Olho a cidade de São Paulo ainda me espantando com o tamanho dela. Sinto o ar pesado e minha respiração lenta, a famosa poluição de São Paulo e isso você pode até ver a poeira de poluição divida entre o céu e o chão, completamente diferente do interior.
Encosto minha cabeça no banco e tento fechar meus olhos quando Letícia começa a me cutucar, com quinze anos ela é meu maior tesouro. Eu me viro para ela e sorrio.
— Sol, porque tínhamos que largar tudo lá, eu tinha amigos e tudo mais. — Lety fala sem desviar o seu olhar da minha direção.
— Lety, será melhor assim. Um novo recomeço e apenas nós duas. — Suspiro e mando para longe as lembranças do passado que insistem em aparecer em minha mente.
— Eu sei Sol, mas queria que as coisas fossem diferentes.— Falo enquanto seus olhos se desviam.
— Mas não são. A vida nos deu uma oportunidade então vamos abraçá-la.
Ela assente e volta a encarar a janela, eu sei como ela se sente e no fundo eu me sinto da mesma maneira.
Chegamos à rodoviária do Tietê, desembarcamos do ônibus e aguardamos pacientemente a nossa vez de retirar as nossas malas.
Lety pega a dela e eu a minha, preferimos não trazer muitas coisas e agora eu agradeço por isso.
Seguimos o fluxo das pessoas para não nos perdemos. Aqui é enorme andamos um pouco, passamos por lojas de bijuterias, até mesmo uma livraria.
Andamos até o outro lado da rodoviária e encontramos alguns restaurantes, com o dinheiro que dona Antônia havia me enviado pouco antes de partir, pudemos almoçar em paz.
Pego o celular e vejo quase uma hora para que o filho de dona Antônia chegar, enquanto almoçávamos escutávamos acordes de piano.
— Caraca Lety, o senhor ali toca muito.
Eu falo e aponto para Lety se vira em direção ao senhor de terno e gravata, que nesse momento toca Beauty And The Beast, de Howard Ashman e Alan Menken. Isso é muito emocionante, sou extremamente apaixonada pelo filme e eu não pude deixar passar esse momento.
Marisol Oliveira de Castro esqueça isso.
Eu penso enquanto eu me recordo da promessa que eu fiz a mim mesma quando eu coloquei os meus pés em São Paulo, que aquela menina que um dia eu fui morreria, assim como a minha antiga vida.
— Sol, esqueça a vida lá, vamos focar aqui e agora como você falou. — Lety me tira do meu devaneio me recordando das minhas palavras.
— Você tem razão.
Eu falo e continuamos a ouvir os clássicos que aquele senhor tocou. Não percebemos as horas passarem até meu celular tocar e vejo que é Renan, o filho de dona Antônia e em poucas palavras ele diz que está me esperando na entrada do metrô, porque será mais fácil de encontrá-lo.
Pago a conta do restaurante e eu vou de encontro com Renan, não foi difícil não encontrá-lo, ele se destaca na multidão. Ele esta encostado perto das catracas e assim que nos reconhece vem em nossa direção.
— Letícia, Marisol? — Renan pergunta encarando Lety e logo em seguida me encara.
— Sim somos nós. — Lety responde antes que eu tenha a chance de abrir a minha boca.
— Vou acompanhar vocês até a casa que minha mãe indicou. Vocês estão diferentes, mais bonitas. — Renan fala e logo abre um sorriso.
— Precisamos mudar você sabe. — Eu falo dando de ombros como se não fosse importante a mudança.
Faz alguns anos que não nos encontrávamos pessoalmente, nosso contato era apenas por telefone. Precisamos mudar antes de colocar os pés em são Paulo, uma mudança radical e definitiva.
— Você também está muito bonito, diga-se de passagem.
Eu falo e o puxo para um abraço. Renan agora está com o cabelo comprido, seus olhos castanhos parecem mais brilhantes e seu corpo está em perfeita ordem.
Eu me afasto de Renan, com toda certeza esse foi o abraço que eu mais senti falta em toda a minha vida.
— Então vamos? — Renan fala e sem esperar por uma resposta ele se vira e segue em direção à saída.
Seguimo-lo até um carro e, diga-se de passagem, que carro. Conforme fomos saindo da rodoviária tudo parecia se tornar real, a nossa nova vida se tornando realmente nossa.
Quase meia hora de percurso e chegamos a um bairro chique e Renan nos explica que é um dos bairros nobres de São Paulo.
Paramos em frente a um prédio todo em tom de marrom, realmente é como ele diz aqui as ruas são todas arborizadas e não uma cidade cinza como todos dão a entender, mas eu sei que eu tive sorte em encontrar a Antônia, nem em mil vidas vou ser capaz de recompensa tudo que ela está fazendo por nós.
