel.

Fossem pinturas a óleo ou não, Jimin amava a arte com a força de seu âmago, a guardava nos contornos profundos de seu coração.

E, exatamente por conta daquilo, deslizou as fitas do avental amarelo pelo corpo e o arremessou no fundo do armário de metal cinza, que foi fechado em um baque na sequência.

Em uma corrida desajeitada e após despedidas padronizadas, alcançou a rua, a estação, o vagão de trem cinza-metálico, a multidão de casacos escuros e destino contrário ao dele nas escadas. Os dedos passearam por parte dos cabelos quando ele estava adentrando a loja de tintas, tropeçando, a lentos rodopios, entre os corredores meticulosamente organizados que prendiam seu olhar cintilante em cada ângulo retangular colorido.

Ele colocou o tubo de tinta sobre o balcão e enfiou a mão no bolso da calça larga que formava uma cascata até os tornozelos.

— Deseja mais alguma coisa? — Disse a funcionária do recinto enquanto os olhos de Jimin moviam-se na contagem mental de moedas que ele realizava com os dedos no bolso, sussurrando sem som por entre os lábios a desajeitada matemática.

O garoto depositou a quantia exata no balcão e soltou o ar em um sorriso. A atendente estreitou os olhos para a excêntrica empolgação.

— Obrigado, So Min!— Ele disse, ainda sorrindo, lendo a identificação estampada na camiseta dela.

Agarrando o tubo de tinta azul durante o flash de entusiasmo, Jimin apressou o passo para a rua, onde tornou a correr novamente. Quando avistou o prédio acinzentado de aparência abandonada no final de uma das muitas ruas vazias, diminuiu o passo e abriu o tubinho, levando-o às narinas.

Fechou os olhos e inspirou por um milissegundo. A sensação fê-lo sorrir durante um instante, sorriso que persistiu até ele erguer a mão e, de relance, enquanto fechava o pote de tinta, resvalar-se no fato de que estava atrasado, escancarado pelo relógio apressado em seu pulso.

As ruas repletas de ausência, então, presenciaram sua corrida frequente outra vez.

Os passos apressados na velha escada de madeira escura e empoeirada produziram um barulho quase monótono no ambiente deserto do interior da construção antiga, como o faziam tantas outras vezes no silêncio habitual e característico dela.

A escuridão pela falta de cores nas paredes e corredores de madeira e carpete antigo só não alcançava a totalidade em razão das frestas dos vidros rachados das grandes janelas, que se permitiam fazer a luz solar vacilar para o interior do prédio soturno, fazendo com que as partículas de poeira pairassem no ar em uma dança suave, para então agitarem-se e sumirem com o corpo de Jimin cortando a toda velocidade por elas.

Ele, inclusive, costumava imaginar cores no local, com o intento de tornar a atmosfera incolor menos insossa aos seus olhos de artista.

E quando o garoto imerso na própria distração finalmente alcançou o topo das escadas, respirou fundo, podendo, enfim, diminuir o passo, deixando a respiração ofegante se acalmar enquanto elaborava as desculpas que ofereceria dali a poucos instantes. A mentira teria de ser doce e sutil, ou o olhar de sua professora de pintura denunciaria o conhecimento de que ele sabia do próprio atraso.

No corredor escuro, diversas portas de madeira marrom escura alternavam-se de ambos os lados, umas abertas, outras não, encerrando mistérios artísticos ou ausências silentes por detrás de si. Ele passou por cada qual delas, balançando o pote de tinta azul em uma mão e o estojo de pincéis em outra. A distração o auxiliou a formular uma desculpa instantânea.

De alguma forma, por algum motivo oculto, sentiu que havia algo diferente, estranho, no ambiente, mas era incapaz de identificar o quê, exatamente. Não pertencia ao local imutável, disso ele sabia por conta daquela sensação apertada no estômago.

Era o sentir antes de pensar que o deixou nervoso ante o abandono da familiaridade, forçando-o a abandonar as próprias distrações para aguçar os sentidos.

Porém, como o hábito se sobrepõe à razão, seu pé enroscou naquele mesmo relevo do tapete de sempre. Em todas as terças-feiras ele fazia o mesmo percurso, e, em todas elas, tropeçava no mesmo local.

A expressão aguçada foi abandonada e abriu espaço para uma mal humorada de quem comete o mesmo erro dez vezes e não tira de tais acontecimentos nenhum conhecimento. E, com outra expressão de sofrimento, ele constatou que havia derrubado a tinta azul inteira no corredor. O potinho jazia tristemente no tapete; o líquido azulado se derramava na superfície velha e empoeirada.

