Theïkí Timoría Follow story

Suas mãos tremiam enquanto ele observava seu reflexo na água. Não, de novo não, ele não aguentaria passar por aquilo novamente. Já estava farto das pirraças de Zeus e outra destruição massiva de seus queridos filhos, aqueles que moldou-os do barro com as próprias mãos, deu-lhes atributos, viu-os crescer e prosperar...

Não. Ele não deixaria que Zeus os matasse de novo. Se eram grandes e poderosos, deveriam zelar pelos indefesos mortais, não matá-los. A cada pequeno passo que a humanidade dava, o rei dos deuses se desgostava, pois sabiam que eles eram capazes de pensar e refletir e questionavam os deuses.

E se havia algo que Zeus não suportava era que o questionassem.

Para Prometeu, no entanto, a vontade do rei dos deuses pouco lhe importava. A humanidade não era a única a sofrer nas mãos dele, e Prometeu não seria o único desejando vingança futuramente.

Que Nêmesis distribuísse a justiça entre os mortais, então, mas seria ele a fazer algo entre os deuses.

Havia um lugar onde sabia que teria aliados, mas sua descida não seria fácil, tampouco tinha garantias de que seria ouvido. Era seu dever, no entanto, ser o portador da verdade. Alguém precisava fazê-lo.

A descida até o submundo não lhe era difícil, não, mas convencer os juízes infernais de que suas intenções eram nobres era outra história.

Antes que pudessem decidir o que fazer, a deusa da discórdia surgiu no Tribunal dos Mortos.

– O nosso senhor Hades deseja saber o que o criador dos Homens faz em seu reino.

– Eu venho para avisá-lo do futuro – o titã encarou a deusa de negros olhos e cabelos que o circundava enquanto o analisava. – Venho para falar com ele e com a rainha apenas.

Os três juízes se entreolharam, no alto de seus tronos, conversando entre si com vozes baixas demais para se ouvir de onde Prometeu se encontrava.

– Escolte o titã até os Elísios – disse Minos, por fim.

Eris assentiu e foi à frente, conduzindo o titã até a barca de Caronte, onde ambos entraram.

Prometeu observava horrorizado o caminho que percorriam, vendo milhares de seus filhos gritando pela dor e pelo desespero, alguns se lançando as águas e tentando se agarrar ao barco, implorando pela misericórdia daquele que os criara.

Caronte irritou-se com a atitude dos não-julgados e usou de fogo para espantá-los de volta a seus lugares. Eris riu daquilo.

– Como se sente vendo sua criação fadada a isso? – encarou o titã. – Deve ser doloroso dar à luz a coisas que morrem.

E era. Não eram mortes naturais, conforme seu planejamento. As mortes dos mortais eram violentas e prematuras.

– Todas as coisas morrem, senhora – fitou-a por fim. – Até mesmo os deuses e titãs.

– O que pretende, vindo aqui sem ser chamado?

– Esse assunto é somente para os ouvidos do senhor dos mortos.

Eris murchou por não poder saciar sua curiosidade, mas não insistiu.

O caminho que percorreram nos Elísios era muito mais agradável. Ninfas aglomeravam-se a beira d’água, cantando e tocando harpas e liras, atraindo a atenção dos humanos dignos de estar ali. As flores dançavam nos campos, as borboletas voavam livremente, e o riso de crianças podia ser ouvido.

Caronte atracou o mais perto possível da terra, onde a deusa e o titã desceram e ela o conduziu para a morada de seu senhor, o imponente templo de Hades onde somente os dignos poderiam pisar.

Entre os alvos pilares, sentado em seu majestoso trono, estava Hades, e no trono ao seu lado, Perséfone. Com um gesto, a rainha dispensou a deusa da discórdia, que se afastou após se curvar. Hades gesticulou para que o titã de aproximasse.

– O que o traz aqui, Pai dos Homens?

– Vim alertá-los sobre um terrível futuro. Está na hora de lutar, senhor dos mortos. Está na hora de erguer seu exército com outros deuses.

– Por que eu faria isso? Por que trairia meu irmão?

Os motivos eram por demais pessoais, e Prometeu demorou-se explicando os conteúdos das visões daquele dia, e seus planos para o que deveriam fazer quando tudo o que ele vislumbrou se concretizasse.

Mas Hades e Perséfone não acreditaram em suas palavras.

E assim que deixou o submundo, Prometeu fora capturado e levado perante os deuses. Acusado de conspiração, mesmo que ninguém pudesse testemunhar para comprovar tal ato.

Zeus lhe deu o benefício da dúvida, olhando-o do topo de seu trono, julgando-o assim como os demais.

– Faça isso novamente e não terei misericórdia. Terá um destino pior que os demais presos no Tártaro, isso te asseguro. Que não tenhamos essa conversa de novo, Prometeu.

Desistir não era do feitio do titã e ele sabia que não era o único descontente. Sabia que seria preso de novo, sabia do tormento que o aguardava, mas estava disposto a contrariar o próprio destino para provar que estava certo e o rei dos deuses errado.

Quando suas visões começaram a se concretizar, suas palavras passaram a ser ouvidas com mais atenção e cautela.

Hades logo percebeu que cometera um erro ao ignorar Prometeu.

E outros deuses descontentes uniram forças em segredo.

Prometeu sofreria seu martírio, sim. Era bom que Zeus acreditasse na derrota dele. Que continuasse se iludindo, então, pois o titã sabia o que deveria fazer.

Uma arma, sua arma.

Sua maior e melhor criação.

Fora isso que deixara para trás quando Zeus o acorrentara por roubar dos deuses o seu fogo e dá-lo para a humanidade. Era nisso que pensava todos os dias quando o grifo Éthon aparecia para lhe devorar o fígado, seu castigo divino.

Em sua arma e na família que perdera como castigo. A família que acreditava nele e sabia que sua luta era justa.

A hora de Zeus chegaria, disso Prometeu sabia.

E mal podia esperar por isso.