— Minha mãe deixou algumas instruções nesse envelope, ela me passou a situação de vocês e estarei aqui se precisarem, eu moro no apartamento ao lado. — Ele diz enquanto me entrega o envelope.
Isso é fácil demais.
Saímos do carro e começamos a tirar as malas colocando-as no chão. Ele oferece ajuda, mas Lety e eu damos conta de subir com elas, não quero abusar mais dele.
— Eu não vou deixar que nada do passado de vocês venham a atrapalhar o presente e o futuro, somos uma família. Eu conheço a minha mãe e sei que se ela está ajudando vocês, é porque vocês são importantes para ela, por tanto para mim também. — Renan disse me encarando pouco antes de entrarmos no prédio.
— Eu nem tenho como agradecer a vocês pela ajuda, eu juro que será temporário. Assim que eu arrumar um emprego eu saio daqui e pago tudo o que ela nos deu.
Eu falo, eu não gosto de dever para ninguém. Estou emocionada e agradecida pela ajuda que eles estão me oferecendo, não é apenas uma ajuda. É um recomeço.
Seu sorriso é sincero e da para ver em seus olhos que ele está realmente querendo ajudar.
— Não tem o que agradecer, você disse que precisa de emprego em que você é formada? — Renan diz curioso.
— Direito, mas ainda não exerço porque formei há pouco tempo. — Respondo me lembrando de que eu não tive tempo de poder exercer.
— Vou ver se arrumo algo para você, se você disser que o que eu achar estiver bom.
Renan diz sério, encaro seus olhos e sei que ele está dizendo com sinceridade.
— Claro, com toda certeza.
Respondo realmente agradecida não tenho mais palavras para agradecer.
Coloco as minhas bolsas no chão e o abraço com toda força e sinto que encontrei em Renan um amigo de verdade.
Ele não demora a ir embora e Lety continua em silêncio.
Ela vem em minha direção e me abraça.
— Não deixe Sol, não o deixe vir me buscar. — Ela pede, mas seus olhos imploram.
— Eu não deixarei, prometo.
Prometo para Lety e suas lágrimas caem sobre o meu peito, eu não posso deixá-la sozinha nesse momento e não há ninguém que eu ame mais do que ela e não deixarei que nossas vidas cheguem ao fim, e farei o impossível para vê-la feliz.
— Não chore Lety, acabou eu prometo que acabou. — Falo tentando acalmá-la.
— Vamos recomeçar e reconstruir a nossa vida e nossos sonhos.— Lety diz com um fio de esperando surgindo em seus olhos.
— E Lety, jamais fale alguma coisa que possa nos comprometer. A nossa história acaba de começar de novo e eu quero que ela seja feliz. — Eu lembro a Lety.
— E sem criar laços, vai que precisamos sair. Não precisamos de despedidas.
Lety complementa me abraçando com mais força.
Não discutimos mais nada, depois disso, subimos até o apartamento e fomos desfazer as malas. O apartamento é muito grande e embora Antônia não tenha aceitado o aluguel, eu vou guardar o dinheiro que seria destinado ao aluguel para ela e outra parte para caso precisarmos.
Lety entra no quarto, pulando em cima da cama.
— Gosto dessa é macia. Muito maior que a minha e porque não posso ficar com o quarto maior? — Lety fala pulando sobre a cama, fazendo beicinho.
— Porque você que escolheu aquele e eu não troco.
Eu respondo lembrando-a que quando chegamos ela escolheu o primeiro quarto que encontrou.
— Argh, verdade. Só não precisava me recordar disso. Estou com fome. — Lety diz levando a mão no estômago.
— Eu também, vamos ver que encontramos na geladeira, embora eu acho que vamos precisar abastecer.
Falo enquanto íamos para sala à campainha do apartamento toca, meu corpo sente um calafrio e os olhos de Lety se arregalam me encarando. Fico parada no lugar com medo do que pode ser, ou melhor, de quem pode ser.
— Sou eu Renan — Renan grita do outro lado da porta.
Ouvir a sua voz conhecida me tranquilizou, pelo menos sabemos quem está do outro lado. Vou em direção á porta abrindo-a para que ele possa entrar e Lety não demora a ajudá-lo com as sacolas.
Renan entra segurando uma pizza e uma garrafa de vinho na mão, com um sorriso mais cínico que eu já vi na vida.
— Não se assustem eu ouvir dizer que duas moças do interior se mudaram para o apartamento ao lado e apenas quis fazer uma gentileza.
Renan diz fazendo uma cara de deboche que só ele sabe fazer e eu começo a rir.
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