sandranrs Sandra da Silva

As vezes fugir da nossa realidade não é a melhor opção, os sonhos nem sempre são o caminho da felicidade.


#19 in Übernatürliches Nicht für Kinder unter 13 Jahren.

#perseguindosonhos #contos #sonhos
Kurzgeschichte
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Desenhos na parede.

Foram diversos anos migrando de casa em casa, o que fez com que Lola se limitasse a criar vínculos com outras crianças, tornando-a antissocial e retraída. Por sorte, a pequena garota conseguia se refugiar em seus desenhos, que ficavam espalhados pelas paredes do quarto, alguns já rasgados devido às tantas mudanças, mas ainda estavam ali. Com dez anos, ela acumulava centenas de desenhos feitos por ela mesma, na tentativa de retratar um cenário perfeito para sua vida.

Os pais de Lola trabalhavam o dobro, até mesmo o triplo, do que os pais convencionais trabalham, então a garota sabia se virar muito bem sozinha. Pela manhã, por volta das 06:30, ela se levantava num pulo só e começava a preparar seu café, para em seguida percorrer alguns quilômetros até o ponto de ônibus, onde ficava sentada com um pequeno caderno de desenhos e um lápis preto, rabiscando e criando novos cenários para a próxima noite...

Lola escondia um segredo, e isso era tão incrível quanto qualquer outro poder que pudesse ser imaginado pela criança mais criativa em todo o mundo. Ela conseguia se refugiar dentro de seus desenhos, fugir para qualquer realidade paralela que quisesse criar.

Todas as noites, Lola corria para sua mesa de estudos, pegava seus lápis mais coloridos e bonitos e começava a moldar novos mundos. Na noite passada, ela desenhou um cinema onde passava seu filme preferido, com pipoca e refrigerante de uva. Em seguida, ela vestiu seu pijama, colou seu desenho ao lado da cama e ao fechar os olhos, despertou dentro do cenário mais perfeito que poderia existir naquele momento. Ela passou o resto da noite curtindo aquele lugar, mas quando o despertador tocou, ela sabia que era hora de voltar. Inexplicavelmente, ela não ficava cansada. Seu corpo parecia ser recarregado toda vez que ela viajava, mas ao acordar, ela voltava para sua realidade. Levantava, tomava café, ia para a escola e voltava para seu quarto.

Seus desenhos eram os mais diversos. Alguns lugares eram parques, outros eram galerias de arte, mas seu preferido era a sala de jogos. Às vezes, ela criava alguns amigos para brincar de coisas como pega-pega ou esconde-esconde, enquanto em outros dias, preferia passar suas noites na própria companhia. Naquela manhã, antes de tudo acontecer, ela acordou com a voz alta de seu pai gritando com sua mãe, palavras que ela ainda era muito nova para entender. Ela cobriu seus ouvidos com o travesseiro e esperou impacientemente os minutos passarem até que a casa ficasse em total silêncio, permanecendo apenas o eco do barulho que seu pai havia feito ao bater a porta antes de ir para o trabalho. Seu despertador tocou e ela o desligou na mesma velocidade em que se levantou, pegando o uniforme que estava perfeitamente alinhado sob uma poltrona.

Fazia muito frio aquela manhã, e o dia não havia começado bem. Então, na escola, ela decide não esperar pelo último sinal. De modo quase silencioso e imperceptível, ela pega sua mochila e volta caminhando para casa. Sem guarda-chuva, sem auxílio, sem ninguém, sem proteção. Ela anda pelas ruas da cidade, seus olhos rastejam para todos os lados procurando o melhor caminho para voltar para casa, mas é em vão. Lola se perde no centro da grande cidade, caminho oposto de sua casa. Já havia passado das cinco da tarde quando seus pais notaram seu desaparecimento. Telefonemas, ligações, polícia. Tudo isso se fez presente nas últimas horas. Não foi fácil encontrá-la.

Ela é encontrada adormecida perto de uma cafeteria, completamente molhada e com os olhos inchados de tanto chorar. A reação dos pais foi a esperada... a esperada para a história de Lola. Ela sentiu puxões que a levavam em direção ao carro, e em todo o trajeto até em casa ela ouve seus pais discutirem fervorosamente, questionando quem teria sido o culpado por ter uma filha tão "estranha" e mal-criada, que fugia da escola para aprontar pelas ruas da cidade. Ao chegar em casa, Lola desce do carro e corre meio sonolenta para dentro da residência, deixando seus pais para trás. Sua mochila estava encharcada e seus desenhos estavam todos derretidos. Aquilo partiu seu coração em mil pedaços. Ela precisava colá-los novamente.

— Felizmente, estou bem — diz Lola.

Pelo menos era isso que ela pensava.

Após seu banho, ela se senta em sua poltrona e com um lápis preto, desenha uma casa com árvores grandes balançando ao vento forte. Também desenha uma grande tempestade se aproximando. As lágrimas que caem de seus olhos começam a molhar o desenho. Ela está muito cansada.