— Justo a tinta azul... — ele resmungou, se abaixando para tentar remediar a coloração azul que continuava a escorrer do tubo destampado para o tapete e o piso de madeira estalada.

A mente, como de costume, se resvalou para o pensamento ácido de que aquela era a única maneira de o corredor do prédio adquirir alguma cor, e, por dedicar-se a tal mentalidade, a novidade estranha e musical que preenchia os corredores habitualmente escuros e silentes quase passou despercebida.

Com a tampa do pote, tentou empurrar o que podia da tinta do tapete mofado para dentro do potinho agora quase vazio; as tentativas foram falhas, de modo que tudo o que ele conseguiu foi manchar a ponta dos dedos e os joelhos dos jeans surrados de tinta azul.

Imerso na frustração e na dúvida que gradualmente o consumiram naquele prédio de escapismo situado em ruas isoladas da grande metrópole, sozinho naquele lugar onde ninguém parecia aparecer, uno naquele sentimento, se deixou cair no tapete e fechou os olhos; um xingamento na ponta da língua, prestes a sair — pagara tudo que tinha naquela tinta, ou seja, uma fortuna. Com a postura derrotada, os braços apoiados nos joelhos, engolindo o bolo em sua garganta repetidamente, moveu a atenção para além da própria percepção, para os arredores, a fim de expulsar a ardência nos olhos e a incerteza que surtia na busca por um significado irracional implícito no ocorrido.

Então, enfim, notou o que havia de diferente.

Um som incomum e delicado, ao qual Jimin estava alheio há pouco, preenchia a atmosfera do corredor usualmente silencioso e intocado pela luz diuturna, e também os ouvidos do artista, que parou de recolher os instrumentos de pintura para dedicar-se integralmente ao que sua lenta assimilação havia recém descoberto.

De repente, o silêncio pareceu um pecado quando a atmosfera poderia ser preenchida pelos sons de um piano que agora deslizavam, em doces ressonos, pelo corredor, este que, em um instante que parecia tão distante, era escuro e empoeirado e, no momento seguinte, adquiriu todas as cores jamais vistas que numa dança explodiam para transformar tudo em música.

De súbito, tudo era música, desde a tinta azul derramada sobre o corredor até as batidas do coração de Jimin — que fortuitamente possuía o dom e o infortúnio de sentir a arte profundamente.

E com a curiosidade confusa proveniente do baque que as novidades provocam, ele constatou, ao levantar os olhos para a fresta da porta parcialmente aberta, que naquela sala vazia que testemunhara tantos tropeços seus agora estava um garoto tocando piano como se sua vida dependesse disso.

Ele estava de costas para a porta, então o que era visível de si eram os cabelos negros salpicados de um azul-tempestade, os músculos das costas se movimentando suavemente debaixo do tecido fino da camiseta branca que os cobria, e seus dedos. Dedos esses que se moviam em uma velocidade rápida, alcançando as teclas mais distantes do piano preto com maestria e delicadeza, acompanhados fielmente pelos fios de luz solar que escapavam da janela extensa e os deixavam mais pálidos e fascinantes ainda.

O pianista tocava o piano como se tocasse algo muito frágil; frágil como seus danos pareciam ser, de porcelana. Tocava, sobretudo, como se a música fluísse dele próprio, e não do piano. Estava tão entregue àquela melodia, os músculos das costas tão rígidos em redenção que, na verdade, parecia ser o piano que o tocava, e não o contrário.

Instantemente, a sensibilidade artística de Jimin surtiu, à flor da pele, e os pelos do braço dele se ergueram, as batidas de seu coração se alinharam na partitura e seguiram cada mudança de melodia e ritmo. Enquanto isso, seus pensamentos, capturados na intensa hipnose, se escondiam atrás dos olhos que não ousavam piscar, mas cintilavam na mesma proporção que os delicados raios de sol que fugiam da janela para persistir seguindo o movimento dos dedos do pianista.

Jimin tentou, mas, em pensamentos, foi incapaz de expressar o que tudo aquilo causava em seus sentimentos. Em sentimentos, talvez fosse tristeza ou alegria, ou as cores situadas no meio termo entre elas que tornavam tudo confusamente belo e incompreensível para a razão. Apesar disso, sentia que sua alma conseguia explicar, mas estava indisposta a tornar aquilo claro à sua compreensão.

Assim, entregando-se ao desconhecido, um sorriso de admiração ameaçou se desenhar em seus lábios entreabertos na respiração sutil ao mesmo tempo em que as lágrimas da compreensão inédita se preparavam para libertar-se dos cílios que não se moviam senão sob influência dos movimentos fieis àquelas mãos de seus olhos.

