EXT. COLÉGIO / OUTRO LADO DA RUA - DIA
Uma van escolar sai de cena, revelando o muro branco do colégio com um largo portão laranja onde crianças passavam por ele. RAIMUNDO (15) está sentado na grama tomando refrigerante por um canudo enquanto MARIA (10) está em pé ao seu lado conversando. Sua voz passa a ser o foco apenas quando o adolescente dá atenção para ela, cortando a conversa ao meio.
MARIA
... E então quando chegamos na escola segunda, o feijão tava crescendo! Dá pra acreditar?
RAIMUNDO
Deveria ter feito com batatas, é divertido também.
MARIA
Sério? Vou contar para a mamãe! Vamos fazer em casa!
O som de outra van chama a atenção de MARIA que parece se maravilhar com o veículo cobrindo a visão do portão do colégio.
MARIA
Você já andou em uma dessas?
RAIMUNDO
Não. Você já?
MARIA
Não. Eu venho andando. E também mamãe disse que são caras.
RAIMUNDO
Não sabia que morava aqui perto.
MARIA
(apontando para atrás dele)
Moro sim! E quando eu passar na prova de hoje eu vou estudar naquele colégio bem ali.
O foco muda. RAIMUNDO tira o canudo da boca para poder vira-se para trás, tendo uma noção de qual prédio se tratava mesmo não sendo possível ver o prédio.
MARIA
E advinha! Ano que vem vou poder escrever a caneta!
RAIMUNDO
Já consegue escrever de caneta sem errar? Não vai querer um caderno cheio de corretivo.
MARIA
Às vezes eu pratico… Mas mamãe vive brigando comigo porque não sei escrever meu nome.
RAIMUNDO
(em tom de brincadeira)
Nessa idade ainda não sabe escrever o nome?
MARIA
(fazendo um V invertido com os dedos)
É porque… Ele tem um chapeuzinho no meio dele que eu vivo esquecendo...
RAIMUNDO
Verdade… Seu nome é Maria Antônia, certo?
MARIA
Isso mesmo! Você tem dois nomes também?
RAIMUNDO
Não, é apenas Raimundo.
MARIA
Gosta do seu nome?
RAIMUNDO
Mais ou menos. Mas não me vejo com outro nome.
MARIA
Eu gosto do meu! Mesmo aqueles garotos chatos ficam falando ser nome de pobre, mas eles vão ver só, eu vou passar de ano e eles não!
RAIMUNDO soltou uma risada divertida pela menina o fazê-lo lembrar de sua irmã, cobrindo a boca com a mão.
MARIA
Você tem um sorriso lindo.
RAIMUNDO
(ainda cobrindo a boca)
Impressão sua.
Outra van se afastado do portão foi o gatilho para o rumo da conversa mudar.
MARIA
Você mora por aqui também?
RAIMUNDO
Tecnicamente não, mas chego rápido em casa.
MARIA
Então você mora longe da escola e vai andando?
RAIMUNDO
(bebendo mais refrigerante)
Sim.
MARIA
Nossa, crescer e poder fazer isso deve ser muito legal! Mas sabe o que eu quero mesmo quando crescer?
RAIMUNDO
O quê?
MARIA
Poder estudar de manhã! Igual você.
RAIMUNDO
Por que quer estudar de manhã?
MARIA
Porque parece ser divertido!
RAIMUNDO
Mesmo não podendo ver desenhos na televisão?
MARIA
Eu não vejo desenhos. Normalmente eu durmo. Por isso mamãe não quer me deixar estudar de manhã, mas eu disse pra ela que consigo acordar cedo se eu quiser!
RAIMUNDO
Tenho certeza que sim.
O som da bebida de RAIMUNDO sendo finalizada tomou conta do ambiente por breves momentos fazendo MARIA o repreender.
MARIA
Não pode fazer isso! Mamãe disse que é falta de educação fazer isso!
RAIMUNDO
Às vezes podemos fazer algumas coisas erradas.
MARIA
Quais?
RAIMUNDO
(prendendo o canudo entre os dentes)
Pular no sofá… Na cama… Ou comer leite em pó.
MARIA
Mas não brigam com você?
RAIMUNDO
É por isso que é escondido.
A alta sirene do colégio, fazendo lembrar um alarme de prisão, foi ouvida chamando a atenção de ambos.
MARIA
Está na hora! Você vai ver! Vou tirar a melhor nota e deixar mamãe orgulhosa!
RAIMUNDO olhando para o lado, puxa sua mochila para perto, tirando do bolso lateral uma margarida, entregando para MARIA em seguida.
RAIMUNDO
Para dar sorte.
MARIA
(pegando a flor)
Você fica bravo se eu der essa flor pra minha professora? É que ela ama flores e ela vai ficar muito feliz se eu der uma pra ela.
RAIMUNDO
Não... Pode dar para ela.
MARIA
Então vou indo! Não quero me atrasar!
MARIA olhou para os lados antes de atravessar a pista de mão dupla e sair correndo em direção ao prédio. Um carro passa na frente da visão de RAIMUNDO e quando se afasta, não é mais possível ver a menina.
RAIMUNDO arruma o canudo dentro da lata que segurava e puxa a mochila colocá-la nas costas, limpando a parte de trás da calça. Ele inclina-se para o lado, onde MARIA estava e observa uma cruz de concreto pintada de branco na grama. A margarida estava fincada no solo a sua frente.
RAIMUNDO olha para trás, por cima dos ombros, observando o portão que agora estava fechado. Voltando a encarar a cruz, puxa os lábios para o lado, aproxima-se dela e toca dois dedos em seu topo.
RAIMUNDO
(sussurrando)
Boa aula...
RAIMUNDO se afasta. O foco permanece na cruz e lentamente se aproxima até ser possível ler o nome de MARIA ANTÔNIA, falecida em 1974.
Vielen Dank für das Lesen!
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