Pingos de chuva molham seu rosto e Lola acorda assustada.

— Onde estou? — questiona a menina, olhando para todos os lados.

Ela estava dentro de seu próprio sentimento. Ao adormecer com o desenho nos braços, acabou sendo transportada para dentro do mundo, como de costume. Mas dessa vez, tudo é diferente. Pela primeira vez, ela está dentro de um pesadelo. Ela não sabe como agir ou o que fazer. Caminhando de um lado para o outro, consegue visualizar a silhueta de seus piores pesadelos. Correr não adiantará, pois ela sabe como os sonhos funcionam. Ela entra e só conseguirá sair quando o despertador tocar. Seria inútil lutar contra aquilo. Ela enche o peito de coragem e segue seu caminho, atravessando pontes altas, tão altas que não é possível ver o fim, apenas um abismo escuro e frio. Ela treme como nunca e está suando frio, até que uma voz surge na escuridão.

— Fazia muito tempo que eu não via outra criança.

Lola dá um pulo e vira-se para trás, e lá estava uma garota com a pele pálida e olhos escuros, mais escuros que a própria escuridão.

— Quem é você? — diz Lola com a voz trêmula.

— Eu me chamo Lola — sussurra a menina em tom baixo e tímido.

Que confusão tremenda, as duas eram a mesma pessoa. Como isso seria possível? O que estava acontecendo ali?

— Estou trancada aqui há muitos anos — diz Lola fantasma. — Me lembro da manhã em que me perdi no centro da cidade...

— Como assim? Nós voltamos para casa — balbucia Lola, confusa.

A garota fantasma olha aturdida, como se nada fizesse sentido. A verdade era apenas uma. Lola havia sido encontrada em um banco, segurando firmemente um desenho. Esse desenho era o mundo perdido onde ela estava há tanto tempo. Na vida real, Lola estava em coma em um hospital há muitos meses... As pessoas podem ser violentas com uma garotinha andando sozinha pela cidade.

A partir daquele momento, a luta para voltar seria grande. Diversos obstáculos começariam a aparecer até que Lola encontrasse a saída daquele mundo. Seus pais choravam pela "perda" da filha. Naquele momento, o trabalho para eles era o que menos importava, mas talvez fosse tarde demais para se arrepender de algo.

Os médicos às vezes recebiam sinais de melhora de Lola, mas nunca completos. Ela caminhava em direção à luz em seus sonhos, mas desaparecia na mesma velocidade que um beija-flor bate suas asas.

Meses e meses se passaram e Lola continuava perdida em seu pesadelo, andando por cavernas escuras e molhadas, ela estava tão cansada e quase desistindo de continuar.

— Eu queria ver meus pais — Diz Lola em tom de lamuria. — Eu queria poder voltar atrás e aproveitar meus momentos. Quero voltar para aquela escola chata, quero tentar fazer novas amizades, quero ver meus pais.

Naquele momento o corpo de Lola começa a flutuar e uma luz toma conta de todo o seu ser, ela desperta na cama do hospital, com seus pais ao seu redor em completa euforia por ter a menina de volta. Aquilo era a chave final para voltar, Lola precisava se arrepender de todos seus momentos perdidos, e se arrepender tambem de todas as vezes que fugiu para o mundo dos sonhos. Ela nunca mais voltara para lá, e isso a deixava feliz.










20. Mai 2023 15:36 13 Bericht Einbetten Follow einer Story
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Das Ende

Über den Autor

Sandra da Silva 20 anos. Aspirante a escritora. Te convido para trilhar essa jornada comigo, viajando entre contos e livros. Seja bem-vindo ao meu pequeno mundo de imaginações.

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Luiz Carlo's Luiz Carlo's
A emancipação da menina Lola, parabéns Sandra você escreve divinamente, continue que vai ficar cada vez melhor.. ABRAÇO 🤗
July 03, 2023, 22:07

Jean Duarte Q. Jean Duarte Q.
Conto fascinante! Parabéns!!
May 25, 2023, 23:32

Marcelo Farnési Marcelo Farnési
Muito belo! Parabéns!
May 24, 2023, 22:58

Amanda Kraft Amanda Kraft
Sandra, gostei da forma como você explorou a solidão, principalmente a de uma criança que tende a ser tão sugestionável. Perder-se em mundos cativantes é sempre uma saída para o que não se tem de verdade. No caso dessa, a falta dos pais é que a levou a introspecção. Ainda bem que ela acabou se encontrando e voltando para os braços deles. Um conto sensível, belo e triste. Parabéns, flor.
May 21, 2023, 14:43

  • Sandra da Silva Sandra da Silva
    Muito muito obrigada, fico feliz em saber que você tenha gostado ❤️‍🔥 May 21, 2023, 14:43
CS Crislaine de Souza
Incrível!
May 20, 2023, 14:35

  • Sandra da Silva Sandra da Silva
    ❤️‍🔥❤️‍🔥❤️‍🔥❤️‍🔥 May 21, 2023, 14:44
~