A música em si parecia não ter ápice, aquele ponto no qual todos os sentimentos se alteram em euforia para se acalmarem em determinada parte e depois desabarem em arrebatamento, porque ela inteira causava imersão, do início ao ocaso de sua vida.

E o pianista sentia, nitidamente detinha uma sensação para cada toque da música, cada encontro da ponta de seus dedos com as teclas duais. A postura indo e vindo, como ondas de um mar tempestuoso, denunciavam tal fato. E talvez fosse exatamente essa paixão que o pianista transbordava nas teclas que fez Jimin sentir seu singular e sincero amor pela arte finalmente compreendido.

O pianista, como prova incontestável, solidificando o momento, virou a cabeça para trás, continuando a deslizar as mãos pelo piano sem olhar. Jimin quase levantou com o susto, prestes a sair do local, e, se estivesse em pé, talvez tivesse conseguido ver o rosto dele, mas era incapaz de raciocinar diante de tamanha vulnerabilidade escancarada em sua frente.

Desafetado pela presença paralisada de Jimin, as costas do garoto subiram e desceram com mais frequência, e ele mexeu a cabeça para os lados, parecendo não tão somente tocar, como sentir. Jimin constatou, então, que aquele era o ápice da música para ele.

E a música, respaldando-se na reviravolta, realmente prosseguiu em seu estopim; naquela melancolia que só os sons das teclas de piano conseguem reproduzir com tamanha brutalidade, a mesma que fez a ponta dos dedos de Jimin agitarem-se em gentileza, no desejo de querer tocar o garoto que as pronunciava. Porque, naquele momento, ele parecia de vidro, sensível como a cor da tinta azul que agora secava no ambiente não mais incolor, não quando ele tocava daquela forma refém.

Mas a morte da música, como a de um sonho, chegou. E o garoto, como se recém despertado de um sonho, afastou as mãos das teclas que pareceram solitárias longe de quem a elas pertencia.

Jimin observou, com atenção exclusiva, seus ombros caídos subindo e descendo, da exaustão de sentir na música o que sentia por dentro, talvez. E Jimin poderia jurar que estava ouvindo uma respiração ofegante e exausta, uma respiração de quem acabara a de revelar seus mais profundos sentimentos por meio de um idioma não falado, mas sentido.

Sentido por quem sentia na arte o que não conseguia colocar em palavras. Jimin era fluente em tal ofício. E, na verdade, não sabia se aquela respiração que alcançava sua audição era a própria, a dele, ou ambas — sentiu ter estado prendendo o fôlego aquele tempo inteiro.

O garoto foco da atenção de Jimin colocou as mãos atrás da nuca pálida, os fios azuis se enroscando entre os dedos longos que, Jimin notou, tremiam.

Um instante atrás, as notas musicais floresciam da ponta de seus dedos, no seguinte, a música aparentava deslizar para dentro dele novamente, para onde pertencia.

No meio tempo entre a densidade recém terminada e o que a razão de Jimin o avisou que chegaria— o momento em que ele seria notado, já que não tinha mais a música como cúmplice — Jimin, que de fato ouvia cores, ao se atrapalhar para juntar as coisas, percebeu que se o azul tivesse mesmo som, soaria como aquela música. Soaria como aquela música tocada pelas mãos dele. Era um pensamento desmesuradamente alentador para se debruçar.

Mas como às vezes as cores pareciam querer afogar Jimin de dentro para fora, repentinamente, ele sentiu uma necessidade insuportável e desesperada de colocar todos aqueles sentimentos para fora, tirá-los de si, colorir tantas constatações. De colocar aquela música em uma pauta colorida, em uma tela branca, eternizá-la como gostaria de fazer em sua memória, colocar todas as cores que emanaram no teclado preto e branco em um quadro que, quando olhasse, o faria sentir tudo aquilo outra vez.

— Atrasado de novo, Park — Disse sua professora, Misa, assim que ele, atordoado, entrou na sala repleta de cavaletes e ares de competitividade cruel.

— Tive uma distração — ele respondeu, com a voz mais baixa que os batimentos em seu peito e os pensamentos em sua mente.

— Distrações só são boas quando te servem de inspiração.

Por isso, Jimin colocou a ponta do pincel já sujo de azul na tela e começou a pintar.

O garoto que tinha música na ponta dos dedos o inspirava.


🎹


Cinco Segredos de Beethoven

Um:

Jungkook considerava a música uma doença que precisava tocar para curar

June 28, 2021, 5:17 p.m. 0 Report Embed Follow story
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